II — escolhas.

Havia se passado uma semana desde a formação da turma: alguns já planejavam a faculdade dos sonhos — como Carmem, que já estava prontíssima para a faculdade de moda em Harvard —  e outros apenas queriam viver a vida pelo tempo que fosse permitido, como Cascão. Por mais que sempre sonhou em ser jogador de futebol, naquele momento, Cascão apenas queria viver a vida como ninguém. Mônica apenas aproveitava seu namoro com DC enquanto Cebola procurava o melhor curso de faculdade para manter sua cabeça atarefada, para si, quanto mais ocupado melhor.

Já Magali... ah, Magali. A pobre menina doce e meiga da turma, que sempre esteve disposta à dar conselhos e um ombro amigo, naquele momento, era a que mais precisava de um amparo — por mais que ninguém percebesse, já que Magali fazia questão de esconder seus problemas com seu sorriso doce e gentil. Alguns dias após sua formação no colégio, Magali recebeu uma carta de sua tia-avó Nena, e ela foi definitiva para que o tempo de Magali estivesse contado. 

Magali. Minha pequena Lua, sei que você acabou de se formar com sucesso, parabéns! Mas, lembre-se: quando você completa dezoito anos, a sua primeira fase lunar está desabrochando, é necessário que você esteja preparada para o que irá sentir, ver e ouvir assim que o badalar der meia-noite no seu aniversário. Por isso, peço que aceite seu lado bruxo e venha comigo para o interior, irei lhe ensinar tudo que for necessário, mesmo que isso leve tempo. 

Com amor, Nena Lima. 

Magali sabia o que acontecia quando completasse oficialmente dezoito anos: a sua primeira fase lunar como uma bruxa iria desabrochar do fundo do seu coração e então, ela passaria a sentir coisas que nenhum outro ser humano comum sentiria normalmente. Faltava duas semanas para seu aniversário e Magali já sentia coisas, principalmente em achar que Mingau falava consigo em certos momentos: quando queria comida e reclamava que ela era uma péssima dona, ou quando queria carinho. Sabia que podia ser o estresse, mas Magali nunca escutou aquela voz grossa e rabugenta em sua mente antes. 

Pelo que leu nos livros de Bruxaria Lunar — a linhagem de sua família — os primeiros sintomas do Sexto Sentido de uma Bruxa eram de contato animal: elas ouviam, sentiam e falavam com os animais. Afinal, eles eram os mais fiéis escudeiros (após a senhora Lua, é claro) das bruxinhas e lhe abençoaram com o dom de contato bruxo. Magali passou uma semana inteira pensando em suas decisões: se era certo abandonar seu namorado de quase dez anos, Quim, e suas fiéis amizades de anos apenas para seguir uma origem que era incerta. 

E enquanto olhava para a Lua, Magali sentia a mesma conversando consigo, com seu coração e mente confusa. Mingau estava dormindo em seu colo e foi quando a Lua deu às caras no céu negrume, que Magali ouviu: siga-me. Siga-me. Siga-me, Magali.