A Invasão escrita por Paul


Capítulo 2
Capitulo Dois




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                                                   Evan

                                    15 de Outubro de 2018

Era um dos dias mais quentes de verão. O sol brilhava forte em meio a um céu tão azul que era preciso semicerrar os olhos para olhá-lo. As poucas nuvens eram pequenas demais para proporcionarem qualquer vento agradável. O asfalto fervilhava, a ponto de qualquer coisa a mais de três metros parecer estar ondulando. Pessoas espertas estavam em suas casas, aproveitando seus ventiladores ou ar condicionado. Mas nós dois não éramos essas pessoas. Na verdade, éramos estúpidos demais para estar apostando uma corrida de bicicleta.
Eu pedalava com todas minhas forças. O ar seco e poeirento atingia meu rosto com força, me fazendo respirar o mínimo possível. Meus pulmões ardiam, assim como meus olhos. Escorria tanto suor, que minha camiseta estava grudada em mim, como uma segunda pele.
Meu melhor amigo, Mikha, pedalava a minha frente. O sol forte fazia com que seu cabelo loiro quase brilhasse. Ele me encarou por sobre o ombro, os olhos verdes assumiam um tom acinzentado devido a claridade.
— Vai perder! – Sua voz se arrastou até mim, sendo abafada pelo zumbido que começava a surgir em meus ouvidos.
Diminuí a velocidade, freando bruscamente em frente à minha casa. Minha cabeça começava a doer, e por uma leve fração de segundos fiquei tonto. Larguei a bicicleta e deitei sobre o gramado. Fechei os olhos, respirando fundo a fim de diminuir meus batimentos cardíacos.
        Cobri o rosto com o braço, deixando apenas um filete de luz passar. Urubus voavam preguiçosamente no céu, fazendo pequenos círculos, como se estivessem se certificando que sua presa, no caso eu, estivesse morta.
       - Quem sabe você não ganha na próxima, perdedor. – A sombra de Mikha me trouxe certo alívio.
Abri os olhos e o encarei. Sua boca se abria em um largo sorriso amarelado. Os bíceps se destacavam nos braços, agora cruzados.
— Eu nem tentei. – Menti. – E só parei porque iria desmaiar, e não estava nem um pouco a fim de cair e derrapar nesse asfalto quente.
— Real, né. Tá um inferno.
— Acho que nem o inferno tá tão quente assim. – Forcei meus músculos a responderem, e me levantei. – Eu vou entrar. – Segurei minha bike pelo guidão e me dirigi a entrada da garagem. Mikha seguia em meu encalço. Largamos as bikes encostadas na parede bege da garagem e entramos pela porta lateral ao corredor de entrada.
Estremeci ao sentir o ar gelado do lado de dentro. Meus pelos se arrepiaram e eu agradeci silenciosamente por aquilo.
— Então, onde seus pais estão dessa vez? – Mikha se largou sobre uma das cadeiras na cozinha.
— Não faço ideia. Meu pai disse que eles voltariam hoje, que algo importante estava para acontecer. – Abri a geladeira e peguei duas latas de refrigerante.
— Então não vamos poder repetir a sessão de filmes de terror? – Mikha me encarou.
Fingi tomar um longo gole, apenas para tentar evitar aquela discussão. O que ele deve ter entendido, já que mudou de assunto.
— Então, vamos ver a chuva de meteoros, né? – Mikha largou a latinha sobre a mesa de vidro.
— É hoje? – Perguntei, me apoiando sobre o balcão de mármore.
Mikha confirmou com a cabeça. Tomou um longo gole e se levantou, soltando um arroto alto.
— Te vejo mais tarde. – Disse ele. – Vou pra casa tomar banho.
Ele se virou, e sem dizer mais nada, desapareceu pelo corredor que leva a garagem.
Tomei meu último gole de refri e manquei para o andar de cima. Empurrei a porta do banheiro e comecei a me despir.
Eu sei, as vezes gosto de usar palavras refinadas.    
Fechei os olhos, relaxando com a água gelada. E algumas imagens surgiram, passando rapidamente.
Os lábios de Mikha tocavam os meus, enquanto suas mãos deslizavam por meu tronco. Ambos ficávamos excitados, enquanto gemidos entrecortados preenchiam o ar.
Soltei um longo suspiro, enquanto eu mesmo começava a ficar excitado. E bem, vocês sabem o que vem depois.
Desliguei o chuveiro, me enrolando em minha toalha amarela e caminhei para meu quarto. Fechei a porta atrás de mim e comecei a me trocar. Vesti uma cueca boxer azul e uma camiseta vermelha; Me larguei pesadamente sobre minha cama e deixei o sono vir.

O irritante som de algo batendo em minha janela me fez abrir os olhos, soltando resmungos e vários palavrões. Minha cabeça doía, e levei um bom tempo para me orientar. Meu corpo formigava, parecia que eu havia sido atropelado, de novo; Cobri a cabeça, tentando afastar todo aquele barulho. E então minha janela se abriu e alguém pulou para dentro.
— Acorda, caralho. – Minha nádega esquerda ardeu, quando Mikha desferiu um tapa contra ela. – Você tá perdendo uma coisa muito, coloque ênfase nesse muito, foda mesmo.
Girei na cama, ficando de barriga para cima. Soltei um longo bocejo e me sentei, encarando Mikha em meio a penumbra do quarto.
— Se veste. – Ele caminhou até meu guarda roupa e me jogou algumas peças.
O quarto inteiro foi preenchido por uma luz alaranjada. O que me fez olhar para Mikha.
— O que tá pegando? – Perguntei, enquanto me vestia o mais rápido que conseguia.
— Você precisa muito ver isso. – Mikha esperou eu terminar de me vestir e me puxou pelo braço.
Corremos pelo corredor, descendo a escada de dois em dois degraus e saímos porta a fora. Olhei para o céu e senti minha voz desaparecer.
Como posso descrever o que estava vendo?
Eram esferas luminosas, a circunferência delas era perfeita. Elas voavam acima das casas, mudando de cor lentamente. Algumas até possuíam cores que eu jamais havia visto na vida. E conforme a noite caia, era como estar olhando para as estrelas. Uma delas sobrevoou minha casa, parando a uns oito metros acima do meu telhado e seu brilho azul era tão forte, que iluminava metade do quarteirão.
— O que é isso? – Perguntei, quase em um sussurro.
— Não faço a menor ideia. – Mikha apertou minha mão. – Só sei que são incríveis.
Nos encaramos e sorrimos um para o outro. Seu rosto se aproximou do meu. Seu hálito exalava um leve odor de menta, e nossos lábios estavam perto demais quando o toque do celular nos fez parar.
— É o meu pai. – Eu disse, olhando o nome na tela. Deslizei o dedo pela tela e atendi. – Pai?
Havia estática demais na ligação, o que me permitiu entender quase nada do que ele falava.
— Evan...saia de casa agora...montanhas... ajuda... Mikhael e você, Agora!
O mundo ao nosso redor assumiu um tom avermelhado. Todas as esferas haviam parado de descer e agora pairavam na mesma altura da que sobrevoava minha casa.
Olhei para Mikha.
— O que o seu pai queria? – Mikha retribuiu o olhar.
— Algo sobre montanhas. – Olhei novamente para as esferas. – Tem algo errado.
— Como assim? – Mikha me encarava, preocupado.
— Temos que sair daqui. Agora!
— E meus pais? – Perguntou ele.
— Certo. – Olhei para minha garagem. – Vamos pedalar até sua casa e de lá vamos para algum lugar. Meu pai disse algo sobre as montanhas. Acho que sei o que ele estava dizendo, mas precisamos ir agora.
Corri para minha garagem e peguei minha bike. Mikha me esperava na calçada. Seu rosto parecia distorcido em meio a toda aquela luz vermelha. Tudo estava tão silencioso que chegava a ser assustador.
O som de um carro em alta velocidade nos fez olhar para o fim da rua. Ele avançava em nossa direção. Devido o vidro fumê, era difícil distinguir quem estava dirigindo; Ele passou por nós, tão perto que se Mikha não tivesse pulado da bike, com toda certeza teria sido atropelado. E então aconteceu.
Um risco alaranjado cortou o ar e em questão de segundos atingiu o carro, fazendo-o explodir. Seus pedaços voaram para todos lados, caindo com um baque estridente.
— Puta merda! – Gritou Mikha, caindo da bicicleta.
— Temos que sair daqui. – O olhei de cima. – Tipo agora!
Mikha se levantou, segurando a bike. E pedalamos rua acima, indo em direção a casa dele.
Estávamos na metade do caminho quando algo explodiu atrás de nós e várias pessoas gritaram.
— Não para. – Disse Mikha, ao meu lado. Seu rosto agora estava sério e ele quase não olhava para os lados.
Não sei de onde veio, mas começou com algo parecido com uma TV chiando dentro da minha cabeça. E foi aumentando até se tornar um barulho tão insuportável que perdi o equilíbrio e cai, apertando a cabeça com toda minha força. Era como se meu crânio fosse explodir; algumas vezes parecia que havia uma criatura rastejando por minha cabeça, fincando garras pontudas por onde passava e devorando o meu cérebro.
Mikha se debatia violentamente do meu lado. Ele estapeava o próprio rosto, gritando de forma bestial. Nossos olhos se encontraram por uma fração de segundos e eu pude perceber como estavam vermelhos e cheios de sangue.
Me arrastei em sua direção. Tão rápido quanto o barulho surgiu, ele desapareceu. Mas, Mikha, continuava a se debater e gritar. Sangue escorria para fora de seus olhos, ouvidos e nariz.
Coloquei sua cabeça sobre minhas coxas. Mikha dava pequenos espasmos, como se estivesse tendo uma convulsão. Seus olhos estão fixos nos meus. E toda vez que tossia, uma grande quantidade de sangue escorria para fora de sua boca. 
— Por favor. – Murmurei. As lágrimas faziam meus olhos arderem, tornando minha visão turva. – Não morre. Eu vou procurar ajuda.
Mikha balbuciou alguma coisa. Então seu corpo parou de tremer. Não havia sinal de batimentos cardíacos.
O trovão soou acima de nós, tão forte que fez o chão tremer. Raios cruzavam o céu, agora tão escuro que mal dava para ver aquelas coisas. Mikha já não se mexia mais, e por mais que eu desejasse que fosse mentira, tive que admitir para mim mesmo que ele estava morto.
A chuva começava a cair e outra explosão me fez perceber que ainda estava sentado no meio da rua. Olhei ao redor, procurando um bom lugar para deitar o corpo de Mikha, e então reparei que o que caia sobre nós não era chuva, e sim a água de um hidrante. Um pouco a minha frente, os fios de um poste, balançavam em direção a poça de água que se formava, bem no meio dela havia um corpo caído. Arrastei Mikha para o mais longe possível e o deixei deitado sobre a calçada. Seja lá o que fosse, aquele chiado pareceu atingir até mesmo os animais. Havia vários corpos espalhados pelo chão, desde pequenos pássaros até cães e gatos.
O gemido me fez olhar de Mikha para o outro corpo. O garoto tentava se pôr em pé. Sangue escorria por seus olhos.
— Sai daí! – Gritei, olhando dele para o fio elétrico, cada vez mais perto da água.
O garoto seguiu meu olhar. Ele gritou, e então tombou no chão se contorcendo, enquanto uma espessa fumaça saia de seu corpo e sua pele enegrecia.
Alguém correu ao meu lado. Seu rosto estava coberto de sangue e seus globos oculares estavam vazios. Seu pé se chocou contra a guia da calçada e o corpo tombou para a frente. E em um piscar de olhos, seu corpo entrou em combustão. Assim como o de várias outras pessoas que corriam de um lado para o outro. O choro de um bebê me fez olhar para a calçada oposta. As chamas alaranjadas consumiam o carrinho.
Agora a chuva finalmente começava a cair. Os pingos quentes me atingiam com força no rosto.
Construções caiam, levantando grandes nuvens de poeira. O som de vários carros se chocando uns contra os outros se propagou por todo lado. O vento forte agitava as copas das árvores, quase as arrancando do chão.
— É só um pesadelo. – Fechei os olhos com força. – É só a merda de um pesadelo.
Mas não era.
As esferas haviam desaparecido. O mundo estava coberto por uma escuridão que eu jamais havia visto. Raios cruzavam o céu, acompanhados por relâmpagos que revelavam as enormes naves que agora sobrevoavam a cidade. Cada parte do meu corpo pareceu travar quando uma delas voou em minha direção e parou a alguns metros a minha frente.
Aquela coisa me lembrava a fisionomia de um caça, sem asas e coberto por coisas que pareciam cordas que se moviam, com luzes de diversas cores. Ela sobrevoou acima de mim, desaparecendo na escuridão do céu.
Pedalei o mais rápido que consegui para os limites da cidade. Com toda certeza meus pais deveriam estar escondidos na área em que costumávamos fazer piquenique quando eu era criança.
Olhei para trás uma última vez. Deixá-lo foi a coisa mais difícil que eu já havia feito na vida.
A destruição consumia a cidade e aos poucos os sons da morte foram diminuindo. E mais rápido do que eu poderia pensar, me vi longe de tudo, sendo engolido pela escuridão das pequenas estradas de terra.

E foi assim que tudo começou.

 


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Notas finais do capítulo

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