As novas 12 casas escrita por Elias Franco de Souza


Capítulo 5
Ikki e Rina


Notas iniciais do capítulo

Itsuki se recupera na casa de Natassia, enquanto revela todo o seu passado, e conhece outro cavaleiro de bronze.



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Itsuki acordou sob um teto desconhecido. Parecia estar num casebre de madeira. Sentou-se com cuidado, ainda com o corpo dolorido depois de levar tanta pancada, e levou a mão à cabeça, onde percebeu que tinha um pano enrolado. Guiando-se ao redor do tecido, notou que a parte de trás de sua cabeça estava úmida e, ao conferir a mão, viu que era sangue. Concluiu que o ferimento provavelmente fora provocado quando a amazona de Touro arremessou-a contra o chão. Devia ser por isso que apagou por tanto tempo. Já parecia ser tarde da noite.

— Você finalmente acordou — era Natassia, que entrava no cômodo com panos limpos e uma bacia d’água. A amazona de Cisne já não trajava mais a armadura. E diferente de Itsuki, que costumava usar roupas esportivas, Natassia vestia uma túnica de linho simples.

— Onde estou? — perguntou Itsuki, com a voz embargada.

— Em casa — respondeu com um sorriso.

Natassia explicou sobre como carregou Itsuki nas costas até as habitações dos cavaleiros de bronze, e depois cuidou dos ferimentos dela. Teve a ajuda de alguns amigos, e o médico do Santuário também a visitou algumas vezes para terem certeza que Itsuki se recuperaria bem.

— Me desculpa, Natassia. Eu estou dando trabalho pra você.

— Não. Está tudo bem. Aqui... — disse passando uma tigela de sopa com um pedaço de pão. — Você precisa comer.

— Ah... Eu não esperava que fosse ser tão difícil. Por um momento achei que fossemos conseguir — lamentou.

— Eu também me assustei. Nas outras vezes ela só repelia todas as minhas investidas até eu me cansar e desistir por não ter mais como atacar. Mas a Inna deve ter se irritado por você ter conseguido pegar ela daquele jeito. Ainda mais você sendo uma novata no Santuário, que já chegou chamando a atenção com a armadura de Fênix, e por sua batalha contra o Christopher — Natassia explicava enquanto trocava as ataduras do ferimento na cabeça de Itsuki. — E realmente, se você conseguisse passar logo na sua primeira tentativa, os outros cavaleiros teriam ainda mais motivos para ter inveja de você. Então eu acho que ela só não queria que você ficasse se achando muito — concluiu com outro sorriso.

— É... Mas não precisava ter pegado tão pesado. Eu jurava que ela fosse me reconhecer digna de passar pela casa de Touro por eu quase ter tocado o sétimo sentido.

— Sério? Eu não lembro disso.

— Não lembra? — questionou com estranheza — Realmente, você estava me encarando com um olhar meio distante. Parecia que você tinha desligado do nada no meio da luta.

— Quê? Não brinca com essas coisas — disse rindo.

Itsuki olhou preocupada para a amiga. Ela era meio esquisita às vezes, pensou. Mas voltou a tomar a sopa, já que estava com fome.

— Ei... Eu tive uma ideia — Natassia quebrou o silêncio, após algum tempo pensativa — Você acha que conseguiria despertar o sétimo sentido agora? Eu quero tentar uma coisa com você.

— Agora? Mas a gente tá na sua casa... — respondeu, achando a ideia um pouco excêntrica.

— Sim, mas... Eu acho que a gente poderia ajudar uma à outra, como um exercício. Não precisa se esforçar fisicamente. Apenas relaxa e deixa o cosmo fluir — explicou, sentando-se de frente para Itsuki na cama, e pegando-a pelas mãos.

— Tá bom... — concordou, colocando o prato para o lado, e voltando a dar as mãos com Natassia.

Itsuki fechou os olhos e esvaziou os pensamentos, focando sua atenção em seu próprio cosmo. Aos poucos ele começou a elevar, em sintonia com Natassia. E continuaram a aumentar o cosmo nesse ritmo, sem pressa, como quem sai para um passeio de bicicleta e começa a pegar velocidade naturalmente. Em poucos minutos, para a surpresa de Itsuki, ambas já estavam beirando o sétimo sentido. Realmente parecia mais fácil fazer isso na companhia de alguém, e sem a tensão e euforia da batalha.

— Natassia... Isso é incrível — disse abrindo os olhos. Porém, assustou-se ao ver que Natássia estava encarando-a mais uma vez com aquele mesmo olhar perdido da casa de Touro. — Natássia?

— Ei! O que vocês estão fazendo aí?! — disse uma voz masculina do outro lado da parede, socando a madeira.

Itsuki gritou apavorada, e perdeu o controle do cosmo, deixando-o apagar novamente. Não esperava que tivessem mais pessoas na casa. Natássia riu. Ao que parecia, ela já estava de volta a si, e também deixava o cosmo apagar.

— Desculpa, eu esqueci de te avisar. É o meu colega de casa, o Shoryu¹ de Dragão.

— Daqui a pouco vai aparecer um monte de gente aqui querendo saber por que vocês estão elevando o cosmo assim — disse o rapaz, aparecendo na porta. — E não somos colegas — explicou apontando o dedo para Natassia. — A casa é minha. A pirralha é uma parasita.

Era um rapaz alto que parecia ser alguns anos mais velho que Itsuki e Natassia. Usava roupas urbanas casuais, parecendo ter um estilo bem despojado. O que combinava com seu longo cabelo negro, preso em rabo de cavalo, e sua barba rala. Itsuki levou algum tempo para processar a informação até entender quem estava na sua frente.

— O quê?! — disse finalmente, olhando para Natassia. — Você mora com o filho do Shiryu e não me falou nada?!

Natassia riu, mas tentou acalmar as mãos agitadas de Itsuki.

— Então, Shoryu, essa é a Itsuki. Itsuki, Shoryu — apresentou os dois, oficialmente.

— Prazer em te conhecer acordada. Natassia me falou bastante ao seu respeito — disse estendendo a mão.

— Não brinca... — respondeu Itsuki, cumprimentando-o.

Shoryu puxou uma cadeira para sentar-se próximo às meninas, e conversaram enquanto Itsuki terminava de jantar. O atual cavaleiro de Dragão era simpático e comunicativo. Perguntou sobre as impressões de Itsuki a respeito do que havia conhecido do Santuário até então, e contou sobre o que ela poderia esperar em relação ao resto das 12 casas. Segundo ele, o defensor da primeira casa era Kiki de Áries, discípulo direto de Mu de Áries, embora ele quase nunca estivesse presente, como Natassia já havia explicado. A guardiã da segunda casa era Inna de Touro, uma ucraniana desbocada que gostava de se divertir batendo em novatos. Na terceira casa, estava um cavaleiro misterioso que poucos conheciam, já que ele quase nunca se revelava. O único teste que ele aplicava para os cavaleiros querendo subir as 12 casas era o Labirinto de Gêmeos. A quarta casa era defendida por Hela² de Câncer, uma maluca que te deixa passar se você conseguir sair do Yomotsu sozinho. A quinta casa tinha Malik, que Itsuki já conhecia, e que a deixaria passar se ela conseguisse chegar até lá. A oitava casa, a de Escorpião, tinha Ishtar³, outra amazona que gosta bastante de descer o sarrafo em cavaleiros mais fracos. Porém, ela evita usar as suas técnicas de Agulha Escarlate para não matar ou enlouquecer ninguém por acidente, e portanto deixa o cavaleiro seguir em frente se ele conseguir obrigá-la a lutar a sério. E a décima casa tinha Huan-Li de Capricórnio, que por acaso era a irmã mais nova de Shoryu, e a filha biológica de Shiryu.

— Quem diria que haveriam dois filhos do Shiryu no Santuário... E as outras casas? Você pulou algumas.

— Ué. Você não sabia? As demais casas estão vazias pois pertencem aos lendários cavaleiros de bronze, que não estão no Santuário. Apesar da maioria das pessoas ainda se referirem a eles por suas armaduras pregressas, hoje eles são Shun de Virgem, Shiryu de Libra, Seiya de Sagitário e Hyoga de Aquário. Embora, quase ninguém os tenha visto de fato nos últimos anos para confirmar que estão com essas armaduras...

Itsuki parou por um momento para contar com os dedos.

— Ainda falta a casa de Peixes — questionou após a contagem.

— É que ele não queria te contar — interrompeu Natassia com um riso maroto — mas ele não conhece o defensor da casa de Peixes porque ele nunca ganhou da própria irmã mais nova.

— Eu já ia chegar nessa parte! — apressou-se em explicar Shoryu. — Não é algo para se envergonhar. A minha irmã é uma amazona prodígio. É a mais nova e promissora dos cavaleiros de ouro. E além disso, eu já estava cansado e deixei ela ganhar... — disse, cruzando os braços e virando o rosto, em claro constrangimento, arrancando uma das raras risadas de Itsuki.

— Ainda assim é impressionante que você tenha chegado tão longe — elogiou Itsuki. — Se a Natassia tem alguém como você, eu não sei por que ela pediu ajuda para mim, que sou uma iniciante.

— É que eu não tenho mais interesse em subir as 12 casas. A minha irmã já me falou o que eu precisava saber... — esclareceu, transparecendo alguma indignação em relação ao ocorrido.

— Sim, desde que eu cheguei no Santuário, esse bunda-mole nunca me ajudou uma única vez — reclamou Natassia, torcendo os olhos para Shoryu.

— Eu já te ajudo demais só por deixar você morar e comer aqui de graça — rebateu o rapaz, deixando Natassia embaraçada.

— Mas hein — retomou o assunto Itsuki — Tem uma coisa que eu não entendi. E quanto ao Ikki?

— O que tem ele? — perguntou Shoryu.

— Todas as armaduras de ouro dos lendários cavaleiros de bronze estão com eles. Menos a armadura de Leão. E a armadura de Fênix está comigo. Isso não é estranho?

Shoryu e Natassia se entreolharam, preocupados, como se estivessem tentando evitar falar do assunto para Itsuki. A expressão deles adiantou que tinham algo ruim para contar.

— Nós também já nos perguntávamos sobre a armadura de Leão estar com outro cavaleiro — começou a explicar o rapaz — Mas assumíamos que ele estivesse com a armadura de Fênix. Só que desde que você chegou aqui...

— Por isso que o Christopher não queria acreditar que você era a amazona de Fênix —  interrompeu Natassia. —  Todos nós sempre achamos que Fênix estivesse com Ikki.

— Talvez o que o Malik disse pra você sobre o Ikki ser o único que não pode ser encontrado seja verdade — completou Shoryu.

Ainda sentada na cama, Itsuki encolheu-se e abraçou as pernas. A possibilidade de realmente ser impossível encontrar Ikki a deixou sem chão.

— Mas hein, ainda pode ter outra forma de você encontrar aquela pessoa do seu passado — disse Natassia, colocando uma mão sobre a de Itsuki, para tentar confortá-la.

— Não dá — respondeu sem fazer contato visual — A pessoa do meu passado que eu procuro... É o próprio Ikki — explicou, e fez uma pausa, por medo de ter suas crenças julgadas. — Eu acho que ele pode ser o meu pai.

A revelação surpreendeu Natassia e Shoryu. Se fosse verdade, seria estranho como cada um deles estava ligado de alguma forma aos antigos portadores de suas armaduras. Shoryu como filho adotivo de Shiryu. Natássia como uma órfã resgatada por Hyoga. E Itsuki, que talvez fosse uma filha perdida de Ikki.

Itsuki finalmente decidiu contar toda a sua história. Lembra-se que quando criança, até por volta dos 6 anos de idade, morou com o pai e a mãe. Não se recorda muito bem do rosto do pai, mas lembra que ele se chamava Ikki, e que era casado com sua mãe, Rina. Ao que Itsuki podia se lembrar, aparentemente estava tudo bem entre o casal. Mesmo assim, um dia o seu pai saiu de casa e nunca mais voltou. A mãe de Itsuki se desesperou e tentou procurá-lo com em toda delegacia, hospital e necrotério que encontrou, achando que ele pudesse ter se ferido, morrido ou sido sequestrado. Mas nunca encontraram pista alguma sobre o pai de Itsuki, até que Rina começou a aceitar o que todos lhe falavam. Que seu marido havia fugido de casa e lhe abandonado. Não bastasse isso, pouco tempo depois, a mãe de Itsuki foi diagnosticada com câncer e, com a depressão do abandono, não resistiu por muito tempo. Aos 8 anos de idade, Itsuki se tornou órfã. Como Rina era filha única e os pais dela já haviam falecido, e não se sabia nada sobre a família de Ikki, Itsuki foi parar em uma casa de adoções da Fundação Kido e, após 1 ano morando lá, foi identificada como potencial amazona. Itsuki aceitou o desafio, e foi para a Ilha da Rainha da Morte treinar pela armadura de Fênix, ainda que não tivesse muita convicção em conseguir conquistá-la. Porém, quando descobriu que o antecessor da armadura se chamava Ikki, e ouviu as descrições dele, ficou decidida a descobrir se ele era seu pai, e por que havia abandonado a família.

— Eu sinto muito, Itsuki... Eu não sabia — disse Natassia.

— Tudo bem. Pelo menos agora eu sei que não adianta procurar pelo Ikki. Assim como o meu pai, alguma coisa realmente deve ter acontecido com ele. E se eles forem a mesma pessoa...

— Não. Você já está falando como se fosse certo que ele morreu. Você não pode desistir ainda Itsuki. Essa é a resposta mais fácil para você pois significa que ele não quis te abandonar. E mesmo que ele ainda esteja vivo, você não tem como saber o que realmente aconteceu.

— Mas, Natassia...

— Sem “mas”. Amanhã a gente vai subir de novo as 12 casas e vamos descobrir o que realmente aconteceu com o seu pai. E o Shoryu vai nos ajudar.

— Quê?! Eu?! — Shoryu não sabia como acabou ficando envolvido em um drama adolescente de um dia para o outro.

— Sim! — exclamou Natassia, com um olhar matador para Shoryu. — Isso é muito mais do que eu querer reencontrar o meu mestre. A Itsuki merece saber a verdade sobre o pai dela. Amanhã nós três vamos subir as 12 casas!


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Notas finais do capítulo

1. É o mesmo personagem que Shiryu e Shunrei adotam em Next Dimension.
2. Referência à deusa da morte da mitologia nórdica.
3. Referência à deusa do amor da mitologia sumeriana.