Momentos escrita por Nat King


Capítulo 3
Capítulo 3 - Gorko!


Notas iniciais do capítulo

Gorko!! ( ゚ヮ゚)/

Ainda que "gorko" e suas variantes signifique amargo, essa palavrinha é gritada em cerimônias de casamento como uma brincadeira à vodka servida, que é uma bebida forte. Toda vez que a palavra é invocada, espera-se que o casal troque um selinho, não importa o que estejam fazendo — ou se estão próximos um do outro. Parece uma grande bagunça bem-humorada. O capítulo de hoje traz os preparativos do casamento mais esperado do ano, e toda a bagunça que ele poderia ser xD

Espero que façam uma boa leitura!



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Gorko!

 

Os olhos de Irisa estavam fundos, marcados de roxo por uma semana toda de preparativos e detalhes finais sendo arrematados para o casamento. Apiedada pela amiga, que não contava muito com o apoio da mãe para preparar os arranjos e enfeites, Lilia tomou para si parte da responsabilidade de fazer laços e decorar fitas que seriam depois colocadas para enfeitar o carro do tio de Lukyan. Diferente da jovem noiva, cujo os parentes ela não tinha contato, o rapaz tinha a sorte de conviver perto de todos os quatro tios, seis primos, três avós e até mesmo uma bisavó muito bem disposta a fazer o bolo da festa.

Certo, Lilia não sabia se isso era de fato sorte, porque ela mesma não saberia lidar com tanta gente lhe dando atenção, mas Irisa estava radiante e mais do que empolgada para finalmente trazer o sobrenome do marido como seu, o último passo para ser de fato uma Phorkomov, afinal, ela já era da família há muitos anos.

— Irisa, você precisa dormir urgentemente. — Recolhendo seus pertences no vestiário, Lilia tentava trazer luz à agitação de Irisa. E ela não estava nem se atentando à cerimônia prevista para a manhã seguinte. — Não é saudável se sacrificar desse jeito, é capaz que você caia doente.

— Não tenho tempo pra isso! — A moça gritou, voz alta para despertar a si mesma, mãos apertando seus olhos em uma tentativa de mantê-los abertos. — Eu ainda preciso terminar de costurar as flores no arco do véu — Irisa apontou o pedaço de tule ocupando metade do espaço de seu armário — e apertar a cintura do vestido.

— Apertar mais? — Ela se assustou. — Irisa, é a terceira vez só nesse mês que você precisa fazer ajustes, está perdendo muito peso!

— Não que a diretoria aqui vá reclamar — ironizou, sendo acertada por uma bola de meia-calça. — Eu sei que perdi muito peso, também não queria sair parecendo uma caveira nas fotos, mas tinha tanta coisa acontecendo nas últimas semanas…

— Não ligo, engole isso ou vou te bater. — Tirando uma maçã do fundo da bolsa, ela esperou que Irisa desse pelo menos uma mordida antes de continuar se trocando.

— Estava esperando algo mais gorduroso, Lilia…

— Eu adoraria, mas não será dessa vez. — Um pouco mais relaxada ao ver a amiga devorando a fruta até as sementes, Lilia voltou a calçar os sapatos fechados, jogando um vestido por cima do collant. De volta ao dormitório ela se trocaria devidamente, depois de um banho longo o bastante para lhe render uma bronca. Depois daquela primeira semana como bailarina oficial do Kirov, ela merecia. — Só para te tranquilizar, os enfeites para o carro de amanhã estão prontos, Danik ficou de entregar a Lukyan.

— Ah, Lilka, eu te devo o mundo! — Emocionada além do normal, Irisa se jogou em cima de Lilia, quase desequilibrando a outra bailarina. Baranovskaya desconfiava que a amiga acabaria dormindo ali mesmo, pendurada em seu pescoço. — Você é a melhor dama de honra que eu poderia ter escolhido.

— Eu sou a única que você poderia ter escolhido.

— Isso não tira sua importância.

— Tá bom, sua chorona, recomponha-se, você precisa mesmo ir pra casa, agora.

— Daqui eu vou para a casa do Lukyan, vou me arrumar por lá de manhã, para só daí irmos até a datcha da vózinha dele. — Lilia até achava melhor. A mãe de Irisa era uma pessoa meio estranha e certamente não ajudaria a filha a conter os nervos até a cerimônia. — Espero não desmaiar enquanto as irmãs dele arrumam meu cabelo. Vou dormir com a cabeça cheia de rolos e grampos.

— Com grampos você está acostumada — zombou Lilia, não perdendo a oportunidade de importuná-la um pouco. — Vai estar linda amanhã, tenho certeza.

— Mesmo com essa cara amassada? — De repente, Irisa já não tinha tanta certeza. O beicinho denunciava sua vontade de chorar toda a insegurança e cansaço acumulados. Oh, Irisa…

— Você pode estar se casando de camisola, tenho certeza que Lukyan só teria olhos para você.

— Que horror, Lilia, eu não estou preparando um vestido maravilhoso daqueles para não usar!

— Para de reclamar e vai logo, ou seu noivo não estará mais esperando por você quando sair.

— Ele que não ouse! — Jogando a bolsa por cima do ombro, Irisa deu um beijo estalado no rosto da amiga, antes de sair. — Não se atrasem amanhã, hein?

— Não vamos, Irisa, pode ficar tranquila…

— Olha que eu mesma vou buscar você e Altin se não estiverem às dez horas na casa da avó do Lukyan!

— Nós iremos, Irisa, nós iremos…

Rindo, ela observou a amiga ir embora, decidindo fazer o mesmo. Ela ainda precisava passar o vestido separado para a festa — nada novo, mas o melhor em seu armário — e lavar o cabelo. Já imaginava que a carona com Daniyal deixaria seu cabelo em estado de calamidade pública, mas entre pagar um táxi para atravessar a cidade e aproveitar o veículo ilegal do amigo, sem dúvidas ela optaria pelo que fosse gratuito.

— Sua amiga vai se casar?

Lilia olhou para trás para ver a jovem bailarina que havia se formado com elas — Filatova…? — olhando por onde Irisa tinha saído. Embora treinassem no mesmo estúdio, seus horários eram diferentes; a menina provavelmente ainda teria algumas horas de ensaio pela frente.

Lilia, que só a tinha visto de perto no dia da apresentação, ainda se impressionava com seu tamanho. A bailarina parecia ainda menor ao lado dela.

— Depois de três anos de planejamento e uma vida toda me enchendo o saco sobre casamentos, a partir de amanhã ela finalmente será a senhora Phorkomova. — A adolescente riu, seus olhos puxados apertando ainda mais com a risada sincera.

— Já tinha visto eles pelos corredores. Eu não costumo gostar muito dessa melação toda, mas eles combinam bem. — Lilia não conseguiu conter o riso. Eles eram mesmo um nojo juntos, mas a história daquele namoro de longa data, somada à amizade que vinha desde a infância, os tornava um tipo raro de contos de fada. — Espero que sejam felizes. — Recuperando uma toalha, ela acenou em despedida. — Boa festa pra vocês.

Lilia sorriu para a menina e se despediu. Até que ela era simpática.

Tamanho cansaço foi responsável por provocar um apagão na mente de Lilia assim que ela chegou em seu quarto. Alguns flashes dela pendurando o vestido passado na porta do armário e de bocejar seguidas vezes enquanto prendia os cabelos úmidos em dois coques junto à nuca, depois disso? Ela nem se lembrava de ter se coberto. A primeira coisa que seu cérebro registrou quando foi acordado era a estranheza de ver o lençol a cobrindo; ter alguém batendo à porta foi a última coisa que ela prestou atenção.

Baranovskaya, ligação para você — insistiu a funcionária do outro lado da porta. Pela impaciência, parecia estar ali há algum tempo.

— Ligação? — Com os olhos pesados, Lilia não conseguia sequer abrir as pálpebras. — De quem?

Altin.

Daniyal?

De repente seu cérebro pareceu quicar dentro do crânio e assim fez Lilia, tropeçando no lençol e quase beijando o chão até chegar à porta.

— Está tudo bem? Que horas são?

— Ele não comentou e são sete horas. — A mulher parecia cansada. Seu expediente começava naturalmente mais cedo e ela já precisava lidar com agitação logo cedo.

— Obrigada, só um momento e eu já desço — pediu, revirando suas coisas até encontrar o roupão gasto. Não que existisse o risco de esbarrar em algum homem por ali, era seu pijama que não estava em um estado de preservação bom o suficiente para ser exibido por aí.

Correndo até a sala da administração, Lilia só conseguia ouvir o eco dos próprios pés descalços invadindo seus pensamentos, que eram como um grande ponto de interrogação. Não fazia ideia do que faria Daniyal ligar tão cedo, mas já temia algum tipo de desgraça. Logo hoje?

— Danik? O que aconteceu? — Lilia quase gritou ao telefone, recebendo um chiado longo e forte como reprimenda da funcionária do internato. Não, nenhum “alô, bom dia” para Altin, ela não tinha tempo para isso.

Lilia, você por acaso está com o véu da Irisa guardado por aí? — Daniyal não parecia incomodado com a falta de cumprimentos. Na verdade ele estava igualmente preocupado.

— Não?! — ...e agora era Lilia quem estava preocupada. Do outro lado da chamada ele ouvia não somente Daniyal murmurar preocupado, como o cochichar baixo de Lukyan somou-se ao nervosismo. — O que aconteceu?

Aconteceu que ela já revirou tudo quanto é canto procurando pelo véu e aparentemente ele sumiu. — Lilia fez uma careta, como se tivesse sua canela atingida por um chute. — E agora ela está lá chorando faz meia hora, não quis nem receber o Lukyan.

— Coitada… — Lilia lamentou. Irisa tinha planejado com tanto cuidado todos os detalhes de sua roupa… Como o véu pode ter sido esquecido? Ela havia dito que cuidaria de costurar flores na grinalda na noite anterior… Espere--! — Irisa deve ter esquecido no vestiário! Eu lembro dela mostrando o tule no armário!

Daniyal suspirou. Eles poderiam ter solucionado o mistério do sumiço do véu, mas de nada adiantaria;

O Kirov não abre hoje.

— E agora?

Agora…? — O rapaz respirou fundo, parecendo buscar uma solução. — A gente pode dar um giro pela cidade e ver se acha alguma loja aberta?

Se estivesse em seu estado racional normal, Lilia iria lembrá-lo de que era domingo e que nenhuma loja de tecidos abria no domingo, mas a cena de uma Irisa aos prantos com o cabelo cheio de rolos plásticos e laquê a fez abraçar a ideia como se ela fosse de fato maravilhosa.

— Eu vou separar as minhas coisas e fico te esperando.

Já estou indo te buscar.

Provavelmente pelo susto colocando seu corpo em estado de nervos até agora, Lilia estava mais acordada e elétrica do que no dia em que passou pela seletiva para a Academia Vaganova. Rígida como se estivesse em cena, seus olhos estalados não deixavam a rua, presos na direção em que vinha o ronco do motor da motocicleta, essa sempre chegando primeiro que o dono; mesmo estando a quadras de distância, Lilia podia ouvir o som estridente do escapamento da moto anunciando sia chegada. Não importava quanto tempo Altin gastasse nos ajustes do motor e lataria, aquele barulho específico sempre o perseguia em seus passeios por Leningrado.

Daniyal Altin era dono de um tipo bem sério de feição, que só suavizava em apresentações, os amigos e alguma garota que elogiasse sua moto. Quando aquele rosto tensionava e ele não estava sendo perturbado pelas correções de nenhum professor em algum ensaio, podia-se apostar que sua irritação se dava pelo barulho da moto. E mesmo com a lataria pipocando às alturas, daquela vez, o rosto de Daniyal só esboçava nervosismo.

Quando Lilia imaginaria que um véu de noiva seria a causa de suas preocupações?

— Bom dia, Danik — ela cumprimentou, voz baixa e desanimada. Não estava muito confiante nessa busca por um pedaço novo de tule, mas precisavam tentar, não? — E os planos para hoje?

— Sei lá, dar uma volta pelo centro — afrouxando a gravata borboleta, ele suspirou fundo, como se o nó estivesse o sufocando. — e ver se achamos alguma coisa. Sabe a cor do vestido dela?

— Branco, né, Danik? — Lilia revirou os olhos, mas não o provocou nem nada do tipo. Aceitando o capacete oferecido, ela precisou fazer um pequeno esforço para encaixá-lo com os dois coques na nuca ainda presos. — Quanto tempo temos?

— Considerando que eu preciso te deixar com a Irisa até às dez e a casa fica longe, temos uma hora, uma hora e meia no máximo para termos sucesso.

Subindo na moto tentando equilibrar a bolsa e o cabide ao mesmo tempo, Lilia tentou se acomodar o melhor que conseguiu.

— Tem certeza que quer levar tudo isso?

— Não vou correr o risco de pegar estrada com você usando meu vestido, Daniyal Altin, ele está limpo e precisa continuar assim até o fim do dia. — “Ao contrário dos seus sapatos” ela pensou, sem nada dizer. Não iria criticar o calçado de Danik quando ele estava fazendo a gentileza de lhe dar carona. Por sorte, seus pés não apareceriam muito nas fotos.

Ele empinou a moto antes de finalmente arrancar com ela, só não ganhando uma bronca de Lilia porque ela estava muito preocupada em se agarrar ao bailarino com um braço, enquanto o outro abraçava sua sacola e vestido. Preocupada com a própria segurança? Negativo! A única preocupação de Lilia eram seus pertences e a pouca soma de rublos ali guardado para socorrer a amiga.

Percorrendo as ruas, notaram que, de fato, não existiam muitos lugares abertos em um domingo de manhã. Daniyal até rodou pelo centro e se afastou pouca coisa para os bairros vizinhos, sem resultados muito animadores. Infelizmente, não podiam ficar muito tempo procurando por lojas, ou atrasariam o resto do cronograma do dia, e Irisa já estava muito nervosa para passar por mais uma surpresa desagradável. Se cancelassem o horário agendado no departamento de serviços públicos para seu casamento com Lukyan, era provável que ela fizesse alguma coisa que findasse em sua prisão. Uma Irina de noiva atrás das grades não pareceu uma visão tão cômica como teria sido em qualquer outra situação.

Voltando à região central, Daniyal parou com a moto em frente a um mercado cujo a fachada não convenceu Lilia do sucesso daquela procura. Contudo, era ele ali o único a desbravar a cidade com certa regularidade, então ela não colocaria seu conhecimento em descrédito. Se Daniyal achava que eles poderiam encontrar um corte de tule por ali, Lilia apenas o acompanharia.

Porém, após vinte minutos perdidos percorrendo cada corredor muito atentamente, valia frisar, ela confirmou o que já desconfiava desde o começo; não existia nada ali que lembrasse, nem de longe, um pedaço de pano. Talvez a lona que envolvia o mostruário das batatas, mas Irisa os mataria se eles chegassem perto do vestido dela com algo do tipo.

— Danik, não tem nada aqui. — Daniyal, que trazia nas mãos dois pacotes de qualquer coisa que Lilia não prestou atenção, pareceu verdadeiramente surpreso.

— Deveria ter. Aqui não é um mercado de tudo?

As sobrancelhas de Lilia arquearam, acompanhando sua expressão surpresa quando finalmente entendeu o que ele queria dizer. Ela não podia culpá-lo, podia? Se o estabelecimento se vangloriava em ser um mercado de tudo, esperava-se que ele de fato tivesse tudo.

— Pelo jeito eles só trabalham com secos e molhados, Danik.

— Não faz sentido… — O moço estava mesmo abalado, ela diria que até decepcionado. Lilia se perguntava se ele já tinha percebido que não se comercializava peças de moto ali.

— Podemos reclamar com a gerência outro dia — sugeriu como se de fato fossem fazer isso em um momento mais oportuno. —, mas acho melhor você me levar, agora. Tenho uma Irisa para consolar e você ainda precisa ajudar Lukyan a terminar de decorar o carro.

Sem dizer mais nada, Altin concordou, terminando de pagar pelos pacotinhos adquiridos antes de voltarem à moto e se afastarem do centro em direção à datcha. Irisa ficaria decepcionada, pobrezinha, mas infelizmente não tinha mais o que fazer. Pelo menos todos os envolvidos estavam em festa, e fariam de tudo para ver os noivos felizes, Lilia tinha certeza de que Irisa sabia disso.

Tanto tinha certeza que foi com um sorriso no rosto inchado que a noiva recebeu a amiga no portão de madeira, envolta no mais estampado roupão atoalhado que Lilia já vira, antes mesmo de Daniyal parar a moto totalmente. Pelo jeito, não era apenas Lilia que reconhecia de longe o roncar daquela coisa.

— Oi… — murmurou a noiva, forçando o sorriso a se manter. Ela estava prestes a recomeçar a chorar.

— Oh, Irisa… — Oferecendo um abraço, mesmo carregada de pertences, Lilia tentou oferecer conforto. Por que as situações divididas com Irisa sempre tinham aquele ar dramático? — Eu sinto muito…

— Ainda não me conformo — lamentou a moça, tomando distância. — Eu tinha certeza de que tinha guardado o véu na minha bolsa, chegamos aqui e não estava, achei que pudesse ter esquecido na casa dos pais dele… — bufando, ela conteve as lágrimas, coçando os olhos. — Se eu tivesse conferido tudo quando cheguei na casa do Lukya, mas eu estava tão cansada, até dormi enquanto as meninas enrolavam meu cabelo…

— Tenho certeza de que você será a noiva mais linda do mundo, com ou sem véu. — Mesmo que Irisa tivesse um amontoado de cachos fofos de todos os tamanhos rodeando sua cabeça. Nem se Lilia se esforçasse muito, ela adivinharia o que as irmãs de Lukyan e a própria noiva estavam aprontando.

— Eu sei que eu vou… — reclamando com um beicinho, Irisa voltava a se parecer um pouco mais com a jovem tempestuosa que era. — Mas eu não entendo como aquela droga sumiu no ar! — Finalmente olhando para um silencioso e discreto Daniyal Altin, ela acenou sem muito humor. — Oi, Danik…

— Oi, Irisa… Dia ruim, né?

Lilia às vezes queria acertar a cabeça de Daniyal com alguma coisa pesada, mas isso implicava em ficar sem um parceiro e ela ainda tinha a esperança de levá-lo com ela para o futuro de suas carreiras conjuntas.

— Nem me fale… Só falta sumirem as alianças.

— Ah não, elas eu guardei bem — garantiu, batendo no bolso do paletó. Lilia não achava aquele o melhor lugar do mundo para guardar um par de alianças, mas se Lukyan havia confiado aquela tarefa ao padrinho… — Preciso voltar para terminar de ajudar Lukya, depois voltamos te buscar.

— Acho bom mesmo, Altin, ou não tem bolo pra você.

As duas jovens acenaram enquanto ele se afastava erguendo poeira atrás de si. Havia sido bom, mesmo, que nenhuma das duas estivesse vestida com as roupas da cerimônia. O mesmo talvez não pudesse ser dito depois sobre Daniyal.

A datcha da babushka de Lukyan cheirava a comida, mas o nervosismo de todos com a aproximação do horário não abria o apetite de ninguém, o que contrariava a velha Agnes com seus enormes tachos de comida e refrescos caprichados. Para não chatear a senhorinha, já emburrada com a ignorância dos netos, Lilia aceitou um pedaço considerável de pão e chá fumegante, e uniu-se à noiva no quarto entulhado de vestidos e moças, enquanto outra parte dos familiares improvisavam uma extensão para fazer funcionar o cordão de lâmpadas do lado de fora e afinavam o acordeão para os festejos.

— Babushka disse que papai tem afinado esse acordeão a semana toda — riu Renata, a irmã mais velha de Lukyan. Com cuidado ela abria os cachos da cunhada, fixando as curvas com um spray de marca estrangeira que deveria custar o preço de uma condicional. — Tomara que ele ainda se lembre de como tocar isso após a primeira dose.

— Teremos festa com música ao vivo e tudo, acho que nunca fui em um evento desse tamanho! — Lilia achava graça. Talvez fosse ela a pessoa fora da curva russa de entusiasmo com festejos. Não era como se ela mesma se visse casando algum dia, então estava tudo bem.

— A gente quase não saía daquela escola — Irisa reclamou, enrugando o nariz, suas mãos remexendo os potinhos espalhados sobre a penteadeira de espelho triplo.

— Pois nós podemos até sair do teatro, mas o teatro não sai de nós. — Com uma careta julgadora, Lilia tirou o blush da mão de Irisa, o analisando de perto. — Essas maquiagens são do Kirov.

— Estou reivindicando anos de tortura e adicionando uma pequena cota de vingança, já que esqueci meu véu naquele lugar. — Lilia ainda revirou os olhos, sem julgá-la totalmente. Era apenas um punhado de maquiagens, ninguém notaria se Irisa devolvesse no dia seguinte. E ela também queria usar aquele blush.

— Preciso passar meu vestido, ele amassou inteiro enquanto Danik me trazia, tem um ferro disponível?

— Pode deixar comigo! — Animada para a festa, Diana gritou do cômodo ao lado. Excelente audição. Assustadora, porém excelente. — Só me deixe terminar de ajustar o vestido de Irushka!

Lilia só se lembrava do nome de Diana porque ela devia ser o integrante mais feliz e brilhante da família Phorkomov, isso se tratando de uma família naturalmente barulhenta, com exceção ao caçula, Lukyan. Já Renata havia ficado em sua memória porque ela e Irisa tiveram uma professora de mesmo nome em seu quarto ano de curso junto ao Vaganova, uma pessoa tão desagradável que vaca era a ofensa mais suave que se podia ouvir nos vestiários. Aquele demônio de pernas compridas sabia mesmo como traumatizar um aluno.

Pobre Renata Phorkomova… Ela não merecia ser lembrada por causa de uma pessoa tão desagradável...

Infelizmente, de todos os integrantes daquela extensa família, Lilia não se lembrava de mais ninguém. Era tanta gente que faltava dedos em suas duas mãos para contar todos e ela duvidava que mesmo após tantos anos, Irisa comparecesse às pequenas festas familiares sem engasgar um nome ou outro de vez em quando.

Ocupada entre ajudar a maquiar a amiga enquanto três pares de mãos enchiam os cachos de grampos dourados, Lilia quase perdeu a entrada triunfal do vestido de noiva branco pelas mãos de Diana, maquiando os olhos para além da linha da sobrancelha assim que ouviu os gritinhos animados.

O vestido era, de fato, lindo, o melhor desenho disponível na moda atual e que as limitações financeiras de Irisa podiam pagar. O tecido era um cetim liso branco, que poderia ser tingido depois, caso ela quisesse reaproveitar o corte, facilmente adaptado para um modelo casual, com sua cintura marcada, mangas curtas e discreta gola em formato V. Era simples, elegante, sem nenhum tipo de bordado que dobrasse o valor da peça, mas muito, muito bonito. Lilia sabia como Irisa havia colocado seu coração nele, feito ela mesma tudo do zero, uma vez que Baranovskaya infelizmente não sabia costurar mais que as próprias fitas para ajudar a amiga, e a mãe da noiva não se mostrou muito entusiasmada a ajudar Irisa a fazer nem mesmo a bainha. Bem, a velha não era favorável em nada na vida da filha, desde o casamento à escolha da carreira, então não faria muita diferença.

— É lindo, Irisa! Você fez um trabalho lindo! — Lilia elogiou, percebendo uma empolgação excessiva a fazer saltitar de forma a ofender sua postura sempre séria. Mas como não se emocionar? Era como se ver o vestido finalmente a fizesse perceber que aquele momento enfim aconteceria, que era mesmo verdade: Irisa e Lukyan se casariam!

Emocionada a noiva deixou a cadeira para se aproximar do vestido, o tocando suavemente. Sim, ela se casaria… Ela nem podia acreditar!

Logo, estavam todas devidamente vestidas, noiva, cunhadas e dama de honra, com vestidos passados e maquiagem feita, posando para fotografias que enfeitariam o futuro álbum presenteado por alguém da família de Lukyan — e foi por muito pouco que Lilia não saiu na primeira foto com os cabelos ainda presos nos dois coques.

Quase meio rolo de filmes depois, Lilia ouviu o que muito se parecia com a barulhenta moto de Altin se aproximando, o que era muito estranho, afinal, já estava quase no horário dele chegar com Lukyan no carro do tio do rapaz, e ela tinha certeza de que nenhum carro fazia aquele barulho infernal. Ou talvez fizesse, a especialidade de Lilia não era a mecânica.

Gritos e risadas do lado de fora da casa, no entanto, chamaram atenção dos convidados e familiares, atraindo todos para a parte da frente; sendo interrompidos pela vizinhança, naquela cômica tradição russa, estava Daniyal à frente de sua moto, com Lukyan cantando e rindo na garupa. E o veículo estava totalmente decorado com os enfeites de Lilia e balões de festa coloridos que provavelmente Altin havia comprado no mercado quando estava desatenta. Cafona, extremamente cafona.

Mas o problema ali não era — apenas — os balões coloridos destoando da decoração imaculada que com muito custo Lilia terminou. O problema era essa decoração estar enfeitando a moto.

Todos pareciam muito incrédulos, risonhos e confusos com aquela aproximação. Que tipo de brincadeira era aquela? Onde estava o carro?

— Irisa…! — Lukyan, sempre de poucas palavras, apenas suspirou maravilhado ao ver a noiva. Ele saiu um pouco torto e cambaleante da moto, tropeçando com seu sapato bem polido no mato emaranhado em frente à casa da avó.

— Lukyan! — Ela não parecia muito diferente, o olhando de cima à baixo com lágrimas nos olhos e um sorriso enorme nos lábios. Se Lukyan já quisesse beijar a noiva, Irisa não se oporia a isso.

— Onde está o carro? — Por sorte, uma terceira voz se fez ouvir, voz essa que Lilia não fazia ideia de quem era, mas que supôs ser a do dono do veículo esquecido.

— Tivemos um probleminha e ele não saiu do lugar. — Se aproximando com discrição, Daniyal explicou, capacete em mãos. — Eles vão precisar ir ao Zags na minha moto.

Agora Irisa parecia de fato em choque.

— Mas e vocês? Não podemos casar sem as testemunhas!

— Não seja por isso! — Outra voz, dessa vez de alguém que tinha cara de tio, padrinho ou qualquer velho grisalho do tipo, cresceu na discussão, abrindo espaço entre as irmãs do noivo. — Estou com meu caminhão, aí! Vocês — ele apontou para Daniyal e Lilia — podem ir na carreta!

— O quê?

Não era intenção de Lilia fazer uma careta, não mesmo, apenas aconteceu. Em sua defesa, ela havia sido pega de surpresa muito rápido.

— Por mim tudo bem, onde está o caminhão?

E é claro que Altin não se importaria com isso. Não era o cabelo dele penteado no gel que ficaria um horror depois de exposto ao vento.

— Se o tio Vlad vai levar Lilia e Daniyal na carreta, isso significa que nós também cabemos? — entusiasmou-se Diana. Mesmo que não fossem entrar no departamento de serviços públicos, elas adorariam dar um passeio pelo centro.

— Claro, eu costumo levar oito caixas de verduras na caçamba toda manhã!

Oh, que alívio, pensou Baranovskaya. Mas não.

Suspirando internamente, Lilia olhou para a amiga, aos risos com aquela virada na programação, e apenas aquilo a convenceu. Certo, ela iria enfrentar um trajeto de quase uma hora sentada na caçamba trêmula de um caminhãozinho de carga. A viagem nem havia começado e Lilia sabia que estava valendo a pena.

.:.

Chegando ao destino, Lilia percebeu que nem sempre sacrifícios por amigos valiam a pena. Ela jamais havia sentido tanto medo em toda a sua vida, nem mesmo quando Daniyal quase a derrubou em uma avaliação em frente à diretoria do Kirov que havia simplesmente decidido assistir aos alunos logo naquele dia..

— Tudo bem, Lilia? — Notando os olhos fixos de Lilia no chão de madeira da carreta, Daniyal perguntou em voz baixa.

— Não, não está nada bem. Acho que esse homem quase bateu umas três vezes desde que saímos — sussurrou, aceitando a ajuda oferecida por Altin para descer do caminhão.

— Foram quatro — ele a corrigiu, olhando em volta. Diferente de qualquer pessoa, Daniyal sabia disfarçar com uma perfeição invejável qualquer sentimento, se assim quisesse.

Foi preciso se escorar no bailarino por um tempo até suas pernas finalmente se firmarem. Depois de hoje, ela tinha certeza de que levaria uma semana para voltar a centralizar o balancé.

Irisa, por outro lado, estava distribuindo sorrisos para os outros casais que, tal como ela, fariam daquele domingo seus casamentos. Onde eles haviam estacionado a moto? Lilia esperava que ela e Lukyan voltassem para a festa no caminhão e deixassem para ela a carona na velha e confiável amiga de Danik. Lilia nunca mais reclamaria dela.

Foi em busca da moto que ela percebeu, por acaso, uma garota do outro lado da rua, na entrada do Zags. A jovem, que também a notara, sentada na pequena escada de acesso, logo se levantou, se aproximando a passos tímidos, os cabelos cacheados quase lhe cobrindo o rosto redondo. Só então, quando ela terminou de se aproximar, que Lilia reconheceu a jovem Filatova — sem um coque na cabeça, era difícil para Lilia reconhecer até Irisa, às vezes —, que em vestes casuais parecia ainda mais jovem.

— Bom dia, Baranovskaya, se lembra de mim?

— Sim, claro! Filatova, não? — Tentando ajeitar os cabelos ondulados com uma discreta passada de mão no volume revolto, Lilia tentou parecer o mais próximo possível do que se espera de uma pessoa alinhada. Ela tinha certeza de que também estava com um vinco amassado em seu vestido mostarda. — Que coincidência te ver aqui!

Mais do que coincidência, era a estranheza, e Lilia com certeza deixou isso evidente com sua careta confusa.

— Na verdade eu estava mesmo esperando você. Ou vocês. — Ela apontou para Irisa, que conversando com as cunhadas, ainda não havia notado o distanciamento de Lilia.

Um tanto tímida, a garota abriu a bolsa que, agora Lilia notara, ela trazia consigo. De dentro da sacola, a ela puxou um pedaço de tule, um véu branco cujo tanto a grinalda quanto o comprimento levavam flores também de tule costuradas, embora o tom delas fosse ligeiramente diferente. Não era o véu de Irisa, mas ainda assim…

— Pouco depois de vocês irem embora, eu voltei para o vestiário, pegar um isqueiro para queimar a ponta da fita da minha sapatilha que tinha começado a desfiar. Foi quando eu vi aquela ruiva, Romanova, rasgando um pedaço de tule. — Lilia engoliu um suspiro, as mãos fechadas em punhos prontos para socar Vilena. — Não me passou pela cabeça que fosse o véu da sua amiga, juro que até pensei que fosse uma saia dela. Quando me dei conta, saí do vestiário antes de ser notada e esperei ela fazer o mesmo para voltar. Infelizmente não deu para salvar nada…

— Então como você…?

— O Kirov tem um monte de véus para as willis — ela riu travessa, dando de ombros. — Um a mais, um a menos… Quem vai notar?

Lilia exasperou uma risada. Oh, céus, ela era igual Irisa.

— Transformei o que dava para aproveitar do tule nessas flores… Não dava para saber como era o véu antes, então pensei em fazer algo mais enfeitado, até para não perder muita coisa do véu original…

— Isso está lindo! Não consigo acreditar que fez em uma noite, deve ter dado tanto trabalho…

Ela deu de ombros, oferecendo um sorriso pequeno.

— Eu gosto. E não me sentiria bem não fazendo nada depois de ter sido testemunha daquela cadela.

Oh céus, Irisa precisava conhecer ela.

— E como foi que você nos achou, aqui?

— Na verdade eu fui até o dormitório te procurar de manhã, mas me informaram que você já tinha saído, então eu dei uma volta pelos departamentos e depois da quarta tentativa, encontrei um Phorkomov com horário agendado para as onze e meia aqui. Dei sorte — confessou sorrindo.

— Hey, Lilia, quem é sua amiga? — Irisa se aproximou aos pulos, felicidade em seu rosto radiante. — Ah, a naniquinha da formatura! Você estava linda de Odette!

— Obrigada. — Embora agradecesse, a menina não parecia muito feliz com o apelido.

— Irisa, por favor, não me faça passar vergonha, Filatova veio salvar seu dia, sua ingrata.

— Mas não foi uma ofensa, ela é uma gracinha, eu também queria ter vinte centímetros a menos! — Virando-se em choque para a menina, Irisa abriu a boca, de repente sem palavras. — Ai, eu te ofendi? Eu juro que não queria!

— Irisa! — Lilia quase bateu palmas em frente ao rosto da amiga para que ela finalmente parasse e prestasse atenção. — Veja o que Filatova trouxe para você!

Irisa olhou, mas não viu. Na verdade ela reparou primeiro o chão do que a bolsa, e quando enfim seus olhos registraram a sacola florida, seus olhos se desviaram muito facilmente para o pedaço de pano que muito parecia--

— Um véu!! — Saltitando no lugar, mãos agitadas que não sabiam se pegavam o tecido ou abraçavam Filatova, Irisa tentava de algum jeito acalmar as emoções tortas que ameaçavam manchar sua maquiagem. — É um véu?!

— É um véu… — Filatova sorriu meio constrangida, esperando que Lilia a ajudasse.

— Oh meu Deus! — Finalmente Irisa gritou, em alto e bom som, empurrando o buquê para Lilia enquanto se inclinava para abraçar Filatova. Algo em seus olhos puxados dizia que a garota dispensava aquele tanto de contato físico. — Como você soube?!

— É uma longa história… — ela riu, achando melhor não contar nada, não agora que Irisa estava tão feliz. — Não é o seu, mas acho que improvisa bem.

Improvisa?! Olha esse acabamento, essas flores, isso está muito melhor do que o que eu tinha feito! Foram vocês que planejaram isso?

— Filatova aqui quem fez tudo — Lilia atribuiu os créditos a quem de fato os merecia.

As sobrancelhas claras de Irisa se uniram naquela cara de choro tão comum na bailarina. É, aquela máscara de cílios não duraria até o fim da cerimônia.

— Lukyan, vem ver o que a- a--, desculpa, qual o seu nome?

— Sinya Fiodorevna Filatova.

— Lukya!! Vem ver o que a Sinya aqui me deu de presente!!

E assim, sem qualquer aviso, Irisa gritou o primeiro nome de Filatova, acabando sozinha com qualquer barreira de interação social russa que antecedesse o que se podia entender por amizade. Com Irisa era assim que acontecia: primeiro a amizade, depois a construção dela.

Sorridente e impressionado, Lukyan se aproximou, trazendo os parentes logo atrás. Uma bagunça de risos, palmas e celebração cercaram Sinya e Lilia sentiu muito por ela, reconhecendo a si mesma no constrangimento difícil de disfarçar. Aquele era o jeito Phorkomov de dar boas-vindas.

— Tome! — Emocionada, pegou novamente o buquê feito com as flores do jardim da babushka Agnes, entregando-o a Sinya. De olhos arregalados, a garota recuou alguns passos.

— Não posso aceitar.

— Claro que pode, por que não aceitaria?

— Ah, sei lá, você não tem que colocar as flores nos memoriais de guerra?

Irisa não parecia muito empolgada a fazer isso. Existiam costumes maritais que ela estava adorando seguir, mas aquele não era um desses.

— Não quero — disse simplesmente. — Sério, aceite… Eu não sei como te agradecer melhor…

O pedido de Irisa era incentivado por parentes entusiasmados, encurralando-a em praça pública. Olhando um tanto desesperada para Lilia, Sinya esperava uma intervenção a seu favor que fosse, mas a bailarina apenas ergueu os ombros, apiedada da situação. Eram os Phorkomov, não tinha muito o que fazer naquela situação.

— Tá, mas e o seu casamento? Vai assinar os papéis, tirar as fotos, sem o buquê?

E o simplismo daquela resposta fez Irisa reconsiderar.

— Tudo bem, você tem razão. Nesse caso — abraçando-a em mais uma descompromissada manifestação de sentimentos, Irisa se empolgou. — Você entra com a gente.

Quê?

— Que acha, Lilia? Ela é tão pequenininha, acho que ninguém vai reclamar, né?

— Oh não, eu não poderia, e a sua família?

— Mas ela é tão tímida! — riu uma das irmãs de Lukyan, uma das que Lilia não sabia o nome. — Nem que quiséssemos poderíamos, temos muita coisa pra fazer ainda.

— É, tipo buscar a brux-- a mãe da Irisa — corrigiu-se Diana para não magoar a noiva. Lilia não tinha bem certeza se Irisa havia notado.

— Eu não estou nem vestida para isso. — Sinya ainda tentou desviar, mostrando a simplicidade da saia cinza com a camisa branca de botões. Como ela se livraria daquela gente, agora?

— Menina, nas fotos vai todo mundo sair em preto e branco, mesmo! — Ela não iria. — Vem, por favor…

Irisa insistiu não apenas com seus olhos pidões e sorriso brilhante; suas mãos seguravam os ombros de Sinya como se soubesse que a garota poderia facilmente sair correndo assim que ela deixasse de prestar atenção.

— ...tá. — Com um gritinho empolgado, a noiva comemorou, todas as cunhadas a acompanhando. — Mas depois disso eu preciso ir, tenho um monte de lição de casa pra fazer.

— Você não vai na nossa festa? — foi a vez de Lukyan se fazer ouvir. — Babushka preparou quase toda a comida sozinha.

— E a comida da avó do Lukya é maravilhosa!

— Eu não posso mesmo aceitar…

— Tudo bem, Irisa — Lilia decidiu tomar a defesa da menina. Depois de tamanha atenção, era muito provável que Sinya Filatova passasse a fugir de Irisa pelo Kirov. — Você pode separar um pedaço de bolo e levar para ela amanhã.

Os olhos de Irisa brilharam para a possibilidade e cresceram para a outra garota, que percebeu ter chegado longe demais para negar a gentileza.

— O bolo eu aceito — de bom humor, Sinya aceitou a gratidão que já parecia ser sua sina. Com palminhas animadas, Irisa celebrou.

— Perfeito! Agora, se me permite… — Jogando o véu sobre os cabelos enfeitados, a noiva quase recomeçou a chorar. — Acho que precisamos entrar.

— Primeiro prenda isso direito com um grampo, Irisa, vai acabar perdendo o véu de novo — provocou, Lilia, exibindo um sorriso para Sinya. Alguns grampos reserva de Lilia depois e a noiva estava pronta. Ela sequer reclamou da cor deles contrastando com seus fios loiros.

Já dentro do Zags, algo não muito usual aconteceu, quando Sinya Filatova também acabou ganhando uma faixa vermelha, participando da cerimônia como a terceira testemunha do casamento de Irisa e Lukyan Phorkomov. Ela jamais saberia explicar como um pedaço de tule acabou a colocando naquela situação.


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Notas finais do capítulo

Ai como eu adorei essa zona xD~ E vocês, participariam dessa bagunça? :v Confesso que eu me esquivaria até a morte lol

Curiosidades do capítulo:

— Leningrado era o nome de São Petersburgo durante a URSS;
— Kirov era o nome do teatro Mariinsky, na mesma época;
— o ZAGS, ou departamento de serviços públicos, era onde casamentos aconteciam, uma vez que a igreja havia perdido esse espaço. Exigia-se apenas duas testemunhas, que tinham tanta importância quanto o casal, e na maioria das vezes usavam uma faixa vermelha atravessada no peito para mostrar a importância de seu papel na união dos noivos.
— Os ZAGS tinham ou um busto, ou um quadro de Lenin;
— É claro que comprar produtos estrangeiros que não fossem devidamente permitidos no país ia render um puxão de orelha, mas ninguém seria preso por um tubo de laquê. Eu acho.
— Sobre o modelo de vestido de Irisa: era mais comum nos anos setenta, vestidos com mangas compridas, mas penso aqui que ela vá encurtar a saia para usar em outra oportunidade, afinal, se tem uma coisa que Irisa sabe fazer, é reaproveitar as coisas :v
— Um dos rituais de casamentos (que eu não tenho certeza se ainda perduram), é a do noivo e o padrinho irem buscar a noiva no dia do casamento, num carro enfeitado :3
— Na verdade, em meados dos anos 70, as produções do Kirov não usavam véus para as willis (balé Giselle), mas eu fiz essa licença poética xD
— Não tenho bem certeza se apenas as testemunhas eram permitidas nos casamentos. Uma vez que os escritórios eram pequenos, não deveria caber muita gente :X Mas acredito que não participar do registro em si não era um problema, afinal o casal costumava realizar uma festa em família, que era de fato a celebração. Essa festa podia até ter um segundo dia de festejo extra :v

E acabou! xD Te vejo no próximo capítulo? ♥



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