Recomeço escrita por JN Silva


Capítulo 3
O acampamento


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal
Como podem observar, este capítulo demorou bastante kk
Ele me deu mais trabalho do que achei que daria
Dei uma rápida revisada, me desculpem se encontrarem ainda qualquer erro.
Boa leitura :D



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Snape não conseguiu disfarçar a expressão de confusão e surpresa quando o leão falou com ele. Estaria sonhando? Delirando? Talvez não tivesse morrido, afinal... provavelmente o veneno de Nagini o havia feito desmaiar apenas (e não morrer) e a febre devia estar lhe causando alucinações. Se bem que, tudo o que havia vivido e presenciado desde o Nada até o momento presente fora tão real! Além disso, sua mente estava presente e consciente em todos os momentos, e seu corpo não perdera a capacidade sensorial, como costuma acontecer nos sonhos.

O homem não pôde articular palavra alguma. Apesar de sua coragem e sua força, não podia negar que era estarrecedor estar diante de um felino tão grande e tão peculiar. Aquele animal, sentado, era pouco menor que Snape em pé! Além disso, suas expressões e seus gestos, tinham algo de muito humano, ou melhor, algo muito mais do que humano. Seus grandes olhos dourados, ao mesmo tempo em que transmitiam bondade e paciência, possuíam uma autoridade intrínseca que o tornavam ameaçador. Sua voz, apesar de serena e musical, possuía uma gravidade e poder que fariam estremecer de medo um batalhão. Era adorável e terrível, o que fazia com que olhar para ele fosse, ao mesmo tempo, irresistível e insuportável. Talvez, por esse motivo, é que Snape ficara pregado no lugar em que estava, sem coragem de se aproximar mais, e, no entanto, sem a menor vontade de se retirar da presença dele.

Havia entre eles uma distância de uns dez ou quinze passos largos. O leão continuava a contemplar o mar, tranquilo, com uma expressão solene no rosto dourado. O sol já havia subido um pouco mais no céu, lançando seus primeiros raios sobre a areia branca. Não se sabe se era efeito dos reflexos solares, ou se realmente era possível ver uma luz branco-perolada em torno do leão, como uma aura brilhante e translúcida, o que lhe conferia um ar de pureza e majestade. Essa visão causou certa impressão em Snape, tão intensa quanto paradoxal.  De um lado, experimentava uma sensação confortadora, como se tivesse encontrado o que a vida toda procurara (ainda que não soubesse exatamente o quê), um sentimento de volta para casa ou de vazio preenchido. De outro lado, essas mesmas impressões lhe lembravam de sua indignidade e, por esse motivo, não ousava chegar mais perto daquele ser fascinante, ainda que o quisesse. 

— Desculpe, acho que não o conheço... – disse o homem, quando finalmente conseguiu quebrar o silêncio, preenchido apenas pelo marulhar das ondas.

O leão sorriu levemente, ainda com o olhar longe.

— Realmente, você nunca me conheceu, apesar de eu conhecê-lo bem.

— Isto é impossível...  – retorquiu Snape - jamais estive aqui.

O leão, porém, deu uma risada sossegada, como se achasse graça da inocência do homem.

— Severo Prince Snape, não é? De Cokeworth, Inglaterra...

O rosto de Snape assumira uma expressão de choque. Como aquilo era possível? Antes, porém, que pudesse articular qualquer palavra, o leão continuara a lhe falar.

— São muitos os que se perdem, filho de Adão, e você quase foi um deles. Fico feliz que tenha ouvido meu apelo e vindo a mim...

— Você me trouxe até aqui? – perguntou Snape, lembrando-se da canção.

Compreendia agora que tinha sido propositalmente atraído para lá.

— Sua contrição e seu desejo final foram acolhidos. Estendo diante de seus olhos uma nova oportunidade de recomeçar. Se aceitar os propósitos que tenho para você, sua vida começa a partir de agora...

Snape pusera-se a refletir por um tempo, no significado daquelas palavras.

— O que quer de mim?

O leão se levantou e deu alguns passos pela areia, com uma expressão grave no olhar.

— O mal está sempre à espreita, filho de Adão, esperando uma oportunidade de lançar seus ramos de sombra. Um grande perigo se aproxima, vindo do Extremo Ermo Ocidental; se não for combatido agora, se expandirá a tal ponto que mergulhará Nárnia em trevas e morte. Esta terra é muito amada por mim. Preciso de corações valentes e fiéis, dispostos a lutar.

Snape o ouvia atentamente. Ainda que não conhecesse ao leão e muito menos àquela terra, as palavras tinham impacto sobre ele. Lembrara-se de seu próprio mundo, da ascensão de Voldemort, e de toda a desolação que aquele mal causara. Ele nem mesmo soubera o desfecho da história, se o Lord das Trevas fora destruído ou não...

O leão voltara um olhar grave e solene para ele.

— Os inimigos têm arquitetado planos obscuros em segredo. Como uma sombra silenciosa, avançam cada vez mais rápido para as terras habitáveis. Não haverá esperança de vitória se os deixarmos ganhar tempo e espaço. Tenho sua fidelidade?

Snape andou alguns passos pela areia, considerando a proposta. Não havia praticamente nada a perder, no entanto, uma pequena parte de sua razão lhe apontava a loucura de se engajar em uma possível guerra, em defesa de uma terra que nem conhecia. E depois, sentia-se velho e cansado. Empreendera a maior parte de seus anos em uma guerra estratégica e silenciosa que, por fim, eclodira em uma guerra física, de efeitos trágicos. “Pensei que encontraria descanso, logo depois que morresse...” pensou, sorrindo consigo mesmo, sem humor. Mas em resposta a esse pensamento, uma lembrança surgiu, fazendo sua consciência pesar: ele havia desejado uma última oportunidade e agora a tinha. Iria desonrar sua palavra?

O homem ficou assim por algum tempo, em silêncio, com o coração e a mente divididos.

— Diga-me o que está pensando, descendência de Adão...

Snape fitou os olhos dourados, cheio de incerteza.

— Não sei o que lhe dizer. Uma parte de mim quer lutar por esta terra, mas a outra... não sei, me parece loucura lutar por algo que sequer conheço...

O leão passara um longo tempo encarando a face pálida do homem, com um olhar sério, sem nada dizer. Snape tentou sustentar o olhar, mas não aguentou e baixou os olhos para os pés, como se sentisse vergonha do dissera. Ainda era difícil contemplar aquela face áurea por muito tempo.

— Deve saber – disse o leão, por fim – que o coração humano é um campo de batalha. Há luz e trevas dentro de você. Escolha o que vai alimentar.

O tom sério e quase severo com que o leão lhe falara, impelira-o a tomar sua decisão. Ele havia feito uma promessa e não iria desonrá-la.

— Está bem, eu aceito sua proposta. No entanto, não sei como posso ajudar. Ao que parece, meus poderes não funcionam aqui.

— Isso é porque você não os possui mais, filho de Adão. Nesta terra, é um homem comum, como qualquer outro. Tudo o que o possuiu ou foi, pertence ao seu passado. De agora em diante, deverá aprender a lutar como os outros.

Snape pareceu chocado e quase indignado com aquela revelação. Como assim perdera seus poderes? Suas maiores habilidades e talentos? Ele, que a vida toda fora mestre, teria, agora, que sentar-se no banco dos aprendizes?

— Mas... porquê?!

— Em Nárnia só existem dois tipos de magia: a Magia Profunda e a Magia de Antes da Aurora do Tempo. Eu estava lá quando foram escritas.  A elas ninguém tem acesso, senão eu.

O homem suspirou, ainda um pouco consternado, mas haveria de se conformar. Se o leão assim determinara, então que assim fosse.

— Devemos partir agora... o tempo é curto e há muito a ser feito – disse-lhe o leão.

Então, dirigiu seu olhar ao longe, onde um bando de cavalos selvagens corria pela beira da praia, salpicando água para todos os lados com o impacto de seus cascos sobre a areia molhada.

— Ágata... – chamou, com voz suave.

De início, parecia que nada ia acontecer. Pouco tempo depois, porém, uma égua baia separara-se do bando, galopando na direção deles. Chegando diante do leão, curvou-se diante dele, em reverência.

— Ao seu dispor, Aslam.

— Preciso que leve este nobre amigo ao seu destino. É uma longa jornada para ser feita a pé. Eu lhes mostrarei o caminho.

— Como desejar... – respondeu, solícita.

 Em seguida, caminhou até Snape, abaixando-se diante dele, a uma altura que ele conseguisse montar. Ágata também parecia bem maior que os cavalos comuns.

— Suba em minhas costas, humano. É uma honra levar um amigo do Grande Leão. Segure firme em meu pescoço. Não há necessidade de segurar ou puxar minha crina, porque isso dói demais. Mantenha as pernas juntas aos meus flancos e segure-se bem, não há risco algum.

Snape fez como ela havia dito, certificando-se de que estava bem seguro. Tão logo montou, ouviu a voz de Aslam ressoar:

— Me acompanhem, não há tempo a perder.

A partir de aí, deu-se início a uma longa cavalgada, que estaria longe de terminar. Aslam corria adiante, indicando o caminho. Entraram pela floresta virgem que margeava a praia e embrenharam pela mata adentro. De início, Snape teve se abaixar bastante, quase encostando o rosto ao pescoço da égua, para proteger-se dos galhos das árvores e de espinheiros. Era uma vegetação densa e difícil de atravessar. Esse percurso do caminho, Snape nem notara. Mantivera a cabeça abaixada e os olhos fechados, com força. Tudo o que pudera perceber é que era uma floresta escura e silenciosa. Mesmo se protegendo o melhor que pôde, não conseguiu evitar alguns arranhões no rosto e nas mãos.

Após atravessar a barreira verde, estendia-se diante deles uma colina escarpada, de vegetação rala e descontínua. Alguns arbustos surgiam aqui e acolá e uma camada de pedregulhos cobria alguns trechos do caminho. Como era uma descida íngreme, desceram-na com bastante cuidado. Esse pedaço do caminho levou algumas horas para ser transposto. Depois da colina, havia um extenso campo verde à frente deles. Ágata voltava a correr como o vento.

A viagem durara várias horas e seria cansativo descrevê-la toda. Ao longo do caminho, fizeram algumas pausas, para comer e descansar. O que é possível dizer, é que o homem ficara encantado, na medida do que podia observar, com os cenários quase surreais que presenciara: os campos de urzais, as águas brilhantes e rumorosas dos rios batendo contra as rochas em seu serpear, as revoadas de pássaros que pareciam cobrir a abóboda do céu numa miríade de penas coloridas. Além disso, a presença de Aslam, que lhes guiava o caminho adiante, era como um alimento para o espírito. Estar na presença dele era algo indescritível. E a corrida de Ágata lhe provocava uma grande sensação de liberdade. Todas essas sensações, há muito tempo, eram desconhecidas para Severo Snape.

Quase ao fim da tarde, chegaram a um vale, no qual parecia estar montado um acampamento. Havia muitas tendas e pavilhões, e grupos de homens e criaturas estranhas movimentando-se para lá e para cá, em vestes militares. Snape apeou da montaria.

— Aqui, carne de Adão, começa a sua aventura... – disse-lhe Aslam, de modo inspirador.

E virando-se, para Ágata, agradeceu-a.

— Seu auxílio foi de grande valor, filha. Seu esforço será recompensado. Que seus cascos sejam sempre fortes e nunca lhe falta uma relva macia.

E assim dizendo, soprou suavemente sobre ela, como uma benção. A crina branco-acinzentada esvoaçou ligeiramente ao toque do hálito morno. A égua curvou-se diante dele, reverente e agradecida, e partiu. Aslam e Severo começaram a descer pelo caminho. Quando estavam na metade do caminho, um centauro avistou-os com grande espanto, sinalizando para os outros a presença dos dois. Todos os outros soldados, que os puderam ver, organizaram-se em uma linha de frente e curvaram-se respeitosamente, bradando:

— Salve Aslam, o Grande Leão!

Alguém no meio deles disse:

— Devemos avisar o Grande Rei Pedro!

E saiu, entrando em uma espaçosa tenda vermelha, com o desenho de um leão dourado estampado na lona.

Pouco tempo depois, não foi sem uma grande surpresa que Snape viu um garoto sair da tenda, em vestes reais, e vir ao encontro deles.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado
Bjs!



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