A quick pace escrita por Mandalay


Capítulo 1
A quick pace — capítulo único




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Maka sempre estaria a sua frente, com passos longos e pesados, sem gentileza alguma. Apenas a sua frente. Sempre a sua frente. Sempre a um metro ou dois de distância, apontando a direção correta, a direção que ela achava ser a mais correta a seguir.

Maka nunca fora muito gentil em seus gestos ou talvez ela apenas não conseguisse deixar a gentileza passar por si, sempre colocando um grande espelho em seus quatro lados, para que a gentileza passasse por ela e fosse refletida no ato. Sem brechas, mas até mesmo naquela armadura existiam fendas que poderiam ser exploradas, caso alguém fosse corajoso o suficiente.

Em algum momento, Soul se sentiu corajoso o suficiente para isso.

Mas agora, sua confiança mais parecia uma bravata.

Maka desde o começo estivera a sua frente. Quando o escolheu como parceiro, quando discutiam a melhor forma de executar um plano, quando era teimosa o suficiente para não desistir, quando era ela quem sempre tinha a razão no final.

Em algum momento, ele se acostumara a ideia de olhá-la pelas costas e não havia problema nenhum ali, Soul sempre soube que alguém deveria estar a frente dele, ele só queria poder se sentir bem com isso.

E Maka o fazia se sentir bem.

Ela era a artífice e ele, a arma que ela usaria para chegar ao topo.

E esse plano parecia tão certo, tão promissor, tão pouco crível que quando os dois atingiram tal objetivo todo o resto caíra por terra. As inseguranças, os medos, as restrições que sentiam, foram pouco a pouco esquecidas, colocadas em algum lugar de seus subconscientes.

Quando foi que isso mudou?

Quando a segurança que sentia só de estar na presença dela mudou, exatamente?

As costas de Maka agora pareciam distantes demais. Seus passos pareciam mais leves, mais confiantes, mais confortáveis. Ninguém manejava sua foice como ela, ninguém seria capaz de entendê-lo como ela e a cada passo que ele dava tentando alcança-la, ela se afastava em três.

O que aconteceria se ele conseguisse alcançá-la?

Como estaria o rosto dela?

Como ela reagiria ao vê-lo ao seu lado, como um igual?

Não apenas um apoio para aquele objetivo que ela tanto buscava - não apenas uma foice - não apenas alguém para estar ali.

Como ela reagiria em ver ele, sendo ele mesmo?

"Você está pensando demais. Como não está acostumado com isso, pode acabar criando cogumelos na sua cabeça, Soul", era o que ela dizia sempre que o encontrava com o olhar fixo sobre algo ordinário, que não necessitava de tanta atenção.

"Para de dizer isso Maka, eu não estou pensando", era o que ele respondia, numa ânsia de manter uma aparência distante daquela que representava seu estado emocional naquele momento.

"Sei, se não está pensando em algo, então porquê não me respondeu quando eu te chamei?"

"Porque você não me chamou."

Nesse momento ela sempre fechava a cara.

"Então você vai fazer as compras, já que é tão esperto", e saía de cena, com suas costas mais uma vez dadas a ele.

Soul sempre se preocupara em manter uma aparência, um estilo, um jeito todo característico de ser e, por algum tempo isso foi a sua grande escapada. Quando algo não ia bem, sempre tinha uma frase na ponta da língua, para manter as aparências.

E agora, o quê ele tinha exatamente?

O que ele tinha era o que ele sentia, e o que ele sentia mais parecia uma grande confusão. Uma mistura de cores, um borrão, uma teia de pensamentos que crescia mas, não parecia ter um começo certo.

Soul se sentia perdido, para dizer a verdade.

"Soul, você esqueceu de comprar sal e leite. Onde está com a cabeça para se esquecer disso?"

"Eu posso comprar amanhã."

"Amanhã não vai adiantar se preciso de sal para fazer o jantar agora."

"Tá, desculpa Maka, não precisa ficar assim!"

"Não é assim que funciona Soul, você tá com a cabeça em outro lugar. E enquanto estiver assim, sempre vai deixar alguma coisa para trás", a sensação de que ela diria algo como "me deixar para trás" ao final da frase ainda era forte, mas Maka não terminara de dizer seus pensamentos, se resumindo a guardar os mantimentos que ele havia comprado.

Será que era ele quem estava na frente?

Quando dançavam era sempre ele quem conduzia, o que não seria algo incomum, mas ele sabia que Maka não gostava de dançar e preferia deixar esse detalhe nas mãos dele entretanto, ele não se sentia no controle quando dançavam. As vezes, parecia que a mera presença de Maka o consumia.

E ele não estava gostando disso.

"Cara, a Maka é louquinha por você! Deixa de ser idiota!", fora o que Black Star o dissera certa vez, "Como se ela não fosse gostar de você, pelo menos é o que Tsubaki me conta, é só você que não quer ver isso."

As vezes, no calar da noite, ele sentia uma presença que não era a dele. No fundo de seus pensamentos, bem lá embaixo, quando ele se encolhia numa tentativa de querer pensar em nada, em algo que o fizesse duvidar menos de si mesmo. Era lá que essa presença tentava ajudá-lo a se levantar, a não temer e apenas querer se abrir sobre si mesmo.

Mais tarde ele descobrira que aquela presença era a de Maka, usando a ressonância da alma nele.

Em algum momento, que ele não se atentara em marcar, Maka deixara de caminhar. Suas costas estavam paradas, a camiseta branca de botão balançava com o vento, assim como a saia xadrez que ela usava por baixo. Os pés não andavam nem para frente, nem para trás, estáticos em um ponto determinado por ela, como se quisesse ficar ali por vontade própria.

E ela se virava para ele, para encará-lo passos atrás dela, o rosto inexpressivo, o verde de seus olhos não transmitia nada, estavam distantes demais para isso porém, uma de suas mãos estava estendida em direção a ele.

Como se ela o esperasse.

— Soul? Eu acabei de chegar, você já fez o café?

O apartamento parecia estar vazio, oco, se não fosse pelo som vindo de um dos cômodos. Se aproximando da porta entreaberta, Maka notara que Soul estava concentrado em algo, sentado em sua cama com a perna esquerda transformada em um teclado na forma de foice. Seus dedos passavam pelas teclas brancas e pretas numa velocidade absurda, para depois desacelerarem, formando uma melodia triste. O quarto estava pouco iluminado mas ela sabia que ele tinha uma feição séria no rosto, ele sempre ficava assim quando compunha.

— Ele está assim desde que você saiu - sussurrou Blair em seus pés, ambas o observavam atentamente, com cuidado para não serem descobertas.

— Desde que eu saí? Isso foi de manhã.

— Ele parecia estar inspirado, não parou por um segundo, sempre o mesmo som.

Maka se resignou a um suspiro, convidando a gata para o café que iria preparar.

Ela sabia que entrar no quarto de supetão não era a melhor resposta, não importava o quão estranho Soul estivesse agindo nos últimos dias, agir como nos velhos tempos não seria o suficiente.

Se ele tivesse algo para dizer, em algum momento ele diria, disso ela tinha certeza.

O café da tarde ficara pronto, ela e Blair aproveitaram aquele momento trocando olhares tristes.

O café esfriou e uma janta fora preparada, mas só ela comera.

Maka tentara dormir, tentara controlar sua vontade de querer buscá-lo com sua ressonância, mas não conseguira.

A alma de Soul parecia mais calma e menos confusa que nos últimos dias, a música que ela escutara ao longo da tarde ressonava constantemente, como uma canção de ninar.

E quando ela imaginara que entraria naquele salão escuro, com o piso parecendo um tabuleiro de xadrez, fora surpreendida por um jardim claro. Soul estava no centro dele, com um piano de cauda a sua frente, sentado num banco estofado. Seus dedos nas teclas brancas e pretas, a melodia repercutia sem sinal de estar perto do fim.

De repente, o jardim se tornara uma praia bonita, depois um campo aberto, até se paralisar em um palco para um público que não existia.

Havia uma memória ali, de quando ela conhecera Soul pela primeira vez, e ela se repetia sempre que eles davam um aperto de mão.

E de repente tudo o que Soul sentira em dias passava por ela, e ela quis chorar, tamanha a emoção que tomava sua alma naquele momento.

Soul se sentia solitário.

Muito além disso, ele parecia ter se esquecido de tudo o que eles haviam passado juntos.

Ele a estava colocando a frente dele de novo.

E ela queria poder dizer alguma coisa a ele, assegurar que ela não o estava deixando para trás, que ela-

"Eu sei Maka."

Seus olhares se encontraram. Soul estava com olheiras muito escuras.

"Eu só me esqueci disso, eu não sei como ou o porquê, eu só esqueci e acabei sofrendo muito com isso."

"Por um motivo que nem existe mais."

"É, eu sou um bobo, né?"

"Não. Só é tímido e egoísta e arrogante e idiota, não bobo."

"Desculpa Maka."

Ela caminhou até ele. O vestido que naquele lugar geralmente era preto, agora estava branco, e ele estava de frente para ela.

"Você tem uma letra 'pra essa música?"

"Não sei, porquê?"

"Uma letra ia deixa ela mais bonita."

Soul negou com a cabeça.

"Só você consegue achar as minhas melodias bonitas."

"Todas elas são lindas Soul, você só tem que aceitar isso."


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Notas finais do capítulo

Eu realmente não sei o que estava fazendo quando resolvi escrever esta oneshot. Sinto que já trabalhei com esse shipp em tantos aspectos que, carregar um drama desses nas costas do Soul me deixou estranha ah-haha, quando paro para pensar nisso, Ohkubo realmente trabalhou bastante esse lado dele- mas de forma beem espaçada pelos capítulos/arcos.

E relendo agora dois anos depois, esse acabou sendo um dos meus textos favoritos de Soul Eater.



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