Cecília escrita por Vanda da Cunha


Capítulo 9
Uma conversa sincera




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— Seu pai nos disse, que lhe deu a fazenda ... Por que não diz a verdade a ele?

 

— De que verdade está falando, Rosália? — Cecília levantou um pouco as sobrancelhas e engoliu em seco, a mulher simples e pouco letrada conseguira perceber seu descontentamento.

 

― Você é uma moça inteligente, e sabe do que estou falando. — Houve um hiato de infinitos segundos. — Não sei como o patrão não percebeu...

 

A jovem colocou a mão no queixo, começara a gostar da cozinheira, abriu-se para ela.

 

— Eu acho que ele já percebeu, Rosália. Talvez tenha medo de me perguntar, por já conhecer a resposta.

 

— Essa fazenda é a vida do seu pai, Cecília. Eu sou apenas uma empregada, e sei que não tenho o direito de lhe falar nada, quero, no entanto, pedir-lhe um favor.

 

— Um favor...?

 

— Finja que gostou daqui. Demonstre certa alegria. — Ela fez uma pausa e engoliu em seco. — Eu sei que o patrão está morrendo. Nós gostamos muito do seu pai, Cecília, devemos muito a ele.

 

— Obrigada por cuidar tão bem do meu pai, Rosália; mas ele não está morrendo. — Ela forçou um riso e continuou. — Prometo, no entanto, que me esforçarei para atender seu pedido. — disse com voz embargada.

 

Depois dessa conversa, a moça foi para o quintal, a calmaria matinal , envolveu-a completamente, sem pressa, ela dirigiu-se até a mangueira, e sentou-se no banco desconfortável. Viu algumas galinhas ciscando o chão, enquanto os pintinhos corriam de um lado a outro. Um riso diferente brotou em seus lábios, deslumbrada, admirou a densa mata que rodeava o pequeno descampado, as árvores altas quase tocavam o céu. Hipnotizada por tão gloriosa natureza, fechou momentaneamente os olhos e respirou o ar puro e refrescante.

 

Tudo era tão pueril e harmonioso, que nem viu as horas passarem. Sentiu uma gota de suor descendo por seu pescoço, e escorrendo por entre os seios. Olhou para o céu, e viu que o sol já estava alto, imaginou que, certamente já passavam das dez da manhã.

 

Achou melhor voltar para dentro de casa, e esconder dos mosquitos e do sol que começava a esquentar. Assim que entrou na cozinha, foi questionada por Rosália.

 

— Já voltou? Pensei que fosse demorar mais.

 

— Está esquentando, Rosália. E esses mosquitos perturbam demais! Deus me livre! — Reclamou matando um besouro que sentara em seu ombro.

 

— Logo, logo você acostuma. Depois de uns dias nem sente mais! — A cozinheira disse num riso frouxo.

 

— Eu vou para o quarto, quando o almoço ficar pronto, você me chama.

 

— Pode ir descansar. Eu chamo você.

 

O dia foi longo e melancólico, o pai estava demorando a chegar. Vez em quando, ela levantava da cama, ia até a janela e pensava em Campinas.

 

A noite, depois que jantou, entrou para o quarto, não foi preciso que Rosália a ajudasse a arrumar o mosquiteiro. Sem nenhum entusiasmo, olhou para o tecido rendado que caía pela borda da cama, em seguida deitou-se e logo dormiu.

 

Quando Alfredo chegou de Rolim de Moura, perguntou pela filha, quis saber como fora seu primeiro dia na fazenda, Rosália enquanto o servia, contou-lhe todos os detalhes. Exagerou um pouco para agradar o patrão.

 

Após a refeição, ele foi para o quarto, antes de deitar, olhou para a filha que tranquilamente ressonava. Abaixou-se, e carinhosamente, afagou-a nos cabelos, sentiu-se feliz por vê-la tão tranquila. “

 

Ela vai se acostumar.” Pensou enquanto se deitava na cama ao lado.

 

Os dias foram passando, e como por tinha que ser, tudo tornou-se comum, o lugar já não era tão desagradável, os mosquitos não incomodavam tanto, e a água do filtro parecia mais fria. Cecília acostumou-se a Rosália, achava engraçado a voz cantada e o som do R fortemente parecido com o som do L.

 

A tarde como de costume, ela tomava banho na represa, e de noite, dormia ouvindo os roncos do pai.

 

Numa dessas tardes, em que se banhava na represa, pensou em Miguel. Há dias que não pensava nele, sentiu-se estranha por não sentir falta do homem que seria seu marido. “Não o amo, e talvez nunca o amarei” Pensou enquanto brincava com a água.

 

Fechou os olhos e deixou o corpo seminu flutuar na água. Pequenos peixes mordiscavam-na. Ora a cintura, ora os pés. Plena e transbordando paz, ela se permitiu sonhar.

 

— Boa tarde moça! Uma voz grave, tirou-a dos sonhos, assustando-a.

 

Como para se resguardar, ela afundou o corpo na água, só a cabeça ficou à vista. Intrigada com o rapaz montado em um cavalo branco com manchas avermelhadas, ela respondeu a saudação e questionou.

 

— Boa tarde... Está procurando alguém?

 

— Sou seu vizinho, eu moro no sítio ao lado! Vim para cumprimentar seu pai! Soube que ele chegou de Campinas! Já era para eu ter vindo, mas infelizmente o...

 

— Você não devia vir pela frente? — Ela o interrompeu com voz firme.

 

— Eu só quis encurtar o caminho, moça! Não fiz nada demais. — Ele reagiu

 

— Não estou dizendo que fizestes algo errado. — Ela suspirou antes de prosseguir. — Meu pai está em casa, pode ir falar com ele.

 

— Obrigado... E desculpa por atrapalhar seu banho. — Ele falou do alto do cavalo.

 

De dentro da água, por alguns segundos, ela o contemplou. Era uma rapaz simples, usava chapéu na cabeça e uma barba rala cobria parte do rosto. Ela passou a mão pelo cabelo e tirou alguns fios que cobriam seus olhos. Depois mansamente saiu da água.

 

— Não precisa se desculpar. — Respondeu após pisar em terra firme, e ir até o vidro de shampoo.

 

Diante da beleza da jovem, o rapaz ficou pasmo, o queixo pendeu para baixo, entreabrindo a boca. Ela vestia apenas uma delicada lingerie de algodão, e os cabelos caiam sobre as costas, como uma cascata luminosa. A pele clara brilhava com os reflexos do sol. Boquiaberto, ele viu o ser etéreo caminhar sobre a grama, e sensualmente abaixar-se para pegar o shampoo. A visão celestial, o deixou meio paralisado. Ela percebeu que o deixara atordoado, e gostou disso. Riu por dentro e com voz tranquila falou.

 

— O que foi? Não viestes falar com meu pai? Então porque estás aí parado? O rapaz piscou algumas vezes e engoliu em seco.

 

— Eu já estou indo... — Disse com voz relutante. E em seguida saiu.

 

 

 

 

 


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