"Tudo pronto."
— N

Gabriel lia as palavras de Nathalie naquele papel com um sorriso nos lábios.
Por um momento, imaginou que ela não continuaria a ajudá-lo, principalmente depois daquele fracasso na última batalha com os heróis, que resultou em sua fuga repentina da cidade. Ele certamente não esperava que tomaria aquela decisão. 
Minutos antes de partir para o Tibet, Gabriel observava a equipe de super-heróis se aproximar da mansão através das câmeras. Já se preparando para a pior das hipóteses, ele repassou com Nathalie os detalhes do plano que tinha feito caso aquilo ocorresse.
Estava tudo saindo como esperavam. Os heróis tentaram entrar na mansão através do ponto cego das câmeras e, imaginando que não havia ninguém em casa, nem tomaram o cuidado de serem silenciosos. 
Gabriel percebeu que, pelo visto, ele havia se descuidado em algum momento e Ladybug desconfiava dele novamente. Ela não desconfiaria mais quando Hawk Moth aparecesse ao lado de Gabriel Agreste, como ele planejava. Então, os heróis levariam o pai de Adrien para um "local seguro" e, estando sozinho, ele poderia se transformar enquanto Nathalie, akumatizada com a aparência de Hawk Moth, lutaria com os heróis na frente da casa ou na sala de estar até que a transformação dos mesmos estivesse prestes a terminar. E, quando isso acontecesse, o verdadeiro Hawk Moth surgiria, e nenhum dos heróis teria para onde fugir. Os miraculous estariam em suas mãos. O plano parecia perfeito.
Porém, em pouco tempo, Gabriel viu Ladybug colocar a senha no quadro de Emilie, revelando o esconderijo de Hawk Moth, o que o surpreendeu. Como ela sabia a senha? Isso não fazia o menor sentido.
Quando observou, pelas câmeras, a equipe de super-heróis entrar em seu esconderijo, ele percebeu que tudo o que planejava tinha ido por água abaixo. Ladybug veria o corpo de Emilie e essa seria a grande prova de que Gabriel era mesmo Hawk Moth e que usaria as jóias para reviver a esposa. Além disso, se Ladybug sabia a senha do quadro, ela já o vigiava há um tempo e tinha provas suficientes para a equipe admitir que ela estava certa. Agora não havia nada que pudesse fazer para convencê-la de que ele não era Hawk Moth. 
Sentindo a raiva pela heroína crescer dentro de si, seu primeiro impulso foi o de se transformar e lutar contra os heróis, que, àquela altura, já deveriam estar em seu covil. Mas, antes que colocasse a senha do quadro, ele percebeu que talvez ainda desse para seguir o antigo plano. Nathalie ainda poderia ser akumatizada e lutar contra os heróis enquanto ele pensava em alguma coisa. Então foi isso o que fez. Percebeu que a secretária lhe fazia inúmeras perguntas, já que agora estava claro que Ladybug sabia a identidade de Hawk Moth. Mas, perdido em seus pensamentos, não conseguira ouvir as indagações de Nathalie. Rapidamente se transformou e, sem dizer uma palavra, levou a borboleta negra às mãos dela, que aceitou a akumatização prontamente, como ocorreu quando tranformou-se em Catalyst. Em poucos segundos, Hawk Moth encarava uma cópia tão perfeita dele mesmo que parecia olhar-se em um espelho. Sorrindo e em silêncio, Nathalie, já transformada em Copy Moth, foi até o covil onde os heróis se encontravam, sem saber que, em poucos minutos, Gabriel mudaria de ideia ao perceber que a probabilidade daquele plano dar certo era mínima, já que agora sua identidade não era mais um segredo.
Sentindo a raiva queimar-lhe as veias, juntou o que pôde, escreveu rapidamente os bilhetes de Adrien e Nathalie, e tomou todo o cuidado possível para sair daquela casa sem ser visto por nenhuma câmera, usando o celular para controlá-las enquanto ele passava. Se os heróis derrotassem Copy Moth, o que provavelmente aconteceria, Gabriel seria considerado um fugitivo e não demoraria muito para que o buscassem por todas as câmeras.
A partir daquele dia, andou disfarçado e fez de tudo para que não fosse visto em lugar algum, o que tinha funcionado até aquele momento.
Ele voltou o olhar para a janela, observando a brancura da neve que atingia o local, com a certeza de que, se tudo ocorresse como planejava, sairia dali em breve. E, agora, com a confirmação da ajuda de Nathalie, sabia que isso ocorreria talvez até mais cedo do que ele esperava. Sentia-se, naquele momento, muito mais preparado para a batalha que tanto aguardava.

***

Marinette fitava, sorrindo, o loiro à sua frente, lembrando-se do pedido de namoro na noite anterior, mas, ao perceber o olhar de sua amiga, voltou a si. Ela não podia saber. Não ainda.
— Por que você está disfarçando? — Alya perguntou.
— Disfarçando o quê? — Disse ela, voltando o olhar para o livro de história sobre a mesa.
— Que está olhando pra ele, ué. Como se isso nunca tivesse acontecido antes… — Marinette deu de ombros e fingiu estar totalmente imersa na leitura, mas Alya voltou a insistir. — Sei que já perguntei várias vezes e você sempre muda de assunto, mas o que aconteceu entre vocês? Depois daquele surto todo do cinema e tudo mais, eu achei que vocês ficariam juntos, mas aí você parou de surtar por causa dele de repente. Teve aquela vez que viram vocês dois abraçados, achei que tinham voltado com tudo, mas você disse que não era nada… Sério, eu podia jurar que vocês estariam juntos, com direito a pedido de namoro e tudo… — Marinette corou.
— Namoro? Quê? Não… a gente… não. — Ela não conseguiu continuar e a morena riu.
— E a antiga Marinette está de volta, senhoras e senhores. — A azulada deu uma cotovelada leve no braço da amiga e fez uma careta. As duas riram e voltaram para os livros.
— Mas, é sério, não aconteceu nada depois daquilo no cinema e no aeroporto no dia que fomos falar com a Kagami. E… está tudo bem, somos amigos. — Marinette disse depois de alguns instantes em silêncio. Já tinha dado aquela resposta algumas vezes para a amiga, mas Alya parecia conhecê-la tão bem ao ponto de saber que certamente estava mentindo. 
A morena assentiu, um pouco contrariada. Não entendia por que Marinette não lhe falava mais sobre Adrien, mas tinha certeza de que, se realmente estivessem juntos, ela lhe contaria. Só não sabia que estava totalmente enganada.

***

No intervalo, Marinette encarava Adrien de longe, que conversava com os amigos. Queria se aproximar e saber do que ele tanto ria, mas tentava ficar um pouco distante do garoto em público, pois, desde o dia em que os viram abraçados no pátio, existiam alguns rumores de que estavam juntos.
Ela se sentia muito mal por ter que mentir para os amigos, principalmente para Alya, que sempre a ajudava na época que queria conquistar Adrien. Mas sabia que era melhor para todos se ocultasse o que tinham. Se aquela informação chegasse à internet, era apenas uma questão de tempo para que Gabriel se aproveitasse da situação, isso, é claro, se ainda estivesse com o miraculous da borboleta e se ainda planejasse pegar as jóias mágicas dos heróis. 
Ela suspirou. "Queria poder estar perto dele assim como os outros casais estão…", pensava, olhando para Mylène e Ivan, Rose e Juleka, Alya e Nino…
— Vocês se resolveram então? — Perguntou à amiga quando ela se aproximou.
— Eu e o Nino? Ah nos resolvemos sim, nem lembro mais por que estávamos brigados. — Alya falou e as duas riram, sentando-se em um dos degraus da escada.
A azulada sorriu ao ver que Adrien a encarava. Ele apontou para o próprio celular, indicando que ela devia olhar o dela.

Para de me olhar que nem uma menininha apaixonada antes que desconfiem kkkkk
Ah, e limpa a baba que dá pra ver daqui.

Instintivamente, ela levou a mão à boca, mas ao olhar para o loiro, que ria dela, lhe lançou uma careta.

Engraçadinho…

Não acredito que você caiu kkkkk

Tem planos para hoje à noite?

Adrien sorriu ao ler a mensagem de Marinette.

Ainda não.

Depois da aula de chinês, passa lá em casa. Não aguento mais ouvir meu pai te chamando para almoçar/lanchar/jantar lá kkkkk
Ah, e se prepare para o bolo de coração e o "discurso constrangedor", como você chama.

Marinette o encarou enquanto ele lia a mensagem e notou que o namorado arregalou os olhos. Ela riu e o loiro lhe lançou uma careta, que a fez gargalhar ainda mais.

***

Depois de sua aula de chinês, Adrien mandou uma mensagem para Nathalie, avisando que iria para a casa de uma amiga. A mulher prontamente lhe respondeu e ele saiu da mansão, entrando no carro.
No caminho, pensava sobre o quanto as coisas tinham mudado naquelas últimas semanas. Se seu pai estivesse em Paris, certamente não o deixaria sair, mesmo que tivesse o resto do dia livre.
Pensar em Gabriel o fez sentir um frio inexplicável. Apesar de tudo o que ele havia feito, não dava para evitar aquela preocupação. Onde seu pai estaria? Será que pensava em voltar? E, se voltasse, o que aconteceria? Ele ainda lutaria pelos miraculous? Se arrependeria de tudo o que havia feito? Explicaria por que razão queria tanto aquelas jóias? Iria pagar pelos seus crimes contra a cidade? E, a principal pergunta que invadia sua mente: ele seria capaz de lutar contra o próprio pai?
Na última batalha, quando enfrentaram Nathalie akumatizada acreditando que era Hawk Moth, Adrien lutara sem pensar que poderia estar batalhando contra o pai. Foi tudo tão repentino que não tivera tempo de digerir aquele pensamento, apenas lutou como se não soubesse a verdadeira identidade do vilão de Paris. Mas, depois daquele bilhete que o pai deixara, e depois de tantas noites sem dormir, finalmente permitiu que aquele pensamento o invadisse e a ficha parecia ter caído. Seu pai realmente era Hawk Moth. Mas, sempre que podia, tentava não pensar nessa informação. 
Nino, Alya, Kagami, Luka, Max, Kim e, principalmente, Marinette — que, como faziam parte da equipe de super-heróis, eram seus únicos amigos que sabiam a verdade sobre Gabriel — o ajudavam sempre que podiam, demonstrando que podiam contar com eles naquele momento tão complicado. Adrien agradecia imensamente aos amigos e à namorada, mas realmente estava tentando evitar aquele pensamento. Sentia que precisava viver e aproveitar aquele momento com os amigos e Marinette, que finalmente era sua namorada, e não deixar-se abater pelas escolhas erradas de Gabriel. Só não sabia que, quanto mais evitava pensar naquilo, mais a verdade sobre seu pai voltava a atormentá-lo. 
Adrien respirou fundo, na tentativa de acalmar os pensamentos. Lembrar de Gabriel sempre o fazia sentir aquele misto de raiva e decepção, além, é claro, de incompreensão. Por que seu pai tinha feito aquilo? Claro que Gabriel nunca fora tão próximo do filho, sempre se mostrava tão frio e concentrado no trabalho que mal tinha tempo — ou vontade — de conversar com o próprio filho. Mas mesmo assim era estranho, para Adrien, encontrar um motivo para que seu pai quisesse tanto aquelas jóias.
Finalmente viu a casa de Marinette pela janela do carro e conseguiu afastar aqueles pensamentos que tanto o incomodavam.

***

Nathalie olhava para o novo traje, sentindo a hesitação que teve há alguns minutos a abandonar aos poucos. O antigo vestido de Mayura ganhara detalhes roxos e pretos, com um símbolo de borboleta próximo ao seu pescoço. Em uma das mãos, ela segurava seu conhecido leque e, na outra, o cetro de Hawk Moth.
Seus olhos percorreram o novo esconderijo, preparado por Gabriel para o caso de alguém descobrir sua identidade antes da hora e precisasse mudar os planos. "Ele realmente pensou em tudo", concluiu e, notando a adrenalina percorrer seu corpo, conseguiu sentir as emoções negativas de seu futuro vilão.

***

Marinette ria com o rubor nas bochechas de Adrien ao chegar ao local e ver a mesa exageradamente adornada por Tom.
— A gente não conseguiu controlá-lo. — Sabine sussurrou para o loiro e todos riram.
Não demorou muito para que Adrien se juntasse à mesa ao lado dos pais de Marinette. Era tão bom se sentir em casa e, finalmente, afastar por completo aqueles sentimentos que o atingiam quando pensava em seu pai e na mansão solitária que tinha deixado para que ele morasse com Nathalie.
Logo, todos estavam rindo e conversando. Ao contrário do que o loiro havia imaginado, Tom não fez seu "discurso constrangedor" ao saber que a filha estava namorando e os pais de Marinette compreenderam a decisão do casal de não contarem para ninguém sobre o relacionamento por enquanto.
Os quatro conversavam animadamente quando, da televisão da sala de estar, veio uma notícia que já não era ouvida há semanas.
— Novo vilão ataca a torre Eiffel, transformando cidadãos… — Os dois jovens se entreolharam, surpresos, enquanto Tom e Sabine exclamavam expressões de espanto.
— Mãe, eu… lembrei que amanhã tem teste de literatura. Vamos estudar, Adrien? Estamos subindo. — Sabine assentiu, com as mãos sobre o peito e com o olhar focado no noticiário.
No quarto da azulada, os dois jovens tentavam, em vão, controlarem-se.
— Como assim novo vilão? Meu pai voltou? Como que ninguém ficou sabendo disso? — Adrien perguntava, andando de um lado para o outro, mas foi interrompido pelo toque de notificações do celular de Marinette.
— A Alya acabou de postar sobre o vilão. Disse que é um sentimonstro!
— Mayura! — O loiro afirmou, lembrando da conversa que teve com a azulada uma semana depois que descobriram sobre Hawk Moth.

"A Mayura só pode ser alguém que seu pai confiaria o bastante para guardar um segredo como esses…", a garota tinha dito naquela ocasião.
"Nathalie!", os dois disseram juntos, mas logo se acalmaram.
"Mas ela realmente não parecia saber sobre seu pai ser o Hawk Moth, lembra? Ela ficou bem surpresa e parecia decepcionada quando soube."
"E também, porque meu pai teria akumatizado a Nathalie naquele dia, se ela podia muito bem usar o miraculous? Sinceramente, acho bem difícil meu pai confiar em qualquer pessoa, até mesmo na Nathalie, para mostrar esse lado bizarro dele"
"É… talvez ele nem conheça a identidade da Mayura. Mas, de qualquer forma, é bom ficarmos de olho nela. Por precaução", Marinette tinha dito, mas com todas as preocupações que os atormentavam, até haviam esquecido desse detalhe.

— Está pensando o mesmo que eu, não está? — A azulada falou, fitando os olhos surpresos, mas ansiosos de Adrien.