Yui e Ayato se entreolhavam nervosos enquanto esperavam pelo Grande Mestre em exercício. Ajoelhados no pátio aberto do Templo de Atena, ansiavam o encontro com Nicolas de Altar, que era quem auxiliava Atena na ausência do Grande Mestre Shun. Os jovens tinham relatórios importantes em mãos para passar a Nicolas, e que seriam de grande interesse a Saori. Mas como não podiam entrar nos cômodos internos do Templo de Atena sem permissão das saintias, aguardavam do lado de fora, enquanto uma das sacerdotisas de Atena chamava o Grande Mestre interino.

Yui era uma bela jovem de cabelos longos e platinados, enquanto Ayato era um vigoroso rapaz de pele bronzeada e cabelos curtos e negros. Em comum, tinham seus belos pares de olhos verdes, além de suas armaduras de bronze que se assemelhavam. Yui vestia a armadura de Sextante, enquanto Ayato trajava a armadura de Oitante. Se a função do cavaleiro de Altar era auxiliar o Grande Mestre como seu braço direito, Yui e Ayato eram aqueles que operavam como seus assistentes diretos¹. E embora lhes fossem delegadas inúmeras atribuições do Grande Mestre, a principal tarefa da dupla durante uma batalha era monitorar as constelações de Atena.

— Ela está voltando... — observou Ayato, ao ouvir suaves passos aproximando-se de dentro do templo.

— Podem entrar — disse a saintia loira, aparecendo na porta. — O mestre Nicolas e a mestra Yasmin requisitam a sua presença.

Yui e Ayato hesitaram por um instante. Não esperavam serem chamados a entrar. Mas seguiram a saintia Alice² de Golfinho, e adentraram os aposentos mais reservados do templo, cruzando algumas outras saintias no caminho, até que chegaram ao cômodo onde Nicolas de Altar os aguardava. Era o salão de banho da deusa Atena.

Ainda trajando sua armadura sagrada, Saori estava dentro de uma enorme piscina aquecida. Mas, obviamente, não tratava-se de um mero banho. Atena estava de olhos fechados, e parecia estar muito concentrada. Inclusive, considerando o nível místico em que manifestava-se seu cosmo, era provável que sua mente nem estivesse presente. E de cada lado de Saori, também banhando-se na água, estavam Nicolas, com a armadura de prata de Altar, e Yasmin, a líder das saintias e oráculo de Atena, com a armadura de bronze de Coruja. Porém, mais do que estarem simplesmente segurando as mãos de Atena, os dois pareciam estar usando seus cosmos para auxiliar Saori em alguma difícil tarefa. Tão difícil, que Atena precisava até mesmo estar submersa naquela fonte sagrada para revigorar-se. E, atrás do trio, havia ainda outra saintia portando o escudo e o báculo de Atena, em caso de precisar oferecê-las a Saori com prontidão. Tratava-se de Emilia de Cetro³, a saintia designada especialmente para ser curadora dos objetos sagrados do Santuário.

— E então... — recebeu-os Nicolas, parecendo bastante cansado, devido ao cosmo que emprestava a Saori. — Trouxeram o relatório?

— S-sim... — adiantou-se Ayato, ainda um pouco nervoso com a situação, para entregar-lhe um pergaminho.

Com a mão livre, Nicolas recebeu o pedaço de papel, e começou a lê-lo com o cenho preocupado. O Santuário já havia perdido as vidas de 21 cavaleiros de bronze, 11 de prata e 2 de ouro, sem falar em outras 10 constelações de bronze, 4 de prata e 2 de ouro que estavam bastante fracas, indicando que seus detentores estavam provavelmente feridos demais para continuarem a lutar. E descontando ainda os 10 cavaleiros de bronze e 2 de prata que estavam fora da linha de frente para cumprirem outras funções, além de 1 cavaleiro de prata e 4 cavaleiros de ouro que continuavam ausentes do Santuário, isso significava que o contingente em batalha no Santuário estava possivelmente reduzido a 11 cavaleiros de bronze, 6 de prata e 4 de ouro. Se esses números continuassem a se reduzir, era só questão de tempo até o inimigo chegar ao Salão do Grande Mestre, algo que seria impensável de acontecer em outras eras.

— A propósito, senhor Nicolas... — começou Yui, aproximando-se devagar. — Se me permite perguntar...

— Não se preocupem com Atena — interrompeu-a Yasmin. — Realizar tantas tarefas difíceis ao mesmo tempo, como reforçar a barreira do Santuário, mover as dimensões de 13 cavaleiros ao mesmo tempo, e transcender sua forma astral até o mundo dos mortos, é desgastante até para a nossa deusa Atena. Mas nós estamos aqui para apoiá-la.

— Esse é o verdadeiro dever de nós, saintias — explicou Alice, tocando o ombro de Yui. — Estarmos próximas do coração de Atena — sinalizou, gentilmente, cobrindo o peito com a outra mão.

— O coração de todas nós está com Atena — completou Yasmin, com um acolhedor sorriso.

Nesse momento, Yui e Ayato notaram que as demais saintias do templo, apesar de estarem guardando vigílias em outros cômodos, também estavam presentes através do cosmo. Os corações de todas elas estavam sincronizados ao de Saori.

— Mestre Nicolas, sobre o relatório... — perguntou Ayato, finalmente, retirando o Grande Mestre interino de suas elucubrações.

— Vocês tem feito observações muito valiosas das nossas constelações ativas nesta guerra — respondeu, enfim. — Continuem com o bom trabalho... — dispensou-os Nicolas, com um sorriso cansado. — Assim que Atena retornar, eu informo as nossas baixas a ela.

— Com sua licença... — curvou-se então Ayato, acompanhado de Yui, antes de se retirarem.

Após os jovens saírem, Nicolas questionou a líder das saintias.

— Será que falta muito para Atena concluir a missão?

— Atena vai levar o tempo que for necessário. Nem a mais, nem a menos — respondeu, vagamente, a misteriosa mulher.

— Eu não sei como você consegue ficar tranquila numa hora dessas... Mas talvez seja por que eu não me sinto a altura de substituir o Grande Mestre Shun — especulou, com um sorriso amarelo.

— Não se diminua, Nicolas. Durante anos o Mestre Shun te preparou para esse momento, pois ele espera grandes feitos de você. Se você tem fé em seu mestre, tenha fé na escolha que ele fez em você.

As palavras de Yasmin tranquilizavam Nicolas. Ao lado dela, sentia que podia corresponder às expectativas que Shun e Saori depositavam sobre si. Porém, ainda restava-lhe uma ponta de aflição a respeito de como seguia a missão de Atena no submundo.

No abandonado domínio de Hades, que havia perdido muito de sua forma original, a forma astral de Saori protegia e guiava um de seus cavaleiros.

— Maitreya, por aqui — dizia a jovial deusa.

O cavaleiro de prata, ainda trajando sua armadura de Taça, a seguia um pouco inquieto. A forma distorcida do mundo inferior, adquirida após a morte do corpo verdadeiro de Hades, escondia muitas armadilhas e perigos para aqueles que ousassem aventurar-se em seus domínios.

— Atena, já estamos caminhando a algum tempo...

— Eu sei que você quer voltar para ajudar na batalha das Doze Casas. Mas enquanto houver uma chance de salvar um de meus cavaleiros, eu não vou abandoná-lo.

A angústia de Maitreya era justificada. Os planos de Saori e do cavaleiro de Gêmeos, para mover as peças no tabuleiro dessa Guerra Santa, não haviam saído exatamente como o planejado. De fato, o cavaleiro de Taça era para estar ali no submundo com Atena. Porém, os demais cavaleiros resgatados por Saori deveriam ter ficado de fora da batalha nas Doze Casas. E, para piorar, ao invés dos cavaleiros de ouro do outro mundo terem sido enviados exatamente para as casas dos cavaleiros de ouro do Santuário, alguns dos inimigos acabaram se deparando com os jovens de bronze e prata.

Apesar disso, a determinação incessante de Saori, em resgatar aquele que ela buscava no submundo, comovia Maitreya, pois o lembrava de quando o lendário Seiya de Pégaso esteve preso a uma cadeira de rodas. O prateado tinha apenas quatro anos de idade na época, mas lembrava-se claramente da comoção que tomou o Santuário, quando Atena arriscou até mesmo a continuidade do espaço-tempo, para salvar um de seus fiéis defensores.

— Aqui! — exclamou Saori, notando um brilho dourado no fundo de um desfiladeiro. — O encontramos! — comemorou.

Com pressa, a dupla deslizou a enorme rampa de terra e poeira, desfiladeiro abaixo, onde alcançaram o espírito de Kiki. Mesmo em sua forma astral, o velho amigo de Saori trajava a armadura de Áries, e tinha aquela flecha dourada cravada no peito.

— Atena, eu sei o que eu disse antes... Que essa seria a única maneira de salvar o Kiki. Mas, não se esqueça, talvez nem isso dê certo.

— Não se preocupe com as minhas expectativas, Maitreya — encorajou-o, tocando seu ombro. — Apenas faça o seu melhor... Eu estarei aqui para ajudar.