Reviver escrita por LaviniaCrist


Capítulo 56
Invasão


Notas iniciais do capítulo

Vou dar uma explicação rápida para ter sumido por tanto tempo e voltar como quem não quer nada:
Sumi porque eu quis!
Pode parecer horrível, mas no meio de vários problemas de várias ordens diferentes, eu resolvi me afastar de tudo e me concentrar em tentar resolver o que poderia ser resolvido e aceitar o que eu não podia fazer nada para mudar. Quando tudo já estava quase “ok”, em Janeiro, meu computador começou a apresentar vários erros e isso me atrapalhou por mais de um mês – ele precisou ser formatado duas vezes.
Estou tentando lidar com tudo da melhor maneira possível e retomar meus projetos, mas algumas perdas foram inevitáveis, incluindo os arquivos desta fanfic com as versões em inglês e em espanhol, os resumos, além deste capítulo: o último em que eu estava trabalhando (cujo a única coisa que sobrou foi um rascunho no drive).
Eu poderia ter aparecido ao menos para dar um aviso ou para responder uma mensagem ou outra? Sim, mas eu não quis. Eu gosto de sumir. Sumir evita que apareçam novos problemas e me força a focar apenas nos que eu já tenho.
Peço desculpas para quem ficou preocupado e/ou chateado.
Prometo voltar à rotina de um capítulo por semana até o final de março.
Também prometo algumas novidades, mas falo delas mais tarde.
Tentei responder todos os comentários, caso tenha esquecido de alguém: peço que comente novamente, porque a notificação não apareceu para mim.
Obrigada por tudo e beijokas!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/790516/chapter/56

Gotham, Mansão Wayne, quarto de visitas ao leste – 23:59.

.

Alfred, o mordomo incansável, estava desmerecendo o título. Não era para menos: passar o dia contornando as brigas constantes da família e se desdobrando para cuidar de Damian consumia qualquer estamina que ele conseguiu juntar durante os anos. Em contrapartida, bastava observar aquela criança adorável por alguns segundos para sentir que tudo valia a pena.

— Tem certeza de que precisa sair hoje, Patrão Bruce? — o idoso perguntou terminando de juntar as várias folhas de desenhos esparramadas pelo chão.

Bruce manteve o olhar focado única e exclusivamente no filho, que desfrutava de um sono pesado e tranquilo. Queria ficar ali, vigiando o sono dele; passando a mão pelo cabelo do filho, em uma carícia, quantas vezes fosse necessário para ter certeza de que já não haviam ferimentos lá - nada além dos arranhados mais novos, adquiridos no meio de um sonho agitado.

— ... Sim.

— Apesar de soar pretencioso: eles não podem realizar essas reuniões sem o Batman?

O vigilante noturno, ainda em seus trajes sociais, apenas suspirou e deu um beijo na testa do filho. Suspirou também pouco antes de finalmente se afastar e ir para a porta, murmurando a resposta antes de sair:

— ... Não.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, jardim dos fundos – 01:24.

.

— Cara...! Precisava ter parado tão longe da porta!? — Mutano choramingou, estava exausto. Haviam patrulhado toda São Francisco em tempo recorde antes de conseguirem uma brecha  — Minhas perninhas doem!

— O outro portal que eu tinha feito foi para este mesmo lugar. Não sei até que ponto aqui é protegido, talvez tenham sensores de movimento... — Enquanto falava, Ravena tentava analisar meticulosamente qual próximo passo daria — ... e você poderia ter se transformado em um falcão.

— Eu pensei nisso, mas você já estava olhando por cima. Duas aves no céu chamariam atenção demais.

— Como se um guepardo correndo no meio dos carros não chamasse atenção suficiente... — Revirou os olhos.

— Exatamente: eu roubei toda a atenção para mim e ninguém notou você. Aliás, meus seguidores adoram gatões verdes! — O rapaz colocou uma das mãos na cintura e com a outra mostrou o celular, sorrindo. O número de seguidores só aumentava, estava famoso dentro e fora da cidade que protegia.

— ... Não tinha parado de ser excessivamente... carente?

Ele estava pronto para responder, mas repentinamente foi puxado para dentro dos arbustos. Estava escuro, o que ajudava a se esconder por mais que os galhos não estivessem repletos de folhas.

Ravena o mantinha imobilizado para evitar protestos, além de tampar a boca dele com uma das mãos. Este ataque, porém, era apenas uma defesa: ela viu alguém se aproximando e temeu terem sido descobertos tão rápido.

Entretanto, era apenas Alfred passando pelo jardim para ir até seu almejado local de descanso: um chalé rupestre e aconchegante próximo ao lago em um dos limites da propriedade Wayne.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, quarto de visitas ao leste – 00:59.

.

Damian estava sentado na cama, encarando o despertador antigo que segurava nas mãos com ansiedade.

Todos os dias, Sr. Pennyworth o colocava para despertar na hora dos remédios. Quase sempre, Damian o segurava poucos segundos antes e esperava – como se estivesse mais preparado até mesmo que o despertador. E, normalmente, Alfred chegava a tempo de vê-lo desligar o aparato.

— Espero que mantenha a pontualidade quando for mais velho, Mestre Damian — o idoso disse com um sorriso enquanto acendia as luzes do quarto.

— Prometo tentar! — O pequeno sorriu também — Sr. Pennyworth, por que eu não posso tomar os remédios mais cedo?

O mordomo apenas estendeu o comprimido e um copo de água para a criança, o observou ingerir o medicamento e depois afagou o cabelo escuro quando Damian se deitou mais uma vez. Estava pensativo, ou melhor, o cansaço o forçava a pensar meticulosamente antes de falar qualquer coisa que fosse.

— Pergunte ao seu pai, Mestre Damian. Ele tem horários confusos. — Sorriu.

— ... Por isso ele sai para essas reuniões estranhas de madrugada?

— ... Sim.

— E... são só reuniões de trabalho? — perguntou baixo, como se não quisesse que Alfred realmente escutasse a pergunta.

— Só reuniões entediantes de trabalho, com muitos papéis e slides sem graça — O mordomo sorriu novamente, assegurando que o pequeno não deveria se preocupar.

Damian o encarou com os belos olhos verdes denunciando o quão interessado estava em arrancar mais respostas. Porém, ele se manteve em silêncio e tentou apenas dormir – sabia que Alfred só o deixaria sozinho quando estivesse entregue ao sono.

A curiosidade latente o fazia prestar atenção até nos pequenos detalhes e, sendo assim, notou o quão cansado o mordomo já estava. Não queria chatear o Sr. Pennyworth com ainda mais perguntas... não queria chatear ninguém.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, jardim dos fundos – 01:27.

.

— ... Eu vou dar um jeito de entrar, você fica aqui — Ravena sussurrou finalmente libertando o amigo. Ela se levantou, bateu a poeira das roupas e se preparou para criar mais um de seus portais.

— Nem pensar! — Mutano a segurou pelo antebraço, a puxando para se abaixar mais uma vez. Depois, continuou em um tom mais baixo: — Ficou louca? Você não pode entrar lá sozinha, é a casa do Batman! Tipo, ele é o Batman! Preparado pra tudo, lembra? Até para acabar com o Superman... e outros heróis... tipo nós dois!

— Eu posso entrar sem ser notada, só preciso escolher o lugar certo. Você fica aqui caso alguém apareça.

— Mas Ravena... — Ele murmurou chegando a fazer beicinho.

— ... Não. — Ela franziu o cenho e se levantou novamente — Se ouvir alguém chegando, você me avisa.

— Eu não vim até aqui só pra ficar de vigia! — Apesar de apreensivo, Mutano também queria fazer parte ativa do “resgate”.

— E você não vai ficar só de vigia — Afirmou, encarando o amigo — Se eu não voltar em dez minutos, vá atrás de mim.

— ... Sério?

— Eu ia pedir para avisar a Estelar, mas eu sei que você não vai fazer isso — Ela ergueu os ombros e deu um pequeno ar de sorriso com as feições tão previsíveis de Garfield. Depois, completou um pouco mais séria: — Pelo menos dê um jeito dela ficar sabendo onde estamos.

Mutano ponderou alguns segundos, analisou as alternativas e finalmente concordou, bem mais animado do que a situação pedia:

— Tá legal!

.

.

Gotham, Batcaverna, computador central – 01:13.

.

Diferente de várias outras vezes em que esteve na frente da gigantesca tela de computador, Timothy Drake não estava dando a menor atenção para as imagens que nela apareciam. Ele estava bem mais focado em seu bloco de anotações fazendo rabiscos aleatórios enquanto falava com seu melhor amigo pelo celular:

— Não é difícil de entender, mas nenhum deles sequer me ouviu!

— Tentou não parecer obcecado? Dariam mais credibilidade... — Conner deu seu melhor para soar otimista.

— Eu não estou obcecado sobre isso!

— As simulações que está fazendo há semanas dizem o contrário, Mestre Tim — Alfred palpitou e logo depois bocejou, denunciando o quão exausto já estava.

— Eu te ligo depois. — o rapaz respondeu ao amigo e desligou a chamada. E, só então, encarou o mordomo e se surpreendeu em vê-lo com claros sinais de fadiga — Alfred... — murmurou, sem saber ao certo o que deveria fazer — ... você está péssimo! Precisa descansar! — constatou o óbvio.

— Irei assim que Mestre Dick ou Patrão Bruce chegarem — O idoso respondeu tranquilamente enquanto observava a tela, estava de pé ao lado da cadeira onde Tim estava sentado — Já conseguiu chegar em algo conclusivo?

— Ainda não... — Timothy sussurrou, mas logo depois fez questão de esclarecer que ainda tinha esperanças: — Mas estou perto de algo! As simulações vêm apresentando um padrão cada vez mais próximo, eu só preciso de mais algumas tentativas com mais variáveis para ter certeza de que...! — Ele encarou o mordomo novamente e toda a animação foi embora — ... Não é nada que não possa esperar um pouco. Pode ir descansar, Alfred, eu tomo conta do gremlin até eles chegarem.

— Creio que não é a melhor alternativa...

— Não confia mais em mim, não é? — Encarou o chão — Eu também não confiaria...

— Não se trata exatamente isso... — O mordomo pigarreou, como se estivesse prestes a dar um de seus longos discursos, mas o jovem Timmy o interrompeu antes mesmo de começar:

— Eu sei que não sou a melhor pessoa do mundo para tomar conta de crianças, mas prometo que não vou deixar nada de mal acontecer — Sorriu, um sorriso tímido de alguém que queria reparar os erros — Me dá essa chance, Alfred — Pediu.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, entrada – 01:28.

.

Uma casa grande, escura e com um peso quase tátil permeando o ambiente. Parecia mais uma mansão mal-assombrada do que o lar de um super-herói, ou ao menos foi essa a impressão que Rachel teve assim que colocou os pés do lado de dentro.

Ela deu alguns passos com absoluto cuidado – esperava qualquer tipo de armadilha. Porém, não haviam motivos para tamanha precaução: não havia nada lá que denunciasse o quão paranoico Batman conseguia ser, muito menos algo que remetesse a ele.

Mais calma e ansiosa para ver o companheiro de equipe, a bruxa caminhou pela entrada, pela sala principal e chegou até a escadaria.

Antes que ela pudesse subir ao segundo andar, onde imaginava ser o quarto – ou cativeiro – de Damian, ela notou que havia mais alguém ali. Notou em tempo de se esconder no meio das sombras e esperar até que pudesse continuar suas buscas.

A tal pessoa parecia não ser uma ameaça: cabelos desgrenhados, pantufas e uma blusa preta com o símbolo do Superman, além de um pote de biscoitos à tira colo e o celular precariamente encaixado entre o ombro e o ouvido.

— Não, eu não vou ficar te mandando fotos dele dormindo... Por que é estranho! Dá a sensação de que a qualquer momento ele vai me morder! — Tim fez uma pequena pausa para enfiar mais um biscoito na boca — É, eu sei que o Dami é fofo e tudo mais, mas é estranho e eu me sinto mal mandando fotos dele pra todo mundo! — Fez mais uma pausa para tirar o cabelo do rosto antes de descer as escadas: — Todo mundo é todo mundo: Dick, Babs, Jay... Até o B me pediu fotos dele! O quê? ... Não, não vou colocar na internet, não por enquanto — Deu um sorriso malvado, chegando a pular o último degrau da escada animado com o quão maquiavélico seria se todos admirarem o “adorável Bruce Jr” na internet – serviria também como uma forma de chantagear o pequeno quando ele voltasse ao normal.

Timothy estava tão animado com seus planos futuros que não se deu conta de que havia um intruso na mansão escondido nas sombras.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, quarto de visitas ao leste – 01:31.

.

Ravena precisou cobrir a boca com as mãos para evitar qualquer murmúrio que fosse – até mesmo uma risada. Agora entendia como conseguiram juntar Robin, o filho do Batman, e o adjetivo “fofo” na mesma frase:

Damian estava dormindo abraçado à coberta, trajando um de seus pijamas preferido: o com estampas de patinhas. Parecia só um garotinho qualquer, dormindo, com o cabelo bagunçado e um lastro de baba escorrendo do canto da boca.

Não parecia estar fingindo, muito menos que acordaria de supetão e morderia quem quer que se aproximasse... não parecia Damian, sempre um passo à frente de todos e pronto para tudo – quem, aliás, tinha o hábito de não dormir, ao menos não tão pesado quanto parecia dormir agora.

Ela também reparou no quarto: livros entreabertos, materiais artísticos espalhados sobre uma mesa, televisão e um videogame ainda ligado; várias coisas que um rapaz normal teria ou que pelo menos gostaria de ter, mas o “antigo Damian” não era só um rapaz normal – ele não deixaria suas preferências tão nítidas. Um detalhe curioso é que o abajur ao lado da cama estava aceso, por isso tudo era tão visível, era mais um sinal de que tinha algo de errado.

— Damian... — Ravena chamou em tom baixo e se aproximou um pouco mais da cama — Damian, viemos ajudar você.

Como não teve respostas, ela se aproximou ainda mais e segurou o rosto dele com as mãos. Seria tudo tão fácil se pudesse simplesmente invadir a mente dele e descobrir o que tinha de errado. Porém, era preciso tomar o absoluto cuidado antes de fazer qualquer coisa.

E, antes que ela pudesse ao menos pensar no que faria quando o garoto finalmente abrisse os olhos, ele o fez. A encarou com aquelas duas esmeraldas, assustado, lutando contra as pálpebras pesadas para continuar acordado.

— ... Damian?

— Pe... sade... — Ele se esforçou para tentar falar, uma tarefa realmente difícil quando se está entorpecido — e-lo...

— Pesadelo? ... Está tendo um pesadelo? — Antes que tivesse suas respostas, o rapaz fechou os olhos de novo — Não, não Damian, fica acordado! — Pediu, o puxando para que ao menos ficasse sentado na cama — Dami, abre os olhos — Pediu novamente e, quando já estava prestes a usar seus poderes, o amigo finalmente pareceu acordar mais uma vez:

— E-Ele... me matar... — Sussurrou, tateando até conseguir se apoiar e se manter sentado sozinho, ou ao menos algo próximo disso. Segurava o cobertor com força. — Fug-gir... — A encarou. Estava apreensivo, exalava medo como o último sobrevivente de um massacre.

Ravena o segurou pelo rosto novamente antes que ele tentasse se levantar ou qualquer outra coisa que exigisse controle de si mesmo. Queria respostas antes de tirá-lo de lá, queria ao menos saber com o que estavam lidando, mas primeiro precisava deixa-lo calmo:

— ... Eu prometo ajudar você dessa vez.

.

.

Enquanto isso na Sala da Justiça...

.

— Bruce... — Superman o chamou em um murmúrio — Bruce, a reunião acabou há exatamente cinco minutos — Ele esperou por qualquer tipo de resposta e, como não obteve, continuou a conversa unilateral: — E você saiu dela tem mais de meia hora...

— ... É.

— Bruce, eu sei que tem sido difícil para você. Todos nós entendemos isso... — O homem de aço coçou a nuca, sem saber ao certo como continuar — ... e aproveitamos este tempo em que esteve fora para decidir o que seria melhor para, er... você conseguir lidar com tudo.

Batman o encarou, finalmente.

Durante todo o tempo que esteve fora da sala de reuniões, ele se manteve olhando pela vidraça daquele corredor. Pareceu compenetrado observando as estrelas quando na verdade estava perdido em seu mundo de pensamentos particulares.

— ... E o que seria melhor para mim?

— Você precisa de um tempo.

— O Batman não precisa de nada — Respondeu em um tom frio e voltou a encarar a vidraça.

— Mas o Bruce precisa... — Superman suspirou — É nessa conclusão que chegamos: você precisa de mais tempo. Eu não contei o motivo para ninguém, aliás, nem precisaria...

— ... Nem?

— Digamos que você parado feito uma estátua aqui fora foi um bom argumento! — Respondeu com certa graça — A partir de agora, o Batman vai agir apenas em Gotham a menos que seja estritamente necessário — Sorriu.

— ... Por quê?

— Porque você precisa ficar com a sua família.

— ... Não.

— Bruce, por favor — Suspirou — Se não quer ficar com a sua família, aproveita para dormir então. Melhoraria este seu péssimo humor...

— Damian tem medo de mim.

— Ele tem medo do Batman.

— Tim está chateado comigo.

— Ele é um bom menino, logo vai superar.

— Jason me culpa.

— Achei que a Selina já tinha dado um jeito nisso...

— Dick acha que estou contra ele.

— Bruce, eu poderia ficar aqui o dia inteiro te dando motivos para manter a esperança, mas eu vou falar algo que o Alfred falaria nessa situação: você é um péssimo pai, aproveite este tempo para tentar ser um melhor.

— ... Como?

— Primeiro: sai de perto dessa vidraça. Flash apostou com o Arqueiro Verde que você acabaria quebrando ela com o poder da mente. — Quando o amigo finalmente deu alguns passos a contragosto, bufando, ele completou: — E o Arqueiro Verde apostou que você entraria em combustão espontânea depois! — Soltou uma risada descontraída.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, quarto de visitas ao leste – 01:33.

.

Ravena já havia acendido a luz do quarto e conseguido, consideravelmente, acalmar Damian. Restava agora juntar as peças que tinha e tentar entender tudo o que estava acontecendo para que assim conseguisse ajudar o companheiro de equipe.

— Ele... ele sempre me mata nos pesadelos — Damian tentou explicar de novo. Apontou para as folhas de desenho em cima da mesa, ela as pegou com cuidado e analisou. Alguns desenhos de cães, pessoas e cenas de pesadelos, por assim dizer. A única coisa que se repetia em todas as cenas era uma figura escura e ameaçadora:

— Batman?

Bastou esta palavra para que Damian se contorcesse de dor e começasse a arranhar o rosto mais uma vez. Ravena imediatamente deixou os desenhos de lado e foi até ele, tentou segurar as mãos dele e impedir que continuasse – tinha reparado na mais nova cicatriz na sobrancelha que se formou com o ato, a antiga foi rasgada no mesmo lugar.

— Ele não está aqui! — Ela tentou o acalmar temendo ter acionado algum gatilho na mente dele, o rapazinho já estava inundado de medo mais uma vez — Você não está tendo um pesadelo — Disse com o tom mais sereno que conseguia manter. O segurou pelas bochechas e o forçou a encará-la — Só perdeu a memória, por isso não se lembra de mim... sou a Ravena, Rachel. Sua amiga. — Segurou as mãos trêmulas dele mais uma vez e chegou a uma resolução: — E eu tenho uma chance de consertar tudo agora, só preciso que confie em mim.

.

.

Gotham, Mansão Wayne, jardim dos fundos – 01:37.

.

— ... Cara, eu sou muito pontual! — Mutano sorriu de canto e tirou uma selfie. Nada que revelasse a Mansão Wayne por inteiro, mas o suficiente para que Estelar – quem supostamente conhecia aquele lugar -, reconhecesse. Ele a postou junto com várias outras fotos antigas, nada que despertasse a curiosidade alheia – a menos que alguém estivesse procurando por ele. Depois disso, se transformou em um pássaro pequeno e voou para única das várias janelas, a que tinha a luz acessa.

Antes que pudesse se transformar em uma formiga ou algo tão pequeno quanto para poder entrar, ele viu Ravena jogada no chão e Damian sentado na cama olhando na direção dela.

Não estava fazendo nada além de olhar.

Provavelmente a atacou rápido o suficiente para nada mais ser necessário e agora contemplava o resultado.

Damian era rancoroso e vingativo, só iria esperar até poder fazer “justiça” com quem se recusou a ajuda-lo. Talvez estivesse sendo mantido longe de todos para a segurança do mundo.

No fundo, Mutano já esperava por isso desde o começo.

Ele estava tão cego com aqueles pensamentos que só se deu conta de que já estava dentro do quarto quando finalmente encarou Damian nos olhos. Estava em forma de lobo, encarando o Wayne como uma presa encurralando o caçador.

— O que fez com ela? — O tom animalesco da fala era realçado com um rosnado. — O QUE FEZ!? — Perguntou novamente, pronto para atacar quem veio resgatar antes que fosse atacado também.

Damian, ao contrário de qualquer expectativa, se desatou a chorar.

— E-Eu não sei! — Disse baixo, agarrando o cobertor com força o bastante para deixar os nós dos dedos brancos. Sabia que iria morrer, pois todos os pesadelos prosseguiam dessa forma, mas aquele estava sendo tão diferente... no fundo, perder a esperança de um “sonho bom” doeu ainda mais do que as mordidas que iria receber daquele lobo.

— Está... isso são... lagrimas? — Mutano se aproximou minimamente dele. Estava desconfiado, mas não haviam sinais de luta ali. Assim como não havia sinais de que aquele era realmente o Damian que conhecia. Por precaução, o lobo pulou em cima daquele garoto e tentou o reconhecer pelo odor. Havia morango nas roupas, algo que parecia ser algum tipo de remédio, sinais de cigarro… cheiro do Asa Noturna, Robin Vermelho, Batman…

Damian apenas se encolheu e esperou pela morte.

— No fundo… — Aproximou ainda mais o focinho — É, é você!

.

.

Gotham, Mansão Wayne, jardim dos fundos – 01:38.

.

— Não há de que, Bruce — Superman disse enquanto colocava o amigo no chão.

— Eu não pedi por uma carona.

— Você não precisa pedir — Sorriu. Quando o outro já estava começando a andar em direção à casa, o chamou: — Ah, Bruce...?

— ... Quê? — Este continuou andando.

— Eu sei que está escondendo coisas de mim e da Lois. Entendo que não quer ninguém se metendo nos seus assuntos, mas se quiser conversar...

— Eu não quero.

— Seria bom para… — Clark parou de falar quando o outro parou de andar. Batman virou o rosto minimamente para ele e rosnou:

— Eu. Não. Quero.

— Bem, quando quiser… — Suspirou — Ah, é ótimo finalmente ter aceitado a ideia do Damian conhecer os amigos de novo. Acho que o Jon vai ficar um pouco chateado por não ter sido o primeiro, mas os jovens heróis com quem ele anda sabem lidar melhor com esse tipo de coisa.

— … Jovens heróis? — Ele finalmente desfez a carranca — Mas eu não… — Pareceu analisar as alternativas possíveis com a velocidade de um computador. Aos poucos, o que mais chamava a atenção do Superman naquele lugar não eram as vozes de Damian e de Mutano, o vento passando pelas árvores ou coisas do tipo, mas sim o coração descompassado e apressado de Bruce ao constatar o pior: — MEU FILHO ESTÁ EM PERIGO!

.

.

Gotham, Mansão Wayne, quarto de visitas ao leste – 01:38.

.

— Fica calmo! É só ficar calmo! Vai ficar tudo bem, só precisamos de calma! — Mutano mais parecia tentar convencer a si mesmo enquanto caminhava de um lado ao outro do quarto.

— Eu juro que não fiz nada... — Damian sussurrou pela quinta vez — Ela... Ela só encostou em mim...

— Eu sei, Dami — Mutano suspirou — Não foi sua culpa, eu sei que não foi — Bagunçou o cabelo dele tentando melhorar um pouco os ânimos — ... Você é fofo, sabia? Estranho eu nunca ter percebido isso… não! Eu percebi desde sempre, mas agora não parece um fofinho que me mataria ou… — Bastou olhar para aqueles olhos verdes cheios de lágrimas para se calar — … não matar de matar mesmo, imagina se você iria matar alguém… né? — Deu uma pequena risada nervosa e encarou a amiga estirada no chão, depois encarou a janela com uma esperança fútil de que Estelar chegaria para resolver tudo. Estava apreensivo.

 — ... Eu acho que entendi o que você quis dizer — Ele acabou sorrindo, apesar de ainda não entender como o monstro tomou forma de um garoto normal de pele esverdeada — O mais importante agora é levar ela antes que ele chegue. Você consegue sair daqui com ela mesmo sendo perigoso, não consegue? — Perguntou a ultima parte mais baixo, como se fosse quase um segredo.

— Você vai vir também — Mutano disse convicto. Apesar de não entender as circunstâncias e tão pouco no que tinha se metido, sabia que Damian estava completamente fora de seu habitual, estava indefeso e o pior: parecia estar até mesmo com a razão debilitada.

— Não posso... — O pequeno desviou o olhar — Ele vai ir atrás de mim, vai acabar matando vocês dois também.

— Enfia logo nessa cabeça dura que você não está em um pesadelo, Dami!

— Estou sim!

— Não está! E precisa sair daqui antes que fique pior!

— ... Pessoas verdes não existem! Nem lobos verdes!

— Ah é!? Tá dizendo que eu sou o quê? Fruto da sua imaginação!? — Debochou erguendo os braços. Damian chegou a abrir a boca, mas antes que pudesse retrucar Mutano tomou a palavra novamente: — Nem tenta responder! — Apontou o dedo para ele como uma repreensão.

Antes que a pequena discussão continuasse, um som aterrorizante fez com que os dois rapazes se calassem. Ravena, que até aquele momento mantinha-se imóvel no chão, começou a ter tremores – apesar do corpo parecer tão rígido quanto o de um cadáver -, enquanto parecia se sufocar com o próprio ar.

— Droga, droga, droga, droga…! — Mutano praguejou, estava prestes a entrar em pânico com as consequências devastadoras que aquilo poderia gerar.

— Fica calmo, é só uma crise epilética… — Damian tentou soar otimista, mas até mesmo ele estava nervoso.

— Crise de o quê...!? — Faltava pouco o rapaz de pele verde arrancar os próprios cabelos.

— Vai passar logo, sempre passa.

— Como assim vai passar logo!? Não dá pra parar essa coisa!?

Damian estava prestes a responder com o pouco que sabia sobre o mal que ele próprio sofria, mas antes que pudesse abrir a boca parar falar algo, abriu-a em um grito mudo de pânico enquanto andava para trás com as penas trêmulas.

Não — uma voz profunda e fria respondeu à pergunta, causando calafrios em Mutano. Era Batman.

— S-Senhor Batman, senhor, e-eu... Nós... Er... Não é o que parece! — Ele se aproximou mais de Ravena — Só pensamos que... q-que...

— Pensaram!? Premeditaram isso!? — Ele perguntou da forma mais amedrontadora possível. Não era de propósito, ou melhor, era a única forma dele não explodir e descontar a raiva neles.

— Eu dei a ideia, mas a Ravena quem pensou mais do que eu! — Admitiu, erguendo a companheira de time como podia. Buscou rapidamente por Damian, mas não o encontrou... provavelmente tinha aproveitado a deixa para fugir.

— Fora daqui! — o mais velho ordenou.

— Procurem pelo Sr. Pennyworth, ele vai ajudar a Rachel! — o pequeno Wayne aconselhou, apesar de não sair do esconderijo obvio debaixo da cama.

Mutano apenas obedeceu ao que lhe foi dito.

Ravena, com os tremores mais leves, não estava consciente ainda e tampouco poderia protestar.

Batman sentia seus instintos de justiceiro gritando para que fizesse algo a respeito daqueles invasores. Bruce, por outro lado, só queria tirar aquela roupa e arrumar uma maneira de consertar o estrago possivelmente feito na mente frágil do filho... no fim, aquelas duas metades só formavam um homem frustrado, derrotado e cansado.

.

.

Enquanto isso, na Batcaverna...

.

— É, ele está bem! ... Sim, Jason, eu estou olhando ele de quinze em quinze minutos. — O nerd da família revirou os olhos — Eu já disse que ele está bem! Não precisa vir só porque estou sozinho com ele! — E finalmente encerrou a ligação. Ainda não conseguia entender o porquê de todos se preocuparem tanto com o gremlin, se a situação dele estava controlada ao que parecia.

Ele encarou a gigantesca tela de computador com suas simulações ainda carregando.

— ... Não era exatamente este tipo de pergunta que eu queria responder com as linhas temporais divergentes — Murmurou se recostando na cadeira mais uma vez — ... Eu sou um detetive e sempre procuro motivos! — Passou as mãos pelo cabelo — Mas não...! Preferem ficar brincando de “lar doce lar” com o Damian sem nem ao menos entenderem que dá pra consertar ele sabendo o que aconteceu!

O celular dele disparou o alarme “checar Damian”, atrapalhando temporariamente o monologo de queixas do pobre rapaz. Nada o impediria de ir resmungando por todo o caminho:

— Vá lá, Tim! Mostre para eles o que encontramos! — Repetiu as falas da namorada com ironia — Você deveria saber melhor do que qualquer um, Steph, que o Bruce só se importa com o que ele quer se importar! — Passou as mãos pelo cabelo mais uma vez quando chegou à biblioteca — Eu só quero ver a cara dele quando eu provar que está tudo relacionado! — disse convicto, logo depois suspirando e voltando ao seu habitual semblante de derrota prévia antes que chegasse ao corredor — A quem estou querendo enganar? Eu só preciso dormir... dormir e esquecer o Damian um pouco. Daí sim eu vou poder me dedicar aos meus estudos sem...

E, antes que pudesse completar a frase, Timothy se deparou com o caos instalado na mansão: Ravena caída no chão próxima à escada; Superman abaixado ao lado dela, tentando se decidir entre colocar a pobre garota deitada no sofá ou leva-la para longe de tudo e todos enquanto ainda havia tempo; Mutano, que zanzava de um lado para o outro tropeçando nos próprios pés, falava desesperado com alguém pelo celular.

— ... e agora ela não acorda! Além disso eu tenho certeza que o Batman vai me matar! Se ele não me matar, provavelmente a Ravena vai! Ou você! Mas não importa, só vem logo antes que... Alô!? Alôô!? Ah, cara... é isso: eu vou morrer! Mas que caral... — Se calou antes de terminar, surpreso ao ver o antigo Robin ali.

— ... Ataque intergaláctico? — Timothy perguntou fazendo contato visual diretamente com o mais racional dentre os três.

— Não, não precisa ficar em pânico — Superman avisou — O Br... Batman só anda estressado, mas acho que não vai fazer nada além de um longo sermão sobre invadirem a casa dele e tentarem sequestrar o Damian.

— Certo... — O rapaz murmurou novamente e passou por eles surpreendentemente calmo, subindo as escadas como se absolutamente nada estivesse acontecendo. Tudo poderia ser apenas uma alucinação causada pela falta de sono – na melhor das hipóteses. Virou lentamente a cabeça para trás e constatou que continuavam lá — Droga...

A mente já tinha trabalhado em mais alternativas para aquele caos, todas elas envolvendo o Wayne Jr. e Batman - além da pior possível: Batman perto de Damian.

E, como de praxe, o pior estava concretizado:

No quarto do caçula, havia um Batman estagnado como se estivesse em transe. A criança da casa também estava lá, obviamente, mas estava rudimentarmente escondida embaixo da cama – nem se dava ao trabalho de disfarçar os soluços do choro.

Timmy passou pelo mentor como uma flecha e se abaixou perto do “esconderijo” do irmão mais novo.

Levou algum – considerável— tempo até que conseguisse tirar a criança lá debaixo ao custo de mordidas nas mãos, empurrões, chutes e quaisquer outra coisa que Damian conseguia fazer além de gritar por ajuda, pelos pais, pelos irmãos, pela vida... gritos abafados em meio ao choro que mais pareciam sussurros. Se defendeu como conseguia, como podia... como apenas uma criança assustada.

— Sou eu, sou eu... — Tim murmurou quando finalmente conseguiu abraçar o pequeno — Está tudo bem agora... Foi só um pesadelo.

— Não foi! — Damian tentou se desvencilhar dele uma última vez apenas para olhar em volta e constatar que só haviam os dois ali — Tim, não foi pesadelo, eu juro! Ele estava aqui! E-E tinham mais dois, dessa vez foi um pesadelo diferente! Ele não me matou, mas estava aqui! — disparou o mais rápido que pôde tentando não soluçar entre as palavras.

— Está tudo bem agora... — Afagou os cabelos escuros do irmãozinho — Foi um pesadelo, mesmo parecendo real. Você só deve ter caído da cama e pensou que era de verdade, talvez confundiu a sombra de algo com aquele monstro do seu pesadelo... está tudo bem agora.

— ... Não... — Resmungou tentando manter sua versão dos fatos, mas não havia como retrucar — ... eu vi... — murmurou baixinho, escondendo o rosto e se abraçando a ele — ... eu vi...

— Dami... — Tim tentou soar o mais amigável possível — você está tomando muitos remédios, talvez eles causem essa impressão de ter visto coisas que não são reais...

— ... Era real sim!

Timothy ficou em silêncio. Não sabia como tranquilizar ele agora, nem quais palavras usar para minimizar a situação... a única coisa que poderia fazer era seguir com a mentira ensaiada de que a realidade era um “pesadelo”.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Eu poderia jurar que já tinha mencionado o fato do Alfred não morar na mansão em alguma outra nota final, mas eu não encontrei nada. Tendo dito ou não, cá está:
Em uma entrevista para a Empire, Jeremy Irons (ator que interpretou Alfred em Batman vs. Superman) disse que o mordomo não mora na Mansão Wayne, mas sim em uma casa à beira lago.
Eu pesquisei sobre a moradia de cada um dos personagens quando ainda estava nos primeiros capítulos, foi quando achei esta informação. Tomei isso como uma verdade absoluta e resolvi inserir na fanfic, pois nada faria mais sentido que o inabalável mordomo ter suas horas de descanso longe de qualquer coisa que pudesse interrompê-lo. Aliás, por que não fazê-lo em uma residência humilde e aconchegante que contraste ao luxo da Mansão?
É por isso que em alguns capítulos (Manhã, Cafeína e Choque) fica claro que Alfred não estava lá, mas eu simplesmente me esqueci de apontar onde ele estava. Peço desculpas caso fosse uma curiosidade, eu simplesmente não notei que tinha esquecido de dar esta informação – por mais que eu sinta já ter falado isso antes...



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Reviver" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.