Drania escrita por Capitain


Capítulo 9
manhã


Notas iniciais do capítulo

atrasado e curto.
mil perdões.



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Eu acordei um pouco menos confusa do que quando fora dormir. O sonho que eu tivera fora tão real, tão detalhado. E diferente dos sonhos que eu tinha quando viva, aquele sonho não se desviara nem um pouco da realidade. Era como uma lembrança, só que mais em foco, como se eu tivesse voltado a ter doze anos, e revivido meu primeiro encontro com Alice. De repente, eu sabia um pouco mais a respeito de quem eu era. Então eu percebi que morrer tinha realmente apagado parte de mim.

Não só memórias, ou as minhas pernas, ou necessidades fisiológicas como comer. Morrer tinha apagado parte da minha personalidade. A garota que eu era no meu sonho era muito mais decidida, muito mais forte, mais... viva. pode parecer um pouco óbvio, mas eu não tinha percebido até então o quanto o Vazio havia tirado de mim. Eu tinha esquecido como era viver. Imagino que isso seja natural, de certa forma. Morrer muda completamente as suas perspectivas sobre a vida. Mas eu não tinha percebido até agora o quanto aquilo era triste.

O acampamento estava vazio, e o fogo, apagado. A floresta estava em silêncio, e eu estava deprimida. Tudo o que eu queria era voltar a ser a Drania do meu sonho, correndo por aí, atendendo bêbados na taverna do Greg, rodando os malditos guindastes do porto. Mas eu estava ali, morta, fugindo de um culto maluco, com um orc e uma bruxa. falando nisso, onde eles estão?

As coisas de Goroth ainda estavam na área de acampamento, e nada parecia ter sido mexido muito, então deduzi que ele e Aurora estavam nas proximidades. Talvez Aurora houvesse acordado, finalmente. Resolvi procura-los. Demorou algum tempo para reaprender a melhor forma de flutuar, e eu atravessei algumas árvores antes de conseguir me estabilizar no ar. Encontrei-os quase imediatamente, sentados lado a lado no limiar da clareira, como se contemplassem as ruínas da casa da bruxa. Exceto que nenhum deles olhava para lá.

Aurora tinha a mão firmemente pressionada contra o peito de Goroth, enquanto murmurava palavras inteligíveis. Antes que eu tivesse tempo de me perguntar se devia estar ali, algo parecido com uma esfera de luz deixou o corpo de Goroth, e foi absorvida pela mão de Aurora. Por alguns instantes, um círculo de luz brilhou no chão, ao redor dos dois, e depois desapareceu. Aurora respirou fundo, e deixou-se cair, segurando o braço do orc em busca de apoio.

A bruxa foi a primeira a falar.

— Obrigada – ela disse – estou bem melhor agora.

— Mas ... – o orc olhava para os curativos enormes nas costas da bruxa – você não...

— Curar todos os meus ferimentos exigiria muita energia – ela respondeu – mais do que você tem a oferecer. Eu curei as partes importantes. Meus pulmões, minhas costelas. O resto são só músculos, e eles vão ter que esperar.

Goroth aquiesceu. Alguns segundos de silêncio se passaram, e eu me perguntei se devia interromper a conversa dos dois. Mas eu pensei demais, e o momento passou.

— Vamos ter que ir à caverna. – Goroth disse, de repente – é nossa única opção.

— Tem certeza? – aurora respondeu, parecendo bastante consternada. – E quanto ao seu...

— Com sorte, não teremos que lidar com eles – Goroth desconversou imediatamente. – Assim que a fantasma acordar, iremos juntar suprimentos e partir. Você consegue andar?

— Até parece que você vai me deixar caminhar – ela sorria.

— Eu tinha que perguntar. – Goroth se defendeu – do jeito que você é orgulhosa, era capaz de se ofender por eu te carregar.

— Eu até caminharia – aurora não pareceu ofendida pelo comentário – mas não me sobraria energia para ensinar Drania no caminho.

Ele ficou em silêncio por um momento.

— Você confia nela? – ele perguntou.

Eu imediatamente me escondi dentro do tronco de uma árvore. Estava curiosa para saber o que a bruxa achava de mim.

— Como assim? – Aurora replicou, visivelmente surpresa pela pergunta.

— É que... – Goroth suspirou – o culto de Kraaz está atrás dela. Ela não sabe fazer nada de útil. Não sabemos quem ela era antes de morrer, e mesmo que o contrato a prenda, e se ela...

Aurora olhava fixo nos olhos de Goroth.

— Tem algo mais, não tem? – ela perguntou, num tom mais sério – você nunca duvidou das minhas escolhas antes, Goroth. O que te preocupa tanto a respeito dela?

O orc olhou ao redor antes de responder. Por um segundo, seus olhos pairaram sobre a árvore em que eu estava escondida, e mesmo estando dentro do tronco, eu achei que ele tinha me visto. Mas ele desviou o olhar, e suspirou outra vez.

— Eu já ouvi o nome dela antes. – Ele disse – Drania. Significa desgraça na língua dos orcs. É um mau presságio.

Aurora exibiu um sorriso sarcástico.

— Eu não achei que você fosse supersticioso, Goroth.

Ele sacudiu a cabeça.

— Não, não é isso, é só... – ele suspirou novamente – porque você a escolheu?

— Eu não sei – Aurora respondeu. – Eu estava só procurando, e eu só... A ajudei. Eu senti algo diferente nela.

— “algo diferente”? – o tom dele era incrédulo – os fantasmas não são todos a mesma coisa?

— A maior parte dos fantasmas é só uma sombra, um espectro pálido e disforme do que eles eram quando vivos, cheios de raiva e ressentimento, mas ela... – Aurora levantou a cabeça, o olhar fixo nos olhos de Goroth. – Eu senti algo no futuro dela, Goroth. Há caos. Muito caos. Mas também... Eu acho que ela ainda vai ser alguém grande, uma pessoa realmente importante no futuro. Foi isso que eu senti.

Goroth bufou uma pequena risada.

— Agora, quem é que está sendo supersticiosa? – ele falou – magos não podem enxergar o futuro, ninguém pode. Não me venha com essa de “sentir”.

Alguém grande? Uma pessoa importante? Eu sequer era uma pessoa. Não era humana nem quando estava viva. O que Aurora estava querendo dizer com aquela loucura?

— Eu estou falando sério, Goroth. – Aurora o segurou pelo braço de novo – existem coisas maiores do que eu e você, e Drania chega bem perto de ser uma delas. Eu sei que não acredita em destino, mas acredite em mim, eu tenho um bom olho para essas coisas.

— Ah, fale sério, isso é diferente – Goroth disse – ela é...

— Se destino não existe, e ela não é especial, então porque o culto está atrás dela?

Goroth se calou. Se havia algo que ele queria dizer, ele guardou para si. Então Aurora acreditava que eu tinha um tipo de grande destino. Como se isso existisse. Eu só precisava encontrar Alice. O destino que esperasse.

— Então, o que vai fazer? – Goroth deu-se por vencido.

— Eu vou cumprir minha parte do contrato. – Aurora disse – vou ensiná-la tudo o que eu sei. E depois... ela vai descobrir o que fazer.

— E o assalto?

Aurora ajeitou o vestido, cobrindo os curativos nas costas, e então apontou para eles com a cabeça.

— O assalto teria que esperar de qualquer jeito, não é?

Ela pôs-se de pé com dificuldade, e começou a caminhar rumo às ruínas da sua cabana. Assim que pude, flutuei de volta ao acampamento, deixando Goroth sentado à beira da clareira. De certa forma, eu estava feliz. Naquela manhã, descobri duas coisas que seriam muito importantes nos próximos dias.

Aurora acreditava em destino.

E Goroth não gostava de mim.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

até o próximo!