Ambíguo escrita por Lasleth


Capítulo 3
Guo - A travessia




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Yifan ainda não entendia o que Yixing queria dizer. Claro que se tornou óbvio que era com ele que Xuanzi conversava em outro dia, mas se ele estava o vendo e tocando então não poderia ser uma alucinação, certo? 

— Não sou do seu imaginário, senhor Wu. Pelo contrário — Sorriu fazendo o moreno ficar ainda mais incomodado —, sou mais real do que pode imaginar. 

A pequena alfa nesse momento ergueu a cabeça para prestar atenção no outro, sorriu para Yixing agradecendo ao bolo e pedindo por mais um pedaço, porém ele lhe disse que infelizmente havia acabado. 

— Não brinquei quando disse que estamos aqui para lhe ajudar, por favor nos acompanhe. — Continuou depois que respondeu a pequena. 

Ele se ergueu e Yifan rapidamente pegou na mão da filha, os três se colocaram de pé enquanto Yixing caminhava lentamente para outro cômodo. Abriu a porta para denunciar que o local era um tanto escuro e menor que o cômodo anterior, mas não deixava de ser confortável como a sala onde estavam. Mas o que mais chamou a atenção de Yifan, naquele momento, foi o homem sentado na cadeira da mesa circular, que ficava ao centro da pequena sala. Zitao estava com os cotovelos apoiados sobre a mesa enquanto as mãos agarrava os fios loiros em uma demonstração de desespero e dor. 

— Zitao. 

A voz de Yixing chamou a atenção de Yifan, como o outro conseguia enxergar o ômega ali? E porque Zitao estava naquela situação? Será que ele também estava a procura de ajuda? 

Quando resolveu procurar por um lugar que lidava com isso, sentiu-se um completo idiota. Yixing parecia ser alguém de bom coração, mas a sequência de acontecimentos apenas dizia ao moreno que ele estava sendo enganado. O alfa ficou confuso porque não conseguia entender quem estava mais louco, não sabia se Zitao era uma alucinação, um espírito ou se Yixing sequer fosse humano. Sua cabeça começou a latejar e sentiu a filha lhe apertar a mão, chamando sua atenção. 

— Papai, não é a mamãe? — Ela apontou de forma inocente para o ômega em prantos. 

Yixing dava a volta na mesa para afagar as costas trêmulas do amigo.

— Zitao… — O chamou mais uma vez e o ômega ergueu a cabeça. 

Como sempre Zitao sequer percebeu ou fez questão de demonstrar interesse na presença do marido e filha no local. 

— Yi… Yixing, por favor! Faça parar, eu te imploro, por favor! 

— Ei, se acalme. 

Yixing o trouxe para um meio abraço torto enquanto Zitao ainda estava sentado. Xuanzi se encolheu para perto de Yifan que lhe trouxe um pouco de proteção também, era injusto com a pequena, não fazia sentido submetê-la àquela situação estressante. A cena ainda cortava o coração do alfa moreno. Yifan queria ao menos uma troca de olhares, mas Zitao parecia vagar triste e perdido pela vida. 

— Eles estão aqui. — A frase de Yixing fez Zitao estremecer. O ômega olhou para todos os lados enquanto o amigo sorria gentil, tentando terminar seu próprio raciocínio. — Eles estão aqui como eu te disse. Vamos poder ajudá-los agora. 

Pai e filha ainda se encontravam em confusão. Zitao enxugou as lágrimas teimosas e sorriu para Yixing, esperando que o amigo se sentasse ao seu lado na mesa. 

— Eu… Eu quero tanto morrer, Xing, pela segunda vez se for possível, essa dor não desaparece nunca do meu peito. — Levou a mão ao local indicado, apertando a camisa enquanto fechava os olhos com força, as lágrimas caindo. — Por favor, nos ajude. 

Yifan olhava do marido ao tal de Yixing.

— Estamos aqui ainda, se é possível, por favor, não nos ignore — falou esperando que Yixing ou Zitao o respondesse, mas nada aconteceu. — Ei… Zitao? Yixing? — perguntou de novo.

Yifan sentia seu peito comprimir porque agora os dois lhe ignoravam, Xuanzi começou a chorar agarrada ao seu lado, o local aos poucos começou a escurecer.

— Papai! Eu tô’ com medo, o que tá acontecendo? PAPAI! 

Yifan deu um passo para trás quando sentiu que todo o local iria engoli-lo, fechou os olhos com força quando Xuanzi o chamou pela última vez, sua voz ecoando, quando voltou a abri-los existia apenas um breu total. Estava sozinho e sentia seu corpo se arrepiar como se estivesse ligado a uma corrente de energia elétrica sutil. Olhou para os lados, girou sobre os próprios pés, mas o ambiente a sua volta não parecia ter um começo, meio ou fim. 

— Olá? — falou e a voz ecoou, só poderia estar sonhando. — Estou delirando, só pode ser… — sussurrou.

O moreno acreditava agora que ainda estava deitado na cama do hospital, era essa a única resposta, seus últimos cinco anos foram apenas uma ilusão. Estava em coma e ainda delirava com uma vida onde Zitao havia falecido e lhe deixado. Iria acordar e perceber que era tudo um sonho maluco. 

“Não…”

Uma voz sussurrou ao pé do seu ouvido. Yifan levou sua mão a orelha para afastar o incômodo da surpresa. 

“Não, Yifan…Você não está no hospital.”

O moreno ainda buscava a voz quando uma sombra o surpreendeu, de repente a imagem de Yixing e Zitao sentados na mesa se fez presente à sua frente.

— Eu sei que eles estão mortos, já faz cinco anos, Xing! — Tao dizia com os olhos ainda molhados.

— Zitao se acalme, sabemos disso.

“Sabemos…”, Yifan queria entender o porque Yixing sempre falava no plural se ele era o único ali, além de seu marido. 

— Vamos ajudar, todos nós, se acalme para que possamos começar. — Yixing o tranquilizava.  

Yifan nesse instante sentiu algo tocar o seu ombro, o fazendo se virar de costas para a cena dos dois na mesa. O alfa fitou nos olhos do jovem rapaz a sua frente, quase tinha seu tamanho e o sorriso era bem gentil.

— Olá, estamos aqui para te ajudar.

— Todos querem me ajudar — respondeu sem ânimo, o sorriso do rapaz se alargou.

— Entendemos — fechou os olhos —, sua filha está bem e está com saudades.

— Xuanzi?

Saudades? Eles estavam juntos há alguns minutos.

— Acalme-se. Me chamo Chanyeol, me acompanhe.

Yifan franziu o cenho e seguiu o jovem pelo breu, Chanyeol parecia alguém calmo demais para pertencer a mente confusa e turbulenta de Yifan. O alfa o seguia, mas seus passos eram pesados e pareciam que não saiam do lugar. 

— Se sente pesado, mas é comum durante a travessia.

— A travessia? — fitou dos seus pés para as costas largas do outro. — Estou confuso, o quê…

— É perfeitamente normal! — riu enquanto ainda caminhava, sem perder o ritmo. Ele ainda estava de costas quando o breu deu lugar a uma fagulha de luz, bem a frente de Yifan, o cegando.

O alfa levou a mão aos olhos, o brilho o incomodava e agora, além de sentir o corpo pesado a luz brilhante parecia lhe queimar, causando uma sensação terrível por todo o corpo. Antes mesmo que resolvesse gritar a luz se desfez, como poeira, explodindo e se dividindo em milhares de pedaços sutis, caindo a sua volta. Quando Yifan abriu os olhos estava dentre um campo de flores gigantesco onde mal se via o fim. Mais a frente Chanyeol terminava de caminhar indo em direção a outro rapaz que segurava a mão de sua filha. Xuanzi carregava o ursinho e o lenço que estavam em suas mãos no dia do acidente, dentro do carro.

— Não… — Yifan soltou a olhando ao longe, Chanyeol o chamou com a mão e o moreno não sabia se teria forças para caminhar até eles. 

Percebendo a confusão e paralisia no maior, Chanyeol e o outro rapaz conduziram Xuanzi até ele. A garotinha estava em um lindo vestido branco, carregando seus objetos favoritos enquanto bebê. Sua aparência era a atual, de cinco anos de idade.

— Olá, sou o Baekhyun. — O outro rapaz se apresentou, fazendo Yifan tirar seus olhos da filha para olhá-lo, ele também estava todo de branco.

O moreno estava tão absorto que não reparou nos pequenos detalhes, toda aquela confusão só lhe significavam uma coisa naquele momento: ele estava morto. E todo o restante veio como um balde d’água, todos os últimos cinco anos passaram em frente aos seus olhos como uma cena de filme em velocidade máxima, tudo aquilo era uma mera ilusão perante sua atual realidade e quando pode voltar a si mesmo percebeu que estava novamente na sala com Yixing e Zitao. 

Sentados a mesa ao lado do seu marido e do amigo estavam outros jovens de roupagem branca e era incrível porque todos pareciam pontos de luz, emanando uma energia sutil e calmante para o ômega loiro que se acalmava. Yixing lhe explicava que as coisas dali em diante seriam menos amargas porque todos haviam compreendido seus erros.

Na cabeça de Yifan as coisas se esclareceram lentamente, ele entendeu que estava morto e isso doía em seu peito, mas será que ele deveria se apegar à dor? Justo agora que não estava mais na matéria para sentir reações em seu corpo físico?

— Essa dor ainda é do espírito, amigo. — Chanyeol se aproximou por um lado, junto de Baekhyun que lhe sorria. — Você pode optar por continuar a sentindo ou não, mas saiba que ao pensar nessa dor você automaticamente se conecta a Zitao — apontou o homem à sua frente. — Você acredita que ele mereça continuar sofrendo? Todos vocês vivem de alguma forma, porém em planos diferentes. 

Xuanzi agarrou a mão do pai, do outro lado. Yifan compreendeu a fala de Chanyeol e se sentiu menos sozinho com o toque da mão da filha, que era curiosamente quente e confortável. 

— Papai, eu não quero ir embora agora que encontramos a mamãe. — Ela olhou a figura de Zitao na mesa e Yifan sorriu.

— Não dá pra encontrar algo que nunca foi perdido, querida. — Ele entendeu ali, naquele rápido instante o que deveria fazer. 

Yifan e Xuanzi sabiam que jamais perderiam Zitao outra vez, afinal, nunca o perderam.

Yifan estava sob a ilusão da morte onde criara para si uma realidade menos dolorosa e por longos meses terrenos fez Zitao sofrer igualmente a si. Sua filha, por outro lado, a partir do momento que viera a falecer rapidamente foi resgatada por Baekhyun e Chanyeol. Ela dizia que os dois eram seus anjos de guarda e eles cuidaram dela pelo tempo em que o papai alfa ficou em “sonho ilusório”. Yifan agradeceu aos dois novos amigos por terem amparado a pequenina, ela estava radiante. 

Yifan compreendeu que fora um tolo ao criar toda aquela ilusão, toda aquela mentira. Compreendeu que sua dor ao desencarnar fora um choque para o seu ser espiritual, e que por isso automaticamente se colocou dentro de um casulo que, a princípio, lhe parecia de proteção. Mas agora Yifan deixaria Zitao viver, mesmo que pensar naquela breve separação ainda lhe parecesse sufocante, isso porque sentia saudades. O ômega teria que aprender a viver com a perda também, não era fácil para nenhum dos dois lados, mas infelizmente a dor fazia parte da evolução e ela precisava ser sentida e superada, por ambos os lados. 

No tempo certo iriam se reencontrar. 


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