Céus em Queda escrita por Youseph Seraph
Notas iniciais do capítulo
Você, caro leito, pode achar estranho a mudança abrupta de localização da história, mas te garanto, se você ler dessa maneira, ficará mais fácil entender o que virá.
Ah, a velha Londres. Nenhum lugar melhor para estar um homem tão melancólico.
Youseph caminhava sem muito destino nas ruas da capital britânica. E achava aquilo uma chatice. Estava querendo encontrar, de alguma forma, algo que pudesse fazê-lo se sentir vivo. Algo gostoso. Algo prazeroso.
Seus cabelos pretos desarrumados, que iam até metade de seu pescoço, se encaixavam perfeitamente com o formato de seu rosto. A barba mal-feita dava um belo charme também. A camisa social branca levemente desabotoada e a calça social preta? Algo para direcionar os olhos do "público". Mas seus olhos, caídos pelo tédio, mas resplandecendo em seu tom âmbar, era o seu maior charme. Ele sabia que era lindo. E sabia que, cedo ou tarde, encontraria diversão naquele lugar.
Após andar por um bom tempo, ele finalmente chega a seu destino. Uma boate, claro. Ele põe a mão direita em seu bolso e, de lá, tira uma carteira de cigarros e um isqueiro. Ele tira um cigarro da carteira e o acende, então começa a fumar.
Os assuntos de sua família... não, melhor não pensar sobre isso. Não agora. A situação já estava complicada demais sem meter anjos no meio.
Entre olhares e olhares, passam homens e mulheres, que trocam sorrisos maliciosos com o rapaz galante. Youseph era bem conhecido aqui, mas não pelo seu nome. Ele era um flertador nato. E era bom nisso.
Entre todos ali presente, um rapaz lhe chama atenção. Ele é baixinho, mas satisfaz o tipo de Youseph, que vai até ele.
Os dois trocam olhares, então Youseph começa uma conversa.
—Posso te pagar uma bebida?
O homem, moreno, de olhos claros e maxilar definido, sorri com o flerte.
—Está de cerimônia hoje, lindão?
—Se quiser partir pra cima vem logo.
Era assim que funcionava a técnica de flerte de Youseph: seja você mesmo, porque você é irresistível.
Antes que o outro rapaz pudesse sequer se aproximar de Youseph, uma pessoa lhe chama atenção na sala. Uma garota ruiva. Ela não parecia estar acostumada a frequentar um lugar como esse. Se estivesse, saberia como furtar uma carteira sem ser percebida. Com um gesto, ele dispensa o beijo do rapaz com quem havia acabado de insinuar um dia de pegação.
O rapaz olha para Youseph como se tivesse absurdamente ofendido, mas para quando vê o punho de seu suposto pretendente interferindo no que deveria ter sido um tapa na garota.
—Mexe com alguém do seu tamanho. —Diz o rapaz.
O homem que havia sido interferido, por sua vez, se enfurece. Ele já deveria estar bêbado demais, afinal, era tarde. Ele, que era grande, musculoso e de pele tão clara quanto Youseph, estava se tornando um pimentão de tão vermelho.
Youseph se arrepende levemente de ter ajudado a moça, mas mesmo assim, joga um beijo para o rapaz que havia conhecido e volta sua atenção para a moça ruiva, que já estava correndo. Em seguida, viu o punho do bombado atravessando o ar onde sua cabeça estivera há um segundo atrás. E então, Youseph corre.
Ele não deixaria a moça fugir. Era uma ladra de quinta. Mas não deixaria que um homem daquele porte tocasse em um fio dos cabelos cacheados da mulher. Por alguns minutos, enfiando-se entre os carros, Youseph perseguiu a moça, ao mesmo tempo que corria do brutamontes. Isso, até chegarem a um beco sem saída.
—Ora ora, —Disfarçou o rapaz. —Parece que temos aqui um conflito de interesses. O senhor parece estar enfurecido, não é chuchu?
Dito isso, o fortão se enfurece ainda mais.
—Ela tem uma coisa que é minha.
—Eu sei, —Diz Youseph. —Mas quer mesmo bater em uma garota indefesa.
—Eu não estou indefesa. Saiam da minha frente vocês dois. —Cortou a ruiva. Sob a luz de um poste que piscava após alguns segundos acesos, Youseph viu, pela primeira vez a garota com atenção. Ela era um pouco mais gordinha que as outras da boate, usava roupa, também social, azul cobalto, bem como uma calça preta e sapatos igualmente pretos, sem salto, que facilitavam a sua fuga.
Mas o que mais lhe chamara atenção foram seus olhos azuis, que pareciam oscilar para um laranja, assim como os cabelos da mesma.
—ENTÃO VENHA SE DEFENDER! —Grita o brutamontes, tentando novamente socar a mulher.
Youseph não pôde não intervir. Puxou-a rapidamente pelos braços e correu. Ela não pareceu gostar daquilo, mas continuaram até despistar o homem.
Quando finalmente pararam, eles soltaram um profundo suspiro, mas a moça continuou andando.
—Ei! —Interrompeu Youseph, antes que a garota fugisse. —Nem um obrigado? —Ironizou.
—Eu estava com tudo sob o controle. —Dizia ela, enquanto caminhava ainda mais.
—Pelo menos posso saber seu nome? —Pergunta Youseph.
—Não. Não pode.
—Você parece estar mal. Venha comigo. —Sugeriu Youseph.
A sugestão pareceu chatear a mulher. Ela parou.
—Sabe quantos homens me pediram para ir com eles? E sabe quantos deles conheceram a dor de uma garota nada indefesa? —Ameaçou ela.
Youseph parou e abaixou a cabeça.
—Eu sinto muito. —Disse ele.
—Pois deveria sentir.
—E o que eu posso fazer por você? É sério! Dá pra ver que você está mal.
—Só não me siga.
Infelizmente, Youseph não poderia atender às exigências da mulher. Então ele se enfiou na frente dela.
—Você não é uma boa ladra, vai se meter em situações como essa de novo. Alguma hora não vai dar certo pra você, viu?
A moça pareceu se enfurecer.
—E DAÍ? ISSO LÁ É DA SUA CONTA? —Gritou ela.
Nesse momento pequenos de fogo se desprenderam das mãos dela.
—Uma anja? —Surpreendeu-se Youseph. —O que uma anja faz aqui?
A mulher recua. Só havia um jeito de alguém ter reconhecido uma anja nessas ruas: sendo um anjo também, ou tendo o conhecimento de suas existências. Ela se desespera e começa a correr. Youseph corre logo atrás.
—Por favor, deixa eu te ajudar! —Insiste ele.
—NÃO! —Grita ela. —Foi confiando que tudo acabou mal pra mim.
Youseph não viu outra alternativa. Ele parou e simplesmente ficou inerte. A mulher parou também.
—Não vai fazer nada? —Questiona ela.
Em um piscar de olhos, a mulher se vira e se encontra com a imagem de Youseph novamente. Onde ele estava, apenas uma lata de lixo. Então ela percebe.
—A casa Seraph!?
Youseph ri.
—Sim. Meu nome é Youseph Seraph. Filho de Ezequiel Seraph. Vem comigo, por favor?
A mulher sente-se tentada a ir, mas hesita.
A casa Seraph, por memória dela, havia sido exilada. Eles não interferiram em nada que outras casas da aristocracia fizeram. Não mexeram um dedo. Nem quando sua própria casa, a dos Campbell, foi destruída.
—Por que eu deveria confiar em você, Seraph? —Questiona a mulher.
—Porque eu sei quem você é, Campbell. —Diz ele. —E porque eu tenho todos os recursos para ajudá-la. Independente do que for, eu prometo não te machucar.
—E como posso acreditar em você? —Pergunta a mulher.
Então, Youseph fica parado e abre os braços. Alguns objetos do cenário se desfazem em fumaça e muitas paredes parecem se abrir.
—Não há mais ilusões. Me queime se quiser. Me queime vivo! Te dou essa oportunidade.
Então, Youseph segura a mão da mulher e, com ela, envolve seu pescoço, fazendo-a tocar sua pele.
—Eu não sou uma ilusão. Venha comigo. Ou me queime aqui mesmo.
Após um suspiro profundo, a mulher cede.
—Está bem. Eu vou com você. —Diz ela.
Youseph não consegue conter o sorriso. Esta garota deu, em uma noite, mais diversão do que qualquer homem ou mulher havia lhe dado em toda sua vida. E nem precisou de toques com desejo para isso. Mas não era diversão que Youseph viu nela. Ele viu fogo.
—Poderia pelo menos dizer seu nome agora? —Pergunta o homem.
A moça sorri, um pouco mais vulnerável.
—Serena. Meu nome é Serena Campbell.
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