Mirtilo escrita por OmegaKim


Capítulo 39
XI - No fim do túnel




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Jihyun enfiou-se na banheira, abraçou os joelhos depois que a espuma sobre a água cobriu o seu corpo. Nua, naquele banho de meia-noite, numa tentativa de fazer o sono vir, desejava que os pesadelos não viessem junto. Não costumava lembrar-se dos sonhos antes, mesmo sabendo que eram pesadelos. Acordava abruptamente, com o nome de Kyuhyun preso nos lábios e o coração aos saltos, no entanto, não haviam imagens em sua mente que pudessem justificar aquele incomodo todo. Mas agora... desde que Donghae a abandonara naquela lanchonete, não era capaz de esquecer as imagens daquele dia.

Elas vinham, arrastando-se sobre si durante o sono e a sufocavam devagar, levavam embora sua sanidade e a deixavam mergulhada em medos. E haviam tantos, que Jihyun não conseguia dormir. A falta de sono a deixava estressada o suficiente para que o mesmo não conseguisse se aproximar. Então, ela terminava as madrugadas vagando por seu quarto. Encarando-se no espelho. Escondida no armário de casacos, perto da saída, encostada no fundo, contra a parede e com os joelhos junto ao peito, tentando respirar no mundo escuro.

Por vezes, abraçava-se a única imagem que tinha de Kyuhyun e adormecia, apenas para acordar gritando no segundo seguinte. Percebendo que nem mesmo a imagem neutra do amante beta poderia salva-la daquela condição inegável: ela estava completamente sozinha. Estava lutando sozinha contra o mundo escuro, como viera a batizar o lugar onde seus pesadelos sempre aconteciam.

Soltou os joelhos e esticou as pernas, então segurando nas bordas da banheira, afundou o rosto ali, fechando os olhos para que o sabão não entrasse e soltando o ar pelos lábios, formando bolhas. Lá embaixo era silencioso, o mundo exterior não tinha controle ali. Havia apenas o sangue pulsando contra seus ouvidos. Era relaxante. Mas então, ela estava voltando a superfície, em busca de oxigênio. Frustrante.

Encarou o teto branco do banheiro e suspirou. Soltou a borda da banheira e afastou os fios de cabelo do rosto, piscou os olhos e então suspirou. Ficou algum tempo imóvel, até que sentiu seus músculos muito relaxados e reprimiu um bocejo. O frio veio como alerta para que saísse dali. O fez, sem muito entusiasmo, colocou o robe e saiu do banheiro. Andou até sua cama, sentou-se na beira. Torceu a ponta dos cabelos, de olhos fechados, pensando em mil coisas ao mesmo tempo. Fez tudo lentamente, com uma paciência que não pertencia ao momento.

Terminou deitada em sua cama com o celular ao seu lado. Encarou durante muito tempo número de Donghae antes de passar para outro. Observou o de Siwon com os lábios comprimidos em irritação, mas logo o estava passando. Saiu dali. Deslizou os dedos até a galeria, vasculhou atrás das fotos proibidas. As encontrou em um álbum oculto, tinha receio que alguém, algum dia, mexesse no seu celular e do jeito que sempre se precavia, escondia até mesmo coisas de si mesma ali.

Encarou as fotos, havia o começo de um sorriso no seu rosto enquanto observava Donghae com Baekhyun nos braços. Ela quase nunca se atrevia a olhar as fotos do filho, mas também não conseguia apaga-las. Então as escondia, porque pelo menos assim não pensava sobre elas. Só que em momentos como aquele, quando todo o mundo ficava silencioso, Jihyun terminava ali, olhando para um Baekhyun bebê que teve a má sorte de nascer de si.

Haviam muitas fotos. Todas mandadas durante os anos por Donghae, como que tentando alerta-la pelo modo como estava perdendo os anos da vida do filho e Jihyun sabia disso, mas para cada vez que se pegava olhando para os traços do filho, só conseguia sentir raiva. Era uma raiva tão fria no seu peito e direcionado para alguém tão inocente, que a ômega apenas ignorava tudo que o Lee tentava para promover aquele encontro, era a forma que ela havia encontrado para preservar Baekhyun.

Só que... olhando para aquele bebê de bochechas gordas, sorrindo no colo do ômega Lee, Jihyun não conseguia parar de sentir aquela enorme tristeza misturada com saudade, sentimentos que não eram direcionados para seu segundo filho ou Donghae. Eles pareciam fazer parte do pacote de incerteza que sempre surgia na sua mente quando pensava sobre seu primogênito.

Aquela pequena criança, que ela nem ao menos teve a chance de segurar nos braços ou olhar no rosto e que durante muito tempo havia acreditado que estava morta, porque mesmo com o que Donghae lhe dissera vinte anos atrás, Jihyun não acreditava que fosse realmente verdade. Parecia como uma das pegadinhas que suas mães e irmão sempre lhe pregavam, afim de lhe ensinar a lição mais valiosa dos Park’s: não confiar em ninguém. Então, ela não confiava. Não conseguia chamar Donghae de amigo, mesmo depois de tudo que o ômega fizera por si e também não conseguia pensar que o que ele dissera podia ser verdade.

Remoera tudo durante muitos anos, fazendo pequenas pesquisas. Não sabendo por onde deveria começar, sonhando com uma criança com os olhos de Kyuhyun. Usara o dinheiro que recebia para tentar ter um ponto de partida, mas era tão difícil quando se era uma fugitiva, pois não podia se aproximar dos Byun’s sem que eles a reconhecessem. Então, não avançava em nada. Estancada, Jihyun, decidia pelo que era mais fácil acreditar: Donghae estava mentindo. Repetiu isso para si mesma durante muitos anos, até que olhar as fotos de Baekhyun parecesse injusto quando seu outro filho deveria estar consigo.  

Travou a tela do celular, não valia a pena remoer aquele tipo de sentimento. Baekhyun tinha uma vida boa, com pais que o amavam e agora, com dois irmãos. Era mais do que Jihyun imaginou que ele pudesse ter se tivesse levado-o consigo. Só Dal podia imaginar o tipo de desastre que seria e para o bem da verdade, talvez, o seu primogênito estivesse melhor assim também. Pois segundo o que escutara de Donghae, ele havia ido parar em um orfanato, por isso era de se esperar que uma família o tenha adotado.

Talvez, nem saiba que é adotado, pensou.

Virou de peito para cima e suspirou. Estava tudo complicado demais, percebeu. Procurar o seu primeiro filho, era como procurar um fantasma. Sem rastro, sem testemunhas... Realmente, o Senhor Byun — pai de Siwon — tinha feito um bom trabalho em escondê-lo.

Destravou a tela do celular e procurou o número de Donghae nos contatos. Se ela pelo menos conseguisse o fazer trabalhar para si mais uma vez, era provável que os documentos ainda estivessem na Alcateia Byun, escondidos em algum lugar secreto, que nem mesmo Siwon sonharia em procurar. Mas ela não podia entrar na Alcateia sem denunciar sua condição, então restava-lhe Donghae.  O bobo, Lee Donghae, que estava acima de qualquer suspeita.

Começou a digitar uma mensagem de texto para o ômega, convocando-o para um encontro de paz.

***

O quarto era simples. Uma janela entre duas camas de solteiros. Um baú em cada pé de cama. E era isto. Do olhou em volta, as paredes brancas o lembravam do quarto de hospital onde passará algumas semanas se recuperando do acidente de carro. Olhou para atrás de si, onde o médico beta, Dr. Lee Sungmin, estava.

— Não é muito grande, mas dá para você ficar aqui por um tempo. — ele disse diante do olhar um tanto desolado do garoto ômega, mas afinal o que ele esperava de um abrigo? — Você vai dividir o quarto com meu aprendiz, Huang Zitao. — então desviou os olhos para seu relógio de pulso. — Ele deve estar chegando daqui a pouco. — voltou a olhar para o garoto, que agora sentava-se na beira da cama vazia, agora ocupada por si mesmo.  — Se precisar de alguma coisa ou sentir algo, pode falar com Zitao, ele irá me comunicar se não conseguir resolver.

Ele assentiu colocando as mãos na barriga de seis meses. Era uma barriga um tanto pequena para o tempo que tinha, mas o beta havia dito que fora culpa do acidente, que prejudicou que o bebê recebesse os nutrientes da forma correta do ômega, mas tudo parecia sob controle agora, se assegurou, ao lembrar do modo como fora tratado. Estava tudo sob controle, quando pensava na saúde do seu filhote.

— O jantar vai ser servido daqui uma hora. — o beta continuou diante do silêncio do outro. — Não se atrase, sim? — Do assentiu e o médico suspirou antes de sair do quarto.

O ômega encarou a outra cama e sentiu uma pontada na têmpora, como se alguém tivesse enfiado uma agulha bem acima do seu olho. Levou a mão até ali e esfregou o local, tentando aliviar a dor. Então fechou os olhos, respirou fundo. As dores de cabeça eram bem normais, devido a batida na cabeça. Sungmin havia lhe dito, que com a diminuição do coagulo na área responsável por suas memórias, era possível que as recuperasse, mas até que isso acontecesse parecia um bocado de tempo vivendo sem saber o próprio o nome. Abriu os olhos novamente e desceu as mãos até a barriga, acariciou-a, pensando se o pai daquela criança o estava procurando ou se era aquele alfa que estava consigo no carro.

Fitou mais uma vez a cama vazia e meio tombou a cabeça para o lado, mordeu o lábio e franzio a testa. Alguma coisa em si conhecia aquele padrão, a forma como as duas camas estavam dispostas ao lado uma da outra. Tinha certeza que já havia visto aquilo, mas se ele ao menos pudesse se lembrar onde... Suspirou fechando os olhos, deitou-se de lado. Tentou procurar em sua mente a cena parecia com aquela, mas tudo que encontrou foi um pouco mais de dor de cabeça e alguns flashs coloridos sem sentido. Ficou tão concentrado nisso que não percebeu quando a porta se abriu, deu-se conta apenas quando uma mão foi depositada no seu ombro, chamando-o.

— Está bem? — o garoto perguntou, visivelmente preocupado.

Do sentou-se na cama, esfregando a têmpora mais um pouco.

— Sim. — piscou ao mesmo tempo que sentia seu filhote chutar, parecia pressentir a sua desconfiança, colocou a mão ali. — Quem é você?

O garoto riu. Era muito mais novo que si, um adolescente em roupas de gente adulta. Usava camisa e calça social, como se tivesse vindo de uma entrevista de emprego, mas pelo jeito como a mochila havia sido largada no pé da sua cama, Do notou que, talvez, tivesse vindo da escola.

— Huang Zitao. — apresentou-se sorrindo, a mão estendida. — Seu colega de quarto.

Do apertou sua mão e farejou o ar, involuntariamente.

— Você é ômega. — percebeu e subitamente as bochechas do garoto tornaram-se róseas.

— Desde o começo do ano. — contou e Do sorriu, com o jeito como Zitao parecia inocente e nenhum pouco confortável com a sua condição.

Fazia-o lembrar-se de alguém...

— Tem quantos anos? 14? — chutou. O ômega mais novo assentiu. — Foi quando me descobri ômega também. — subitamente falou e logo estava arregalando os olhos.

Ele havia se lembrado!

Levou a mão até a boca, assustado com aquela informação tão mínima, mas que significava tanto.

— Tudo bem?  — o Huang se apressou na sua direção novamente. — Está sentindo alguma coisa? — segurou-lhe o pulso e começou a verificar sua pulsação, do jeito que tinha aprendido nas aulas com o Professor Lee Sungmin.

Zitao estava treinando desde os 12 anos, quando percebeu que gostava de cuidar de outras pessoas, para ser um curandeiro. E com ajuda de Lee Sungmin, que o apadrinhou, o garoto estava cada vez mais perto de ser um curandeiro formado entre os lobos, pelo Santuário. Esperava se formar um sacerdote quando fizesse 18 anos, mas até lá era um longo caminho de aprendizagem e uma das áreas que o chinês mais tinha interesse era a obstetra. Achava fascinante o modo como ômegas machos conseguiam engravidar e levar adiante uma gravidez, também apreciava a gravidez feminina. E até o momento já havia participado de dois partos como ajudante do Professor Lee.

— Estou enjoado.  — o ômega disse ao sentir o estômago revirar, a dor de cabeça ficando um tanto mais forte.

— Deite-se. — o chinês o fez deitar, colocou um travesseiro embaixo dos seus joelhos, para ajudar na circulação e o fez sentir o cheiro da própria palma.

Não havia quase nenhuma base cientifica para aquilo, mas de alguma forma o cheiro da pele da própria pessoa, fazia ânsia do enjoou ir embora. E foi isso que aconteceu com o ômega ao mesmo tempo que seus olhos se fechavam e o peito parava de subir e descer com pressa.

— Melhor? — perguntou.

Do assentiu ao mesmo tempo que um sino tocava. Zitao olhou para a porta, como se esperasse alguém entrar por ela, mas só estava avaliando as batidas do sino, contando os espaçamentos mentalmente afim de saber o que significava. Era o jantar.

— É melhor que fique aqui. — falou suavemente, avaliando a temperatura do outro ômega. Parecia normal. — Eu trarei o jantar. — então sorriu para passar segurança, mas o ômega apenas piscou na sua direção, parecia confuso. — Qual o seu nome? — lembrou-se que ele não havia se apresentado.

— Do. — respondeu baixo, era o único nome que escutara da boca daquele alfa, não parecia como se fosse o seu, mas era melhor do que não ter nenhum.

— Eu volto logo. Tente descansar. — afastou-se, apressado, correu porta afora.

Do virou-se na cama, ficando de costas para a outra cama e se encolheu ali. Fechou os olhos bem apertados e tentou lembrar-se de mais alguma coisa, só que quanto mais força fazia, mais dor de cabeça sentia. Em algum momento ficou cansado do vazio em sua mente e se aconchegou para dormir, abraçou o travesseiro que tinha estado embaixo dos seus joelhos, afim de acalmar seu lobo, que parecia estar cada vez mais triste de saudade de alguém que o ômega não lembrava. Não percebeu que estava chorando até que o primeiro soluço escapou dos seus lábios e não percebeu que estava sonhando até o momento que acordou com um nome impronunciável preso nos lábios.

Haviam imagens desconexas na sua mente. Todas muito embaralhadas, não sabia dizer qual era sequência de quem, contudo, conseguia apontar certa semelhança entre elas: todas se passavam em um quarto como aquele. Com duas camas de crianças, uma janela larga e pôsteres de animes pregados nas paredes. Era um quarto infantil demais para que o ômega não se desse conta de que era uma lembrança. Talvez, de quando ainda era um menino, nada além de um menino na casa que cresceu. Piscou os olhos, sentando-se na cama.

As dores de cabeça eram horríveis e o modo como tudo parecia tremer diante dos seus olhos, só deixava tudo pior. Devia ter algum problema de visão, tinha quase certeza disso. Fitou a cama ao lado da sua e encontrou Zitao deitado, lendo um livro de capa grossa. Abriu a boca para perguntar quanto tempo dormira, mas as palavras foram esquecidas na sua língua, quando uma outra imagem sobrepôs esta.

De repente, não era mais Zitao deitado na cama. Era mais baixo e gordinho, usava óculos redondos e parecia concentrado demais enquanto lia. O garotinho olhou para si, os lábios comprimidos em uma linha de irritação enquanto a marca de um galo se destacava na sua testa, como se tivesse caído de cara em algum lugar. Do se preparou para falar, mas as palavras ficaram presas. Ele não tinha ideia do que dizer, ainda mais quando sem aviso prévio algum um adulto ajoelhou-se na sua frente. Então, não era mais noite, o quarto explodia em luz de verão e o cheiro que aquele lugar tinha era tão familiar.

“Não corra mais, Kyungsoo”, ele disse antes de levantar o rosto.

Sorriu para si, enquanto o ômega sentia os olhos cheios de lágrimas ao mesmo tempo que o outro se aproximava e beijava-lhe o rosto de criança. O seu eu da lembrança fechou os olhos com aquilo ao mesmo tempo que a pessoa de verdade, recordava o cheiro daquele adulto e descobria sua identidade.

Pai. — murmurou.

E antes que o Huang pudesse perguntar o que havia de errado, o corpo de Kyungsoo desabou sobre a cama, desmaiado.

***

Minseok sentou-se à mesa da cozinha com uma xícara de café fumegante à sua frente. Observou o líquido escuro um tanto sonolento enquanto sentado do outro lado da mesa, Baekhyun parecia tão catatônico quanto si. Viu o alfa bocejar e sem poder se impedir, bocejou também.

— Quer café? — Minseok acabou perguntando depois de mais de meia hora de silêncio, empurrou sua xícara na direção do alfa. — Eu só achei o suficiente para fazer uma. — explicou.

Baekhyun não disse nada enquanto passava seus dedos pela alça da xícara e depois bebia um pouco do líquido. O devolveu para o marido, empurrando com a ponta dos dedos sem muito entusiasmo. Estava fitando a superfície da mesa, sem nada no pensamento e com uma sonolência visível. Eles deveriam ter dormido mais, pensou, mas sabia que não conseguiria. Eram anos acordando cedo, seu corpo estava simplesmente condicionado à aquilo.

— Você deveria descansar. — se escutou dizer à Minseok, a voz saindo rouca de sono.

Ergueu a mão para apoiar o rosto sobre a mesa ao mesmo tempo que o ômega bebia mais do café.

— Estou bem. — respondeu simplesmente e o alfa assentiu, mas não parecia ter acreditado.

Eles ficaram em silêncio de novo, com os pensamentos longe enquanto compartilhavam do café naquela xícara. Quietos sobre os acontecimentos daquela semana. Minseok tinha a impressão de que eles deveriam falar sobre, mas não tinha ideia de como começar aquele assunto e Baekhyun parecia tão mau-humorado naquele começo de dia, que o ômega decidiu pelo silêncio como melhor opção.

Empurrou a xícara pela metade para o alfa, mas Baekhyun a empurrou de volta.

— Beba. — cedeu e Minseok o fitou. — Eu posso comer mais tarde. — disse diante do olhar indecifrável do marido, nunca sabia dizer o que Minseok pensava ou sentia, era tão misterioso para si desde que voltara da França.

O ômega não contestou, apenas voltou a enlaçar seus dedos na alça da xícara e a levou aos lábios. Sorveu o líquido devagar ainda com os olhos nos de Baekhyun. O alfa não fez força para desviar e então aquilo estava acontecendo de novo, Minseok percebeu. Era normal durante o cio ter os olhos de Baekhyun sobre si, cheios de desejo e posse, mas ali, quando o cheiro dele estava no grau normal, tudo que Minseok conseguia ler nas orbes do marido, era uma coisa engraçada, parecida demais com preocupação.

Desviou os olhos, as bochechas ficando vermelhas ao mesmo tempo que Baekhyun afastava a cadeira e ficava de pé, parecia ter cansado de brincar de encara-encara. O loiro devolveu a xícara quase vazia para a mesa e colocou as mãos sobre as coxas. Usava um short e uma camisa, que o próprio alfa havia colocado em si quando estava exausto demais para abrir os olhos.

Realmente, cios de alfas eram mais intensos. Seria por isso que Baekhyun se mostrava preocupado? Minseok havia avaliado sua aparência no espelho, quando acordara. Estava pálido, com alguns hematomas pelo corpo, um corte no lábio inferior e olheiras profundas, de quem não dormia há dias. Estava péssimo, reconhecia. Nenhum pouco atraente. Mas não era como se isso tudo fosse culpa do Byun, o ômega tinha sua parcela de culpa também quando veio ao encontro deste sem ser chamado, ele havia escolhido estar ali.

Suspirou e levantou o olhar apenas para perceber que o marido já havia saído da cozinha. Encarou a xícara mais um pouco, antes de ficar de pé e sair dali também. Logo eles teriam que voltar a vida real, onde não passavam de duas pessoas em um casamento de conveniência. Ou seja, precisava de um banho gelado e bem demorado.

No entanto, Baekhyun estava sentado na beira da cama, os cotovelos apoiados nas coxas e o queixo nas mãos. Parecia pensativo demais para que Minseok achasse que era por causa do cansaço pós-cio. Ele podia passar direto e ir até o banheiro e se preparar para ir embora, mas essa era uma opção fácil demais para querê-la, então respirou fundo e deu um passo em direção ao alfa. Era um tanto difícil conversar com Baekhyun, nunca sabia o que deveria dizer ou quando dizer, o alfa era tão fechado, que Minseok por vezes se perguntava como Chanyeol conseguia ser totalmente o oposto.

— Tudo bem? — perguntou baixo, as mãos atrás da costa, segurava os dedos do jeito que uma criança tímida faria.

Baekhyun ergueu o rosto e o fitou, parecia surpreso e confuso ao mesmo tempo. Mas assentiu mesmo assim, fazendo Minseok comprimir os lábios em desagrado pela resposta. Por isso, aproximou-se mais um pouco e sentou-se ao lado do alfa, deveria ser mais incisivo, percebeu.

— Sabe, você... você pode confiar em mim. — colocou as mãos sobre as coxas, as palmas estavam suando em nervosismo e ele sentia como se tivesse 16 anos de novo, falando com Jongdae pela primeira vez ao redor da fogueira. — Nós estamos casados agora e se não podemos confiar um no outro, então quem nos resta? — seus olhos não estavam em Baekhyun, fitava o chão de madeira do quarto.

Restava o silêncio, Baekhyun respondeu mentalmente. O velho silêncio que sempre o acompanhava.

Soltou um suspiro e se preparou para responder. Acreditava que Minseok tinha razão, mas ao mesmo tempo não queria ceder e se machucar. Estava com medo de se apegar e depois simplesmente ter que terminar com isso, afinal, não era bobo. Sabia sobre a cláusula de dois anos no seu contrato de casamento, que dizia que se Minseok quisesse ir embora, poderia ir sem mais problemas, contanto que eles não tivessem filhos. Mas o que ele deveria fazer? Ambos estavam caminhando para um ano de casamento, logo teriam completado dois anos. Haviam cios demais para acontecer nesse meio tempo, convivência demais para que Baekhyun continuasse ignorando o marido. Ele se acostumaria, mesmo que não quisesse.

Se machucar pareceu-lhe inevitável.

— Então confie em mim também. — se escutou dizer, quase tão baixo e inseguro quanto Minseok.

E antes que perdesse a coragem, depositou sua mão sobre a de Minseok em sua coxa. O ômega retesiou o corpo em surpresa e levantou o rosto para encontrar o do alfa, atrás de alguma explicação para o ato. Baekhyun o fitou de volta, e tudo estava tão silencioso enquanto o loiro avaliava o castanho dos olhos dele. Tentando ler qualquer coisa, tentando saber se era o único que sentia aquele comichão estranho na boca do estômago. Não mexeu sua mão e muito menos o Byun mexeu a sua, as duas apenas ficaram ali. Uma em cima da outra.

Eles podiam fazer isso, os dois podiam ao menos construir uma amizade, Minseok se assegurou. Eles podiam confiar um no outro e tentar transformar aquele matrimonio em algo bom, talvez, até mesmo tivessem filhotes no futuro. Talvez eles... Não. Ainda era perigoso pensar nisso. Só que mais perigoso do que isso, foi o jeito como Baekhyun retirou a mão de cima da sua e segurou-lhe o rosto, cobrindo a bochecha direita com a palma da mão.

Porcaria, Minseok pensou ao sentir a boca ficar seca. Não era idiota, conhecia muito aquela sensação, que só pareceu piorar quando Baekhyun cobriu sua outra bochecha com a outra palma, desviou os olhos para sua boca. Fechou os olhos involuntariamente e esperou o beijo, com o coração aos saltos. Não era o cio, o cheiro de Baekhyun não estava forte, seu corpo não estava queimando em desejo... aquilo era pior, era mais brando. Era como sentir o vento no rosto na primavera, suave e doce.

Perigoso demais, sua consciência o alertou. Deveria se afastar e afastar aquelas sensações, estava sendo burro por deixar aquilo tudo vir tão depressa, mas Minseok havia sentido saudade da sensação gelada na ponta dos dedos quando enfiou os dedos nos cabelos de Baekhyun e o trouxe para perto, do jeito como o estômago se revirou em ansiedade ao quere-lo tão perto e da surpresa que era perceber o quanto aquilo era bom.

Eles deitaram-se na cama, com Baekhyun sobre seu corpo. As bocas juntas, famintas atrás do gosto do outro. Minseok estava tremendo quando os lábios de Baekhyun alcançaram seu pescoço do mesmo jeito que o alfa tremeu quando retirou sua camisa. O ômega passou as pernas pela cintura do marido, apenas para poder colar seus peitos nus, mas antes que pudesse tornar tudo mais profundo, teve o corpo de Baekhyun subitamente afastado do seu.

Minseok encolheu-se na cama, procurando sua camisa, tentando tapar sua nudez com as mãos, assustado demais, ao mesmo tempo que via o corpo de Chanyeol prensar o de Baekhyun contra a parede. A áurea alfa de Chanyeol, o estava deixando acuado. Ele se arrastou sob o colchão até o canto da cama, onde se encolheu, enquanto escutava os rosnados de ambos os irmãos.

— Fique longe dele. — Chanyeol rosnou contra o rosto do mais velho, mas Baekhyun simplesmente chutou-lhe os joelhos.

— Fique longe, você. — mandou, aproveitando-se da surpresa do irmão em ter sido golpeado e trocando de lugar consigo, agora, era Chanyeol que estava preso contra a parede. — O que acha que está fazendo? Aliás, quando chegou? — Baekhyun estava usando a voz ativa de alfa, o antebraço com curativo sendo pressionado contra a traqueia do irmão, para deixa-lo mais passivo com a falta de ar.

— Está dormindo com Kyungsoo e acha que eu não faria nada?! — tentou acertar o seu rosto, mas Baekhyun desviou, por ser mais baixo era sempre mais fácil se esquivar dos golpes do irmão. — Ele é meu ômega. — rosnou ao tentar soltar-se.

Baekhyun bufou e o soltou.

— Não seja idiota. Eu não me casei com Kyungsoo, — falou, mas Chanyeol o fitou com o olhar incrédulo. — se não acredita, então olhe você mesmo. — e sem aviso prévio algum, saiu do quarto, bufando e com os pensamentos fervilhando em sua mente.

Chanyeol caiu sentado no chão, as costas tinham deslizado pela parede de madeira. Puxou o ar com força antes de ver o irmão indo embora, quis se levantar para segui-lo e exigir explicações, mas quando levantou o rosto, se viu arregalando os olhos em surpresa diante da figura seminua de Kim Minseok encolhido no canto da cama.

— Minseok? — soltou inutilmente apenas para ver o rosto do ômega torna-se tão vermelho, que Chanyeol não conseguiu ficar indiferente, pois no minuto seguinte seu rosto também estava tornando-se vermelho, ao se dar conta da situação que havia atrapalhado.

E para o bem da verdade, Minseok só queria poder se fundir com a parede antes que derretesse de tanta vergonha.

***

Henry encostou-se no capô do próprio carro, com os óculos escuros no rosto e os braços cruzados, parecia um tanto sério demais. No entanto, de onde estava, procurou com os olhos por Oh Sehun. Era terça-feira à tarde, um dia um tanto frio apesar do sol brilhando no alto do céu, mas estava tudo bem, o ômega estava bem aquecido no casaco que pegara das coisas de Lu Han.

Afastou-se do carro quando avistou a silhueta longa de Sehun dentro do restaurante. Pegou sua bolsa, que estava sobre o capô e foi em direção ao local. Quase não acreditara quando o alfa havia marcado aquela reunião para discutir as novidades sobre o desaparecimento de Kyungsoo, ainda mais depois do modo como Joohyun o havia tratado. Parecia bem óbvio para si o modo como a beta não contaria nada ao filho.

Assim que entrou no restaurante foi em direção a mesa do Oh, que assim que o viu, pôs se em pé para saudá-lo com uma reverência respeitosa, do mesmo jeito que Henry o saudou. Então, ambos sentaram-se.

— Os senhores querem fazer o pedido? — o garçom perguntou, surgindo de lugar nenhum e causando surpresa no ômega.

Lançou um olhar para Sehun, não sabia se deveria dizer algo ou não.

— Você quer algo? — o Oh perguntou diante do seu olhar.

Henry quis assentir, afinal havia tido um dia de trabalho cheio na Alcateia Kim, mas achou melhor apenas se manter no seu lugar. Afinal, não conhecia Sehun direito, não sabia o que ele podia pensar se aceitasse algo assim, transformando aquilo em um encontro. Era melhor manter o ar sério de reunião.

Fez que não com a cabeça e Sehun dispensou o garçom da mesma forma.

— Então? — O Lu decidiu entrar de vez no assunto, retirou os óculos escuros e os guardou na bolsa ao mesmo tempo que Sehun ajeitava-se na cadeira.

Escutou um farfalhar de papel e olhou para a mesa, apenas para ver o alfa deixar ali um envelope marrom. Colocou a bolsa ao lado da cadeira que estava sentado e puxou o envelope na sua direção. Abriu-o, olhando por cima suas informações. Minseok ficaria animado com aquilo.

— Aí estão alguns dados sobre aquele dia, como os funcionários que estavam trabalhando, quem estava fazendo a segurança do casamento. — Sehun disse.

Henry espalhou os papéis sobre a mesa, procurando a lista de funcionários. Esse havia sido um pedido especial seu, pois havia um certo incomodo no seu cérebro todas as vezes que pensava que Kyungsoo teria armado uma fuga sozinho. Não parecia que algo impulsivo, como Minseok chamava, ser tão bem trabalhado ao ponto de não deixar nenhum rastro para trás. Kyungsoo era um ômega, mas não como ele e muito menos como Minseok. Ele não saberia apagar seus rastros tão bem, tinha certeza disso. Por isso, segurou a lista de funcionários, como se ali estivesse as respostas de todos os seus problemas.

— Quem estava fazendo a segurança da Alcateia Kim? — perguntou ao começar a ler os nomes, todos eram lobos de confiança. Betas que eram totalmente fiéis aos seus superiores, nenhum trairia Junmeyon.

— Kim Jongdae. — Sehun respondeu e logo estava estalando a língua entre os dentes, como se tivesse lembrando-se de algo. Meio se inclinou sobre a mesa e começou a vasculhar entre os documentos. Henry o observou, ansioso. — Aqui. — empurrou ao ômega. — O padrão de segurança que ele usou naquele dia.

O Lu franzio a testa para aquilo estampado na folha de A4. Era obviamente o desenho da Alcateia Kim, os pontos pretos representando onde os sentinelas estavam postos. Todos muito bem arrumados, mas apenas se um ataque viesse da frente. Observou a parte de trás, onde ficava a floresta. Um ou dois sentinelas ali, totalmente desfalcado mostrando que ou Kim Jongdae era muito inexperiente ou estava escondendo alguma coisa. O que seria importante o suficiente para que Jongdae esperasse um ataque pela frente?

— Isso não é estranho? — Sehun perguntou. — Há mais lobos sentinelas concentrados dentro da alcateia, nos portões da frente, do que na entrada pela floresta. Se alguém fosse atacar os Kim’s com certeza viriam por trás.

Era verdade, Henry pensou. Então, ele procurou sua bolsa e procurou uma caneta ali e sem pensar muito marcou o lugar na imagem, onde não haviam sentinelas. Traçou um a linha desde o começo até o final. Sehun apenas o observava, sem saber o que o ômega pretendia mas sem querer perguntar e atrapalhar seu raciocínio. Desse modo, fitou a testa franzida do Lu quando o mesmo voltou a olhar a ficha de funcionários. Ao lado do nome de cada lobo havia sua função e quais lugares tinha acesso.

Kim Jongdae: acesso livre.

Desviou os olhos para a forma como a linha azul se estacava na imagem, formando um caminho perfeito até a floresta. Balançou a cabeça em negação, aquilo não podia fazer sentido, mas quanto mais pensava nisso, mais percebia que fazia sim.

Ele estava lá. Quando aconteceu a captura de Baekhyun e Chanyeol, fora Jongdae que contara a Leeteuk sobre Minseok e Kyungsoo. Ele tinha estado cuidando dos prisioneiros. Aliás, fora ele que o mandou embora com as ordens de Leeteuk. Estava lá durante o casamento, tomara conta da segurança do local e tinha livre acesso a casa dos Kim’s.

Kim Jongdae estava lá o tempo inteiro, pensou.

— Que filho da mãe! — exclamou.

— O que aconteceu? — O Oh lançou um olhar ansioso para si.

Henry colocou a lista sobre a mesa e apontou com o dedo.

— Kim Jongdae era o responsável pela segurança, também tinha livre acesso a casa dos Kim’s. — contou. — O senhor Ryeowook me disse que havia sido ele quem deveria levar Kyungsoo até Heechul para a Cerimônia Vermelha, mas...

— Ele não estava no quarto. — Sehun completou recordando-se que ele mesmo tinha estado com Ryeowook quando o mesmo recebeu essa notícia. Seus olhos se arregalaram quando entendeu onde Henry queria chegar.

— Aqui, olhe pra isso. — mandou, apontando a linha que fizera na imagem. — É um caminho.

— Não diga que...

— Não acho que Kyungsoo fugiu. — externou.

— O que? Espera. — voltou a se encostar na cadeira. — Está dizendo que Kim Jongdae o raptou? — Henry assentiu. — Mas por que?

O ômega cruzou os braços e se encostou na cadeira também, mordeu o lábio e tentou pensar. Era como um jogo, recordou-se. Ele e Minseok brincaram disso na Academia: pegue o vilão. Como vieram a batizar o jogo. Eles eram colocados em uma sala, uma dupla por sala, com um punhado de papéis em mãos e pistas espalhadas por todo canto. Só podiam comer ou beber se descobrissem algo relevante. Mas ali, não era mais um jogo, estava acontecendo de verdade, com pessoas que ele costumava conviver.

Pegue vilão, disse a si mesmo mentalmente.

Sehun o fitou, sem saber o que deveria fazer. Não havia com o que contribuir quando não convivia tanto com os Kim’s mesmo antes de romper a aliança e mesmo durante o casamento, não virá muita coisa de relevante. Era um dia normal, lembrou. Minseok parecia apreensivo, Leeteuk estava radiante e Donghae havia chorado no banheiro dos Kim’s depois que deixara Baekhyun ir em direção a Cerimônia Vermelha. Todos pareciam despedaçados de alguma forma, todos tão infelizes quanto os noivos.

— Droga, droga, droga.  — Henry resmungou, arrumando apressadamente os papéis dentro do envelope e tirando Sehun dos seus pensamentos.

— O que está fazendo? — perguntou ao ver o ômega colocando tudo de mal jeito dentro da bolsa.

— Preciso falar com Minseok. — disse ao colocar a alça da bolsa no ombro.

— Lembrou de algo suspeito, não foi? — o alfa sondou e o Lu suspirou, parecia não querer contar. — Tudo bem, não me conte agora.

Henry segurou a alça da bolsa, de repente parecia envergonhado da sua atitude.

— Quando souber mais, eu te conto. — se escutou dizer e o alfa assentiu antes de vê-lo partir, andando apressado até a saída, fazia Sehun crer que o que quer que Henry tenha lembrado, era de uma importância crucial.

***

Leeteuk sentou-se no sofá da casa dos Byun’s, desconfiado e um tanto impaciente. Esperava encontrar Heechul logo e então ir embora dali, mas a empregada beta desapareceu com a promessa de encontrar o Kim há uns bons minutos atrás, o alfa começou a pensar que ia acabar demorando mais ali. Escutou passos na escada e virou o rosto naquela direção, apenas para encontrar a figura gorda de Lee Donghae descendo a escada devagar, olhando para os degraus e demorando-se em cada um, fazendo o Kim saber que a barriga de oito meses estava bastante pesada.

Revirou os olhos com a imprudência do outro, afinal deveria estar descansando, deitado em algum canto enquanto suas empregadas lhe serviam ou até mesmo Siwon lhe servia tudo o que precisava. Cruzou os braços e permaneceu onde estava, virou o rosto para frente e não mexeu um músculo para ajudar o ômega na escada. Contudo, logo sua atenção estava sendo chamada quando a porta de entrada se abriu e fechou-se com força.

Leeteuk ergueu o olhar da mesinha de centro e observou o corpo de Byun Baekhyun entrando, irritado, as mãos fechadas em punho ao lado do corpo. Virou-se no sofá para observar melhor, conseguia sentir a áurea alfa dele agitada e tinha quase certeza de que se o chamasse, receberia um rosnado em troca.

— Baek. — escutou Donghae o chamar, erguendo a mão e tocando-lhe o braço, que só agora o alfa notava, enfaixado. Baekhyun parou, respirou fundo e fitou o ômega. — O que aconteceu? Onde está Minseok? — e com a pronuncia do nome do filho, ergueu as sobrancelhas.

— Pergunte a Chanyeol. — Baekhyun bufou antes de soltar-se do pai e correr escada acima, irritado demais para explicar o motivo.  

O alfa olhou para o caminho que o Byun fez da mesma forma que Donghae, mas depois estava deixando de lado aquilo. Não era problema seu, afinal. Voltou a olhar para a mesinha de centro, desejando internamente que Heechul aparecesse de uma vez, coisa que realmente não aconteceu. O que aconteceu foi Lee Donghae colocando uma bandeja com chá e biscoitos sobre a mesinha de centro e sentando-se à seu a frente, em outro sofá.

— Achei que podia estar com fome. — falou ao sentar-se com dificuldade, Leeteuk se resumiu em permanecer onde estava, com os braços cruzados e dessa vez, a testa franzida em alguma coisa que ele não conseguia classificar. — O que aconteceu com seu rosto? — Donghae perguntou ao notar o roxo no lado direito do seu rosto.

— Nada demais. — respondeu simplesmente, não estava afim de manter uma conversa com o ômega.

Alguns minutos de silêncio, com o Lee acariciando a barriga de oito meses e com Leeteuk, sem realmente querer, identificando o cheiro de Siwon misturado ao de Donghae, afim de mostrar que o ômega tinha um parceiro, só que além disso, o alfa conseguia sentir o cheiro levemente adocicado que vinha do ventre do mesmo, fazendo-o ter certeza de que pertencia ao bebê.

Havia escutado algo sobre a criança, achava que tinha sido Heechul que comentara sobre ser uma menina. A primeira menina entre os Byun’s em três gerações de garotos, um tanto surpreendente e pelo jeito como notava o cheiro, apostava que seria uma ômega, mas era cedo demais para pensar nisso. A garota nem havia nascido ainda e o cheiro que sentia não era certeza sobre sua classe. Talvez ela tivesse um cio tardio ou não tivesse cio algum... de qualquer forma, era cedo demais, se assegurou.

— Veio visitar Minseok? — Donghae tentou pegar um dos biscoitos na bandeja, mas desistiu quando teve que se inclinar muito, a barriga atrapalhava seus movimentos.

Duvidava muito que Minseok quisesse o ver, pensou. O filho havia passado alguns meses na Alcateia Kim depois do casamento, mas não havia tentado falar consigo. Não achava que ele ia querer falar consigo agora, ainda mais quando Leeteuk sabia que havia estragado tudo.

— Falar com Heechul, na verdade. — respondeu.

— Sabe, eu acho que deveria falar com Minseok. — Donghae continuou, pareceu não notar o modo como o alfa não queria manter uma conversa. — Ele nunca fala sobre, mas eu sei que sente falta da família, até mesmo de você... — e a voz estava insegura diante dos olhos castanhos avaliativos de Jungsoo. — e já faz algum tempo que tudo isso aconteceu, então pensei que podia ser bom pra ele falar contigo novamente.

— Pensou que podia ser bom? — devolveu, sorriu com escárnio, inclinou-se para frente. — Eu vou te dizer alguma coisa que podia ser boa: Siwon não ter matado meu irmão.

Donghae piscou com a mudança repentina do assunto, mas o que ele podia esperar de Leeteuk? O alfa sempre tinha duvidado de si e na época que conheceu Siwon, era o único amigo do alfa que não apoiava seu relacionamento com o mesmo. Lembrava-se do jeito que o Byun ficava depois de algumas sessões de discussão com Leeteuk, sempre escolhendo ficar consigo do que escutar os conselhos do amigo. Suspirou, cansado. Uma parte sua ainda esperava se dar bem com o Kim, acreditou que com o casamento dos filhos de ambos, a amizade entre ele e Siwon pudesse voltar aos poucos, mas olhando agora... parecia um tanto impossível.

— A culpa não foi de Siwon. — se escutou dizer, os olhos baixos. — Kyuhyun estava dormindo com a pessoa que ele amava, Siwon tinha direito de...

— Matar?

— Ficar com raiva. — consertou.

— Ficar com raiva...  — sussurrou, meio rindo, debochando, fazendo Donghae sentir-se mais envergonhado do que falava. — Você não sabe o que diz, não foi você que sofreu as consequências. Tudo que teve foi fácil, não precisou fazer nada demais para ter tudo isso, quer dizer, só precisou piscar esses olhos pra Siwon e esperar a mágica acontecer. Eu tive que assumir uma alcateia de última hora, tive que casar com alguém que eu não amava, eu deixei meus sonhos pra trás. Siwon me deixou cheio de consequências, só porque ficou com raiva.

Donghae engoliu em seco, não sabia o que deveria dizer. Estava com medo do modo como a áurea alfa de Leeteuk parecia forte, como se ele estivesse ao ponto de gritar.

— E-eu sinto muito.

— Não preciso da sua compaixão. — bufou, voltando a encostar as costas no sofá.

— Não é...

— Cale a boca. — rosnou na direção do ômega, irritado demais com aquela conversa, com a visão do Lee, por estar tanto tempo esperando.

Estava irritado demais consigo mesmo.

— Não fale assim com ele. — subitamente Heechul estava ali, parado atrás do sofá, com os braços cruzados e olhos naquele tom de castanho sério, que sempre fazia Jungsoo engolir em seco antes de dizer qualquer coisa.

Virou o rosto para poder vê-lo.

— Já não era tempo. — falou, ignorando o que o Kim tinha dito antes. — Achei que teria que sair pela casa chamando seu nome. — tentou brincar, mas seu tom estava irritado demais para isso.

— O que faz aqui? — Heechul deu a volta no sofá e sentou-se ao lado de Donghae, descruzou os braços e se inclinou para pegar um dos biscoitos.

— Você desapareceu, achei que podia estar com problemas.

— Se eu estivesse com problemas saberia. — referiu-se a marca que compartilhavam.

Leeteuk bufou.

— Apenas vamos embora, acho que sua visita aos Byun’s durou tempo demais.

— Desde quando me dá ordens? — Heechul o provocou, comeu um biscoito logo em seguida. — Eu digo quando isso ficar demais.

— Não me provoque. — Jungsoo inclinou-se, cruzando as mãos perigosamente em frente ao corpo.

— Ou o que? Você nem queria estar aqui para começo de conversa. — Heechul inclinou-se do mesmo jeito, os olhos duros quando fitaram o alfa.

— Agora é você que quer me dar ordens. — riu antes de ficar de pé. — Vamos.

Mas Heechul se limitou a cruzar os braços, no entanto, Lee Donghae segurou-lhe o braço, fazendo o ômega mais velho encara-lo. Houve algum tipo de comunicação ali, que fez o Kim suspirar e ficar de pé.

— Vamos. — respondeu ao alfa, então Leeteuk começou a se afastar ao passo que Heechul o seguia, mas sem antes lançar um sorriso carinhoso à Donghae como se disse “está tudo bem”.

Então eles saíram, apenas para que Donghae fosse agraciado pela figura séria do marido o observando do alto da escada, não conseguiu se impedir de corar e abaixar o rosto, sem que pudesse ver o modo como Siwon curvou o canto da boca em um sorriso. Desceu vagarosamente, indo em sua direção ao mesmo tempo que o ômega escutava seu celular tocar. Reconheceu o som da mensagem e pegou-o do bolso, destravou a tela bem a tempo de Siwon chegar até si e já havia terminado de ler, com os olhos arregalados, quando o Byun sentou-se ao seu lado.

— Devia estar descansado. — o alfa disse, sem coragem para se aproximar mais, para beija-lo, ainda estava magoado com tudo que tinha acontecido. — O que há? — perguntou ao notar a forma como as pontas dos dedos de Donghae estavam tremendo levemente. — Hae. — desesperou-se, não queria que o marido passasse mal novamente, esse tipo de coisa não fazia bem algum ao bebê.

E subitamente, o Lee estendeu-lhe o celular. A tela estava acesa quando o alfa segurou o aparelho. Primeiro fitou o marido, em busca de algum sinal do que esperar, mas logo estava lendo a mensagem aberta ali. Comprimiu os lábios em total desagrado e ficou de pé num rompante, mais rápido do que Donghae podia acompanhar. Estava segurando o celular quando se afastou em direção a saída.

— Siwon. — o ômega levantou-se com dificuldade e foi até o marido, enquanto ele parecia agitado demais, andando de um lado pro outro. — Wonie. — chamou dando passos vagarosos em sua direção.

Siwon virou-se para si, ainda segurando o celular. Estava com raiva do modo como Jihyun era capaz de mandar uma mensagem tão simples, como se nada estivesse acontecendo, como se ela não tivesse mentido por mais de vinte anos. Era cinismo de mais para uma pessoa só, pensou.

— Eu vou lá. — ele disse e o Lee aproximou-se um passo ao mesmo tempo que via seu celular ser guardado no bolso do alfa.

— Wonie, não...

— Eu vou lá. — repetiu. — Eu vou acabar com isso.

Donghae não sabia o que dizer, só era capaz de sentir o seu estômago se revirando em ansiedade pelo que viria.

— Não deixe ela te machucar. — levantou a mão para tocar o rosto do alfa, delicadamente, como se ele fosse um animal raivoso.

Siwon deixou, até mesmo inclinou o rosto sobre a palma do marido. Precisava de um toque carinhoso, um abraço, qualquer coisa além do silêncio que ele mesmo se impôs. Se viu virando o rosto na palma do outro, beijando-lhe o pulso e o desejando tanto, que seu peito doía. Acabou o trazendo para perto, puxando-lhe até que estivesse perto o suficiente para enfiar rosto na curva do seu pescoço, atrás do cheiro de lírio roxo que apenas o Lee detinha, ali, no centro da nuca.

— Vou ficar bem. — sussurrou contra sua pele, fazendo-o se arrepiar e suspirar no minuto seguinte.

— Me deixe ir com você. — Donghae pediu, enroscando-se no marido, trazendo-o para perto numa maneira de matar toda aquela saudade, acreditara que ele não chegaria mais perto de si depois de tudo.

— Hae. — Siwon beijou-lhe o ombro coberto pelo tecido da camisa de algodão. — Isso é... você está...

— Estou bem. — sussurrou de volta, a ponta dos dedos entrando perigosamente por baixo da camisa do marido e tocando sua cintura. — Me deixe...

— Tudo bem. — se escutou concordar contra a pele do pescoço do ômega. Deixou um beijo ali antes de levantar o rosto e procura-lhe a boca. — Tudo bem. — sussurrou contra seus lábios e Donghae suspirou, de olhos fechados, anestesiado em tantas sensações boas, do mesmo modo que Siwon. — Vamos resolver isso juntos.

Juntos para o jeito certo, Donghae pensou, afinal não havia mais barreira alguma. Siwon podia olhar dentro da sua alma e não encontrar nada negativo. Donghae estava limpo de qualquer mentira, estava livre para apenas amar Siwon, sem sentir medo de perder tudo no minuto seguinte. E isso era o tipo de sentimento libertador, que fazia Donghae se sentir seguro.

***

— O que está dizendo? — Chanyeol perguntou, sentando-se na beirada da cama, os olhos um tanto desfocados.

— Nós... ninguém sabe onde ele está. — Minseok disse olhando para suas mãos, tinha estado apertando os dedos em nervosismo quando começara a contar a Chanyeol o que acontecera com Kyungsoo. — Nós o estamos procurando desde o casamento, mas não há nenhuma pista. — então, estava falando baixo, o nó se formando na garganta quando externava a inutilidade das buscas. — E já fazem meses... — suspirou, fechando os olhos e perguntando-se se algum dia veria o gêmeo novamente.

— Nada? Durante esse tempo todo? — Chanyeol parecia não entender o que o Kim dizia, repetia as palavras de um jeito catatônico, mas Minseok não podia culpa-lo, afinal era um baque e tanto saber que a pessoa que se ama estava desaparecida.

— Nada. — confirmou.

Chanyeol ergueu a mão e bagunçou os próprios cabelos, suspirou e depois estava fungando, chamando a atenção de Minseok, que o fitou um tanto surpreso. Não estava acostumado a ver alfas chorando. Ele arrastou-se em direção ao alfa sobre o colchão, até o momento ainda estava parado no mesmo canto que se refugiara quando Chanyeol surgiu naquele quarto.

— Chanyeol? — chamou, incerto do que deveria fazer.

Mas não precisar tentar mais do que isso, pois logo o Byun estava abrindo os braços e o trazendo para perto, envolvendo-o em um abraço surpresa, escondendo o rosto na curva do seu pescoço e chorando sobre sua pele.

— E-eu sou tão idiota, Minseok. — chorou. — D-deixei Kyungsoo sozinho.

Minseok franzio a testa em compaixão e ergueu a mão para dar alguns tapinhas nas costas largas do alfa.

— Não foi desse jeito, Chanyeol. — falou suavemente, mas logo estava mordendo o lábio, tentando não chorar também, porque havia deixado Kyungsoo sozinho também. — Ninguém tem culpa.

— Eu fui teimoso, me isolei. — chorou mais um pouco. — Meus pais me enviaram cartas, mas ignorei todas. Na verdade, eu ignorei todos. — abraçou Minseok mais forte. — E agora Kyungsoo está... eu nem sei.

— Não se culpe. Nós vamos encontra-lo, é só uma questão de tempo. — suspirou, apertando os olhos bem fechados, não queria chorar. — Sehun está fazendo algum progresso e eu e Junmyeon espalhamos cartazes com a foto dele por aí, alguém deve tê-lo visto. — era nisso que sua esperança residia: alguém devia tê-lo visto.

— Oh Sehun? — Chanyeol levantou para fita-lo, os olhos estavam vermelhos do choro e as bochechas molhadas, parecia à Minseok mais ômega do que si mesmo. Tão frágil. — Você ia casar com ele, não era?

Minseok mordeu o lábio mais um pouco antes de assentir.

— Isso foi antes. — suspirou, não havia contado exatamente como vierá parar junto de Baekhyun, era estranho demais lembrar-se daquele dia. Tudo havia acontecido tão rápido, com todos eles sento golpeados de uma vez. — Bom, meu pai me obrigou a casar com Baekhyun depois que Kyungsoo desapareceu, então... não havia como manter um noivado com Sehun. — contou, os olhos desviando-se do Byun.

De alguma forma ainda sentia por Oh Sehun. Pobre garoto alfa que havia sido trancado em um quarto para que Minseok pudesse correr em direção aos braços de outro, não havia sido justo consigo e pra falar a verdade, por vezes, o Kim sentia que não havia sido justo consigo também.

— E-eu sinto muito.

Eu também sinto, pensou.

— Está tudo bem. — assegurou e se afastou de Chanyeol.

— Er... bem que parecia mesmo, você e Baekhyun estavam...

Minseok corou, o que fez Chanyeol rir, baixo, ainda triste demais para deixar o sorriso escapar mais. Mas era o suficiente pro clima estranho se dissolver.

— Não era nada demais. — se escutou dizer, mas Chanyeol estava lhe lançando um sorriso malicioso. Tarde demais para tentar contornar a situação, pensou.

— Não parecia nada demais.

O Kim não conteve em empurra-lo, o rosto queimando tanto que achou que suas bochechas fossem derreter. No entanto, tudo que Chanyeol fez foi rir mais um pouco enquanto o ômega ficava de pé.

— É melhor nos irmos. — começou a se afastar sem esperar pelo alfa, que logo estava correndo atrás de si.

— Espera. — Chanyeol passou um braço por sobre o seu ombro e o trouxe para perto. — Não fuja de mim. — meio o abraçou e Minseok fechou os olhos, desejando poder sumir dali. — Nós somos praticamente irmãos agora. — Chanyeol praticamente cantarolou, fazendo Minseok sorrir.

E foi sorrindo que entrou na Mansão Byun, com um Chanyeol no seu encalço, fazendo perguntas nada discretas e deixando o ômega mais envergonhado. Mas com sorte, conseguiu livrar-se dele ao dizer que precisava de um banho, porém foi apenas com a promessa de encontra-lo mais tarde e contar mais coisas sobre o desaparecimento do gêmeo, mesmo que Minseok não soubesse de mais nada. No entanto, concordou, pois conseguia entender o lado de Chanyeol. Ele não estava ali desde o começo, não sabia como tudo tinha acontecido, não sabia os progressos e ainda estava sensível sobre tudo. Minseok só esperava que Chanyeol colaborasse com alguma coisa. Talvez, o alfa soubesse de algum lugar secreto que eles frequentavam na época do namoro, era provável que Kyungsoo pudesse estar lá.

Suspirou mais um pouco antes de entrar debaixo do chuveiro e começar seu banho. Estava sendo um dia agitado, pensou, mas logo estava sorrindo do modo como Chanyeol conseguia ser enormemente otimista e com um bom humor, mesmo diante da notícia do desaparecimento de Kyungsoo. Minseok acreditava que o alfa só estava mascarando sua dor com um sorriso no rosto e fazendo piadas sobre seu casamento com Baekhyun, mas de alguma forma todos eles estavam fazendo a mesma coisa. Seguindo em frente sem querer seguir, ainda parados na porta de entrada, esperando por Kyungsoo.

Às vezes, Minseok sonhava com o irmão. Estava sempre perdido em algum lugar e para todas as vezes que o loiro chamava seu nome, o irmão não olhava na sua direção, então sempre acordava com o nome de Kyungsoo preso nos lábios, sufocado em sua garganta e o peito pesado. E foi pensando nisso que começou a chorar debaixo do chuveiro. Queria que o irmão voltasse de uma vez, ninguém iria culpa-lo pela fuga, estavam todos com saudade demais para pensar nisso. Minseok só queria que ele voltasse, logo, rápido, viesse em sua direção e provasse que ainda estava vivo e bem, porque o ômega odiava aquela incerteza que aparecia a cada novo dia. Alimentava seus fantasmas e deixava-o apavorado com a ideia de nunca mais ver o gêmeo.

Encolheu-se contra a parede do banheiro, a água descendo por suas costas e as lágrimas se confundido com a água do chuveiro em seu rosto. Por que Kyungsoo não podia simplesmente voltar? Já eram seis meses sem notícias suas, sem escutar suas reclamações, de olhar nos seus olhos ou simplesmente sentir o seu cheiro. Sentia falta do irmão de uma forma avassaladora, doía no peito, rasgava sua alma, sufocava.

Apenas volte, pediu. Em algum momento rezou para Dal, a deusa Lua, pedindo pela saúde do irmão, pedindo-o de volta entre os Kim’s. Então chorou por tempo suficiente embaixo do chuveiro, até que suas mãos ficassem enrugadas. E teria chorado por mais tempo se alguém não tivesse batido à porta do banheiro, chamando-o para a realidade. Era a empregada beta, perguntando se o ômega desejaria almoçar no quarto. Desejava, respondeu. Desejava ter 14 anos de novo, com a cama de Kyungsoo ao lado da sua enquanto eles conversavam bobagens durante a noite e comiam besteiras, sempre rindo de um fato aleatório.

Havia sido uma boa época, Minseok sabia. Quando eles eram só adolescentes descobrindo o mundo, conhecendo pessoas, cheios de curiosidade. Gostava daquela época, quando não tinha preocupação alguma, quando ainda corria atrás de Kim Jongdae pela alcateia, seguindo-o com os olhos sempre que podia, pagando de bobo na frente do irmão, imaginando um futuro cor-de-rosa entre ele e o alfa. Tudo mentira. Nada além de ilusão, pensou. Aquilo nunca existiu... Kim Jongdae era um alfa idiota, que só queria tirar sua virgindade, não gostava de si realmente, tudo fazia parte de um plano para se aproveitar de si e de sua posição como herdeiro Kim. Minseok conseguia ver melhor agora, mas na época tinha doido como ferro quente na pele saber que havia sido usado.

Lembrava-se muito bem do jeito como quis ser mais parecido com Kyungsoo, apenas para não ser enganado novamente, pois Kyungsoo era mais inteligente. Ele conseguia saber o que as pessoas queriam antes que elas pedissem, sempre sabia o que fazer e como fazer. Ele não tinha sonhos cor-de-rosa idiotas da forma que Minseok tinha, para Kyungsoo tudo era muito prático, muito rápido, simplesmente fácil.

Kyungsoo era quem devia ter ido para a Academia. Teria se dado melhor, talvez conseguisse seguir as regras e não sentisse medo de si mesmo, porque Minseok sentia. Ainda tinha pesadelos com as coisas que viu e com os treinamentos, o modo bruto como fora tratado e moldado nessa forma mais bruta ainda, sabia que a Organização o tinha feito perigoso, pois sentia-se assim. Terrivelmente perigoso, como uma bomba relógio, pronto para matar todos em volta num piscar de olhos. Mas Minseok nunca quis matar ninguém, foi por isso que mudou os resultados, correu contra a corrente, tentou fazer seu destino. Ele não queria segurar uma arma e muito menos aponta-la para alguém.

Claro que no começo era fácil, sempre escutara que a primeira morte era difícil. Mas a sensação que veio quando matou a primeira vez, era tudo menos difícil. A segunda vez foi mais fácil ainda e na terceira vez, Minseok já não sentia mais nada. Parecia certo matar aquelas pessoas, todas estavam fora das regras, todas tinham pedido por aquilo inconscientemente. Era o que sempre lhe dizia seus professores: “nós estamos protegendo nossa espécie”. Sim, realmente estavam, Minseok acreditou nisso tempo suficiente até que foi classificado como ômega negro.

É a classe mais alta, Henry tinha lhe parabenizado. Mas nunca poderia voltar para casa se aceitasse aquilo, não poderia ter uma família. Ele teria que abandonar todos e seguir em frente com novo nome, uma nova vida, limpando o mundo de pessoas que ameaçassem sua espécie. Não teria um lar, mudaria constantemente de lugar e com sorte ainda conseguiria manter Henry em sua vida, mas ia ter que esquecer o nome Kim e tudo que vinha com ele. Minseok teria que cometer o assassinato mais terrível de todos para ser um ômega negro perfeito, digno de todos os louros da Academia: Teria que desistir de si mesmo.

Teria desistir dos seus sonhos cor-de-rosa, abandonar de vez a ideia de um dia ter um filho ou um marido ou sei lá o que. Teria que afogar a si mesmo até que não pudesse mais escutar sobre o quanto seria bom se apaixonar de novo, deixar que alguém se aproximasse novamente, pois desde Jongdae, Minseok não teve nada além de casos. Apenas encontros que faziam parte do trabalho e encontros que faziam parte do cio, nada além disso. Tudo muito casual, tudo muito mecânico. Era bom daquele jeito, tinha que admitir. Tornava tudo mais fácil e seria mais fácil ainda se ele tivesse aceitado ser um ômega negro... se ele apenas tivesse dito sim, não poderia nem sonhar em ter filhos, simplesmente porque a Organização daria um jeito para que ele nunca pudesse tê-los.

Era assim que funcionava, afinal. Ômegas Vermelhos eram obrigados a espionar seus parceiros, construir uma família para manter a aparência, sempre viveriam dela até o fim. Ômegas Neutro tinham mais sorte, podia se apaixonar e construir uma família por querer, era mais do que os Vermelhos podiam ter, afinal nem todos tinham sorte de ter um parceiro bom ao seu lado. Mas ômegas negros... eles eram apenas isso: escuridão. Eles limpavam a sujeira, deixavam tudo em paz para que os outros pudessem ser felizes enquanto eles apenas observariam, de longe todas as coisas que nunca poderiam ter.

— Minseok? — escutou alguém bater na porta do quarto enquanto se vestia, havia acabado de sair do banho e dos pensamentos.

— Sim? — respondeu incerto depois que reconheceu a voz de Lu Han, em parte porque não entendia o que trazia o ômega ali. Foi até a porta, ainda abotoando a camisa. — O que foi? — perguntou assim que abriu a porta.

— Poderia ficar com Yixing por um momento? — Lu Han perguntou, os olhos ficando grandes em apreensão, fazendo Minseok bufar porque não podia acreditar que o Lu estava usando aegyo consigo. — Henry não voltou do trabalho ainda e o senhor Donghae está um tanto impossibilitado. — suspirou ao mesmo tempo que o loiro olhava para baixo depois de abrir mais a porta e observar Yixing ao lado de Lu Han com papéis nas mãos e uma maletinha de lápis-de-cor em outra, parecia pronto para riscar todas as paredes da Mansão Byun. — Preciso ter uma conversa em particular com Jongin, prometo que não vou demorar. — continuou. — Eu pediria a Baekhyun, mas Yixing não gosta do cheiro de alfas. — de repente parecia envergonhado.

O ômega suspirou e assentiu para o outro. Estava tudo bem, se assegurou. Não era tão bom com crianças assim, mas Yixing era um lobinho comportado, não achava que iria ter muito trabalho.

Lu Han agachou-se em frente ao filho, ajeitando suas roupas como se fosse deixar o filho na casa de um desconhecido, quando o Lu estaria à uns dois quartos de distância naquele mesmo corredor. Fazia Minseok achar engraçado, mas também pensativo, pois se perguntava se seria assim quando tivesse filhotes. Se realmente os tivesse, sua consciência sussurrou para si.

Se realmente conseguisse tê-los, disse a si mesmo mentalmente.

— Minseok vai cuidar de você por um tempinho. — disse ao filho em chinês. — Baba estará ali. — apontou pra lá. — Eu volto logo. — ergueu o dedinho mindinho para selar sua promessa de retornar e Yixing prontamente o enlaçou no seu, então Lu Han estava deixando um beijo na testa do filho antes de pega-lo no colo e entregar a Minseok. — Divirtam-se. — falou em coreano, antes de ir embora.

Minseok ainda lhe sorriu antes de fechar a porta do quarto e colocar o chinesinho sentado na beira da sua cama. Parecia tão pequeno e fofo, ainda mais com as covinhas nas bochechas e as mãozinhas daquele tamanho.

— Você quer desenhar? — perguntou e Yixing assentiu antes de estender o papel sobre a cama e ajeitar-se. Minseok o observou abrir a maletinha de lápis-de-cor e organizar as folhas, era como ver uma miniatura de Lu Han, terrivelmente organizado.

Acabou rindo para si mesmo.

— Quer delenhar? — o pequeno perguntou, no auge dos seus dois anos e meio, ainda se enrolava com as palavras, trocando letras e deixando tudo mais adorável ao ver do Kim.

Minseok assentiu antes de sentar-se à frente de Yixing na cama e segurar a folha que era lhe oferecida. O Kim procurou uma cor interessante entre os lápis, mas não sabia o que deveria desenhar. Contudo, ao notar o Lu desenhando, o que lhe pareceu, um animal, decidiu fazer o mesmo. Então, logo estava desenhando um lobo negro.

***

Lu Han sentou-se à frente do irmão no quarto que ambos dividiam, mas diferente de si, Jongin não parecia nenhum pouco animado. Na verdade, o irmão estava até bem quieto desde que o ômega contara que o acordo com os Kim’s havia sido aceito. Kim Junmyeon era oficialmente o seu noivo.

— Eu te levarei para conhece-lo na semana que vem. — Lu Han continuou, enquanto Jongin olhava para todos os lugares que não fossem o seu rosto. — Não fique nervoso, ele é um bom alfa. Tenho certeza de que vai cuidar bem de você.

— Como pode dizer isso? Você o conheceu não faz nem uma semana. — Jongin rebateu e então estava cruzando os braços e fazendo Lu Han suspirar, afinal estava demorando para o ômega dar seu show de irritação.

— Minseok me falou sobre ele e eu também o investiguei. — contou. — Não há nada de ruim na sua ficha, Junmyeon é gentil e sensato.

— Então você deveria casar com ele.

— Não é desse jeito que funciona, Nini. — tentou pegar as mãos do irmão, mas o mesmo desviou-as. — Vamos lá, Kai. Não seja assim comigo. — tentou mais um pouco. — Nós conversamos sobre isso durante meses e você sabia que iria acontecer, por que está se comportando como se não soubesse?

Jongin comprimiu os lábios e abaixou os olhos, então jogou-se na cama, de braços abertos. Ele teria que contar a Lu Han uma hora de qualquer forma, em parte porque nunca poderia esconder algo do irmão assim e em parte porque não havia segredo entre eles.

— Lu Han, eu não quero casar. — contou com um suspiro, o que só fez Lu Han juntar as sobrancelhas daquele jeito preocupado que só irmãos mais velhos tinham. — Conheci alguém. — terminou de dizer, fazendo a preocupação do Lu mais velho sumir, para que a surpresa pudesse aparecer.

— O que está dizendo? — puxou o irmão, para que pudesse encara-lo, olhos nos olhos.

Jongin engoliu em seco diante da expressão de horror de Lu Han, parecia como da vez que o ômega dissera ao outro que ia estudar em uma faculdade humana. Lu Han o olhara daquela mesma maneira, como se tivesse dito que iria arrumar suas coisas e sumir no mundo.

— Eu conheci alguém. — repetiu.

— Só pode estar brincando. — o ômega ficou de pé, andando de um lado pro outro, a mão na boca e os olhos ainda muito grandes de surpresa. — Por acaso está grávido? — virou-se de supetão para o irmão, os olhos mais arregalados.

Se Jongin estivesse... se ele estivesse grávido, estaria tudo perdido. Todo o trabalho duro para trazer Junmyeon para o seu lado teria ido para o ralo tão rápido quanto veio.

— Não!  — Jongin sentou-se muito rápido, as bochechas se tornando vermelhas.

— Menos mal. — Lu Han relaxou. — Que droga, Kai! — esbravejou no minuto seguinte. — Quem é?

Lu Han mudava de humor tão rápido que Jongin estava se sentindo acuado.

— Não diga que é um alfa. — pediu ainda assim.

Jongin encolheu-se mais onde estava e Lu Han riu, amargo.

— Droga, Jongin! Nós conversamos sobre isso durante meses! — esbravejou. — Você sabia que iria casar, por que se deixou envolver? Não é capaz de pensar nas coisas?!

— E-eu... eu só me apaixonei, o que tem de errado nisso? — sussurrou.

— Não tem nada de errado. — Lu Han se aproximou, falando mais baixo e afastando a raiva, não gostava de ver Jongin acuado daquele jeito. Sentou-se do seu lado e o trouxe para um abraço. — Paixão é um sentimento bonito, Jongin. Não há nada de errado, mas esse não era o momento certo. Você entende? — e Jongin assentiu, as lágrimas se acumulando nos cantos dos seus olhos enquanto abraçava o irmão, já sabia onde aquilo ia dar. Ia ter que desistir de Suho. — Nossa alcateia depende de nós, não podemos ficar pra sempre com os Byun’s, nós...

— Por que não? — fungou. — Os Byun’s são legais, Baekhyun até deu um carro pro Henry.

— Eu sei, mas não é assim que funciona. Não há espaço pra mais uma alcateia aqui e nossos lobos não confiam tanto nos Byun’s assim, com os Kim’s temos chance de recomeçar. Junmyeon concordou em me dar um pedaço do seu território, nós vamos ficar protegidos lá. Os Kim’s são numerosos, eles nos camuflam. — disse suavemente.

— Lugie, e se... se eu não gostar dele? — sussurrou tão baixo, que o Lu quase não escutou.

— Apenas o conheça, tudo bem? Se você não gostar dele... eu dou um jeito. — Lu Han suspirou, já pensando no que faria para continuar o contrato sem que Jongin tivesse que casar. — Só se preocupe em conhece-lo.

Jongin assentiu ainda com a cabeça no ombro do irmão, eles ficaram ali muito tempo ainda. Com Jongin pensando no modo como contaria a Suho, que não poderiam se encontrar mais, que ele iria se casar com um Kim. Conseguia pensar que ia ser difícil pro alfa, pois sabia que ele era um Kim. Mas também ia ser estranho para si casar com alguém que mal conhecia. Jongin só esperava que tudo desse certo mesmo, não queria dar problemas para Lu Han. O irmão já se esforçava demais em deixar todos eles vivos e saudáveis, deveria pelo menos retribuir casando com aquele alfa.

É, era o melhor a se fazer, de qualquer forma. Afinal, dado as circunstâncias, não existia plano B.

***

Jihyun sentou-se na mesa reservada do restaurante. Ficava numa sala isolada, era perfeito para uma conversa particular. Havia conseguido marcar o encontro e agora, esperava que Donghae viesse até si. Tomara a liberdade de pedir uma bebida, queria acalmar seus nervos. Quase não dormira durante a noite, só conseguia pensar no que perguntaria ao Lee, como o convenceria, que tipo de coisa tinha que dizer. Estava ansiosa demais.

Bebeu um pouco da bebida do seu copo, estava sozinha no cômodo, sentada sobre a almofada no chão, com a mesa à sua frente, ela lembrou-se do encontro que Hyukjae a levou quando era mais nova, o modo como ele a obrigou a sentar sobre seu colo diante de tantos outros alfas, alegava que a estava protegendo, mas quando a mão dele deslizou sobre sua coxa, Jihyun sabia que não tinha nada a ver com isso. Mas era uma criança, não entendia porque era errado e muito menos em que sentido era errado, quando todos lhe diziam que estava tudo bem. Hyukjae é seu alfa, suas mães lhe diziam, ele pode fazer o que quiser. E realmente podia, mas isso não significava que devia.

Bebeu tudo de uma vez, depositando o copo sobre a mesa com uma força desnecessária apenas para respirar fundo depois. Então, escutou a maçaneta da porta girar e sabia que seu convidado havia chegado, aprumou-se no lugar, ajeitando sua coluna, cruzando as pernas para sentar-se sobre elas. Olhou para a porta ao mesmo tempo que ela abria lentamente, seu coração estava aos saltos quando Donghae entrou, mas sua boca abriu-se em surpresa quando Siwon entrou logo em seguida.

Ela sentiu como se alguém houvesse a segurando pelos ombros e lhe chacoalhado com força, deixando-a tonta o suficiente para querer vomitar a bebida de antes. Quase se inclinou sobre a mesinha, quase colocou tudo pra fora. Quase. Quis se levantar e sair correndo, queria fugir do olhar terrivelmente sério e decepcionado de Siwon, era como olhar pra todos os seus erros, era como olhar pra Kyuhyun, morrendo em seus braços, sussurrando a última frase da sua vida. “Eu te amei mais do que minha própria vida”.

Observou o modo calmo como os dois se aproximaram da mesa e sentaram-se à sua frente, eles a encararam, como se esperassem o momento em que ela fosse gritar. Mas Jihyun não conseguia fazer nada, nem ao menos desviar os olhos dos dois. Alternava o olhar, surpreso, entre Donghae e Siwon, meio que perguntando ao ômega o que o alfa fazia ali ao mesmo tempo que se perguntava se Siwon realmente estava.

— Olá, Jihyun, quanto tempo, não? — Siwon disse, quebrando o silêncio e fazendo a ômega engoli em seco.

Jihyun estava perdida.


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