It's never too late for love escrita por Lipe


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

O prólogo é sempre mais curto, então espero que consiga te interessar o bastante para que leia os próximos capítulos, que serão um pouco maiores. Comentários são sempre bem-vindos :D



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Let love conquer your mind

Warrior, warrior

Just reach out for the light

Warrior, warrior”

 

E então, meus dedos confundiram-se em um rápido lapso cerebral. Por um momento, eu não pude mais continuar com a música.

Já havia um bom tempo que eu não encostava naquele velho piano, guardado no meu quarto desde os cinco anos de idade. Todo empoeirado, bastava arrastar os dedos sobre a madeira para que minhas digitais fossem tomadas pela sujeira. Naquele momento, entretanto, eu nem me importava realmente com aquilo; o susto, pela falha no seguimento da música, me fazia reparar no quão incomodada eu estava com toda aquela situação.

Mas eu precisava continuar. Por algum motivo, a música me encorajava em momentos como aquele.

 

I’m a warrior

Warrior, warrior

I’m a warrior

Warrior, warrior of love…”

 

No exato momento em que terminei de tocar a música, virei em direção à porta, depois de três fracas batidas. Kate, a mais velha dentre minhas três irmãs mais novas, entrou no quarto com um sorriso triste estampado no rosto. Era bem incomum ela ficar acordada até aquela hora, mas mesmo com todo o barulho que o piano deveria fazer em seu quarto, eu sabia que ele não era o motivo de sua insônia; o mais provável era que, agora que toda a gritaria tinha acabado, ela tivesse tido a liberdade de sair da cama para vir falar comigo. De alguma forma, eu percebia o quão assustada ela estava apenas por encarar o negro de seus olhos, vacilando a cada movimento que faziam.

— Eu adoro essa música… — disse, chorosa.

Ela percorreu todo o caminho do quarto até mim e parou em frente ao piano, esperando por um espaço no banco para sentar. O que eu devia dizer à ela? Era evidente que aquela conversa toda de “não se preocupe, eles vão ficar bem” não iria colar. Especialmente com ela, que já não era mais uma criança. Seus 15 anos lhe davam consciência suficiente para saber que aquele tom de voz só é usado em situações extremas. Extremas... como uma briga de separação.

— Eu sei o que você está pensando, mas não quero ser consolada. — disse, em seguida, tentando não olhar em meus olhos. Ela lera completamente meus pensamentos… — Só toque um pouco comigo.

No fim, acabei não falando nada mesmo.

Eu demorei algum tempo a notar, mas era a primeira vez que ela se sentava do lado direito do piano. Costumava ser o lado com mais notas a serem tocadas e, portanto, mais difícil, especialmente para alguém iniciante como ela. Alguma coragem momentânea? Provavelmente... Isso, ou ela procurava algo mais desafiador que apenas algumas notas graves para esquecer a angústia vivida minutos antes. Ela era a única das irmãs que mostrara algum interesse em aprender a tocar o piano comigo, afinal, mas nunca tivera coragem de arriscar… E, talvez, achasse que esse era o momento certo para fazê-lo.

Passando os dedos sobre as partituras escritas à mão, parou em “I went too far”, outra música da Aurora, cantora a qual, aliás, ela era mesmo muito fã — muito mais até do que eu mesma. Ela sempre foi uma pessoa de extremos: Quando gosta de algo, ama, quando não, o faz com a mesma intensidade.

— Ok, você não precisa que eu te ensine isso, não é mesmo? — brincou, timidamente, de uma maneira que me fez sorrir. — Não é como meus amigos da escola, que não conseguem fazer nada no piano sem a minha ajuda.

Finalmente, posicionamos nossas mãos sobre as teclas. Ela pareceu muito concentrada em conseguir tocar todas as notas, mesmo que seus dedos ainda se confundissem muito sobre a melodia. Eu, que já tinha mais experiência, facilmente acompanhava seu ritmo com as poucas notas que me sobravam, mas eu não conseguia vê-la cometer tantos erros sem sentir o ímpeto de ajudá-la… E eu tentei, mas ela afastou minha mão, gritando comigo com um ar infantil e mimado.

Em uma situação normal, aquilo daria uma péssima discussão, mas eu sabia que não era o momento certo para isso. Tentando ser uma boa irmã, me fiz compreensível; ao menos daquela vez, eu devia isso à ela. E ela seguiu, com as notas cansadas e pausadas do piano soando por todo o quarto, continuando em seu próprio ritmo… Até eu reparar naquela solitária gota de lágrima que escapou de seu rosto, disparando contra a madeira do piano.

Quando vi a cena, senti os olhos marejarem também, mas segurei o máximo que pude para que ela não percebesse, mordendo o lábio inferior enquanto a abraçava. Quando sentiu meus braços encostarem em seu corpo, ela não conseguiu mais se impedir, e o choro escorreu pelo seu rosto. Soluçava como uma criança, e eu imaginei que talvez esperasse que eu ouvisse o som incômodo que aqueles espasmos faziam sem dizer nada.

Eu, entretanto, não podia mais ficar quieta.

— Kate… — Puxei seu rosto para olhá-la cara à cara. Seus olhos permaneceram fechados a maior parte do tempo, enquanto ela procurava resistir à força de minha mão, mantendo-se distante. — Você sempre foi a mais corajosa entre nós… Não consigo te ver chorar desse jeito. Essa não é você, não é a Kateryn que conheço.

Ela se livrou da força que eu fazia e virou o rosto para a frente novamente.

— É melhor eu te levar pra cama. — continuei, por fim.

Ainda abraçadas, lado a lado, levantamos e seguimos calmamente pelo corredor. Como o quarto dela era o primeiro do corredor e o meu o último, acabamos por passar pela porta fechada do quarto das outras irmãs, que parecia silencioso demais para uma noite como aquela. Depois de deixar Kate em sua cama, cobri-la e dar-lhe um longo beijo na testa, segui novamente até a porta silenciosa e me deparei com duas camas mergulhadas na escuridão, ocupadas por pessoas que fingiam não estar acordadas naquela hora.

Presumindo que era por pensarem que a pessoa que abrira a porta era nossa mãe, não eu – afinal, toda criança faz isso e não tinha como saber se era o caso — e por não ter motivos para testar se estavam realmente acordadas, puxei e fechei vagarosamente a porta. Todas estariam seguras em seus quartos agora, de todo modo, e eu teria algum tempo para descer e falar com minha mãe, que com certeza estaria sentada na cozinha como sempre fazia em situações como aquela.

Com a cabeça apoiada sobre as duas mãos, seu choro parecia chegar ao fim quando atravessei a porta da cozinha. Sua mão direita segurava um único e último lenço de papel, enquanto vários outros se espalhavam pela mesa à sua frente. Sentei ao seu lado, e ela olhou-me nos olhos por alguns segundos antes de desatar a chorar novamente.

— Por favor, mãe, acalme-se. Ele vai voltar pra casa. — amenizei, fazendo o possível para transparecer a pessoa mais estável naquela situação. Por dentro, entretanto, sentia um enorme embrulho no estômago. — Você sabe, ele sempre volta.

Eu sabia que ele já não estava mais em casa por conta do barulho que a porta fez logo após a gritaria silenciar. A bem da verdade, eu tinha certeza de que não era a única a ter ouvido aquele estrondo ecoar pela casa e o carro ligar nos segundos seguintes. Além deles próprios, ninguém sabia ao certo o motivo da briga, mas todos sabíamos que, hora ou outra, isso iria acontecer, porque as discussões vinham sendo muito frequentes nas semanas anteriores. Esse era apenas o resultado que já era esperado.

— Não, Kasey, ele não vai voltar. — admitiu, após secar uma última lágrima com a borda de um dos lenços de papel. — Dessa vez… É pra valer.

Era pra valer… E não havia nada que pudéssemos fazer quanto a isso.

Levantei. Já estava tarde e não havia mais nada que eu pudesse fazer, além de ser bom deixá-la ter alguns minutos sozinha para refletir sobre o que tinha acontecido. Antes de sair, porém, fui até a pia para pegar um copo d’água e pude observar que uma chuva muito forte caía sobre a janela à minha frente. A árvore do quintal direito da casa também era visível dali, chacoalhando de um lado para o outro com a ventania que se iniciava. A cena me assustou um pouco, de fato, mas não havia muito o que fazer a não ser subir para meu quarto e me esconder debaixo das cobertas, torcendo para que nada pior acontecesse e para que o dia seguinte chegasse logo.

Fazendo de tudo para me desligar do mundo e de meus pensamentos conturbados, acabei dormindo mais rápido do que esperava. Um sono pesado. Um sono sem sonhos.

 

 

Assustada pelo caos que parecia se reiniciar, acordei por volta das 3h30 com muito barulho no andar debaixo. Desci correndo as escadas, ouvindo o som de sirenes do lado de fora. A polícia estava à frente da porta, e eu me aproximei bem a tempo de ouvir a notícia que faria minha mãe desmaiar de assombro:

“Sinto muito por ter de dar as más notícias, senhora, mas seu marido está no hospital. Ele sofreu um grave acidente e está internado… e a situação não está nada estável.”

 

—~*~-


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