Depois da Ruína - O Fim escrita por Bzllan


Capítulo 3
Conversas da Madrugada


Notas iniciais do capítulo

nos vemos lá embaixo hehe



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A noite decide chegar cedo, como esperado. O céu nublado anuncia uma chuva passageira pela madrugada. 

O grupo decidira por passar a noite ali, acomodados cada um em seu canto.

As fogueiras foram apagadas há horas, e à medida que a noite cai, mais escuro fica. Silenciosos, tentam dormir, incomodados com os animais que dominam a mata. O lugar frio e sombrio durante à noite parece o cenário de um filme de terror.

Lídia, como combinado, mantém-se acordada. Encostada em uma árvore de tronco largo, deseja ter os sentidos mais apurados. Se sente inútil olhando para a escuridão vazia.

O barulho de um galho quebrando ao seu lado a faz se sobressair. A silhueta de Maia se aproxima devagar.

— Me assustou. - A ruiva diz.

— Me desculpa. - Maia se senta ao seu lado.

— Não devia estar dormindo?

— Disse ao Rafa que estava sem sono. - Ela sorri com os olhos pesados. Claramente é uma mentira. - Ele perdeu o irmão ainda ontem. Conheço ele. Sei que esconde bem, mas está devastado.

— E como você está? - A ruiva pergunta.

— Vou ficar bem. - Ela sacode a cabeça com os olhos fechados para a lembrança de Murilo morrendo em seus braços sumir.

Um silêncio se segue entre as duas, misturando-se aos sons da mata, tranquilizantes e assustadores.

— Pode perguntar. - A ruiva diz, com um tom de voz amigável, sentindo a curiosidade da garota.

— Ok. Como… Qual a sua história?

— Que pergunta íntima.

— Desculpa, é que… Me ajuda a entender as pessoas.

Lídia concorda com a cabeça.

— Bom, eu tinha catorze. Eu morava com meus pais, mas minha mãe tinha ido viajar à trabalho logo antes da quarentena. Ficou ilhada em Milão, onde a situação ficou feia muito rápido. Demorou alguns dias para sabermos de sua morte. - Lídia diz, fitando os próprios joelhos, a cabeça apoiada em uma das mãos.

— Sinto muito.

— É, foi um período difícil. Não pudemos nem enterrá-la, nem nos despedirmos. Meu pai morreu dormindo uma semana depois. Acho que não aguentou.

Maia imediatamente se arrepende de ter tocado no assunto.

— Me desculpa, eu… não devia ter perguntado.

— Não tenho mais problemas em contar isso, foi há muito tempo. Fico pensando que… talvez os dois estejam juntos em um lugar melhor do que isso aqui em que a gente vive. É bobagem, eu sei.

— Não, nem um pouco. 

Maia consegue sorrir para a recém amiga mesmo no escuro, que retribui.

— Enfim, fui morar com meu tio. Você o conheceu.

A ficha da garota cai.

— Eduardo é o seu tio?

— É, irmão da minha mãe. Nunca me contou como, mas ele e Sara eram amigos de infância. Conseguiu umas vacinas clandestinas e… virou tipo um herói. Ele e Sara, é claro. O crédito fora todo dela. Nos escondemos na cidade por um tempo antes de pensarmos nos bueiros, que acabou sendo mais seguro.

— Não entendo porque Sara não levou mais pessoas com ela… com a gente, no caso.

— É pedir demais pra ela salvar as bundas de todo mundo. Tirou quem conseguiu do trem e arrumou abrigo. Acho que distribuir as vacinas por baixo dos panos foi o jeito dela nos manter vivos.

— Acha que tem mais sobreviventes por aí?

— Com certeza.

Maia ainda não havia parado para pensar sobre pequenos detalhes como esse. O que a garota diz faz sentido.

— Maia?

— Oi?

— Você está exausta. - Não foi uma pergunta. - Vai dormir. Eu não conto pra ninguém.

Maia ri, simpatizando com ela. 

— Ok. Posso dormir aqui?

— Por favor. Ainda me fará companhia.

Maia se deita na terra gelada. O sono a embala devagar, até que ceda ao mesmo. Sonha com Murilo.

 

x

 

Levi se arrepende de ter se lavado no riacho gelado. As roupas úmidas deixam o frio ainda mais cortante, mas a sensação de estar finalmente limpo é reconfortante. Consegue passar as mãos no rosto sem tirar resquícios de tinta preta.

Afastado do grupo, deita de um modo estratégico nas raízes de uma árvore, tentando não pensar na quantidade de insetos que o rondam.

De canto de olho, vê uma sombra se aproximar devagar. Ele força a vista, até perceber que se trata da amiga.

— Não consegue passar uma noite sem mim, não é? - Dá o sorriso zombeteiro de sempre.

Naomi revira os olhos.

— Vim trazer isso. - Ela lhe estende um cobertor. Pequeno e fino, mas quente o suficiente.

— Cacete, onde arrumou isso? - Ele o pega entre as mãos e coloca ao redor dos ombros, sentindo o vento menos cortante em sua pele.

— Uma amável senhora me emprestou. Agradecimento pelo turno de vigia.

— E por que está dando pra mim?

— Emprestando. Porque as minhas roupas secaram, e vocês moleques ficaram ensopados até tarde.

— Pare de me julgar, Naomi, eu estava fedendo.

Ela ri. Ele a observa. Os cabelos e rosto limpos, renovada. Tirando os ferimentos recentes no rosto, pareceria nova em folha.

Ela se distancia alguns passos, mas dá meia volta.

— Posso ficar aqui? Não quero ficar sozinha.

— Eu me sentiria ofendido se não ficasse.

Naomi se senta ao seu lado, tirando o rifle das costas e se acomodando, dividindo a extensa raiz da árvore.

Um silêncio mórbido se alastra, mas não de um modo constrangedor. Apenas desfrutam da companhia durante a noite. 

— O que foi? - Ele pergunta depois de certo tempo.

— Como assim?

— Parece tensa de novo.

Ela força uma risada, passando as mãos na nuca.

— Saudades de casa. Devem estar preocupados.

— Com sorte chegamos amanhã. Aí vai ter uma cama quente, um rango decente… Esse peixe tinha gosto de sal, eu sou muito mais o javali. - Ele diz, brincando.

Naomi ri.

— Eles mereceram, pare com isso.

Ele também se permite rir.

— Você estava se divertindo hoje. - Ele observa.

— É. Foi bom esquecer de tudo por um tempo.

— Não tem que ficar remoendo tudo toda hora.

— Parece que… todo mundo conta comigo o tempo inteiro.

— Isso é porque todo mundo sabe que você vai tomar as decisões certas.

— Não, isso é porque ninguém quer tomar decisão nenhuma, e eu fui estúpida o suficiente pra me dispor a isso.

Ele se vira para ela, com as sobrancelhas cerradas em dúvida.

— Não acha isso mesmo, né?

— Eu acho sim. - Ela ri, sem entender a pergunta. - Eu sou só uma criança mimada.

Repete as palavras de Levi do dia anterior. Ele percebe, e se dói.

— Desculpa, não quis tocar no assunto. Foi sem pensar.

— Sabe que eu não quis dizer isso.

— Quis sim. - Ela se vira para ele. Não diz de modo agressivo, mas questionador. Os dois se encaram. - Eu vou ser sincera agora, e pra última pessoa que eu normalmente diria isso, mas… Eu estou desesperada pro Gabe assumir o comando.

— Você é uma líder forte pra caralho, Naomi. - Ele procura pelo olhar dela, que apenas não consegue ser sustentado. - E… já que estamos sendo sinceros, eu fico pensando se Rilo não estaria vivo se eu tivesse te obedecido. E nós um pouco mais inteiros.

Ela revira os olhos.

— Cala a boca.

— Mas é verdade.

— O que aconteceu com o nosso amigo foi uma tragédia. Ninguém estava esperando por isso, poderia ter sido pior.

Ele abre a boca para argumentar, mas olhando bem nos olhos dela, percebe que Naomi não quer falar sobre isso. 

Sua proximidade o deixa nervoso. Olha dos olhos castanhos da amiga para os lábios, tomando uma coragem que não sabia se teria.

Aperta seus lábios contra os da garota, em um beijo mais desesperado que romântico. Ela se esgueira.

Com os dedos sobre os lábios, olha para o amigo, que sustenta seu olhar, mas sente o rosto corar. Agradece por estarem no escuro.

— Foi mal, eu…

Ele não termina a frase. Naomi deixa seu lado impulsivo a dominar e lhe retorna o beijo, dessa vez mais lento e cheio de desejo, entrelaçando os dedos nos cabelos loiros de Levi.

Levi a puxa pelas coxas, de modo que ela fique em cima dele. A dor no corpo vale a pena.

Os amassos cheios de desespero rumam para algo mais. Ele passa a mão pelas costas desnudas da amiga. Naomi recua.

— Está nervosa? - Ele sorri. Nem na situação irá deixá-la sair por cima.

— Eu… não fiz isso com a mesma frequência que você, se me lembro bem. - Ela se lembra da conversa que tiveram há pouco tempo sobre o passado dos dois.

Ele sorri, dessa vez sinceramente, sem malícia.

— Mas você quer?

Naomi olha para o amigo. Pensa na vida que está levando e em como quase morreram horas atrás. Em como perderam o amigo e a vida é curta. Ela não sabe o que esperar para o futuro dela, nem de nenhum dos colegas, mas sabe de uma coisa. Ela deseja o amigo agora.

Apenas concorda com um sorriso.

— Então relaxa.


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Notas finais do capítulo

EAÍ
POIS É
EU SURTEI HAUHAUAH EU FIQUEI TÃO FELIZ
ai gente eu gosto muito desses dois, não deu



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