Faunt; Terror Nacional escrita por P B Souza


Capítulo 6
Rastros


Notas iniciais do capítulo

Ta na hora de começar a buscar o irmão raptado.
É clichê, mas pode acabar surpreendendo hein! Fica de olho.



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São Paulo, Brasil.

21:42, quinta-feira, 14 de agosto de 2014.

A cidade que nunca dorme hoje parecia ainda mais desperta. O mundo inteiro tinha seus olhos virados para as capitais da América. No Norte, todos olhavam para Nova York. No Sul, todos olhavam para São Paulo.

Jonas desceu do taxi na frente da residência onde cresceu junto de sua mãe e irmão. Ainda suava frio, tremia. Sua pele estava clara, e ele era negro! Pálido, os lábios quase roxos, sua pressão estava baixa. É o fim de tudo. Era a única coisa que conseguia pensar.

Parou ali, na frente do portão olhando para o quintal aonde Harward brincava enquanto ele ficava sempre lá dentro, normalmente olhando da janela do segundo andar, enquanto lia e relia os livros, enquanto pensava no que seu pai havia deixado para ele. Eu sempre carreguei o peso, você sempre teve o tempo para viver a juventude, os amores, as amizades. Jonas pensou em Harward, então olhou para o outro lado da rua, atravessando-a. Aquela rua era deserta, ainda mais naquele horário.

Colocou as mãos nos bolsos da calça enquanto na calçada seguia rumo à esquina indo para o ferro-velho, ele nunca pedia para o taxi, Uber, carona, ou qualquer outro, deixá-lo na frente do ferro-velho. Então, atravessando a rua, parou em frente a outra casa. Mas que droga você foi fazer?

Ali, naquela casa de um andar só, portão enferrujado, grama crescendo no cimento trincado, janelas quebradas, visivelmente abandonada, crescera seu melhor, e ele assumia; único amigo. Ernesto.

Jonas olhou para a casa pressionando um dente contra o outro, a cabeça tomada por ideias, a voz de Tzék ecoando na sua cabeça com as broncas e sermões de mais cedo como se a culpa fosse dele de alguma forma, então vinha as ações de Ernesto, a briga dos dois meses atrás que levará a tudo aquilo. Se você tivesse esperado, tivesse tido paciência, eu não precisaria ter feito tudo isso. Jonas sempre soube como Ernesto era, só não imaginava a que distâncias ele iria para conseguir o que Jonas sempre teve; dinheiro!

Agora a casa estava abandonada, a mãe e pai de Ernesto estavam mortos, tal qual os parentes de Jonas, os dois eram filhos perdidos em um mundo que não perdoava os erros, as consequências vinham, e todos sentiam seus impactos, colateral ou não, todos sofriam as consequências.

Então olhou para frente e continuou seu caminho à esquina. Podia ver as outras casas, a maioria estava com as luzes acesas, TV’s ligadas podiam ser vistas pelas janelas entreabertas pois estava quente apesar da estação. Todas essas casas viam a mesma coisa; o atentado terrorista em NY, o assalto à gigante farmacêutica nacional em SP. Um dia de terror para o mundo.

Quando chegou no ferro-velho, encontrou-o vazio, tudo apagado, o portão encostado como sempre, afinal quem roubaria ferro-velho? Jonas entrou e seguiu seu caminho até o capo enferrujado do Monza, puxou-o para cima com facilidade com a alavanca hidráulica dando tração, e desceu as escadas rumo a sua caverna secreta.

— Jonas? — A voz de Fausto veio como um balsamo.

Fausto era um amigo de Harward quando Harward tentou robótica, mas não deu certo. Mas a vida é cheia de estranhezas e Harward acabou se tornando amigo de Ernesto (que ele não suportava na juventude) e Jonas acabou se aproximando de Fausto, que ele sempre disse ser um atraso na vida de Harward. A verdade é que Fausto só não era excepcional por preguiça, preferia sempre as festas e saideiras de fim de semana enquanto Jonas sempre preferiu os livros e o estudo, julgando todos que não seguissem sua religiosa conduta acadêmica.

Ernesto seguia, vivia para os livros e para a escola, para os cursos, depois para a faculdade... E olha aonde isso nos trouxe.

Fausto correu até Jonas e o abraçou, sem avisos e sem se segurar.

— Meu deus, você parou de atender, seu celular tá constando numa delegacia, ninguém na OBLT me fala nada, e graças aquela IA dos infernos eu não consigo invadir o sistema deles...

— A polícia ficou com meu celular, Tzék ficou com a polícia e os advogados, o velho Obyl foi parar no hospital passando mal. — Jonas levou as mãos na cabeça olhando para o teto, suspirou. — Roubaram o SVM!

— Você viu Nova York?

— Por cima, explodiram alguma coisa...

— Explodiram a Techboot! — Fausto disse voltando para o salão principal da CAAV, aonde ficavam os monitores e os teclados. Jonas veio atrás dele, puxou uma cadeira de rodinhas e se jogou nela encarando a parede. — É onde o Ernesto trabalha.

— Tomará que ele tenha explodido junto! — Jonas balançava a cadeira de um lado para o outro, a cabeça com os pensamentos indo e vindo do presente para o passado.

Depois que rompeu com a USP, sua pesquisa não tinha um teto para ficar, daí a ideia de criar a CAAV, e Ernesto teria sido a primeira pessoa a se considerar para criar uma base como aquela, mas como? Jonas se lembrava de tudo, cada briga, Ernesto indo no mercado negro para vender algo que não era dele. Ele quase colocou tudo a perder. Então a cisão final e cada um seguiu um rumo, mas adiantou? Agora Jonas sentia que não haviam dado um passo à frente sem voltar sempre ao ponto de partida.

O passado vinha ainda mais forte. Lembrou-se da carta junto dos estudos do SVM deixados por seu pai. A serpente do Éden. Jonas não lembrava muito de seu pai, e sabia ainda menos de seu avô, mas o que sabia era que em algum momento entre o fim da segunda guerra mundial, guerra-fria e ditadura no brasil, seu avô tomou conhecimento dessa mulher que chamaram até mesmo de bruxa. O corpo dela foi estudado por tanto tempo e tantas pessoas que os restos mortais remanescentes foram usados por seu pai para continuar a pesquisa de seu avô na busca em entender como um humano podia mimicar as habilidades de um animal, até não sobrar resto mortal nenhum. Tudo que eu tenho são anotações de uma época de incertezas cientificas.

— Jonas? — Fausto estalou os dedos na frente de Jonas e ele pareceu sair de um transe e voltar para a realidade... quase.

— Meu avô provavelmente torturou uma mulher que sei lá... tinha poderes de cobra, e tirou das células dela a essência do SVM, isso na década de 70. Meu pai e meu avô nunca se deram bem, e eles passaram anos sem se falar, mas meu avô engoliu o orgulho pra passar o Serpente do Éden para o meu pai porque ele acreditava que isso ia mudar o mundo de alguma forma. Meu avô era um militar e queria fazer uma arma. Meu pai um pacifista, ele quem imaginou a cura ao invés da arma, mas também não conseguiu entender como fazer funcionar. Eu só não consegui, como misturei o DNA de cobra, leopardos, lagartos, pelicanos, beija-flores, águas-vivas, alguns peixes... A cura virou a cura definitiva na minha mão e agora o que o exército protegeu por décadas, meu avô contrabandeou para meu pai e meu pai morreu para proteger... Eu deixei roubarem.

— Não foi sua culpa...

— E importa? — Jonas se levantou com tudo e jogou a cadeira para trás, saiu andando para seu quartinho, e espancou a porta atrás de si.

Fausto fez que não com a cabeça, levantando a cadeira e indo ao computador. Lia as notícias, procurava conexões, ele sabia que tudo aquilo não era coincidência, não podia ser, sua intuição não deixava passar batido.

Então um pop-up no monitor. Ele abriu a mensagem “Grupo terrorista assume responsabilidade por atentado no central park”.

O vídeo era sem imagem alguma, tudo preto. Não, não é. Fausto abriu as configurações do monitor e aumentou o brilho, mas não adiantou, então mexeu na gama e contraste, puxou o histograma do vídeo e mexeu nas colunas de luminosidade até ver, um salão escuro, um homem na frente da câmera, um homem sem barba, branco pelo visto. Não parece islâmico. Até mesmo a feição do rosto não era de alguém do oriente médio.

A gravação terminava então com uma palavra que estava escrita embaixo da chamada.

— Jahan-ko. — Fausto minimizou tudo que estava aberto e em outra aba jogou o nome. — Que organização é essa?

Mas o google tinha pouco para nada a respeito deles. Outros meios então. Fausto abriu outras ferramentas de busca, quando a internet comum não bastava, os bancos de dados de inteligência governamental nunca falhavam.

— Fausto... Desculpa. — Jonas então voltou de seu quartinho. — Eu consegui salvar uma ampola... Eu esqueci, preciso resfriar antes que estrague.

Fausto olhou para Jonas, viu o homem com o rosto inchado, as manchas das lágrimas nas bochechas mostravam que havia chorado, os olhos estavam vermelhos, mas não foi em nada disso que Fausto reparou.

— Você trouxe pra cá?

— A polícia não me revistou, só pediram o celular. No tiroteio eu peguei e guardei na cueca... Eu esqueci, eram cinco.

— As outras quatro estão com eles?

— Duas... Uma quebrou, uma Tzék conseguiu pegar, uma comigo. Duas estão com eles. — No frigobar aonde cerveja e refrigerante gelavam, Jonas deixou a ampola. — Elas não servem pra nada ainda...

— Jonas, olha aqui! — Fausto berrou balançando a mão para chamar a atenção de Jonas. O monitor tinha outra notícia aberta — Jahan-ko assume responsabilidade por atentado terrorista biológico em São Paulo.

— Jahan-ko? — Jonas olhou para Fausto, então fechou os olhos e franziu o cenho, forçando a lembrança. — Foi eles... Acho que foi esse o nome que Ernesto disse, compradores no mercado negro.

— Eles mataram o Ernesto, e roubaram o SVM? — Fausto olhava para Jonas e então para o monitor, e de volta para Jonas. — É um tanto demais...

— O que é isso? — Jonas perguntou quando no monitor apareceu um telefone tocando, mas sem som algum, e um número estranho apareceu embaixo do ícone.

— Estão ligando para a sua casa. — Fausto respondeu. — Eu redirecionei a linha para as ligações caírem aqui e não lá...

— Atende, como atende...

— Mas esse número...

— É da Inglaterra. Londres. — Jonas respondeu, agora preocupado. Não era o número de Harward, mas sim de alguma residência. Fausto atendeu a ligação. — Alô?

Hello, is this Mr. Faunt residence?

Sim, sou o próprio. — Jonas respondeu no seu melhor inglês. A conversa estava em alto-falante.

Estou ligando a respeito do voo de... Seu irmão, correto? Esse é o segundo contato na lista, o primeiro não respondeu...

Sim, o que tem o voo? — Jonas pensou no primeiro contato, provavelmente seu celular.

Exatamente o que queria perguntar, no aeroporto confirmamos com o manifesto que Harward Faunt não embarcou no voo. Estou ligando para saber se houve desistência...

— Meu deus. — Jonas voltou para seu idioma e balançou a mão para Fausto. — Desliga. Pode desligar.

Jonas colocou novamente as mãos na cabeça, falando “não” repetidas vezes e andando em círculos enquanto Fausto olhava para ele sem saber o que fazer por um instante. Eles ficaram rendidos, a notícia foi como a cereja em cima de um bolo de desastres.

— São eles. Tem que ser eles. — Jonas disse começando a ligar os pontos. — Quem mais teria o trabalho de explodir Ernesto, invadir a OBLT, e agora meu irmão?

— Achei o GPS do celular do Haw... Ele tá na praia.

— O quê?

— É, olha aqui. — Fausto abriu a janela no computador, o mapa mostrava o litoral de Santos. — A precisão é de dez metros.

— A gente precisa ir pro litoral então.

— Nem eu nem você tem carro...

— Não, mas a OBLT tem.


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