ATENA

O convite chegou rápido e inusitado, assim como qualquer notícia ruim.

O envelope cor de rosa em minhas mãos continha um pedido cortez, mas ainda assim incômodo, como tudo que vinha da deusa do amor. Afrodite era uma deusa que não poupava esforços para conseguir o que queria e, quando seus desejos envolviam sua festa de aniversário, tudo se tornava mais intenso do que deveria e as coisas tendiam a saírem do controle.

Abri o envelope devagar, internamente desejando que fosse apenas um bilhete despretensioso, talvez contando uma nova fofoca, como ela tanto gostava de fazer. 

Infelizmente, sabia que estava errada. Eu deveria saber que essa hora iria chegar.

Querida Atena,

Como você já deve ter imaginado, o meu aniversário de quatro mil anos está chegando! E, é claro, essa data não será deixada em branco. 

Eu diria que este é apenas um convite, mas na bem verdade é uma convocação.

Parabéns! Você é importante o suficiente para seu nome estar na lista dos seletos convocados para a mais exclusiva e espetacular festa que o Olimpo já viu, o Carnaval Escarlate!

Beijinhos, querida.

Lady Afrodite

Lentamente, deixei suas palavras se assentarem sobre mim. Convocada? Afrodite deve ter perdido sua noção de vez! Quem ela pensava que era para me convocar para algo tão bizarro quanto uma de suas festas?

Caí para trás em minha cadeira novamente. Eu não admitiria isso nem sob tortura, mas não sabia como lidar com aquilo. Talvez sair à sua procura e tirar satisfações não adiantaria muito. Eu conhecia a deusa do amor bem o suficiente para saber que ela não cederia e acabaria por tornar a discussão um espetáculo por si só. Se Afrodite tinha se dado ao trabalho de nomear sua própria festa de aniversário, com certeza planejara o evento nos mínimos detalhes. 

Carnaval Escarlate. Refleti sobre o título e sobre o que ele poderia estar implicando. Ela realmente não poderia achar que nos forçaria todos a vestir fantasias bobas para passar dias a fio festejando, como os mortais costumavam fazer.

Algo assim era esperado de Dionísio, mas saber que era Afrodite quem estava orquestrando tudo me dava um arrepio de terror. O que esperar de um evento assim? 

Passei minha mão pela testa franzida e pensei em quatro mil desculpas para fugir de seu aniversário. Nenhuma delas, porém, boa o suficiente para me salvar. 

Lamento, vai ser no dia do meu torneio de xadrez.

Sexta? Aquela sexta? Ah, querida amiga, vou estar ocupada catalogando minhas enciclopédias. 

Pelas barbas de Zeus, eu esqueci que tenha que levar minha coruja para passear.

Meus olhos correram pelo convite uma vez mais e, então, percebi um detalhe importante. Ou melhor, a ausência de um.

Em nenhuma parte da convocação estava dizendo para confirmar presença, muito menos informando onde e quando a suposta festa seria. Sorri sem conseguir me controlar, sentindo o alívio relaxar meus ombros até então tensionados. Se eu não sabia onde deveria comparecer, então não poderia comparecer de qualquer forma.

Um descuido tão pequeno da parte de Afrodite, que provavelmente escreveu seus convites sonhando tão envolta com sua festa extravagante, que não lembrou de informar aos seus convidados a parte mais importante.

— Uma pena, Afrodite  – suspirei em minha poltrona. – Talvez no ano que vem.

Abri a última gaveta de minha escrivaninha e coloquei o envelope cor de rosa debaixo de todos os outros papéis – plantas baixas, rabiscos, cálculos e tudo o que não despertava interesse em mais ninguém –, de modo que ficasse bem escondido. 

Convite? Que convite? Ah, Afrodite, seu emissário deve ter se perdido.

Sabe como as coisas são, Hermes sempre perde uma carta ou outra no caminho.

Me permiti um pequeno sorriso de vitória. Essa passou perto.

Finalmente, pude voltar minha atenção às coisas que realmente importavam. O dia estava abafado e eu gostaria de sair do escritório para tomar um banho o mais rápido possível. Em pouco tempo, Afrodite era menos do que uma lembrança embaçada em minha mente.

Não seria assim por muito tempo, no entanto. 

Eu só não tinha ciência ainda.