Pokémon - Cicatrizes escrita por Golden Boy


Capítulo 5
Déja Vu


Notas iniciais do capítulo

Esse é o capítulo que mais gostei de escrever até então. Espero que goste de lê-lo :)



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Archer girou o cigarro na mão. Esse fora um dos poucos hábitos que adquirira durante seu tempo em cárcere. Não fumar, mas girar coisas entre os dedos. Começara com moedas, depois canetas, e agora cigarros. Era uma boa forma de manter suas mãos ocupadas quando estava nervoso.

    A fuga não tinha sido uma tarefa fácil. Foram necessários quatro agentes Rocket e meia dúzia de pokémon. E a maior parte desses tinha sido presa, para que Archer pudesse recuperar sua liberdade. E tudo isso tinha sido arquitetado por Libra, a mulher que o esperava do outro lado da porta.

    Archer jogou o cigarro no cinzeiro acima da lixeira ao seu lado, ajeitou a gravata e entrou. Ele não sabia muito bem o que esperar. Por um lado, queria que fosse Giovanni com um codinome novo. Seria bom ver o fundador da organização retornando às atividades, ainda mais depois de tanto tempo de férias. Por outro, queria que fosse Ariana ou Petrel. No fundo, ele sabia que eles não ficariam escondidos por tanto tempo. Mas se fosse qualquer um desses, por que um nome novo? E se fosse, realmente, alguém novo, por que agora? E como esse alguém tinha conseguido organizar tão bem os recrutas e mercenários Rocket para esse plano?

    A primeira coisa que Archer notou em Libra foi a cor de seus olhos. Lilás, como em um desenho animado. Eram quase hipnóticos. Ela estava de pé, vestindo um uniforme branco com um R estampado na altura da lapela esquerda.

    — Olá, Archer. — ela disse, com uma voz suave. — É um prazer finalmente conhecê-lo.

    — Igualmente. — Archer respondeu de prontidão. — É Libra, não é?

    — Sim, é assim que me chamam por aqui. — Nessa frase, Archer notou um leve sotaque. Um sotaque de Sinnoh. — Imagino que tenha perguntas.

    — Sim, de certo. — Archer explorou a sala com os olhos. Um pokémon translúcido no fundo da sala, tão imóvel quanto poderia. Olhos grandes, pouco mais de um metro. Quase perfeitamente camuflado. — É um Kecleon ali?

    — Ah? — Por um segundo, Libra se esquecera da presença de seu pokémon. — Ah sim, o Virgo. 

    Archer assentiu sorrindo. Ele gostava de estar de novo naquele ambiente, cercado por pessoas com o mesmo código moral.

    — Qual o objetivo dessa nova Team Rocket? — A pergunta pegou Libra desprevenida. Por tantos meses ela planejou o retorno, a grande inauguração da Team Rocket, a fuga de Archer. Comprou lugares que serviriam de esconderijo para os membros. Mas… o objetivo? O mesmo de sempre, oras! Mas ela sabia que essa resposta não bastaria a Archer. Ele era esperto, e não se contentaria com isso. Se Libra não se mostrasse uma boa líder, ele usurparia seu lugar sem pensar duas vezes. 

    Archer era um Mightyena, e Libra se sentia uma indefesa Mareep diante dele.

    — Usar o poder de Celebi para recriar o experimento M2. — disparou Libra, e ela torceu para que a resposta não parecesse tão improvisada como realmente era. E pelo assentimento calmo de Archer, ela ficou aliviada.

    — É uma boa ideia. Você pretende então voltar para o momento em que Mewtwo destruiu o laboratório e… impedi-lo?

    — Talvez voltar um pouco mais do que isso. Pegar o DNA do Mew e recriar Mewtwo do zero. Só que dessa vez sem falhas. Um Mewtwo perfeito. Um M3. — Libra se sentiu uma supervilã megalomaníaca falando assim.

    — A Elite Four não vai deixar. Eles monitoram todos os Pokémon lendários do país. — Archer respondeu. Ele ouvira sobre isso na prisão, o projeto de monitoramento fora idealizado por Samuel Oak e Blue Oak, sua neta. — Não só eles, mas também os líderes de ginásio… todos trabalharão contra nós. — Libra notou a escolha de palavras. “nós”. Ele já estava dentro. 

    — Já estou cuidando disso. Meu irmão está se livrando deles, um a um. 

    — Então somos nós por trás do assassinato de Blue?

    — Sim. E Koga é o próximo.

    — Escolha interessante de alvos prioritários, devo admitir. 

    — Não foi minha escolha. Foi de Sócrates.

    — O nome de seu irmão é Sócrates? Como o filósofo? — Archer ergueu as sobrancelhas com uma incredulidade curiosa. Libra deu de ombros.

    — Tivemos pais excêntricos. 

    — Percebi. — Archer gostara de Libra, mas ainda restava uma dúvida em sua mente. — Onde eu entro nisso tudo?

    — Bem — começou Libra. — Você é popular entre os recrutas, um membro da velha-guarda que já foi chefe interino da organização. — Ela pausou e olhou para Archer. O mesmo olhar frio e curioso. Seus olhos eram pequenos e ágeis. Ele mantinha as mãos à vista, com os pulsos sempre na direção dela, e seu queixo estava ligeiramente erguido. Sua postura era impecável como a de um modelo. — Você tem certas liberdades e mordomias que outros não tem, como o meu número de PokéGear pessoal para se comunicar diretamente comigo. Mas ainda obedecerá minhas ordens. Capisce?

    Archer soltou uma risada que mais pareceu uma tosse. Ele aguardou alguns segundos para medir a expressão de Libra, que parecia impassível. Então, ergueu uma sobrancelha e começou a falar.

    — Creio que… — Archer foi interrompido prontamente.

    — Acho que não fui clara o suficiente. Se você não concorda com isso, não tenho problema algum em te mandar de volta para a prisão. Você está aqui fora porque é útil para mim, não o contrário. — Libra se sentia no comando de novo. — Você partirá para Ecruteak daqui dois dias. Consiga uma pena arco íris de Ho-Oh. — Libra deu a volta em Archer, que a seguiu com os olhos, e saiu da sala, mas não sem antes dizer: “Isso é tudo”.

 

+++++

 

    Gold estava no terraço do Planalto Índigo. Não só porque se sentia confortável perto do céu, mas porque sabia que lá não seria incomodado por Crystal. Ela ainda carregava um medo de altura paralisante desde o incidente na Torre de Rádio. Mas ele também tinha uma razão para não querer se sentir incomodado.

    Quando se certificou de que estava sozinho, soltou Skarmory.

    — Oi, amigo. — Gold passou a mão na cabeça do pokémon, que piou em alegria enquanto esticava suas asas de ferro. Gold então mergulhou a mão no bolso e tirou um porta-pergaminho de bambu que dentro tinha uma carta. Então, com a outra mão, deu um petisco para Skarmory. Ele o lançou ao ar, e Skarmory empinou o corpo para pegá-lo. — Preciso que você entregue isso em Ecruteak, pro Morty. Lembra dele, não é? — Indagou o treinador.

    O Pokémon de ferro assentiu, e Gold se ajoelhou para colocar o porta pergaminho na perna de Skarmory com a ajuda de uma tira de couro. 

    — Ele está em Ecruteak, provavelmente no ginásio dele. 

    Quando Skarmory levantou voo, Gold observou sua silhueta diminuindo no horizonte. O céu estava adquirindo uma cor laranja, que em certas partes parecia mais um rosa. As poucas e esparsas nuvens brancas serviam como um lembrete da imperfeição daquele mundo. 

    Como um lembrete de que a chuva estava à espreita. 

    — Morty? Você ainda fala com ele? — A voz era de Silver. Gold se assustou e teve que ajeitar a posição dos pés para não cair de bunda no chão.

    — Eu chequei todo o andar, onde diabos você estava escondido? — disse Gold com certa rispidez. Não era um grande problema que Silver soubesse, o problema seria se o rapaz contasse para Lance. Ele não tinha certeza do grau de intimidade deles, então precisava sondá-lo antes de revelar ou não os motivos da carta.

    Silver deu de ombros:

    — Eu conheço esse prédio como a palma da minha mão.

    Gold lhe lançou um olhar incrédulo. Se Silver conhecia algum lugar bem, era o próprio quarto. Ele não era um explorador, e dificilmente conheceria os esconderijos de um edifício (mesmo que fosse sua casa).

    — Tá, eu fiquei atrás da porta ouvindo. — revelou o ruivo. Gold rolou os olhos. O garoto se aproximou com cautela. Gold, apesar da distância emocional e física que brotara entre eles, ainda era seu amigo mais antigo. O mais importante, e talvez o único. — Então… vai me contar o que foi tudo isso?

    — Isso depende. — Gold levantou uma sobrancelha. 

    — Do que?

— Do resultado da nossa batalha. 1x1. A grande revanche. — Gold sorriu, divertindo-se com a ideia de batalhar novamente com o amigo. Eles já lutaram diversas vezes durante sua jornada juntos, mas a mais importante de todas elas tinha sido a que acontecera nas semifinais da Liga Pokémon.

    Era 3x3, e Gold estava confiante. Ele estava acabando de se recuperar dos ferimentos causados na Torre de Rádio, e os eventos eram tão recentes que Crystal ainda estava no hospital, em coma. Gold precisava ganhar aquela batalha. Precisava ganhar a liga. Era tudo que lhe restava. Ele queria estar com o troféu da Liga ao lado dele quando Crystal acordasse. Bem, ele estava, mas era Silver que tinha o trazido.

    Silver sabia disso, e não ligava tanto para o resultado daquilo. Para ele, ser campeão era só um título que lhe daria certas regalias. Não era seu sonho. Ele estava ali por insistência de Falkner, que vira potencial no garoto para se tornar um treinador, e Silver aceitou tentar ganhar as oito insígnias. 

    Aquele era o sonho de Gold, e apenas um passatempo para Silver. Talvez isso tenha sido o que lhes afastou.

    Por isso aquela dita revanche era tão importante para Gold. Seria seu triunfo sobre seu rival, uma vitória para coroar sua vida monótona. Para reacender a chama dentro dele. 

    — Tudo bem. — Silver respondeu, sem esconder seu sorriso. Ele mostrou todos os dentes. — Mas vai ser três contra três, igual na Liga.

    — Feito. — Eles apertaram as mãos, e desceram juntos para o campo de batalha principal.

+++++

    Cada um se posicionou de um lado do campo. Silver ficou do lado que sempre ficava em batalhas nesse campo, o lado do Campeão. Politoed estava ao seu lado.

    Gold foi até o outro lado, e pegou sua primeira pokébola. Crystal, Lance e Thomas estavam chegando nas arquibancadas agora. A presença deles não incomodava Gold, mas para Silver isso tirava um pouco da intimidade daquela batalha.

    — Três contra três, perde o primeiro que não tiver pokémon em condições de batalhar. — declarou Gold, com um sorriso maroto. 

    — Então chega de conversa. — A pokébola de Silver descreveu uma parábola e se abriu logo antes de tocar o chão. Um Umbreon se materializou no campo de batalha. — Umbra, vamos vencer. — declarou Silver, falando com o seu pokémon.

    — Golduck! — Golduck se materializou a partir da pokébola de Gold e fez um som característico. Ele sentiu a areia debaixo de seus pés e sorriu da melhor forma que pôde. 

    — Faça as honras. — Pediu Silver. Crystal e Lance já estavam acomodados na arquibancada. Thomas também estava, mas mantinha uma distância de três assentos de Crystal. Umbreon analisou seu oponente, e Golduck fez o mesmo enquanto alongava seus braços e pernas.

    — Golduck, Hydro Pump! — Golduck parecia assustado com o comando. Ele olhou para seu treinador, e então para Umbreon, e só aí reuniu fôlego para disparar um jato de água na direção do inimigo. Umbreon desviou com facilidade, fazendo com que o ataque não fizesse mais do que molhar uma parte do terreno. Gold não esperava que seus pokémon estivessem tão enferrujados, afinal eles lutavam sempre no ginásio! Quer dizer, geralmente ele só usava Feraligatr. Era mais simples uma batalha de um contra um para ele.

    — Foi isso? — indagou Silver. Gold cerrou os olhos. Odiava o cinismo de Silver. — Umbreon, Agility. — O pokémon noturno relaxou, mas se manteve de pé. Uma luz piscou em seus anéis amarelos, e ele parecia estar mais leve. 

    — Foi isso? — imitou Gold, tentando fazer a voz suave de Silver.

    — Espere e verá. Sua vez.

    — Golduck, Psychic! — O pokémon azul levou os dedos a testa, e sua jóia vermelha brilhou. Umbreon se manteve parado. Golduck fechou os olhos com força e se concentrou. Seus olhos brilharam em azul, e só. Silver balançou a cabeça.

    — Ataques do tipo psíquico não afetam pokémon do tipo noturno. — disse. Gold parecia mais decepcionado do que surpreso. — Você está mesmo enferrujado, não? Umbreon, Shadow Ball! — O pokémon preto correu na direção de Golduck e saltou. No ar, deu um mortal e uma esfera roxa e negra formada a partir das sombras do local se formou em sua boca, e ele a soltou. A esfera explodiu no rosto de Golduck, que caiu para trás e rolou pelo campo até os pés de Gold antes de finalmente se levantar.

    O pokémon de água balançou a cabeça e percebeu que estava meio tonto. 

    — Ei garoto, ainda consegue lutar? — perguntou Gold. Golduck assentiu, ainda zonzo, e pisou para dentro do campo de batalha novamente. — Se aproxime dele!

    Golduck correu até ficar a menos de dois metros de Umbreon. Silver estava atento, e pronto para comandar o próximo ataque. 

    — Toxic! — gritou Gold. De imediato, Golduck disparou um raio roxo de sua jóia, um raio que acertou Umbreon antes que ele pudesse desviar. Golduck parecia confiante após acertar um golpe, e abriu sua guarda.

    — Iron Tail!

    — Protect! — Rebateu Gold de imediato. Ele ainda tinha alguma prática. O pokémon quadrúpede girou nos calcanhares para acertar Golduck com sua cauda, mas foi impedido por uma barreira mística projetada pelo pokémon de água. 

    — Se afaste! — gritou Silver.

    — Hydro Pump! — Comandou Gold. Seu pokémon desfez a barreira bem a tempo de disparar um jato pressurizado de água de sua boca, jato esse que derrubou Umbreon e o fez deslizar pelo campo por alguns metros. O pokémon noturno balançou o corpo, e respingos de água voaram para todos os lados. 

    — Umbra, você tá bem? — perguntou o ruivo. O pokémon assentiu com um grunhido feliz. — Então acabe com isso com um Shadow Ball

    Dito e feito. A bola de sombras cruzou o ar rápido demais para que Golduck sequer pensasse em desviar. Acertou seu abdômen, e ele caiu de joelhos. Deu uma última olhada para Gold, como se estivesse se desculpando, e caiu de vez. Seu treinador o retornou.

    Na arquibancada, Lance comia pipoca. O Planalto Índigo tinha apartamentos para a Elite 4 e para o Campeão, mas dificilmente os membros moravam lá. Lance, porém, o fazia pela facilidade de acesso à Kanto ou Johto. Ele estava no exato meio, e gostava disso. Seu apartamento era abaixo do de Silver. Os outros membros da Elite 4 moravam no mesmo lugar onde moravam antes de se tornarem membros, e só visitavam o apartamento periodicamente ou quando julgavam necessário. Lance tinha saído para fazer pipoca no começo da batalha, e agora estava voltando.

    — Você já parou pra pensar que essa é uma batalha oficial? — indagou Crystal a Lance, que retribuiu franzindo o cenho.

    — Que? — Um mal estar nasceu no estômago do treinador de dragões. Crystal enfiou a mão no balde de pipoca dele, e começou a comer. 

    — Você conhece as regras! Já foi campeão. Se o Silver não trocar de pokémon até o fim, e Gold ganhar, ele se torna o Campeão de Johto. — enumerou Crystal, ainda mastigando. — Tem três testemunhas, nós, está ocorrendo no Planalto Índigo e é três contra três. Não é? 

    Lance estava boquiaberto. Ou indignado. Ou ambos.

    — Será que o Gold sabe disso?

    — Eu duvido muito. — disse Thomas, se aproximando mais dois assentos. Ele ainda se mantinha distante de Crystal. — E de qualquer forma, acho difícil que ele ganhe. 

    — Silver definitivamente sabe. — disse Crystal. — A postura dele, a escolha de ataques. Ele não está tendo uma luta amadora e amigável. Ele está defendendo seu título com unhas e dentes.

    — Precisamos contar ao Gold. — Lance tentou esconder sua tensão. 

    — Não acha que é mais divertido se ele não souber? — Crystal sorriu. — É menos pressão em cima dele, também.

    Lance assentiu. Crystal estava feliz, e imaginava a cara de Gold quando ele soubesse que era o mais novo campeão de Johto. Mas antes, ele precisava ganhar essa batalha.

   


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Notas finais do capítulo

Uma batalha entre Gold e Silver. Valendo mais do que o esperado. Gold ainda está pensando que essa batalha vale só o segredo da carta que ele enviou à Morty...
Mas e Silver? Foi ele quem propôs que a batalha fosse 3v3! Por que ele teria motivos para dar uma chance assim, de graça, para Gold? Ele quer que o alvo da Team Rocket se torne ele? Ou ele simplesmente quer ver a felicidade do amigo?



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