Homens sábios dizem que só os tolos se entregam

Mas eu não consigo evitar de me apaixonar por você

Abrindo os olhos lentamente Akihiko deu de cara com um teto que não era de seu quarto. Apesar da claridade que entrava pela porta de correr entreaberta que separava o quarto do restante do apartamento ser pouca, pôde reconhecer perfeitamente o quarto de Haruki. Não costumava entrar ali desde antes da briga com Ugetsu e aquela sucessão de acontecimentos terríveis que o fizeram acabar dividindo apartamento com o rapaz de cabelos de mel... Certamente, estar ali naquele momento era algo que Kaji podia considerar uma vitória.

Ele se virou levemente para o lado, sentindo o corpo adormecido do namorado aconchegado próximo do seu, ressonando baixo, completamente alheio ao que acontecia ao redor. Hesitante, o loiro levou uma das mãos para afastar uma curta mecha de cabelo dourado que cobria o rosto angelical do outro homem e agora estava certo de uma coisa: poderia facilmente se acostumar com essa visão em todas as manhãs.

Aquela era a primeira vez que compartilhavam a mesma cama desde o dia em que, de uma forma completamente despreparada e desajeitada, Akihiko acabou se confessando para Haruki, causando não apenas um choque no outro, como também em si mesmo. Ele não esperava apressar as coisas, nem mesmo se achava digno de estar com Nakayama ainda... Sentia que as feridas causadas no baixista não estavam cicatrizadas... Olhar aquele cabelo curto, mesmo que estejam com o relacionamento indo bem, lhe trazia um sentimento sufocante de angústia. Angústia por tê-lo feito passar por tudo aquilo, angústia por não poder trazer as coisas como eram antes... Angústia pela marca enorme que as atitudes impensadas e completamente egoístas deixaram na pessoa que mais se importou e cuidou dele durante a vida, sem nem mesmo pedir algo em troca...

Devo ficar? Seria um pecado

Se eu não consigo evitar de me apaixonar por você

Sentindo um nó se formar na garganta, Akihiko prendeu a respiração por um momento evitando que aquilo não se transformasse em um choro baixo e acabasse despertando o outro de alguma forma. Sentia vontade de abraçá-lo, ao mesmo tempo em que achava que deveria se afastar. Haruki o fez se sentir como nunca antes. O amor sempre pareceu algo doloroso, algo que só lhe tomava coisas e jamais devolvia na mesma proporção ou intenção, algo sufocante. E com o baixista, a cada dia em que reconstruíam sua amizade, agora também como um relacionamento amoroso, ele ia descobrindo que, na verdade, nunca fez a mínima ideia do que era o amor, mesmo que já tivesse passado por relações das mais variadas, sendo com Ugetsu a mais longa e marcante em sua vida.

Como um rio que corre certamente para o mar

Querida, assim algumas coisas estão destinadas a acontecer

Haruki era delicado e cuidadoso em tudo o que fazia. Estando com Akihiko, as coisas não seriam diferentes. Importância, carinho, cuidado... agora ele tinha tudo isso em uma única pessoa. A sensação era tão boa e avassaladora ao mesmo tempo que nem mesmo conseguia se sentir merecedor daquilo. Era uma felicidade estranha que preenchia seu peito a cada vez que via o sorriso sereno, junto com os cabelos dourados, ainda que curtos, se aproximando. Achava adorável o tom de vermelho que pegava o baixista toda vez que trocavam algum carinho ou elogio, por mínimo que fosse, porém, ao contrário da confiança que costumava sempre carregar em seus relacionamentos anteriores, agora sentia suas bochechas queimando e quando menos esperava, o rubor também havia tomado seu rosto. Com Haruki as coisas eram assim. Akihiko nunca teve dificuldade ou vergonha das coisas que falava ou fazia para possíveis parceiros, mas o companheiro de banda acabou lhe mostrando que, quando forte e verdadeiro, o sentimento pode te transformar numa pessoa completamente diferente antes que possa perceber.

Ele suspirou, ainda vigiando o sono do loiro a sua frente. Não conseguia deixar de admirar cada detalhe delicado daquele rosto. Parecia ter sido esculpido parte por parte, como todo cuidado possível. O conjunto inteiro de Haruki era perfeito aos seus olhos. Ele era lindo por fora e por dentro. Akihiko percebeu tardiamente que, mesmo que as coisas não tivessem corrido da forma desastrosa que correram, seria impossível não acabar se apaixonando pelo baixista como estava agora. Perdidamente apaixonado.

Pegue minha mão, pegue minha vida inteira também

Pois eu não consigo evitar de me apaixonar por você

— Bom... dia? — a voz ainda meio sonolenta, tomada por um tom de dúvida despertaram Akihiko de seu devaneio num pequeno susto, fazendo-o olhar para o outro, que o encarava com a expressão serena de costume. — Desculpe. — ele riu baixo, esfregando os olhos.

— Bom dia. — Akihiko respondeu, acompanhando o riso do outro, que agora se aproximava cuidadosamente para se aconchegar ainda mais perto dele.

Haruki acariciou levemente o rosto de Akihiko, descansando a cabeça sobre o braço que apoiava o corpo maior enquanto entrava naquele abraçado aconchegante, segurando a mão livre do mais alto, trocando carícias vagarosas com ele.

Como um rio que corre certamente para o mar

Querida, assim algumas coisas estão destinadas a acontecer

O dono dos cabelos dourados o olhou, curvando os lábios levemente.

— O que está pensando? — Haruki perguntou. — Já acordou há muito tempo?

— Não faz tanto tempo. — Kaji o encarava na mesma intensidade, vendo as bochechas do outro tomarem uma coloração vermelha bem leve e soltando um sorriso sacana, antes de continuar. — Eu poderia me acostumar sem esforço algum a acordar com essa visão... Você é lindo...

— Aaaah, Akihiko! — como o loiro já esperava, o mais velho escondeu o rosto em seu peito, deixando-o antes ver o tom violento de vermelho que suas bochechas haviam tomado. — Você gosta de me deixar assim!

— Sim. — concordou rindo, recebendo um olhar de reprovação do outro, que ainda parecia um tomate. — Eu gosto mesmo.

— Isso não tem graça. — reclamou com as sobrancelhas arqueadas, sem olhá-lo, arrancando uma risada do outro.

— Mas eu tô falando sério. — esclareceu Akihiko, vendo o outro se afastar levemente para ver seus olhos. — Eu me acostumaria sem dificuldade nenhuma.

— Aaah! — em outro surto envergonhado, Haruki pulou da cama, já indo em direito a cozinha, deixando um Akihiko orgulhoso por ter tirado aquela reação do namorado, mesmo que também pudesse sentir um leve calor em seu próprio rosto. — Vamos tomar café!

— Certo. — concordou Akihiko, se sentando sozinho na cama, ainda rindo um pouco.

Pegue minha mão, pegue minha vida inteira também

Pois eu não consigo evitar de me apaixonar por você

Seu cheiro e o de Haruki agora era um só. Não era o apartamento cheirando a Haruki, enquanto o sofá tinha seu cheiro como quando moravam juntos. Eles eram um só e compartilhavam um mesmo sentimento que Akihiko tinha certeza de que queria cuidar pelo o resto dos seus dias, sem perder um sequer.

— Ei. — ele ouviu a voz de Haru, que agora estava acompanhada por uma música calma e baixa vindo do outro cômodo. — Você não vem?

— Estou indo.

E assim ele se juntou ao outro na cozinha naquela manhã inédita após toda a tempestade pela qual haviam passado juntos, se sentindo completamente realizado e feliz vendo aquele que amava arrumar algumas coisas, enquanto contava alegremente curiosidades musicais que havia descoberto recentemente, carregando um sorriso estampado que, como a luz do sol, faziam o coração Akihiko se sentir ainda mais quentinho e amado.

Pois eu não consigo evitar de me apaixonar por você.