Illusion escrita por leilane


Capítulo 4
Capítulo 4




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Acordar nunca foi tão doloroso.
Mal meu subconsciente tinha voltado a funcionar, me tirando do mundo dos sonhos, e minha cabeça já estava latejando. Meu cérebro parecia querer se libertar do meu crânio, tamanha a dor, e a vontade de abrir os olhos ia se afastando de se tornar realidade cada vez mais. Ordenei ao meu subconsciente à voltar a dormir, me livrando da dor infernal.
Pena que a vida não funciona exatamente como eu quero. E o meu toque de celular nunca pareceu ser um porre.
Tentei localizar meu celular ainda de olhos fechados, tateando ao meu redor na cama e no criado-mudo, mas o barulho insurdescente do toque estava me deixando surdo e sem senso de direção. Rolei na cama para procurar do outro lado, sentido não só um soco no cérebro como também um cheiro diferente no travesseiro ao lado do meu. Perfume adocicado e orégano. Pude pensar sobre isso por dois segundos até outro golpe do meu cérebro no crânio me fazer lembrar do celular tocando.
Vamos, crânio, você consegue vencer essa.
Abri os olhos e imediatamente localizei meu celular sobre o outro criado-mudo, o pegando e atendendo a chamada.
— Tomara que seja você, mamãe, senão eu vou cometer assassinato. - resmunguei no celular, esfregando meu olhos e tentando colocar o quarto em foco.
— Ele ainda fala "mamãe", que bebê lindo. - ouvi risadas conhecidas do outro lado e um pedido de silencio conhecido também.
— Luke, onde você esta? - Ashton era um homem morto.
— Provavelmente no meu quarto. Eu te digo quando conseguir enxergar novamente. - limpei a garganta para continuar - Caralho, que horas são?
— Quase quatro da tarde. - ouvi uma voz falar mais alto, meu cérebro pulando.
— E por que me acord... - então me lembrei num estalo, fazendo minha dor de cabeça parecer joelho ralado perto do que estava por vir - Eu perdi o ensaio?
Ouvi suspiros e bufadas do outro lado da linha. Eu estava mais do que fodido.
— Perdeu metade, por isso estamos te ligando. - Ashton voltou a falar - Corre pra chegar aqui em cinco minutos, Hemmings.
E a ligação terminou por aí. Mas que merda!
Levantei da cama tao rápido que me desequilibrei e quase cai. Fui cambaleando até o que achava ser a porta do banheiro. Precisa de um banho. Tomei a chuveirada mais rápida da história e vesti a primeira muda de roupas que eu achei: a que eu estava usando ontem. Quando coloquei a camisa, senti o mesmo cheiro que estava no travesseiro, e foi quando lapsos da noite passada vieram à minha mente.
O bar. As bebidas. Os olhos. A garota.

"- Você não acha que devia me dizer seu nome, pra eu poder agradecer minha heroína?
         - Boa noite, Hemmings."

E é a ultima coisa que eu lembro antes de apagar. Droga, eu não conseguia ver o rosto dela em foco na minha mente. Nem o rosto, nem o corpo, nem a voz estava perfeita na lembrança. Mas os olhos... Impossíveis de esquecer. Eu os via flutuando, com apenas resquícios de rosto ao redor, mas nunca uma visão completa. Apenas os dois ali, me observando, bem abertos, atentos. Azul e castanho.
Pensar nisso desencadeou uma dor extrema na minha cabeça, então tratei de deixar pra la. Por enquanto.
Peguei meus óculos escuros, um boné, celular, carteira e umas aspirinas que tomei no caminho do elevador até o hall.
Ótimo, fotógrafos. Tudo que eu precisava.
Dei meia volta e fui até a recepção, limpando a garganta quando o funcionário dali não me deu atenção.
— Pois não? - ele levantou os olhos ate mim e abriu um sorriso educado.
— Oi. Preciso do meu motorista, mas tem um mar de fotógrafos na porta e meu segurança não esta por aqui. - minha fala continuava enrolada e tossi para disfarçar.
— Já pensou em ligar pra ele? - sugeriu o recepcionista, um tom de sarcasmo na voz. Que atrevido. Ainda se fosse uma recepcionista gostosa com os botões semi abertos... Ai, cérebro, entendi. Sem pensar muito.
O olhei por cima das lentes dos óculos.
— Esse não seria o seu trabalho? - sorrio falsamente - Ou faça melhor, peça para os seguranças do hotel me escoltarem até um táxi. Eu me resolvo de la.
Eu sentia que ele queria me responder com um palavrão ou me xingar de maneiras piores, mas estava trabalhando.
— Sim, senhor. - e pegou o telefone, fazendo a ligação.
Fiquei bloqueando e desbloqueando o celular por um tempo, sem outra alternativa. Até que os olhos voltaram para me assombrar.
Eles pareciam brilhantes e vivos, não simplesmente pela dona deles respirar, mas por demonstrarem algo a mais. Felicidade, energia, calmaria, como um oceano depois de uma tempestade, ou a terra molhada depois da chuva.
Era curioso e tranquilizador ao mesmo tempo.
— Senhor? Senhor! - pisquei rapidamente e me virei ao ouvir o recepcionista falar - Está tudo pronto.
— Ótimo. - sorri, não desviando meus olhos escondidos pela lente escura - Hey, me diz uma coisa.
— Claro.
— Você estava nesse posto ontem de noite ou hoje de madrugada? - questionei, incerto.
— Não, senhor. Assumi a recepção ao meio-dia. - respondeu impassível.
— Tudo bem, obrigado.
Sai dali a passos rápidos, massageando minhas têmporas, localizando os seguranças a minha espera na porta. Nem me incomodei em ser educado ou sorrir, eles estavam ali pra trabalhar, não fazer amigos.
Sempre odiei fotógrafos e seus flashes incansáveis, vigiando todos os meus movimentos, estando presente em todos os lugares, imortalizando os momentos embaraçosos apenas por prazer. De certa forma, admiro a persistência, mas ainda odeio eles.
Mas existe algo que eu odeio mais que fotógrafos: repórteres.
— Luke, vimos você entrando numa boate ontem e saindo arrastado, quer dizer, acompanhado.
— Luke, você não deveria estar no ensaio? Esta atrasado por causa da ressaca? A farra foi boa ontem?
— Há boatos de que você esta se afastando da banda aos poucos para seguir carreira solo. É verdade?
— Luke, uma palavra aqui. Luke, para as fãs.
— Só uma fotinho, por favor!
— Luke!
Se eu não estivesse atrasado, com uma dor de cabeça de matar, visão embaçada e cercado por seguranças estranhos, eu quebraria alguns gravadores e câmeras. Só que isso daria uma enorme abertura para Ashton fazer um sermão, e não, obrigado.
Segui até o táxi sem nem olhar para os lados, apenas dizendo o nome do estádio para o motorista ao fechar a porta e relaxando no banco até chegarmos.
Tive que driblar mais fotógrafos na entrada, só que já haviam algumas fãs na fila para o nosso show. Foi uma missão impossível entrar pela lateral, mesmo com meu segurança me encontrando no meio do caminho.
— Onde você estava, Luke? - perguntou-me ele quando ultrapassamos a porta em segurança.
— Dormi demais. - respondi entre golfadas de ar, batendo em suas costas - Muito obrigado, a gente se fala depois.
Sai apressado para o palco antes de receber mais perguntas.
Aqueles corredores eram como um labirinto muito bem elaborado. Muitas vezes entrei em portas que davam, bom, para lugar nenhum. Tentei seguir o som dos instrumentos, mas precisei de ajuda para chegar até meus companheiros.
— Quem é vivo sempre aparece! - Calum falou no microfone quando me viu, correndo entre as cadeiras, avançando até o palco.
— Ha ha. - falei simplesmente, pegando minha guitarra do suporte e deixando a assistente colocar os pontos em mim.
— Ashton estava a alguns minutos de dar uma declaração para a imprensa. - disse Michael, afinando seu violão.
— Que declaração? - franzi o cenho.
— "Luke Hemmings, nosso querido amigo e ex colega de banda foi expulso por ser um completo idiota". - completou Ashton, fazendo aquele barulhinho com a bateria. "Ba dun tss".
— Ah meu Deus! - gritei de repente, fazendo os três me olharem assustados.
— O que foi? - perguntou Calum, indiferente.
— Acho que tem alguma coisa errada com a minha mão. - olhei para a mesma, expressando confusão.
— O que tem com a sua mão? - Ashton falou, preocupado. Sabia.
— Me diz você... - sorri, mostrando o dedo de meio para ele, plugando a guitarra no amplificador e dedilhando alguns acordes.
Ashton, mesmo irritado com minha piadinha, entendeu o recado e me seguiu com as batidas, Calum e Michael entrando no ritmo rapidamente.
O resto do ensaio foi normal. Ensaiamos toda a setlist, fizemos as brincadeiras rotineiras, trocamos ideias para os próximos shows e fomos para o backstage depois de tudo estar organizado para o show dessa noite.
— A conversa está ótima, mas eu vou dar uma corrida antes do show. - Ashton se espreguiçou, se levantando - Preciso me exercitar pra manter esse corpinho. Até mais.
— Gostoso. - gritou Michael, rindo.
Ashton bateu na própria bunda e mandou um beijo para nós. Saiu da sala e eu fiquei olhando para a porta.
Alguma coisa batia na minha cabeça, e não era mais uma luta entre meu cérebro e meu crânio. Algo me dizia para ir correr com Ashton, eu só não entendia por quê.
— Ahn, eu vou... eu vou correr com o Ashton... tchau. - levantei, confuso, seguindo apressado através da porta.
— O que deu nele? - foi a ultima coisa que eu ouvi antes de seguir pelos corredores, me fazendo a mesma pergunta.
O que deu em mim?
— Ashton! - gritei quando o avistei.
Ele virou e assumiu uma feição assustada quando me viu.
— Luke? O que foi? - depois fechou a cara - Se for alguma coisa com a sua mão de novo, eu juro que vou...
— Não, não. - sacudi a cabeça, me aproximando devagar - Nada disso. Eu quero saber se posso... Bom, se posso ir com você.
Por um momento ele ficou apenas me olhando.
— Você quer ir aonde?
— Correr... com você. Agora.
— Correr?
— É. Com você.
— Você quer correr? Comigo?
Revirei os olhos.
— Já está ficando chato, Ashton. Sim, eu quero correr com você. Podemos?
E ele caiu na gargalhada. Não literalmente "caiu", pois continuava de pé. Mas eu tenho certeza que não caiu por pouco.
— Cara, se isso for mais uma das suas piadinhas, você está melhorando. - massageou a barriga e apoiou uma mão no meu ombro, me olhando nos olhos.
Quando viu que eu continuei intacto, sem um pingo de alteração, ele limpou a garganta e me olhou sério.
— Você estava falando serio, oh... Claro, pode vir! - sorriu envergonhado - Mas quero ver aguentar o meu pique.
Soltei um riso falso.
— Meu caro amigo, eu transo todo o dia, quase duas vezes ao dia. Se tem uma coisa que eu tenho, além de muito charme e lábia, é pique.
Antes mesmo de eu terminar ele já tinha me empurrado e saído correndo. O segui calmamente, guardando energia para o exercício. Eu poderia estar em desvantagem por ainda ter álcool no sangue e olhos flutuantes na mente, mas eu sou Luke Hemmings: o que eu não sei, eu aprendo e viro o melhor!

 

—_________________________________________________

 

— Pode usar um dos meus shorts. - ele me jogou a tal veste, sorrindo.
Estávamos na nossa van seguindo até o parque em que iríamos correr. Ashton preferiu não me levar pela cidade afora, pois - palavras dele - "caso a boneca desmaie, tem espaço suficiente para enterrar lá mesmo".
Tão engraçado.
— Pelo menos tênis você tem. - ele resmungou.
— Eles são confortáveis. - dei de ombros.
Terminamos de nos trocar e saímos para alongar. Tentamos negociar com os seguranças sobre não correrem conosco, mas quando pisamos fora do veiculo, já percebi que pessoas estavam nos reconhecendo.
— Que merda. - Ashton bufou.
— Pois é. - fiz o mesmo, colocando os óculos - Essas pessoas vão me ver nesses shorts ridículos e pensar o que?
Ele revirou os olhos, mas riu, e saiu em disparada pela trilha.
— Você não vem, boneca? - deu um giro para olhar para mim ao falar, seguindo seu caminho.
Bufei e o segui rindo, tentando manter um ritmo bom. Não demoraram algumas voltas até meus músculos pedirem piedade. Eu quase, repito, quase pedi para Ashton me arrastar o resto do caminho, mas felizmente eu ainda tenho um pingo de orgulho.
— Por favor - falei tentando respirar sem doer - para. Eu te suplico, para!
Um pingo de nada.
— Vamos fazer uma parada. - disse ele rindo, me guiando até um banco na lateral da trilha.
Praticamente me joguei no banco, pois minhas pernas fraquejaram e me obrigaram a cair sentado. Ashton sentou ao meu lado e os seguranças pararam um pouco mais distante.
Enquanto tomávamos fôlego, deixei meus olhos observarem o local. Por causa do estilo de vida que levo, nunca me interessei em sair para conhecer as cidades que visitamos nas turnês, sempre mais interessado em descobrir as mulheres pelo mundo. Eu poderia fazer um gráfico das mulheres que já peguei e quantas em quais países. Mas isso seria inescrupuloso demais até pra mim. Talvez não.
Crianças brincavam em uma pracinha mais distante, mas seus gritos e risadas eram ouvidos claramente. Casais e grupos maiores espalhados pela grama, cantando, lendo ou conversando. Pessoas caminhando ou correndo na mesma trilha em que estávamos, sem falar do grupo de meninas ao longe tirando fotos nossas, se aproximando cada vez mais. Suspirei cansado, da corrida e da perseguição diária, mas as garotas me fizeram lembrar da noite anterior. Quase bufei de frustração, mas algo estalou na minha mente.
Eu devia conhecer alguém ontem.
Alguém devia me encontrar ontem.
Nossa, como eu fui burro.
Obvio que a garota dos olhos coloridos era a amiga da namorada de Ashton, não havia outra explicação. Cutuquei Ashton com o cotovelo para chamar sua atenção, mas antes que eu pudesse começar a galar, seu telefone tocou.
— Espera. - disse antes de atender - Alô? Oi amor.
Revirei os olhos e ele riu.
— Não, estou no parque com o Luke. Sim. Falar com ele? - me olhou - Tem certeza? Tudo bem, vou passar para ele.
Estranhei assim como Ashton, mas peguei o celular. Seria a oportunidade para tirar a prova.
— Sim?
— Luke! Oi.
— Oi. Olha só, eu tenho uma pergunta, antes de tudo.
— Kate. - ela riu do outro lado - Meu nome é Kate.
— Não é isso... - ri, mas a agradeci mentalmente por me relembrar seu nome. Claro que eu tinha esquecido.
— Tudo bem, eu entendo, você conhece pessoas demais, e mulheres demais, para lembrar o nome da namorada do seu amigo. - e o sarcasmo entrou em campo - Mas enfim, queria te pedir desculpas por ontem.
— Desculpas pelo que?
— Por ter ficado sozinho. Eu sei que você não está acostumado a isso, mas eu disse que minha amiga iria e ela acabou desmarcando de ultima hora, você achou que alguém iria te encontrar e pode ter criado expectativa...
Parei de prestar atenção quando ela disse "desmarcando". Bom, se não era ela, poderia ser qualquer outra mulher existente no planeta. Vantagens de ser conhecido mundialmente.
— Tudo bem. - a interrompi, limpando a garganta - Vou passar pro seu namorado, tchau.
Entreguei o celular para ele e peguei o caminho de volta para a van caminhando, apreciando a paisagem de uma loira correndo na direção contraria da minha. Sorri para ela e recebi um sorriso de volta. Até fiquei com vontade de para-la para convidar para o show de hoje quando olhei para o decote dela, mas ela parecia compenetrada na corrida. Não me preocupei muito com isso, afinal, existem muitas mulheres desconhecidas por ai, prontas para cair nas graças do canalha do Luke Hemmings.


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Notas finais do capítulo

E aí? Me contem.



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