Elas escrita por Karina A de Souza


Capítulo 4
Capítulo 4


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo com pouca ação, mas necessário...



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Dia 1.835 da Guerra de Stichford.

05:20.

Assim que os guardas do Mestre, e ele próprio, saíram do Castelo Vermelho para os preparativos e início da parada mensal do exército, Martha, Missy, a Doutora e eu entramos pelos fundos, por uma passagem que antigamente pertencia ao esgoto e agora estava vazia.

Ainda havia guardas e criados, então precisávamos ficar alertas.

—Vamos nos dividir. -A Doutora disse.

—Eu vou com Stefflon. -Missy avisou, me puxando pra perto dela.

—Tudo bem. Martha e eu entraremos pelo sul. Não desliguem o rádio. -E começou a se afastar. Olhei para Missy.

—Que foi?

—Está armando alguma coisa?-Perguntei.

—Você é uma coisinha desconfiada, não é mesmo? Vamos, não temos o dia todo.

Avisei Lucy que já tínhamos chegado no nosso destino e que estávamos entrando, então segui Missy por uma porta destrancada.

—Vocês parecem estar se dando bem. -Comentou.

—O que?

—Você e a Lucy. Eu as vi conversando como se fossem velhas amigas.

—E tem algo de ruim nisso?

—Eu não disse isso. Hum, olhe quem tem muito amor próprio. -Apontou para um quadro enorme do Mestre na parede. -Eu era um homem bonito. Você não acha?

—Sinceramente? Não faz meu tipo.

—E algum homem faz?-Sorri, balançando a cabeça negativamente.

—Não. Definitivamente, não.

—Entendi. Bem, vamos fazer nosso trabalho.

Eu nunca tinha entrado no Castelo Vermelho, nem mesmo quando ele era aberto para visitação antes de sequer sermos um país. Quando conseguimos independência do Reino Unido, o lugar se tornou sede do novo governo, e então, um ano depois, o covil do Mestre.

—Por que me escolheu pra ir com você?-Perguntei, enquanto cruzávamos um longo corredor.

—Você é uma criaturinha intrigante, e parece ser boa no que faz. Além disso, Martha Jones provavelmente me empurraria de alguma escada.

—Ela parece ter bons motivos pra isso.

—Não posso discordar. Acredito que você também teria.

—É verdade, sua encarnação anterior não me inspira simpatia, mas sei separar as coisas.

—Sorte a minha.

—Preciso dizer que se a Doutora não tivesse vindo com a gente, eu nunca teria chamado de você. Estou desesperada, mas não burra. Sei quem você é, e também sei que é praticamente uma rebelde quando se trata dos Mestres. Porém, a cobra pica pois é de sua natureza. E eu não pretendo ser picada. -Ela deu um sorriso estranho.

—Certo. Bem, vamos continuar nossa missão, antes que alguém se machuque ou seja picado.

—É claro. Você na frente, senhora.

***

—Como foi lá, hoje?-Lucy perguntou, enquanto eu secava a louça do jantar. -No castelo.

—Estranho. Nós entramos e saímos sem problemas e eu só consigo pensar em todas as pessoas que não conseguiram fazer o mesmo. Tirando isso, não é um lugar tão sombrio quanto pensei. É meio brega, na verdade. Esperava mais do que um show de exibicionismo do Mestre.

—Ah, ele gosta de se exibir.

—É muito notável, com tantos quadros e estátuas dele. E o trono, com seu nome entalhado... Como eu disse, brega.

—Eu imagino.

—Posso fazer uma pergunta?

—Acho que sei o que vai perguntar. Mas tudo bem, vá em frente.

—Como se apaixonou por aquele maníaco?-Ela suspirou.

—Me pergunto isso de vez em quando. Mas se você me conhecesse antes, entenderia melhor. Parecia... Tão simples e certo... E as coisas que ele me mostrou... Depois se tornou um pesadelo sem fim e eu não achei que fosse acabar. E havia muito fingimento. Sorrir. Esconder as coisas. Maquiagem para encobrir o que fosse necessário. Mais sorrisos. A farsa perfeita e não havia quem me tirasse dela. Então um dia tinha uma arma na minha mão e parecia o fim de tudo.

—Você está viva agora.

—E ele também. E tem seu próprio reino de terror de novo.

—Não por muito tempo. Vamos derrubá-lo do trono e não será nada bonito pra ele.

—Você parece tão confiante.

—Chorar não vai nos ajudar, nem incertezas ou medo... É hora de lutar, precisamos focar nisso.

—Você tem razão. Eu...

—Vocês precisam ver isso. -Martha avisou, agitada, aparecendo na porta da cozinha.

A seguimos para a sala principal. A tela grande estava ligada e exibia ninguém menos que o Mestre. No canto da imagem aparecia o selo que indicava que era uma transmissão oficial.

—Queridos súditos... -Revirei os olhos. -É de meu conhecimento que alguns de vocês tramam contra mim. -Cruzei os braços. -Além de ser extremamente desrespeitoso e ofensivo, é punível com a morte. Qualquer informação será recompensada. Caso os traidores decidam se revelar, é possível que suas penas sejam... Aliviadas.

—Ou seja, ele vai nos matar rápido. -Murmurei.

—Lembrem-se de quem está no poder e que as coisas podem tanto melhorar quanto piorar. Não é bom desafiar o seu rei. Dito isso, espero que pensem bem antes de agirem contra mim.

A imagem escureceu. Fim da transmissão.

—Ele sabe. -A Doutora disse. -Sabe que estamos aqui. É uma questão de tempo até começar a tentar nos fazer aparecer.

—O que acha que ele vai fazer?-Martha perguntou.

—Nada de bom. Precisamos fazer algo antes disso... Missy, temos que montar um bloqueador de sinal, nos deixar invisíveis.

—É pra já. -A outra disse, girando no lugar e saindo rapidamente.

—O que vai fazer?-Perguntei.

—Vai ver daqui a pouco. -A Doutora avisou, mexendo em alguns fios. -Vou precisar de vocês também.

***

Enquanto a conexão era feita, eu ajeitei minha postura e respirei fundo. Precisava me manter calma, direta, talvez provocativa, mas não assustada ou nervosa. Isso não ia ajudar.

De repente, a tela grande ligou. Nossa conexão tinha sido aceita, e lá estava o Mestre.

—Ah. Que surpresa. A agente da resistência. Eu achava que você estava morta.

—Devia ter se certificado. Péssimo erro. -Ele riu.

—O consertarei em breve. Qual o motivo da conversa?

—Bem, da última vez que nos falamos, você parecia feliz com o fato de eu ter ficado sozinha. Então saí e arrumei amigas. Você se lembra de Martha Jones?-A médica se aproximou, ficando visível na tela.

—Lembro. Como vai sua família?-A outra não disse nada.

—Aqui está seu velho amigo, agora regenerado. -A Doutora apareceu. -Temos também...

—Lucy. -Ele interrompeu, assim que ela ficou ao meu lado. -Viva. Mas que curioso. Temos assuntos a tratar. -Lucy vacilou, segurei a mão dela.

—E por último, Missy. -A Senhora do Tempo parou do lado da Doutora. -Já deve ter ouvido falado da sua encarnação feminina. -Ela acenou.

—Uma traidora.

—Se você diz.

—E é assim que planeja me derrotar? Cinco mulheres?-Riu. -Achei que você podia fazer melhor... Doutora.

—Eu vou te dar só uma chance. -Ela disse, dando um passo para frente. -Saia desse país, da Terra, e posso considerar não acabar com você.

—Alguém está de mal humor hoje. Vou recusar sua oferta. E pedir que preparem quatro forcas no meu quintal. Já viram minha casa?

—Quatro? Você não sabe mais contar?

—Quatro. Eu vou pegar minha rainha de volta.

—Eu não iria com você nem morta. -Lucy avisou.

—O que devia te preocupar é o que vai acontecer se eu não perdoá-la por suas traições. A morte seria muito simples.

—Não vai tocar um dedo nela depois que acabarmos com você. -Interrompi. -E nem em mais ninguém. Seu reino está terminando. Eu me preocuparia com isso, não com as forcas.

—Não estamos de brincadeira. -A Doutora avisou. O Mestre não parecia mais debochado. Acho que o preocupamos. -Você tem sua chance. Pegue-a enquanto pode, velho amigo. Não vou oferecer de novo. -Então apontou a chave de fenda sônica para o computador, desligando a conexão.

***

—Você está bem?-Lucy, abraçando os joelhos na cama, olhou pra mim.

—Não tenho certeza. -Me sentei na frente dela. -Foi... Aterrorizante vê-lo, mesmo que não tenha sido pessoalmente. Ele sabe que estou viva, e está furioso comigo. Isso não costumava acabar bem.

—Você não precisa mais temer a fúria dele. Está segura. E no momento que disser que quer ir pra casa, eu vou levá-la.

—Mesmo?

—Mesmo. Você não precisa ficar.

—Acho que eu preciso. Eu nunca lutei de volta, nunca. Só esperava o pior e ficava em silêncio. Se eu fugir, ele ganha. Não quero deixá-lo ganhar. Não quero deixá-lo achando que me assustou. Não sou mais uma vítima. -Abaixou o olhar. Eu podia ver que ela ainda estava com medo.

—Lucy, você não é obrigada a lutar. -Toquei o braço dela. -Não é obrigada a ficar aqui e passar por isso. Acabou. Você pode voltar para o passado e continuar lá, ter sua longa vida feliz como uma dama de companhia da realeza.

—E o que isso faria de mim?

—Ninguém aqui vai julgar você. E é a única que pode decidir seu destino. -Olhou pra mim.

—Obrigada.

—Vou te deixar dormir agora. -Fiquei de pé.

—Você não vai?

—Ainda não. -Eu estava me sentindo agitada e sabia que não dormiria naquele momento, mesmo se tentasse. -Boa noite, Lucy.

—Boa noite.

Apaguei a luz e saí do quarto, fechando a porta em seguida.

O resto do grupo estava na sala principal, conversando sobre o dia que tivemos. Missy fazia algumas piadas. Vê-la rindo enquanto Lucy estava apavorada me deixou irritada.

—Como você pôde?-Perguntei, me aproximando dela.

—Desculpe, o que?

—Como pôde fazer aquilo com ela? Com alguém que não podia se defender? Ela se apaixonou por você, só Deus sabe como, e o que recebeu? Abusos de todos os tipos. -Missy ajeitou a postura, finalmente entendendo do que eu estava falando.

—Está acusando a regeneração errada. Eu não fiz nada daquilo.

—Ainda é a sua história. Deve ter lembranças disso. Deve lembrar de como achou divertido ter...

—Escute, posso achar você divertida e boa no que faz, mas não vou permitir que coloque o dedo na minha cara enquanto me acusa de coisas, só por que está apaixonada por Lucy

—O que você disse?

—Não me importo que queira viver um lindo romance lésbico com minha ex mulher, mas você não vai vir até mim e gritar desse jeito, entendeu?

—Você está maluca.

Você está maluca. Olhe pra mim. Olhe pra quem eu sou agora. Sou uma mulher. Acha que apoio o que ele fez? Acha que me divirto quando lembro daquelas coisas? Experimente ter séculos de memórias sobre morte, tortura e coisas ainda piores. Você acha que tem problemas? Outras encarnações minhas me juraram de morte. Pessoas querem me destruir por coisas que eu nem fiz, e nem lembro de ter feito. E toda maldita vez em que tento fazer algo certo, há pessoas que não acreditam em mim. Você me trouxe aqui por que sabia que eu era uma das suas melhores opções. Então pare com essas malditas acusações!

Silêncio. Um longo silêncio chocado, agitado e estranho.

A Doutora limpou a garganta e ficou de pé.

—Acho que o dia de hoje mexeu com todas nós, e isso pode nos afetar de maneiras que nem imaginamos. É melhor descansarmos, pois muitas coisas ainda estão para acontecer. Não é?-Apenas Martha assentiu. -Certo... Todas pra cama, então. -E saiu puxando Missy.

Suspirei. Ela tinha razão. Eu estava nervosa e isso tinha resultado naquela discussão. Meu antigo líder costumava dizer que sentimentos apenas nos atrapalhavam em missões de vida ou morte, e costumavam separar grupos que deviam se manter unidos até o fim.

—Sabe... Achei que só eu tinha notado. -Martha comentou. Olhei pra ela, confusa. -"Romance lésbico com a minha ex mulher". -Riu, se afastando. -Tenho que admitir... Essa Missy é uma figura.


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Notas finais do capítulo

O próximo é o penúltimo capítulo...



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