Depois da Ruína - O Fim escrita por Bzllan


Capítulo 9
De Dentro Para Fora


Notas iniciais do capítulo

queridos leitores, respirem fundo e leiam esse cap com carinho
se me permitem a recomendação, escutem isso durante:
meet me in the battlefield
between the wars
tomorrow we fight

e eu preciso de um posicionamento sobre esse cap pq eu chorei horrores obrigada



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De Dentro Para Fora - Ilustração Júlia

Ivan tomba sobre Júlia, os dois joelhos dobram, e ela o abraça, ajoelhando no chão com ele. A dor em seu peito é tamanha que nem mesmo consegue respirar. Espera que as balas tenham a atravessado também, mas a dor é diferente. Vêm de dentro.

Ela grita com o garoto ensanguentado em seus braços. Não liga para o homem que aponta a arma para sua cabeça. Ele está há um instante de puxar o gatilho quando seu próprio crânio explode. Atrás dele, Alex empunha a arma com as mãos trêmulas.

— Alex? – A voz de Júlia falha.

As duas trocam um olhar pesaroso antes de o retornarem à Ivan. Seus corações despedaçados.

 

Júlia se senta no chão e, aos prantos, vira Ivan para ela, o apoiando no braço e deixando sua cabeça sobre o ombro. O sangue que sai dos ferimentos em suas costas banham a roupa da garota.

Alex se mantém estática por um segundo, até finalmente tomar alguma providência e correr em direção aos dois. Ela se ajoelha devagar ao lado de Júlia, que não segura os gritos de dor. Ivan a puxa para mais perto, olhando dentro de seus olhos embaçados.

— Pare com isso. – Ele diz. Ivan não imaginara a morte assim. Imaginara que sentiria medo, mas a vida que vivera fora boa. Por causa dela. Deixara seu legado. – Esse é o melhor jeito de ir embora.

Ele seca as lágrimas de Júlia, que não consegue pronunciar uma só palavra.

— Protegendo a mulher que eu amo, nos braços dela.

Júlia lhe dá um beijo molhado, segurando os soluços por um segundo.

— Cuide dele. – Ele pega a mão de Júlia e a coloca sobre a barriga da garota, entrelaçando os dedos com os dela. – Vou estar sempre com vocês.

— Não posso... – Ela se esforça para falar. – Não sem você. 

Ele deixa uma lágrima solitária escorrer. Alex a seca. Os olhos espantados, a boca semiaberta, mas a verdadeira reação ainda não chega para ela.

O irmão a olha e pega sua mão, apertando com a força que lhe resta. Faz seu último pedido.

— Cuide dela, tá bom?

Alex leva a mão à boca, contendo o sentimento. Ela promete com o olhar.

A mão de Ivan se afrouxa devagar da sua. Seu corpo pesa sobre o de Júlia, e ele lhe lança mais um profundo olhar, antes da vida fugir de seu corpo como água escorrendo por entre os dedos da garota.

 

Alex olha do corpo sem vida do irmão para Júlia, que chora copiosamente. Não sabe como reagir. A atmosfera inteira ao seu redor parece estar em silêncio, parada no tempo. Um toque em seu ombro a tira do estado de transe. Ela olha por cima do próprio ombro. Diego a puxa pelo braço em direção à porta, arrancando a arma de Ivan e o walk talk em sua calça. Ela quase se esquece da guerra que estão travando. Pega a própria arma do chão e a guarda no lugar. Deixa que o amigo a guie para fora do casarão.

 

Braços fortes envolvem Júlia pela cintura, a tirando do chão. A tirando de perto do corpo do namorado.

A garota se debate, mas não consegue se livrar. Levi a segura com força, resistindo contra qualquer ofensiva da parte dela. Segura os próprios sentimentos. Eles têm que sair de lá agora, e ele sabe. Júlia sabe, mas não consegue se importar.

Ela olha para o corpo do amado no chão. Sozinho. Banhado de sangue. Os olhos abertos. Merecia um final melhor.

Vendo que Levi não irá soltá-la, sua consciência retorna aos poucos. Ela coloca os pés no chão e foge daquela casa e de tudo, correndo cegamente para o ponto de encontro combinado com Rafael.

 

x

 

Cegamente, Alex segue Diego mata adentro. Não se ouve mais nada a não ser a respiração ofegante dos dois. Ele sabe exatamente para onde está indo e que caminho seguir. Ela percebe o que ele faz - passa a mão pelas árvores ao redor, sentindo um corte bem dado com uma faca. Como na história de João e Maria, o grupo deixara as migalhas.

Quando finalmente os encontram, está escurecendo. Devem ter corrido por mais de vinte minutos, os pensamentos de Alex vazios, os sentimentos mais ainda.

Na floresta que recomeça a mergulhar no reconfortante e pavoroso breu, Diego para. Alex logo atrás dele. As sombras começam a ganhar rosto.

Rafael é o primeiro que se aproxima deles, seguido logo pelos outros amigos. Os olhos de Alex se cruzam com os de Nic por um instante, que corre para abraçá-la, xingando a amiga de insana por ter voltado atrás. Mas ela não escuta.

Há rostos faltando na multidão. Ela se pega procurando pelo rosto do irmão. Logo atrás deles, Levi e Júlia se juntam a eles. Júlia está com os olhos tão vermelhos e inchados que parece ter apanhado.

Olha para frente novamente. Naomi, com o braço enfaixado improvisadamente, olha de Alex para Júlia, os rostos com a mesma expressão. Júlia não consegue sustentar seu olhar, mas Alex tenta. Quando finalmente seus olhos admitem, ela sente o soco na boca do estômago e tapa a boca com as duas mãos, soltando um grito de dor. Sua ficha finalmente cai.

Alex ajoelha na terra. Nic tenta ampará-la, mas entende o que acaba de acontecer. Ele a abraça forte. É tudo que ela precisa, que ele a abrace forte. Mais forte, mesmo que a machuque, porque precisa sentir algo além daquela dor.

Os outros sentem o luto em silêncio. Ela não consegue olhar para ninguém. Deseja desesperadamente gritar, mas se contenta em afundar os dedos na terra até que a raiz das unhas peçam arrego. 

Como um flash em sua cabeça, se lembra da última conversa com o irmão. Os dois sentados no mesmo saguão em que jaz seu corpo, conversando sobre o futuro. Ele construiria uma casa com os pés na areia para morar com a mulher que amava. Ensinaria o filho a surfar. Estava curtindo cada segundo de seus sonhos, arrancados de seu peito com a maior brutalidade possível.

De repente, Alex não se sente mais triste. Sente o peito arder em raiva. Fúria.

Ela aperta seu coração com força. A textura da foto por baixo da blusa a pinica. Ela a alcança e desdobra com carinho. Os olhos embaçados veem a família que um dia tivera. Mãe, pai, e irmão, o qual acabara de assistir morrer.

Ela não se via encaixada naquela guerra até o momento, mas agora é como se fosse chamada em primeira pessoa. Os ombros tremem, mas ela se levanta, guardando a fotografia novamente no peito. Saca a arma que usara para matar o homem que matou seu irmão. Está pronta.

 

x

 

— O que vamos fazer agora? - A voz desconhecida surge da escuridão. Os interessados reúnem-se, aproximando-se, criando um círculo inconscientemente.

— Seguir o plano. - Naomi responde. Júlia permanece de cócoras em seu canto, incapaz de falar.

— Não estão pensando em ir ainda, estão? - Um dos homens do grupo pergunta.

Como se em consenso, todos tiram um segundo para se olharem. A pergunta os pega de surpresa.

— Ainda nem contamos nossos mortos. - Ele fala, mas corrige-se. - Ainda nem sentimos por nossos mortos.

Maia sai de seu canto para responder.

— É por isso que precisamos ir. 

O homem a olha com interrogação nos olhos.

— Não temos escolha. Se ficarmos aqui, nos encontram essa noite, e já era. Não tem pra onde fugir.

— Isso é muito reconfortante. - Gael, cuja voz não é ouvida há tempos, pronuncia-se sarcástico, sendo a voz de seu povo.

— Qual vai ser? - O primeiro homem pergunta de novo.

Um silêncio mortal se segue. Todos pensam em suas vidas e futuros. Tudo depende da decisão que tomarem ali.

— Estão brincando, não é? - Alex, sentada em seu canto, levanta-se para olhar os outros de frente. Ela solta uma risada falsa, ainda engolindo os soluços. - Não estão vendo?

De repente, ela tem a atenção de todos. Mesmo dos que não consegue ver devido ao escuro. As palavras estão com ela. Ela aperta a foto dentro da blusa antes de falar.

— Se decidirem ficar, já estamos mortos. Eles vão nos encontrar antes dessa noite acabar. Eu não vou ficar aqui. - Ela continua. - Se for pra morrer, eu vou morrer levando quantos filhos da puta eu conseguir comigo, e eu não estou falando só desses merdas que estão no nosso encalço, eu estou falando dos merdas mais em cima, os que mandam em tudo, e lucram com nosso sofrimento. 

Ninguém a debate. Alex segura as lágrimas. Têm muito a botar para fora.

— Todos já perdemos entes queridos, não importa quando. Eu acabei de ver o meu irmão morrer, - as palavras saem rasgando por sua garganta. - e é exatamente por isso que eu vou entrar naquela prisão e vingá-lo. Vingar Ivan. Vingar Murilo. Vingar cada uma das vidas que nós perdemos hoje. - Ela vê algumas cabeças concordando com ela. - Porque se eu tiver que morrer hoje, eu vou morrer lá, lutando. E não aqui, chorando. A decisão de vir junto é de vocês.

Os sons da floresta mergulhada na escuridão vem reforçar seu argumento.

— Eu vou. 

Alex procura a voz na multidão. Próxima a ela, escondida na segunda fileira de pessoas, uma mulher de olhos cansados a fita, emocionada. Abraça Carolina em um dos braços e Vítor no outro.

— Vou por eles. - Ela diz para que todos possam ouvir.

Alex se emociona. É uma mãe. Não uma guerreira. Nenhum deles é, mas a vida os cobra naquele momento.

— Nós vamos. - Eduardo olha para o que restou de seu povo, o coração partido.

— Nós vamos. - Carla, a garota que auxiliara na enfermaria do abrigo, fala por ela e pelos próximos. Sente a recente perda da mentora Sra. Kira.

De repente, todos esperam um posicionamento de Alex. Ela respira fundo, emocionada. Um sentimento diferente de tristeza a assola. Emoção, força, raiva, fúria. Tudo mistura-se em um bolo em seu peito. 

Ela olha para as garotas que a guiaram até aquele momento. Júlia está sentada no chão olhando para ela com carregadas olheiras, mas sentimento no olhar. Do lado oposto, Naomi a encoraja com um aceno de cabeça, os braços cruzados. 

— Podemos ser poucos agora, - Ela necessita tirar aquelas palavras do peito. - Mas acabaram de mexer com a família errada. 

Ela olha para a recém tatuagem no ombro. Ainda queima, mas lhe dá uma força que não esperaria ter.

— Vamos destruir aqueles merdas de dentro pra fora de um jeito que não vão nem saber o que os atingiu.




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Notas finais do capítulo

olá de novo ♥ agora podem me xingar



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