Ouro e Prata - Símbolo de uma Promessa escrita por GolDKler


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

É a primeira vez que estou escrevendo uma história. Críticas são muito bem vindas para ajudar a melhorar o conteúdo. Mas por favor, seja educado.

Esta história acompanhará diferentes personagens e seus pontos de vista.
Espero que gostem. Boa leitura!



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GABRIELLE

Acordei assustada com um barulho alto acompanhado de uma claridade forte. Após alguns segundos percebi que foi um raio. Uma chuva com ventos fortes caía sobre Susana, uma grande cidade litorânea. 

"Espero que não derrube nenhuma árvore", pensei comigo, já que trabalharia bem cedo. E como havia muitas árvores velhas em meu bairro, sempre tinha algumas ruas interditadas após ventos fortes.

Após alguns minutos voltei a dormir. 

Era 4h45min quando meu despertador tocou.

— Droga. - Reclamei olhando que ainda chovia um pouco. - Que falta faz meu carro agora. 

Minha única condução no momento era minha moto. Meu carro estava na oficina depois que um ser muito inteligente havia acertado minha traseira em um semáforo há uma semana. Por sorte ele aceitara fazer um acordo e pagar todo o conserto, já que estava um pouco alterado pela bebida e se fizesse um boletim de ocorrência seria muito pior para ele. “Quem anda embriagado às 5h30min da manhã?”, eu me perguntava. “E a minha sorte a de ter cruzado seu caminho?”. Aquele horário não tinha movimento algum. O jeito era se conformar e ir de moto mesmo.

Tomei um banho rápido enquanto a cafeteira trabalhava. Terminei de me arrumar e comi rapidamente, saindo com capacete e a capa de chuva na mão. Chegando na escada dei de cara com a Crystal. Ela com a cara amassada que denunciava quem acabou de acordar. 

—  Vou te levar. - Me falou mostrando as chaves do carro. 

Só lhe dei um sorriso e aceitei apesar de achar que era muita sacanagem ela levantar tão cedo por minha causa, mas ela não era do tipo que voltava atrás. 

— Que merda, - ela falou olhando um galho enorme na rua ao dar ré no carro  - por que não tiram todas as árvores que estão em risco logo?

— Porque o nosso prefeito é maravilhoso, - falei sarcasticamente - ele só pensa na área turística da cidade. 

15 minutos depois chegamos em frente ao hospital Álvaro Fontes. Agradeci muito a carona e fiquei observando o carro até ele virar a esquina e sumir. Ainda chovia fino. 

Crystal era minha amiga desde o tempo de escola. Ela era minha família ali, já que meus parentes moram em outra cidade. 

Vim para Susana aos dezessete anos para fazer faculdade e estou aqui desde então. Fiz minha especialização, e como dois dos melhores hospitais escola do país estão aqui, acabei ficando, não queria me mudar de novo. Apesar de ambos serem muito disputados eu consegui entrar, era uma das melhores alunas desde o colégio e adorava um desafio. 

Segundo minha mãe, eu tenho uma habilidade especial. Memória fotográfica. E isso realmente é de muita ajuda. 

Crystal era policial. Ela seguiu a carreira do pai, com quem se parecia muito já que herdara seus cabelos ruivos e personalidade forte. Escolheu essa carreira a muito contragosto dos pais, que achavam que ela devia ter feito algo mais feminino. Isso era algo que a chateava muito e um dos motivos do porque quase não ia visitá-los. Por outro lado, eu me dava bem com os meus pais, porém não me dava muito bem com seus novos companheiros. Eles se separaram quando eu tinha 11 anos e cada um seguiu sua vida. Hoje eles tem novas famílias e eu tenho irmãos de ambos os lados, porém mal conheço eles, falo com meus pais praticamente só por telefone, uma vez que passo muito tempo no hospital e eles em seus trabalhos. 

O dia parecia que não ia ter sol. Eu amo dias chuvosos que fazem um pouco de frio. Susana era a cidade que mais chovia no país, então era bem comum dias assim. Apesar de gostar, não iria fazer diferença porque eu só iria sair do hospital a noite. Algumas vezes até dormia no hospital mesmo. Mas hoje tinha combinado de jantar com Crystal e Amabelle a noite, elas não gostam quando eu fico direto no trabalho e sempre me cobravam de ir para casa. 

Caminhei pelos corredores cumprimentando algumas enfermeiras e plantonistas no caminho ao vestiário. Me troquei fui cumprir minhas tarefas. Hoje o dia prometia, eu tenho uma cirurgia marcada para às 8 horas. Eu estava no penúltimo ano da residência e fazer um procedimento sozinha me dava frio na barriga. Mesmo acompanhada de um especialista para garantir o sucesso da cirurgia, isso só me deixava mais nervosa. Porém na hora era como magia, assim que entrava na sala de cirurgia todo o nervosismo desaparecia, e eu ganhava uma confiança que normalmente não tinha. Era isso que me fazia uma das melhores residentes, trabalhava muito bem sob pressão.

— Bom dia, Dra. Silver. - Uma mulher alta de longos cabelos loiros e olhos muito azuis me cumprimentou com um olhar sério. - Está preparada? 

— Bom dia Dra. Miller, estou pronta sim. - Respondi confiante percebendo que ela me analisava. 

— Vamos lá.

Algumas horas depois, estava me lavando após terminar a cirurgia que tinha sido um sucesso. 

— Bom trabalho, Dra. Silver. - Ela falou saindo da sala. - Cuide do pós operatório, e me mantenha informada.

— Entendido, Dra. Miller. - Eu fiquei lá mais alguns minutos com sorriso bobo na cara. Um elogio vindo dela era algo raro.

O restante do dia foi corrido como sempre. Um acidente envolvendo dois carros havia deixado vários pedestres feridos. 

— Tô morta, - Michele falou enquanto encostava no armário cheirando seu uniforme e fez uma careta - e tô cheirando como uma também. 

Michele era residente do quarto ano também, ela já tinha escolhido sua especialidade: “neuro”, falava toda orgulhosa. Ela é do interior e às vezes soltava algumas gírias muito engraçadas, ela era minha melhor amiga ali e eu sua confidente. 

— O dia hoje foi uma loucura mesmo. - Completei olhando meu celular, havia uma mensagem de Crystal, provavelmente iria me buscar. - Poderia me dar uma carona? - Pedi para Michele, não queria dar trabalho para Crystal. 

— Claro, só espera eu tomar um banho, rapidão. 

Na saída do hospital ouvi alguém me chamando.

— Dra. Silver, - era Beatriz uma das recepcionistas. - Não te vi o dia todo. - Falou com voz envergonhada.

— Fiquei a tarde toda na emergência. 

— Ah sim. - Ela estava cada vez mais vermelha. - Uma ótima noite, bom descanso.

Mi desfarçava o riso assistindo a cena. 

— Boa noite. - Respondi enquanto olhava ela sair quase correndo.

— Ela não consegue passar um dia sem falar com você - Mi falava com sorriso malicioso entrando no carro. 

— Ela é simpatica e só porque me comprimenta não quer dizer que ela esteja afim de mim. 

— Ah tá bom, acredito. - Disse com ironia e continuou - Por que você não dá logo uns pegas nela. 

— Se for continuar falando bobeira eu vou a pé. - Já estava começando a ficar irritada.

— Ah relaxa, eu tô brincando. Mas você deveria sair com alguém. - Ela falava rindo enquanto saíamos do estacionamento. Me irritar era a diversão dela. - Desse jeito você vai esquecer como se beija. 

Ela foi rindo boa parte do caminho, que demorou dobro do tempo por causa do trânsito. 

— Obrigada. - Agradeci pela carona quando chegamos. 

Desci do carro e fui em direção a portaria. Eu morava mesmo prédio da Crystal, porém fui para o meu apartamento primeiro, pois queria tomar um banho para tirar o cheiro de hospital. Quando terminei, subi para o andar dela e apertei a campainha.

— Gabi, a porta está destrancada pode entrar. - Ouvi a voz familiar de Amabelle. 

Abri a porta da entrada que dava para a sala de estar e entrei.

— A Crystal está no banho. - Me informou vindo me abraçar. 

Amabelle era esposa da Crystal, estavam juntas há 6 anos. E esse é o principal motivo da briga de Crystal com seus pais, pois eles não aceitavam a filha ser homossexual.

 Amabelle é loira magra de olhos azuis parecia uma modelo, muito simpática e gentil. É dona de uma loja de roupas no centro da cidade.

— Como foi o dia? - Ela iniciava a conversa. 

— Foi corrido como sempre. - Falei desabando numa poltrona.

Ficamos conversando por um tempo. Ela me contou um pouco sobre seus funcionários da loja e como tinha sido seu dia. 

— Veio com a Michelle? - Perguntou Crystal quando chegou na cozinha ainda secando os cabelos.

— Sim. Meu carro fica pronto amanhã, se conseguir um tempo vou buscá-lo. 

— Se quiser eu posso ir pegar. - Ofereceu Amabelle enquanto pegava os pratos. 

— Não vou recusar. - Me levantei e fui ajudá-la.

Após arrumar a mesa começamos a nos servir.

— A nova delegada começou hoje. - Disse Crystal enquanto terminava de arrumar seu prato.

— Como ela é, amor? - Amabelle ficou curiosa, Crystal falava muito da nova delegada nos último dias, que ela viria para pôr ordem na cidade.

— Ela tem cara de poucos amigos, - pensou um pouco e continuou - mas me simpatizei com ela.

— Tomara que seja tudo isso mesmo. - Brinquei.

— Ela é.

Depois de um tempo Crystal começou a falar de alguns de seus feitos em Maringá. Ela estava muito empolgada, amava o que fazia, era até engraçado. Apesar que eu não sou muito diferente.

As duas eram minha família, meu porto seguro e nos ajudávamos como podia. No ano que vim morar em Susana, Crystal contou sobre sua orientação sexual aos seus pais. Foi quando as brigas começaram e ela sempre me ligava chorando. Consegui convencer ela de vir morar comigo, meus pais me ajudavam a pagar o aluguel, e o apartamento era próximo da faculdade. Meus pais eram bastante tranquilos sobre qualquer assunto, tanto que foram muito receptivos quando contei sobre minha sexualidade, eles entenderam e me apoiaram. Quando contei o que havia acontecido com Crystal eles ajudaram como puderam. Nós éramos como irmãs e quando uma precisava a outra ajudava não importa o que fosse. Amabelle era igual e já havia se tornando uma irmã para mim também. Crystal logo conseguiu entrar na polícia e um tempo depois os pais dela voltaram a entrar contato com ela. Quando contou para eles que iria se casar, eles não aceitaram vir no seu casamento. Só vieram visitá-la tempos depois, mas ainda estavam bem distantes.

A família de Amabelle eram mais tranquilos com tudo e sempre apareciam carregados de presentes. Eles me consideravam da família também. Isso fazia com que Crystal e eu não sentíssemos tanta falta da nossa família no final das contas.

Quando terminamos de comer, ajudei elas a lavar a louça e me despedi. Chegando no meu apartamento fui recolher a roupa na varanda e coloquei mais para lavar.

 Miguel veio miando anunciando que sua ração tinha acabado.  

— Meu bebê tá com fome? - Apertei ele um pouco e o coloquei no chão. 

Completei seu pote de ração e água fui pra cama. 

Acordei no mesmo horário de sempre e segui minha rotina. Não estava chovendo para minha sorte.

Meu dia tava corrido como sempre. Almocei na lanchonete com Michele, Álvaro e Claudio e depois fui ver alguns pacientes no pós operatório. Quando sentei no balcão para ver alguns exames, olhei para o relógio e percebi que já era quase 16h. Os exames são para uma cirurgia de cardiologia que aconteceria no dia seguinte. Todos queriam muito participar e eu não era exceção. O médico responsável anunciou que deixaria um residente encarregado de fazer uma das partes principais da cirurgia, o que gerou a concorrência. Para mim seria difícil conseguir porque já tinha escolhido a área que iria seguir e provavelmente ele deixaria um residente mais interessado em cardio participar.

 Uma moça ao meu lado me chamou atenção, ela parecia um pouco tensa.

— Oi, tá tudo bem? - Perguntei. Ela parecia meio perdida tentando preencher um formulário no computador. Ela me olhou nervosa.

— Eu sou nova aqui, - ela falava rápido e parecia pouco envergonhada - não sei o que significa essas siglas, já me falaram mas não lembro. 

Observei seu crachá onde vi seu nome, Jakeline. Então olhei para a tela do computador. Expliquei o que era e ela sorriu pouco mais tranquila e agradeceu.

Depois que esclareci suas dúvidas voltei para meus exames.

— Olá - uma senhora sorria radiante para Jakeline - boa tarde, minha querida.

— Boa tarde, - respondeu - no que posso ajudar a senhora? 

Quando vi aquela senhora tive a sensação que a conhecia. Eu tenho memória fotográfica, mas rostos são complicados já que as pessoas mudam. 

— Eu trabalhei aqui há algum tempo. Queria conversar com alguns velhos companheiros. - A senhora falava com olhar muito gentil. 

Jakeline parecia meio sem entender quem ela devia chamar e mais uma vez fui seu socorro. 

— A senhora gostaria de falar com senhor Rodrigo? - perguntei. Ele era um dos médicos mais antigos do hospital. Não falei isso em voz alta porque achei que seria grosseria. 

— Sim, - ela pegou minha mão - não sabia que ele ainda trabalhava aqui. - E deu um largo sorriso.

— Mãe, conseguiu alguma informação? - Um senhor alto com expressão séria veio até a senhora e olhou curioso meu crachá. 

—  Desculpe incomodar, Dra. Silver, - ele estendeu a mão em minha direção após ler meu sobrenome - me chamo Tarcísio, e esta é minha mãe Karme. - Se apresentou.

— Muito prazer. - Apertei sua mão e virei para a recepcionista. - Jakeline, chame o Dr. Rodrigo e diga que tem uma visita para ele, a Dra. Karme Dias.

— Sim. - Respondeu prontamente.

— Você sabe quem eu sou? - Karme me olhava admirada.

— Sim, sou uma grande admiradora da senhora, mas confesso que levei algum tempo para reconhecê-la.

— A idade e as rugas nos faz quase irreconhecíveis. - Falou rindo.

Nesse momento duas mulheres se aproximaram do balcão, uma tinha fisionomia séria e carrancuda, a outra era mais alta, magra e tinha cabelos longos e cacheados. Tarciso falou algo que não consegui entender com a moça de cabelos longos, ela se aproximou do balcão e pediu a Jakeline que chamasse a chefe de cirurgia, ela tinha horário marcado. Jakeline confirmou e pegou telefone para ligar.

Junto com elas tinha duas garotas mais jovens. Uma delas me olhava e quando nossos olhos se encontraram ela desviou no mesmo instante. 

Enquanto esperavam, a senhora começou a me fazer perguntas sobre antigos médicos. Jakeline ainda não conhecia todo mundo, então me prontifiquei a responder em seu lugar. Enquanto isso, percebi que aquela jovem continuava a me olhar. 

O Dr. Rodrigo chegou acompanhado da chefe de cirurgia, a Dra. Brenda. Ela ficou conversando com as duas senhoras enquanto a senhora Karme trocava um braço com Dr. Rodrigo. 

— Obrigada de novo, -  Jakeline sorria pra mim um pouco vermelha - não sei que seria de mim sem você agora, é meu primeiro dia.

Enquanto ela falava sua colega voltara do banheiro.

— Agora vai ficar tudo bem, - olhei para Renata que se sentou ao lado dela - mas se precisar de algo pode contar comigo.

Fui chamada na emergência e Jakeline me desejou boa sorte. Antes de sair ainda tive tempo de perceber mais uma vez olhos da jovem em minha direção.

Eu estava acostumada a receber alguns olhares. Apesar de não me achar nem um pouco atraente, eu sempre recebia alguns elogios. 

Quando olhei no relógio novamente me assustei, era 22h37min da noite. Na correria com paciente de trauma não vi as horas passarem. Na sala de cirurgia era como se tempo parasse pra mim, mesmo tendo relógio eu nunca lhe dava atenção. Resolvi dormir hospital mesmo, então liguei para Crystal e pedi para que ela tratasse do Miguel. Ela aceitou um pouco a contragosto, não pelo favor em si, mas por preocupação comigo. 

Ela sempre me cobrava de ir pra casa e falava que ficar no hospital muitos dias me fazia mal. Essa “briga” já vinha acontecendo há quase 3 anos, que foi quando comecei a mergulhar de cabeça no serviço. Mas para não deixá-la preocupada eu ficava no máximo uma noite. Eu sabia de alguns macetes para diminuir meu banco de horas, então sempre acabava trabalhando mais do que precisava. Ficar no hospital fazia o tempo passar mais rápido e eu não pensava mais nada além do trabalho. 

Tomei um banho rápido e passei no refeitório para comer sanduíche leve e um suco. Fui pro quarto de sobreaviso, coloquei o celular para carregar no meu power bank. Me joguei em uma cama em menos de cinco minutos já havia pegado no sono. 

Eram 5 horas da manhã, corria de um lado pro outro me abastecendo de café. 

— Chegou cedo hoje Dra. Silver. - Ouvi uma voz atrás de mim. O Dr. Everton vinha sorrindo com a cara amassada - Também dormiu por aqui? - Perguntou ele.

— Bom dia, doutor. - Respondi pensando que era minha chance. Ele era o médico que iria fazer a cirurgia que todos estavam disputando. - Fiquei presa em uma emergência ontem, - continuei - estou adiantando os pós e pré operatórios da Dra. Miller.

— Agora entendo porque ela sempre solicita você. - Ele riu.

— Ouvi dizer que o senhor vai fazer segmentectomia hoje às 10h e vai deixar um residente fazer parte do procedimento, - olhei para ele com cara de pidona - já escolheu o residente?

— Sinto muito Silver, mas vou dar preferência aos residentes que têm interesse na cardio.

Ele caminhava digitando rápido no celular. Já me dava por vencida quando ele parou.

— A Dra. Zilda vai fazer um transplante de coração, posso indicar uma residente esforçada para auxiliar. - Me olhou rapidamente.

**********

A Dra. Zilda Martins era uma médica muito rígida e sem nenhuma paciência para ensinar. Ninguém gostava dela e ela também não gostava de ninguém. Mas todos reconheciam suas habilidades extraordinárias. Ela só não era chefe do seu departamento porque o Dr. Everton já estava ali há muitos anos e tinha uma carreira bem premiada.

— Vou adorar participar. - respondi - Espero que ela esteja de bom humor. 

— Eu também! - Ele falou soltando uma boa risada - Aquela é osso duro de roer, mas ela é uma artista operando. 

Concordei e nos separamos. Minha barriga estava reclamando, pedindo por algo sólido. Então fui até o refeitório.

Enquanto devorava um misto frio, olhava algumas postagens sobre a nova temporada de uma série que estava acompanhando. Fiquei tão distraída que nem percebi alguém se sentando ao meu lado. 

— Ahh!  - Dei um pulo quando percebi que tinha alguém ali. 

— Desculpa não queria te assustar. - Era Beatriz que chegou de mansinho. - Tá devendo para quem? - Ela riu ao ver meu susto. 

— Que eu me lembre, para ninguém.

— O que está vendo tão concentrada que nem me viu chegando? 

— Quem vai morrer próxima temporada. - Mostrei meu celular com postagem da série.

— Eu também adoro essa série. Eu diria que vai ser a Sandra, eu não gosto dela - falou ela satisfeita em ter motivo para manter um diálogo.

— Eu queria que fosse o Afonso.

— Não sabia que tinha tempo pra ver séries doutora, - ela me deu um belo sorriso - você trabalha demais.

— Às vezes tenho folga sim. Ou melhor, sou forçada a folgar. 

— Tem que folgar sim, - ela me fitava por cima da caneca - ninguém é de ferro e todos merecemos uma folga pra descansar o corpo e a mente. Principalmente você que é tão esforçada.

 Só confirmei com com cabeça e voltei olhar o celular. Não me sentia bem com aquela situação. 

— Você também pode aproveitar as folgas para conhecer outras pessoas, doutora. Se divertir e tal. - Ela continuava falando evitando me olhar agora - Ou tem alguém especial? 

— Especial? - Perguntei, ela ficou um pouco vermelha - E por favor, me chame de Gabrielle. 

— Ah sim, - ela olhava fixamente para sua mão sobre a mesa parecendo juntar coragem para continuar - então Gabrielle, você tem uma namorada ou namorado em casa te esperando? 

— Não. - Respondi já me sentindo pouco desconfortável - Mas tenho um gato. 

 Ela riu nervosa e me olhou.

— Alguém tão bonita como você estar sozinha é quase um crime, - ela ficou ainda mais vermelha ao terminar a frase - poderíamos marcar um d... 

E para minha salvação Michelle chegou, interrompendo nossa conversa e me salvando daquela situação. Beatriz ia me chama para sair e eu não gostava de recusar e magoar as pessoas. Fazia muito tempo desde que saí com alguém e não era algo que eu queria no momento. Na verdade, eu não sabia se algum dia eu sairia com alguém novamente.

Mi ria ao contar que havia acontecido, quando ela chegou Beatriz saiu rapidamente apenas me desejando bom dia.

— Te falei que a mina tava na sua. - Seu jeito de falar me divertia.

— Você acertou, parabéns. - Completei irônica.

Saímos do refeitório conversando sobre como seria o dia e as cirurgias que seriam realizadas. 

— Silver, por favor - era chefe Brenda me chamando, um frio na barriga me tomou no mesmo instante. Ela havia acabado de chegar. 

Fui ao encontro dela imaginando se seria uma bronca, mas eu não me lembrava de ter feito nada de errado. O único motivo que me chamava a atenção era por ficar trabalhando de mais. 

— Bom dia, chefe.

— Bom dia, tenho algo a lhe pedir. - Brenda era uma mulher de cabelos curtos e negros, pele morena e alta, e pouca conversa.

— A nova chefe de cirurgia geral começa hoje, mostre o hospital a ela. - Disse ela olhando para os lados checando os arredores. Ela via tudo o que acontecia ali tinha olhos de águia.

— Sim, senhora.

— Isso é tudo. - Terminou de falar já a caminho de sua sala. 

Fiquei um tempo ali fitando o nada, por que eu ia mostrar hospital a ela? Eu sou residente, normalmente quem faz isso é a chefe mesmo ou outro chefe de departamento.

Era 9h quando fui encontrar a nova médica para mostrar o hospital. Cheguei no balcão e uma mulher alta estava ali conversando com Beatriz. Ela me olhou no mesmo instante. 

— Dra. Karina, esta é a Dra. Silver, ela que vai lhe mostrar hospital - ouvi Beatriz dizer para a mulher.

Assim que ela se virou pra mim percebi que ela era uma das mulheres que estavam com a Dra. Karme. Foi ela quem pediu para falar com a chefe. 

— Bom dia, Dra. Karina - lhe cumprimentei.

— Bom dia. - Ela me respondeu sorrindo - Então você que vai ser minha guia turística hoje? - Perguntou divertida.

— Sim. - Ela parecia ser simpática.

A Dra. Ângela, antiga chefe de cirurgia geral havia deixado o hospital sem aviso. Quem seria nova chefe era o assunto do momento ali. Agora já sabia para quem eu teria que mostrar do que era capaz.

Andamos pelos principais corredores e mostrei onde ficava as salas de cirurgias, tomografias, emergência e muitos outros. Por fim parei na porta da sala dos médicos mostrando onde ela ficaria.

— Esse hospital é enorme. - Ela parecia de muito bom humor - Vou me perder muito aqui, sou péssima com direções. - Ela ria de si mesmo.

— Se precisar de ajuda, pode me chamar a qualquer momento. - Ofereci educadamente.

— Obrigada. - Ela estava abrindo a porta quando parou - Você vai ficar comigo essa semana, certo? 

Uma pensamento triste passou por minha cabeça: “adeus, transplante”. 

— Claro, é só a senhora me requisitar que eu vou trabalhar com você essa semana com muito prazer.

— Então vou fazer isso. - Ela sorriu e entrou na sala fechando a porta ao passar. 

Realmente minha cirurgia de transplante foi passada a outro residente. Mas não foi tão ruim, na verdade foi uma ótima semana. A Dra. Karina pegou várias cirurgias e eu auxiliei boa parte delas. Ela é uma médica extraordinária, que logo começou a notar minha capacidade e me dava confiança para ajudar ela em procedimentos bem difíceis. A Dra. dizia que se não fosse na prática, não aprenderia direito.

Mas ela também percebeu que eu ficava muito tempo no hospital e começou a me cobrar de ir pra casa descansar, me ameaçado de não me pôr em suas cirurgias se não fizesse o que pedia. Então acabei até tirando uma folga extra já que tinha estourado minhas horas. E assim foi mais uma semana de trabalho.


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