Pacto No Desespero escrita por Crosfilos


Capítulo 10
Capítulo 09




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Acordo ao som dos crocitares de inúmeros corvos, que se debanda ao meu redor. Eu não os vejo a princípio, mas pelos sons desordenados que fazem constantemente, sei que estão próximos.

Esfrego meus olhos, e imediatamente ardem devido a luz que passa sorrateira por entre as frestas das folhas nos galhos. Tento me levantar o máximo que o espaço me permiti e cuidadosamente engatinho para espiar o que está se passando lá fora.

Em um pequeno susto, quase elevo minha voz, mas me contenho ao enxergar os olhos brilhantes de meu espírito, que veio rente a minha bochecha com sua cabeça erguida, enquanto seu corpo está seguro preso ao meu pescoço.

— O que aconteceu? Por que esse barulho infernal? – Pergunto.

— São corvos. – Responde rápido e de maneira simples o espírito.

— Jura?! - Ironizo em voz baixa. – Mas disso eu já sei, me refiro ao porquê dessas galinhas malditas não calarem o bico.

— Corvos, só se reúnem nessa quantidade, quando sentem o cheiro de comida.

— O cadáver do velho os atraiu? - Especulo. - Mas pensei que as bestas tinham o devorado ontem à noite.

— E devoraram. Mas outra coisa os atraiu aqui.

— Que coisa?

— O cheiro de sangue.

— Pelo que me lembro só havia o velho.

— Ontem à noite, enquanto você dormia, muitas bestas lutaram, tentando devorar umas às outras quando a comida acabou. E pelo cheiro de sangue, estimo que muitas caíram nas garras das mais fortes.

— É seguro sair?

— Esse tipo de Besta Demoníaca só sai à noite de suas tocas, sob a proteção da noite elas não se revelam em plena luz do sol. Então é seguro sair.

— Que ótimo. - Afirmo, e logo depois derrubo os galhos que ocultavam a entrada.

Fora da proteção do interior da árvore, sinto ser abraçado pelo frio da manhã, que em uma lufada de brisa gélida choca-se contra minha face, e me faz estremecer, me aconchego na túnica em busca de mais calor.

Caminho alguns passos até o córrego, e com as mãos em concha bebo um pouco de água, e lavo meu rosto em seguida. Fito meu reflexo na mesma, e por um momento quase me perco em meio aos meus muitos pensamentos, mas me levanto rapidamente e em passadas largas me afasto.

Por curiosidade, ou pela raiva do maldito barulho, dos corvos, sigo em direção à carroça. Com a carroça ao alcance de minha visão me escondo brevemente entre as árvores, para ver se tem alguém por perto, e assim evitar um encontro perigoso.

Quando noto que não há ninguém ali, além dos corvos, sigo adiante. Mas paro quando vejo as enormes poças de sangue e ossos espalhados ao redor da carroça, onde os corvos rodeavam em frenesi.

— Tanto sangue. Mas nenhuma carne, além das que sobraram nesses poucos ossos

— Bestas Demoníacas não costumam deixar nem mesmo eles quando devoram os seus. Estas são jovens e ficaram com medo da luz do sol, por isso partiram sem devorar tudo.

— Que fedor, até cadáveres em decomposição tem odor mais agradável.

— O que esperava de Carniçais?

— Carniçais? - Repito confuso.

—A espécie dessas bestas.

 - Como você pode saber disso?

— Mesmo antes de ser selado, eu já era antigo. Desde os mundos de terras sombrias, aos de terras sagradas, eu já vi muitos tipos de Bestas Demoníacas. E essas são umas das espécies mais comuns de se encontrar. Mas olhando em volta, é estranho.

— Além desse fedor, o que mais pode ser estranho? – Indago e me afastando da carroça e sigo em direção da cidade.

— Carniçais geralmente vivem sob a terra, de cemitérios, ou habitam lugares abandonados onde consomem a carne e ossos dos defuntos. Porém não vejo lápides ou algo que se pareça a um lugar assim.

— Escutei que há muito tempo houve uma batalha aqui, onde muitas pessoas perderam suas vidas, por isso esse bosque foi nomeado como bosque dos corvos.

— Mesmo que essa história seja verdade, ainda não explicaria o porquê de haver Carniçais nesse bosque.

— Como assim? Eles não são comuns de se encontrar como você mesmo disse à pouco?!

— É comum, que após grandes batalhas, haja uma quantidade sem precedentes de corpos caídos, e muitas vezes estes não são recolhidos, e se deterioram ondem pereceram. Ainda assim, como não há rastros de batalha física ou flutuações espirituais distintas que ficam impregnados nos locais de luta, não há maneira possível de ter ossos ou cadáveres para suprir a necessidade alimentar desse tipo específico de besta neste lugar.

— Eles não poderiam se alimentar dos restos de animais e de outras bestas como fizeram ontem?

— É uma possiblidade. Mas se cometessem canibalismo com frequência seu número seria ralo, e não se compararia ao grande número de Carniçais que pude sentir na noite passada.

— Hum... Então eles devem ter encontrado uma fonte alternativa de alimento.

— Isso não seria possível, pois Carniças só conseguem sobrevivem e procriar ao consumir cadáveres humanos. Somado a isso, ainda tem o fato que cadáveres de mortes naturais ou eventuais assassinatos, não conseguiriam proliferar grandes números dessa Besta Demoníaca.

— Dada a natureza cruel dos clãs que governam essa ilha, eu não duvidaria que estejam alimentado essas bestas de propósito.

— É uma boa resolução dos fatos. Mas no final, alimentar Bestas Demoníacas de baixo nível, só resultará em transtornos futuros.  Pois bestas de baixo nível são irracionais e imprevisíveis. – Afirma e desce do meu pescoço, e ruma o solo.

— Aonde você vai? - Pergunto com uma de minhas mãos ao redor de seu corpo

— Há muitos corvos, um pouco de energia a mais nos ajudaria.

— Essas galinhas devem estar impregnadas com esse fedor. Nem pense que eu vou deixar você comer uma delas e ficar com esse odor

Loki nada diz, apenas dá meia volta com seu corpo, e rasteja por cima do meu braço, ate se enrolar em volta do meu pescoço.

Aos poucos, o som dos crocitares dos corvos, ficam cada vez mais baixo, a cada passo que dou. Mesmo sem qualquer rastro de pessoas, bestas ou animais, além dos corvos, me mantenho fora da estrada. Mas com ela ao alcance de minha vista.

O sol queima alto no meio do céu, marcando o meio dia, quando chego a uma encruzilhada. Por sorte ou azar, encontro uma placa com setas e nomes entalhados na madeira, porém eu não consigo ler, pois nunca recebi educação apropriada no Clã Marlleo.

— E agora. - Balbucio.

— Não sabe ler? – Pergunta a serpente.

— Este alfabeto, não.

— O da esquerda diz: “Enseada dos Caranguejos” e, o outro, diz “Cidade Do Aço”. – Lê o espírito.

— Esquerda então.

— Há um motivo em específico?

— A sede do clã Marlleo fica na Cidade do Aço.

— Entendo.

Sigo o declive da esquerda, arquitetando quais seriam meus próximos passos a serem tomados, pois um erro não resultaria em nada menos que minha morte.

Sigo a estrada que ziguezagueia por entre vários obstáculos e percebo que as árvores aos poucos diminuía de tamanho, à medida que a distância entre uma e outra fica cada vez maior. Não demora, e logo a densa vegetação da paisagem é trocada por dunas altas de areia. Sem escolha, e com nada mais onde eu possa, me esconder, sigo pelo meio da estrada.

Com muito esforço subo uma alta duna à minha frente, pois a estrada em algum momento que eu não me dera conta morrera, sendo soterrada pela areia.

No seu cume respiro ofegante, e olho o sol poente começar a beijar as águas do longínquo horizonte. O cheiro salgado vindo do mar preenche minhas narinas, vindo pelo vento gélido, que me traz alívio do calor. Me dou o impulso que me falta para descer em direção às muitas casas e cabanas do porto, não muito distante.

Tento muitas vezes não cair, quando meus pés somem entre os grãos traiçoeiros de areia quente. Finalmente, depois de muitos esforços, chego ao meu intento. Em passos largos, e quase desesperados, adentro às ruas movimentadas do porto.

Mesmo tendo acabado de chegar em um ambiente completamente novo para mim, respiro aliviado ao notar que todos as demais pessoas ao meu redor ignoraram completamente minha existência, e agradeço mentalmente ao turbante que cobre os fios de minha cabeça, e sigo para a rua principal do pequeno porto.

Passo por muitas pessoas, desde pescadores com seus trajes molhados e sujos de sangue de peixe, a pessoas com finos e caros tecidos.

Nos dois lados da rua que estou, os comerciantes gritam para chamar a atenção dos pedestres a fim de que os mesmo comprassem suas variadas mercadorias.

Não tenho dinheiro para comprar nada, tão pouco vontade para isso, pois objetos banais a essa altura só resulta em ser fardos para carregar.

— Onde posso vender esse saco? - Indago, e fito ao redor.

Começo a me preocupar, pois sem um comprador, o saco é inútil, e eu sem dinheiro, me vejo inútil.

— Não vou me rebaixar ao ponto de trabalhar para ganhar alguns trocados. Tão pouco posso me permitir ao luxo de deixar esse turbante cair e alguém se dar conta da cor de meu cabelo. – Sussurro para mim mesmo.

— Dinheiro. – O espírito repete com desdém, como se a palavra o divertisse.

— Sem dinheiro não tem como eu comprar mantimento, sem ele como acha que sairemos dessa ilha de maneira segura? – O indago.

Loki se mantem em silencio.

— Foi o que pensei... Droga, o que eu faço agora. – Indago para mim mesmo com minhas mãos pressionando meus olhos.

Quase como uma doce melodia de alívio, ou solução para meu jovem dilema, escuto o som incessante de marteladas. E sem pensar uma segunda vez, sigo em direção a elas.

No final da rua, onde o movimento de pessoas é pouco, o barulho se torna mais alto, ao passo que acho meu intento.

Em um barraco sem paredes, onde grosas vigas de madeira ergue um alto teto de palha, vejo um homem de avental de couro, perto de uma fornalha, martelando um pedaço de ferro sobre uma bigorna.

Me aproximo do homem e, entro em no que parece uma ferraria. Porém sou abordado por uma mulher, que se interpôs no meu caminho.

— Aonde o garotinho pensa que vai? – Pergunta a mulher de meia idade de seios fartos, com um sorriso no rosto.

— Tenho assuntos a tratar com aquele homem.

— Veio entregar algum recado de sua família?  Eu posso ouvir no lugar dele.

— Escuta, dona, meu assunto é com ele e não com você, e por falar nisso quem seria você mesmo?

— Sou Titis, esposa de Kratis, todo assunto do meu marido é assunto meu garoto. - Afirma em tom grave.

— Já que é assim, eu tenho algo de muito valor que quero vender.

— E o que seria?

— Algo vindo de uma Besta de Nível 4.

— Oras, garoto, eu tenho mais o que fazer do que acreditar em suas bobagens, se está procurando diversão, para suas mentiras, sugiro que vá para outro lugar ou estará arrumando confusão. - Diz impaciente.

Desato o saco da minha cintura, e entrego nas mãos da mulher.

— Não estou mentindo, verifique por você mesma.

Com o saco em mãos, Titis me lança um olhar bravo e por um momento duvido do que ela irá fazer. Mas, contrariando minhas baixas expectativas, ela assente, e abre o saco

Após ver o conteúdo com seus próprios olhos, ela passa o dedo no pó, e com a ponta da língua o prova. Um olhar de incredulidade e surpresa ganha forma em seu rosto, e rapidamente ela agarra no meu braço me puxando para trás de uma pilha de madeira, fornecendo proteção contra os muitos olhos curiosos da rua.

— Kratis, vem aqui. - Grita a esposa.

— Não posso. – Responde e martela com força o ferro cuja cor alaranjada denuncia sua temperatura.

— KRATIS.- Grita a plenos pulmões, o que fez com que seu marido vacilar em sua martelada.

— Se eu largar agora a espada se perderá e terei que começar do zero.

— Pelas tetas de Phantei, homem, venha cá agora mesmo.

— Está bem. - Larga a espada esbravejando chamamentos inaudíveis. - Espero que o assunto valha mais que 19 moedas de prata que iria ganhar naquela espada. - Diz ao se aproximar.

Kratis aparente facilmente ser mais jovem que sua esposa, se seus olhos cor de menta não denunciassem sua já avançada idade, pois ostenta braços fortes e definidos cobertos por cinzas e suor do trabalho pesado e um corpo na mesma proporção que, mesmo coberto por suas vestias e avental de couro preto, é perceptível sua boa forma física.

— Quem é esse? - Pergunta enquanto me fulmina com sua mirada. - Espero que não seja filho daquele porco, pois já falei que a armadura só vai estar pronta no final do mês.

— Ele trouxe isso. - Afirma, e entrega o saco para o marido.

Após ter o objeto em mãos, abre o mesmo e averigua seu conteúdo.

— Isso é?!- Indaga sobressaltado em descrença. - Pó de osso de uma Besta demoníaca. - Conclui ao final.

— E uma muito poderosa e antiga. – Completa a loira.

— Nunca esperei que tal tesouro fosse cair em nossas mãos, como você conseguiu?

— O garoto, ele está tentando nos vender!

— É roubado, tenho certeza. - Afirma, e fecha o saco, e em seguia o guarda no bolço de seu avental. - É melhor vazar daqui moleque, ou eu vou denunciá-lo aos guardas, e perderá a mão por estar roubando. - Esbraveja.

Mesmo não sabendo de fato que aquele saco originalmente não me pertence, está óbvio a intenção do maior em tentar me escorraçar com uma ameaça, para que assim ele fique com o pó. Mas diferente do que eu aparento aos seus olhos, por dentro eu sou mais vil do que um humilde ferreiro pode imaginar.

— Eu matei o último dono do saco. Ele sangrou e gemeu como um animal. Confesso, foi muito bom ver seus últimos segundos de vida.

— Saia daqui, moleque, antes que eu te mate. - Ameaça, pegando um pesado machado, que estava pendurando em uma das vigas do teto.

— Pena, o chefe não vai ficar contente, eu vou levar algumas chibatadas por isso - Digo saindo do local. - Mas vou me confortar ao saber que vocês estarão mortos antes do amanhecer. – Sorrio enquanto calmamente me viro de costas

— Espera. - Interrompe a mulher.

Me viro de volta para o casal.

— Ele deve estar mentindo. – Afirma o homem para sua mulher.

— Acha que um garoto andaria com isso nas mãos se não tivesse ninguém poderoso atrás dele? Se o roubarmos podemos irritar essa pessoa, você quer ver nossa família destruída, a mim e aos seus filhos mortos ?! - Pergunta a mulher em desespero.

— Mas isso vale uma fortuna. – Afirma e segura o saco no bolso do peito.

— Isso é mais valioso que nossas vidas. – Diz e começa ao que parece ser um choro.

— Pegue esse saco e suma daqui com ele garoto e nunca mais volte a mostrar sua cara aqui novamente, ou vai ter que provar o gosto do meu machado. - Ameaça, a contra gosto, e joga o saco no meu peito.

— O mestre disse que tenho que conseguir pelo menos 100 moedas de ouro por esse saco. – Afirmo.

— E por que ele venderia esse tesouro por tão pouco?! - Pergunta o homem.

— Ele disse que é mais fácil negociar esse pó de osso de besta do que ter que matar todo mundo nesta vila para conseguir dinheiro.

— Kratis. - Agarra no braço do marido

— Se eu pagar não vai haver problemas certo?!– Indaga o ferreiro.

— Mas. -  Contesta a esposa pensativa.

— Mesmo tendo que abrir mão de nossas economias, isso vale pelo menos 5 vezes mais do valor que o garoto está pedindo. - Afirma em voz baixa para a esposa.

— Eu não quero me envolver nisso. Pois assim não serei responsável pelas consequências. - Diz a esposa e sai do local com uma expressão carregada.

— Espere aqui por um momento. – Pede o ferreiro, em um tom quase respeitável.

Me sento em um cepo de madeira, que se encontra perto de mim, e espero, enquanto vejo, ao longe o homem entrar em uma modesta casa de pedra, localizada mais ao fundo da ferraria.

Não demorou mais que alguns minutos, e o ferreiro retorna, sustentando um saco marrom.

— Aqui está. - Estende o saco, em minha direção. - 100 moedas de ouro, como está pedindo.

— E aqui está o pó de osso. - Entrego o saco, quando recebo o que estava com o maior.

— Você jura por tudo de sagrado no mundo que esta negociação acaba aqui? – Me fita sério.

— Juro. - Digo no mesmo tom.

— Se estiver mentindo, e se eu e minha família formos mortos por seu mestre, por Phanteia, eu te amaldiçoou e a tua família a morrer gritando.

— Tem minha palavra que isso acaba aqui. - Afirmo e pego o saco, e saio sem olhar para trás.

Me isolo atrás de algumas palmeiras, situadas não muito longe da ferraria, e com um forte pedaço de corda que encontro na rua, amarro o saco rente a minha cintura, por debaixo da túnica, para que esta o ocultasse de olhares sorrateiros.

— Mente tão naturalmente quanto um ministro em uma corte real.

—  Obrigado. - Agradeço irônico.

— Se sua mentira não tivesse funcionando o que você iria fazer?

— Não sei, talvez, sequestrar um dos filhos, matá-los enquanto estivessem dormindo. As opções são bem extensas.

— No mundo do cultivo, truques baratos e mentiras não o salvaram.

— Eu sei. É por isso que tenho o melhor professor do mundo comigo, para me ajudar. – Digo ainda em tom sarcástico.

Ao voltar para rua, o pesado saco em minha cintura começa a me incomodar, ao entrar em atrito com minha pele.

— Droga esse saco de moedas pesa, além disso ficar com o braço parado sobre ele para o ocultar do contorno da túnica é um penosamente irritante.

— Por que não compra um anel espacial, para guardar esse dinheiro, já que leva-lo o incomodar tanto?!

— Não tinha pensado nisso. Mesmo que ele custe caro, vai me ajudar na hora de transportar os mantimentos para a ilha.

Muitas vezes testemunhei as maravilhas do poder de um anel espacial, quando estava no clã Marlleo. Um pequeno adorno feito a partir de um mineral extremamente raro encontrado no fundo do mar que consegue guardar em seu interior grandes quantidades de itens sem alterar seu peso e tamanho original. Uma verdadeira maravilha, e que embora não posso ser armazenado seres vivos dentro do anel, uma vez lá dentro, alimentos ou objetos não se deterioram, e é quase como se o tempo parasse para tudo que se coloca no seu interior.

Antes de me recordar de minha vida anterior, nunca achei que conseguiria ter meu próprio anel espacial, por isso agora que estou prestes a comprar um me descubro embebecido em descrença.

No meio da rua principal, enquanto desvio de carroças e pessoas, procuro avidamente uma loja que possa vender o que busco. Um anel espacial.

Passados algumas horas, e no meio da maior das ruas do porto, encontro finalmente o lugar de meu intento.

A loja cuja fachada de pedra polida, e uma grande placa de madeira estendida em direção a rua, se ergue imponente, como o lugar mais sofisticado do porto, pois o edifício à minha frente pertence ao clã Marlleo. Uma vez que, o desenho talhado na placa no formato de machado e bigorna na placa é inconfundível para qualquer um.

— É sábio entrar de livre espontânea vontade na toca do lobo? - Indaga o espírito preocupado.

— Desde que ele permaneça alheio de minha entrada, ele se torna inofensivo. – Respondo e abro a porta da loja.

— Bem-vindo, jovem, senhor, no que podemos ser? - Pergunta a moça jovem de olhos azuis, pele clara e cabelos vermelhos, com um cordial sorriso.

— Estou procurando um anel espacial. - Respondo, e caminho sobre o chão que reluz como um espelho bruto.

— O jovem mestre tem sorte. Acabamos de receber uma nova remessa de anéis espaciais da Ilha Branca.

— A Ilha Branca? Não é o lugar que tem gelo e neve durante todo o ano? - Indago ao recordar do nome do lugar.

— Isso mesmo. Nossos anéis, assim como os de todo o Arquipélago das 7 Ilhas, vem de lá.

— Que estranho, eu pensei que que todas as ferramentas de metres espirituais fossem fabricadas aqui na Ilha da Caldeira.

— O jovem mestre tem um excelente tutor, por estar tão bem informado. Mas, de fato todas as armaduras e armas são forjadas aqui. Porém, os anéis espaciais, por serem extremamente difíceis de serem refinados, apenas os clãs da Ilha Branca possuem a habilidade e o conhecimento para fabricá-los.

— Entendi obrigado por me informar, senhora. - Faço uma reverência em agradecimento.

— Não há necessidade de agradecer. – Ri de lado cordialmente. - Qual a qualidade do anel que busca?

— Qualidade?

— Sim, quanto maior a qualidade do anel, maior o espaço que ele terá em seu interior.

— Minha mãe disse para eu vir aqui comprar um anel espacial para que eu possa guardar todos os meus brinquedos. Assim eu vou poder levar eles aonde eu quiser.

— E por que o jovem mestre não veio com ela?

— Minha mamãe está ocupada, e eu já sou grande para fazer isso sozinho.

— Tem razão, você já é um homem. – Observa em um sorriso gentil. - Venha comigo. - Pedi, enquanto me guia a uma sala no interior do lugar.

Depois da sala de recepção que nada mais é que um grande vão, com um balcão na qual algumas moças ficam para atender os clientes, sou guiado por uma série de corredores, até uma sala, cuja a rica e ornamentada mobília demonstra que é usada somente por aqueles de alto estado e poder.

— Tome assento jovem mestre. – Pede a ruiva.

Me sento em um banco coberto por uma pele que cheira a maças, e olho a moça encaminhar-se em direção à porta do recinto.

— Fique aqui e espere, pois irei buscar as opções de anéis que temos disponíveis.

— Seja rápida, tenho que voltar antes da janta, ou mamãe vai ficar brava comigo.

— Compreendo, não vai demorar, eu já volto. - Se curva em uma reverencia e sai pela porta.

— Você se arrisca. - Começa Loki.

— Ela não fará nada comigo.

— Como pode ter certeza?

—Aos olhos dessa mulher sou só uma criança cuja família é poderosa e confiante, o bastante, para mandar uma criança sozinha para comprar algo extremamente caro em um lugar onde você perderia a vida por uma moeda de cobre. - Repondo, enquanto confiro rapidamente, se todos os fios de cabelos, estão cobertos pelo turbante, e quando confirmo desato o saco de moedas da minha cintura e o coloco sobre meu colo.

— Voltei, jovem, mestre. - Afirma, a ruiva, trazendo consigo uma bandeja coberta por ceda vermelha com 3 anéis sobre ela.

Com a bandeja em mãos, ela a coloca no meio da pequena mesa de centro, e se senta no banco do lado oposto do meu.

— Bem, deixe-me explicar para que entenda melhor, jovem, mestre: o primeiro anel tem o espaço em seu interior de 1 metro quadrado, o segundo anel seu espaço é de 4 metros e o último tem 6 metros quadrados. Qual o senhor vai querer?

— Quanto custa eles?

— O primeiro custa 40 moedas de ouro, o segundo 10o e o terceiro custa 190 moedas de ouro.

— O de 40 moedas é pequeno, mas acho que vai dar para guardar muitos brinquedos.

— Então escolherá o 1 anel?!

— Sim vou escolher esse, eu queria comprar o de 6 metros, mas vou ficar sem dinheiro para comprar uma espada para meu treinamento.

— O senhor fez uma sabia escolha, como esperado de um homem crescido. - Bajula.

—Vou contar agora as 40 moedas. - Afirmo, e abro o saco, e pego moeda por moeda e coloco em cima da mesa enquanto as conto de maneira infantil.

— Precisa de ajuda jovem, mestre? – Oferece.

— Não eu consigo sozinho, eu sei matemática. - Digo, em uma falsa birra infantil.

Com 40 moedas, muitas vezes contadas, para reafirmar a imagem de uma criança ingênua e mimada. As entrego para a ruiva, que as recolhe rapidamente com seu próprio anel espacial, que porta em um dos dedos, e em seguida me entrega o anel de 1 metro quadrado de espaço.

Em posse do anel, eu o coloco, mas não tenho conhecimento de como usar para fazer com que o saco com as 60 moedas de ouro restante entre em seu interior.

— Imagine que o anel está comendo o saco de moedas, e que elas vão parar na barriga do anel. - Ajuda a ruiva.

Mesmo que a atmosfera que criei contribui para que ela fale comigo dessa forma, me sinto irritado. Porém me contenho, e a contragosto faço o que ela sugeri.

Ao mentalizar que o anel consome o saco, a minha imagem mental se torna realidade e o saco é instantaneamente sugado para dentro do anel em menos de uma fação de segundo.

— Parabéns, jovem mestre, você é muito talentoso por conseguir da primeira vez.

—Agora que comprei o anel eu vou voltar. Me mostre a saída. – Ordeno em tom infantil e arrogante.

— Como desejar. – A ruiva toma à frente, se levanta e abre a porta, se pondo de lado da mesma para que eu passe. E assim o faço.

No meio do corredor, enquanto sou guiado, a maior, se vira sem conter seu trajeto e me olha, como se tentasse adivinhar algo.

— A qual clã o jovem mestre, pertence? - Pergunta

— Ao clã Rostre. – Respondo orgulhoso com o peito estufado.

Ao ouvir a resposta que tanto busca, a ruiva muda sua expressão. Pois assim como eu supus, ela sabe que o Clã Rostre é o segundo em poder da Ilha da Caldeira, e um aliado poderoso do Clã Marlleo.

— Caso, o jovem mestre, queira um anel de alto grau, ficaríamos felizes em ajuda-lo a conseguir. - Oferece com uma voz mais calma do que antes, porém percebo seu nervosismo disfarçado.

— Obrigado, vou ver se meus brinquedos cabem nesse anel, se não caberem, vou pedir dinheiro a mamãe para vir comprar outro.

— O senhor é realmente sábio por ter essa grande e maravilhosa ideia. – Elogia sorridente.

De volta à primeira sala, me despeço da ruiva que me acompanha até a porta do estabelecimento e sigo apressado para outra rua, pois quero sair da visão da ruiva que sinto pesar sobre mim.


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