Tudo o que está em jogo escrita por annaoneannatwo


Capítulo 34
Em frente à sala dos professores




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Ochako esperava que ele a olharia com tédio, talvez até com desdém, afinal, na última vez em que se falaram, ela foi irredutível ao recusar-se em ouvir qualquer coisa que não fosse um pedido de desculpas vindo do Bakugou. Tudo vai se consertar se ele pedir perdão? Claro que não. Mas a garota só queria que ele… se mostrasse minimamente arrependido, que demonstrasse que… se importa com ela e com os sentimentos dela.

E não dá pra saber se ele se importa, mas a expressão de surpresa com que a recebe é inesperada e indicativo de que ele ao menos sabe que Ochako não viria atrás dele não estivesse desesperada. 

E como ela não estaria? O Todoroki sabe de tudo, sabe que ela não é desse mundo, está ciente de que é um personagem no jogo e ele… ele é tão… ela não tem ideia do que ele quer! Quer dizer, a garota entendeu que a prioridade dele é a peça de teatro, todo o resto parece ser apenas um mero detalhe, mas se é assim… o que ela tem que fazer nessa rota pra conquistá-lo?

—  Eu já vi jogos que quebravam a quarta parede, mas não eram jogos de romance. —  ele analisa assim que Ochako termina de relatar toda a conversa que teve com o senpai, omitindo as partes em que ele flertou agressivamente com ela, claro.

—  “Quarta parede”... 

—  É, quando-

—  Quando um personagem assume que está numa obra de ficção e fala diretamente com a plateia. —  ela explica —  Aprendi com o Todoroki-senpai no clube de teatro.

—  Hum. —  ele coça a cabeça e olha pro lado —  Deu pra perceber que ele sabia, mas não achei que ele ia te falar assim na cara.

—  Ele disse que não via sentido na gente ficar escondendo um do outro o que somos.

—  Combina com a personalidade desse tipo de personagem kuudere.

—  Mais um “dere”? —  ela suspira.

—  É, esses personagens mais sérios que parecem frios e o caralho.

—  Ah, entendo… mas o que eu faço? Se ele sabe que é um jogo, nada do que eu falar pra ele vai soar convincente.

—  Ué, você não falou que ele disse que só se preocupa com a peça de teatro? Foca na peça, então.

—  Sim, mas… é só isso?

—  Só isso o quê?

—  Focar na peça e nada mais? Eu não tenho que… sei lá, conhecê-lo melhor, descobrir qual o problema que o torna alguém tão difícil? Não tenho que me aproximar e… sei lá, mudar a maneira dele de ver o mundo ou algo assim? —   não foi exatamente o que ela fez de maneira restrita em nenhuma das rotas, verdade seja dita, mas é assim que esses jogos costumam funcionar, não? Disso ela lembra assistindo à Mina e à Tooru jogando, por mais que os personagens e acontecimentos sejam diferentes, a ideia é sempre fazer o pretendente se apaixonar ao causar uma impressão tão forte nele que o faz repensar sua vida e às vezes mudá-lo. Para melhor nos finais felizes, e para pior nos bad endings.

—  Mas se o cara já sabe que isso é um jogo, nada dessa merda vai funcionar, só foca no que ele te disse pra fazer.

—  Bom, isso ele vai adorar, com certeza… —  ela murmura, fazendo uma careta ao pensar nas insinuações que o garoto fez sobre “discipliná-la” e coisas do tipo, o Todoroki desse mundo é bastante mandão e exigente —  E você acha que eu consigo pegar o good ending assim? É só não fazer nada de errado na peça de teatro?

—  Só pode ser isso. Mas também… —  ele resmunga alguma coisa que não dá pra ouvir.

—  O quê?

—  Nada, só tô pensando.

—  Mas no quê?

—  Esquece, não é nada.

—  Não pode ser nada, você vai mesmo continuar escondendo coisas de mim? Não terminou bem da última vez. —  ela dispara, notando como ele estreita os olhos e retorce o lábio em desagrado —  O quê, você achou que eu tinha esquecido só porque vim aqui falar com você? Tô aqui te perguntando porque você entende mais desses jogos que eu, mas não te desculpei nem…

—  Nem confia em mim, é, eu sei. —  ele bufa —  Vai ver o Meio a Meio acha que você vai querer ficar no jogo.

—  O quê?

—  Ele é o true ending, é o personagem que amarra a história toda e é com quem a protagonista ia acabar ficando de qualquer jeito. Vai ver ele não tá preocupado com mais nada porque acha que você vai ficar com ele, não importa o que aconteça.

Oh… isso é… não parece algo em que esse Todoroki estaria interessado, mas… ao mesmo tempo, ela não divida totalmente disso. Este rapaz parece muito confiante e certo de que, se Ochako não se apaixonou por ninguém do jogo, é simplesmente porque não era… bom, ele. Mas qual interesse ele poderia ter em mantê-la aqui nesse mundo sabendo que ela não pertence e nunca pertenceu?

—  Mas… eu não vou.

—  Vai ver ele acha que você vai acabar gostando dele e do jogo e vai querer ficar aqui. —  ela olha para o lado, absorvendo essa possibilidade e querendo muito descartá-la, mas não conseguindo por completo —  Mas não sei se é isso, é o que eu falei, isso não costuma acontecer em jogos de romance, é mais coisa de… sei lá, jogo de terror. 

—  Oh… —  ela arregala os olhos.

—  Fora que essa merda toda não tá nem fazendo sentido mais, o jogo não reseta quando você troca de rota, você tá pegando um monte de final neutro e não dá nada, e essa escola tá caindo aos pedaços. —  pra provar esse ponto, ele leva a mão à parede ao lado e fecha seu punho contra ela, fazendo o cimento rachar como se fosse de papel. Nem foi um soco tão forte assim.

—  Sim… esses dias uma parte do teto caiu, acho que afetou minha assistente no jogo, ela não tem funcionado direito desde esse dia. Isso é possível, né?

—  Sua assistente?

—  É, a garota que me deu esse celular e me passa os status das intimidades e coisas assim. Otoge Sakura? —  Ochako a chama para mostrá-la ao Bakugou, mas ela não aparece —  Ué, ela… Otoge Sakura? —  a garota chama de novo, nada —  Viu? Acho que ela foi afetada.

—  Hum… —  ele não diz nada —  Era só isso que você queria?

—  Bom, sim… —  Ochako fica ali, sabendo que não é só isso, ela sempre espera mais do Bakugou. Mas ele não diz mais nada e, com certa decepção, ela dá as costas para se retirar.

—  Uraraka-

—  Hum?

—  Você- —  ele retorce a boca novamente —  Eu já fiz alguma coisa que- aquela nossa luta no Festival Esportivo ano passado-

—  Sim, o que tem?

—  Você- você saiu falando que aprendeu com aquilo, que decidiu aprender artes marciais por causa da luta, não disse?

—  A-ah, eu… sim.

—  Então por que- ugh! —  ele parece estar lutando muito consigo mesmo para falar o que está pensando.

—  Sim? Pode falar, eu tô ouvindo. —  ela volta a se virar pra ele e cruza os braços, esperando.

—  O que eu… eu já fiz alguma merda que você… tenha achado escroto? Tô falando no nosso mundo mesmo.

Isso é… ele tá… de onde isso veio? Ochako franze o cenho e balança a cabeça levemente, não entendendo a pergunta. Ela e o Bakugou não chegaram a ter muitas interações após aquela luta, mas as poucas que aconteceram não poderiam ser consideradas minimamente hostis. Ele tem o jeitão rabugento dele, mas é assim com praticamente todo mundo, não é pessoal e, de maneira geral, Ochako sempre achou um certo divertimento nesse jeito dele, porque no fim é só uma camada de um garoto que pode ser difícil, mas que é muito mais que isso. Ela nunca gostou de como ele fala com o Deku, só isso que realmente sempre passou do ponto, mas de resto… a garota nunca teve problemas com ele, e vez ou outra, já se pegou imaginando como seria se tentasse se aproximar como amiga. Então ele perguntar isso é bastante inesperado, não só porque nunca imaginaria essa pergunta vindo dele, como também nunca esperaria essa pergunta sendo dirigida a ela.

—  Bom, eu… eu te falei aquela vez que acho você grosso com o Deku-kun porque sinto que você se sente intimidado por ele, mas… foi só isso, Bakugou-kun, eu não… não, nunca senti que você disse ou fez algo pra me magoar ou me irritar de propósito. Ou mesmo sem querer, não lembro mesmo.

—  Certeza?

—  Sim, eu… eu te falaria se tivesse. —  ela garante —  Mas por que isso? —  Ochako continua encarando-o, olhos vermelhos rubi encaram de volta —  De novo isso de achar que você é o vilão aqui por minha causa?

—  De novo isso porque é isso, Cara de Lua, você não percebe? Todo mundo nesse mundo é desse jeito porque lembram alguém do nosso mundo, vocè-

—  O Monoma-kun é diferente, por exemplo. —  ela o interrompe —  Quer dizer, eu nem o conheço direito, então por essa lógica, ele nem deveria ser um pretendente, mas ele é diferente do Monoma que eu lembro, então… isso não é necessariamente verdade. Eu não… eu não sei porque você é o vilão, mas pode ter certeza que não é assim que eu te vejo.

—  Ou que você me via.  —   ele a corrige —  Não foi isso que você falou? —  e mesmo que não devesse, mesmo que ainda esteja magoada, ela olha no fundo dos olhos dele e não encontra aquela fúria que esperaria de alguém que se acha tão correto em suas atitudes horríveis, tudo que Ochako encontra é dúvida, e talvez, mágoa.

—  Você… você tem que entender meu lado, Bakugou-kun. Eu entendo que… entendo que isso tudo seja demais pra lidar, que você tá numa posição delicada, mas eu… eu quero ser capaz de confiar em você de novo. —  ela admite de cabeça baixa, sentindo um aperto no coração ao se lembrar do dia em que ele confessou ter empurrado ela escada abaixo, como ele achou perfeitamente plausível fazer isso por conta de um jogo.

O Bakugou não diz nada, e Ochako levanta a cabeça para olhá-lo, surpreendendo-se ao encontrá-lo de olhos arregalados e bochechas coradas, o que…? O que ela disse é assim tão surpreendente? A garota já tinha dito algo nessa linha antes, não? 

De toda forma, ela não deixa de ficar surpresa com a expressão confusa dele, não é sempre que dá pra vê-lo assim, e é… por mais estranho que possa parecer, por mais que esteja triste com ele, Ochako não consegue deixar de achar qualquer coisa de… doce nele. É um Bakugou diferente, mas é um que parece mais próximo do que ela conhece.

—  Tsk, não faz essa cara pra mim.

—  Hã?

—  Essa cara! —  ele aponta, mas desvia o olhar —  Eu já te contei porque comecei a jogar esses jogos? —  e muda o assunto DO NADA!

—  Hã… não, nunca.

O Bakugou coça a nuca nervosamente, seu rosto cada vez mais vermelho. Qualquer que seja o motivo para ele ter começado a jogar, deve ser algo que o envergonha muito para fazê-lo reagir assim. Ochako sente que não deveria reagir com tanta curiosidade, mas já está até se inclinando para ficar mais perto e oferecer sua orelha caso ele ache que é algo embaraçoso demais para se dizer em voz alta e prefira cochichar na orelha dela.

—  Ah, aí está você. —  os dois pulam diante de uma voz masculina suave que surge da ponta de uma das prateleiras, o Todoroki mantém sua expressão neutra de sempre quando os encara —  Oi pra você também, Bakugou.

—  Tsk. —  o loiro se afasta, e Ochako tem certeza que não haverá outra chance de ouvir o que ele ia dizer tão cedo.

—  V-você…? Como me achou? —  ela pergunta, sentindo seu rosto ferver como se tivesse sido pega no meio de uma travessura.

—  Às vezes, se eu me concentro bastante, consigo saber onde te encontrar. —  ele dá de ombros —  Deve ser por causa do true ending.

—  Ou porque você é um esquisitão sinistro do caralho. —  o Bakugou retruca, resmungando.

—  Não, acho que esse seria você. —  o garoto responde sem titubear, e antes que o Bakugou possa brigar, ele aponta para uma placa na parede pedindo que se faça silêncio na biblioteca. Surpreendentemente, o loiro obedece, fazendo uma cara de quem acaba de morder algo azedo —  Então… reunião de estratégia para descobrirem como você vai me conquistar? —  ele se volta pra ela.

—  N-não, eu só…

—  Não vejo necessidade disso, eu já te disse o que você precisa fazer, não disse? Se tiver alguma dúvida, pode perguntar para mim, não precisa recorrer… a ele. —  a pausa que ele faz antes de medir o loiro de cima a baixo é algo que deixa até ela mesma incomodada, imagina então como é para o Bakugou.

—  Ela faz o que ela quiser, seu merda.

—  Claro. Não estou ordenando nada, é só uma dica, façam como acharem melhor. 

—  Você precisa de mais alguma coisa, senpai? —  ela pergunta num suspiro enfastiado.

—  Nada demais, só gostaria de falar com você sobre nosso próximo ensaio. —  o garoto olha para o Bakugou —  Não é nada que ele não possa ouvir, mas você sabe como é.

—  Eu quem escolho se quero te acompanhar ou não, e essa escolha tem uma consequência. —  ela diz mecanicamente, sabendo de maneira exata como isso funciona —  Vamos, então. —  Ochako se afasta do Bakugou e anda em direção ao Todoroki.

—  Uraraka. —  mas antes de ir, o Bakugou a chama, fazendo com que ela se vire  para ele, o rosto do garoto ainda muito vermelho.

—  Sim?

—  Desculpa. —  ele murmura. A vontade dela é fazê-lo repetir de maneira alta e clara, e é o que faria se eles estivessem sozinhos. Mas com o Todoroki aqui, não parece certo, é algo só entre eles dois —  Por tudo.

—  Eu… —  ela morde o lábio, pensando no que pode dizer. Mas novamente, esse é um momento particular somente a eles, Ochako esperará o próximo para dizer o que precisa. 

E ouvi-lo também.

Então ela dá um leve sorriso e acena com a cabeça, torcendo para que ele entenda que essa conversa ainda vai continuar e que, por ora, já é um bom começo.

Porque ela está sempre esperando mais do Bakugou, sabendo que ele sempre pode dar esse mais.

—  Vocês são amigos no mundo de onde vêm? —  o Todoroki pergunta enquanto eles passam pelo corredor.

—  Hum… não exatamente. Somos colegas e nos respeitamos, mas… amigos já é um pouco difícil dizer.

—  Você parece se importar com ele como amiga. Lembro da vez em que encontramos ele e o Midoriya brigando, você ficou preocupada.

—  Ah… é. Aquilo foi… eu não gosto de vê-lo… brigando com um garoto com aquela aparência, se dá pra entender.

—  Ele e o Midoriya do seu mundo brigam muito?

—  Hoje em dia, bem menos. Acho que os dois se entendem melhor, por isso não gostei de vê-lo regredindo na atitude daquele jeito. 

—  E você ainda acredita que não é amiga dele? —  ele dá o que parece ser uma leve risada —  E quanto a mim?

—  O que tem você?

—  O Todoroki do seu mundo. Ele é seu amigo?

—  Oh… sim. Ele é… ele é bem distante às vezes, é difícil dizer se está se divertindo, mas… é, me considero amiga dele, sim. —  ela o olha —  Por que quer saber como é no meu mundo?

—  Nenhum motivo especial, só quero te conhecer melhor. —  ele dá de ombros —  Em relação ao próximo ensaio, importa-se se for na minha casa?

Oh… que direto! Ochako até para de andar, parando em frente à sala de professores, o garoto para também, mas parece ser por cortesia.

—  Oh, eu…

—  A sala de ensaios está fechada, há uma infiltração em uma das paredes.

—  Ah sim… bom, eu… —  ela estreita os olhos —  Eu tenho que dizer “sim” pois é um evento da sua rota, né?

—  Não me lembro de ter chamado outras jogadoras até minha casa, como eu disse antes, o jogo segue mudando, então acho que é algo inédito. —  isso a deixa estranhamente lisonjeada, por algum motivo —  Não sei se influencia na rota, então não se sinta pressionada a dizer “sim”.

—  Mas você não vai gostar se eu disser “não”.

—  Não conheço ninguém que se sinta feliz diante da rejeição. —  bom, isso é verdade… —  A escolha é sua.

Só que não é. Se tudo com o que esse garoto se importa é com a peça, ele querer ensaiar mais faz parte de dar seu melhor na peça, então ela não tem outra escolha a não ser-

—  Tudo bem. Me passa seu endereço, o dia e o horário, e eu vou estar lá.


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Notas finais do capítulo

Oi oi! Seguimos com essa rota metalinguística u.u
Semana que vem aparece mais um personagem novo, conseguem adivinhar quem é?

Beijos e boa semana!



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