Sangue escrita por Salomé Abdala


Capítulo 35
Capítulo 33 – Novos caminhos.




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/78767/chapter/35

Quando Flavius pediu Fip em namoro, ficou subentendido entre nós dois que o acontecimento da noite anterios deveria ser mantido, para sempre, em segredo. Naquela tarde, no momento em que Flavius fez o pedido, Natasha olhou para mim com uma expressão de “Eu não gosto nada disso”, depois sacudiu a cabeça e cruzou os braços:

—Seja o que deus quiser. – resmungou mais para ela mesma do que para qualquer outro.

Eu me limitei a sorrir e desejar, dentro de mim, boa sorte aos dois. No fundo sabia que pouca coisa mudaria. Os dois estavam deitados no gramado se olhando com aquela expressão meio pateta que os amantes se olham. Senti inveja, saudades, vontade de chorar. Lembro-me do tempo em que tinha olhos apaixonados para mirar e planos conjuntos a fazer. Agora isso é passado enterrado abaixo desse mesmo gramado que me expõe, com seus amantes deitados, a minha atual infelicidade.... Cláudio... o que seria sido de nós caso a fatalidade da intolerância humana não tivesse se abatido sobre nossa história?

Levantei-me na intensão de me afastar daquela cena. Não que me incomodasse a felicidade dos dois, mas sua existência me obrigava a encarar aquilo que estava há muito tentando ignorar: eu estava só. Sem Cláudio, sem família, sem ninguém. Amigos novos era tudo o que me restava... a caridade do Fip, o olhar quente de Natasha, as explosões emotivas de Flavius... era todo o meu universo agora. Passar os dias bebendo, sem planos, sem futuro, sem vontade de ir além. Uma pessoa sózinha. Um homem sem futuro:

—Vou pegar mais vinho, vai ser barra segurar vela sóbrio desse jeito.

—Eu vou com você. Deixe que os pombinhos fiquem se entendendo por aí. – respondeu Natasha.

Olhamos para os dois na espera de ver suas reações ao nosso comentário, mas estavam tão submersos um no outro que ouso dizer que não nos ouviram. Sorrimos e partimos até a cozinha;

...

—Senhor meu tio? O que faz aqui? – pergunou Felipe ao abrir a porta.

Estava alí, sentado em sua cadeira de rodas, um mordomo, ou segurança, de cada lado. Terno alinhado, postura de digno homem, segurava em uma das mãos uma bengala de metal:

—Quero lhe perguntar uma coisa. Convide-me para entrar.

—Cla...claro... entre....

Entrou empurrado pelo homem da sua esquerda. Felipe, coração na mão, a se perguntar se estaria seguro ou não:

—Sua mãe me disse que não quer voltar para casa. Que rebeldia é essa, Felipe? Não combina com você.

—Não estou a ser rebelde, meu tio. Tenho um emprego, uma faculdade, não tenho porque abandonar tudo isso apenas para viver abaixo da barra da saia de minha mãe.

—Faz bem. Está a se tornar homem.... digo, uma pessoa crescida. Por homem sei que nunca será.

—Dispenso seus comentário rudes, meu tio.

—Desculpe. Que indelicadeza a minha. Não queria ofendê-la, minha flor.

—Se você veio até minha casa para me humilhar, sugiro que... sugiro que...

—Você não sugere nada! Ainda não tem topete para me enfrentar, rapazinho! Agora sente-se e me responda uma coisa!

Sentou-se, olhos arregalados, corpo tomado pelo medo:

—Pergunte, meu tio.

—Vê o meu estado atual?

—Parece estar a se recuperar muito bem.

—Não seja ridículo! Não vou me recuperar jamais! E é sobre isso que quero te perguntar! Você sabe, por algum acaso, se Francisco está ligado, de alguma forma a esse... digamos... acidente?

—Fra... Francis? Li.... ligado... a... ao seu acidente? De... de que maneira... meu.... meu tio? E não foi um.... um... como é mesmo que se diz? ... assalto?

O homem ficou a observar atentamente a expressão assustada e pouco convinsente do rapaz, em seguida falou:

—Perdoe a minha má comunicação. Não estava a falar nesse acidente. Ora, evidente que fora um assalto. Estava a me referir ao seu acidente, meu querido.

—Aci... acidente? Nã... não sei a que se refere... meu tio.

—Nem eu. – disse sorrindo enquanto seus dois capangas seguravam o rapaz pelos braços. – Trouxe essa bengala para você. Vais precisar dela em breve.

...

—Como acha que vai ser agora? – perguntei ao Michel quando chegamos na cozinha.

—Os dois? Ah, acho que vão se dar bem. Isso já devia ter acontecido ha muito tempo.

—Você não acha que o Flavius ainda gosta de você?

—O Flavius? Gostando de mim? Não, isso é coisa do passado.

—Então a noite de ontem foi um ponto final nisso tudo?

—O que tem a noite passada?

Olhei para a cara dele como que dizendo: “Me poupe, Michel!”, mas ele continuou se fazendo de desentendido:

—Não aconteceu nada ontem a noite!

Tive que apelar:

—Então as camisinhas que achei no lixo do banheiro foram frutos de masturbação? Não sabia que você tinha esse fetiche por camisinhas.

—Camisinhas que você achou? Em que banheiro? Eu não deixei nada em banheiro nenhum.

—Então você as deixou onde?

—Não... não deixei em lugar nenhum, Natasha!

—Até parece, Michel! Você acabou de se entregar ficando ai todo nervozinho quando eu disse que tinha achado as camisinhas. Camisinhas que eu nem achei. Disse só pra ver como você reagia.

—É que você fica ai toda... toda... – ele me encarou com aquela cara de “Não tá adiantando, né?” e enfim desistiu – Tá bom, tá bom. Mas o Fip não pode saber.

—Eu sei que não. Mas me diga, o que rolou entre vocês ontem a noite... você acha que colocou um ponto final no lance do Flavius e você?

—Não tem lance entre o Flavius e eu.

—Eu to falando sobre o que ele sente por você! Por favor, Michel, eu sei que você não é bobo, você sabe do que eu estou falando! Você acha que eu posso ficar tranquila?

Ele olhou para os lados, respirou fundo, pensou um pouco e, por fim, disse:

—Não tenho certeza.

—Droga... foi tão bom assim?

—Foram quatro vezes.

—É, acho que isso significa que foi bom pra caralho.

—O Fip não pode saber.

—Então torce para eles não irem pra cama hoje, porque se você comeu o menino quatro vezes ontem, é óbvio que o Fip vai perceber que as coisas por alí não andam normais!

—Calma, Natasha! Calma! Sei lá, também não é assim... a gente... meio que se revesou e... tal...

Ele ficou todo vermelho e envegonhado. A minha vontade era morder aquela carinha de anjinho dele todinha, mas me contive e fiz cara de séria:

—Tudo bem, eles que se virem por lá. Vamos aproveitar que o Fip ta distraído e dar um rolê no carro dele?

—Você tá louca? Eu não tenho carteira.

—Eu tenho, e agora não sou mais uma inválida! E então? Vamos?

—Vamos!

...

—Qual é o problema? – perguntou Fip debruçado sobre mim.

—Nada, é só que eu não estou me sentindo muito a vontade para isso hoje. A gente pode fazer todo o resto, mas penetração não.

—Andou se gastando por aí., não foi? – ele disse naquele tom meio brincadeira, meio verdade.

—Quem me dera. – respondi sem jeito – É só que hoje... bem... eu não estou totalmente livre... se é que você me entende.

—Ah sim, estamos entendidos. – Ele disse acariciando minhas coxas com aquelas mãos quentes que me faziam tremer inteiro.

Fip tinha um jeito de me segurar... que não era nem bruto nem carinhoso... era... determinado... como se me guiasse pelo caminho do prazer... ele sabia me indicar a direção do que seu corpo queria sem ser rude, sem ser dominador, mas, no entanto, sem permitir que eu me desviasse daquilo que ele havia determinado para mim. Eu gostava disso, da sua agressividade carinhosa, do seu jeito de mostrar que tinha a situação sob controle e que eu não deveria tentar modificar as coisas. Ele deu um tapa de leve no meu rosto, beijou minha boca, mordeu meu lábio inferior e disse:

—Não tem problema, eu conheço, pelo menos, outras oitocentas maneiras de satisfazer você.

—É mesmo? E quais seriam elas?

—É melhor não perguntar.

Disse ele segurando firme nos meus cabelos e puxando meu rosto ao encontro de seu membro rígido. Segurava meu rosto com firmeza ao passo que movimentava sua pelvis num delicado vai e vem. As vezes acertava um tapa ou outro na minha bunda, nas minhas costas, fazia-me mudar de posição e começava a se esfregar em mim:

—Agora que você é meu, vou lhe mostrar todos os truques que nunca te ensinei. – ele disse enquanto enfiava dois dedos na minha boca. Estava a ser iniciado em um novo mundo de prazeres.

...

—Ele está olhando muito pra você, Natasha!

—Que bobagem, Michel, ele está olhando é pra você!

Em verdade, o garoto mantinha o olhar fixo nos dois. Não tinha mais que vinte e poucos anos, Michel o conhecia de vista, era filho ou sobrinho de alguma das muitas amigas fofoqueiras de sua mãe. Vivia há muito tempo na cidade grande e aparecia vez ou outra para uma visita de poucos dias e não mais. Era um daqueles meninos maiores que Michel observava jogando futebol, no começo de sua adolescência, invejando o porte de seus corpos, os pêlos que já tinham, a voz já ha muito mudada. Dos meninos maiores de quem ouvia boatos picantes sobre seus comportamentos sexuais, suas paqueras com as meninas e estremecia ao ver sem camisa. Fazia muito que não o via. Havia se tornado, ao contrário da maioria dos meninos do colégio, um homem bonito, não muito diferente do que já era.

Estava sentado na mesa quase ao lado, sozinho, a observar impiedosamente aos dois amigos que agora discutiam a preferência do rapaz. Seu nome era Selmo, Anselmo, Diego... não se lembrava. Tinha do garoto uma vaga memória dos tempos e desejos de puberdade, depois disso não mais:

—Ele é hetero, Natasha, está na cara.

—Depois dos últimos meses, em que só tenho convivido com vocês, não acredito mais que ninguém seja hétero, Michel. Nem na minha heterossexualidade eu ando acreditando mais.

—Ahahahahaha! Desculpe, mas eu sempre achei que você tinha jeito de lésbica.

—Também, eu sou mais macho que vocês todos juntos! Bem que eu conseguiria mesmo, mas sei lá... eu gosto muito de corpo de homem, sabe?

—Eu também!

Riram, chamando ainda mais a atenção do rapaz:

—Ah, não, Michel, ele não para de olhar! Eu preciso tomar uma providência. – disse se levantando.

—Não, Natasha... não... ele é filho de uma amiga da minhã mãe!

—Meu cú pra sua mãe. – disse num tom excessivamente alto, provavelmente provocado pela bebida – Eu quero mais que aquela velha se dane! Oooi mocinho! – disse já na frente do rapaz.

—Boa noite.

—Sabe, você andou olhando muito para aquela mesa alí. – disse apontando para Michel – Onde está meu amigo... e eu estava também.... Mas eu não estou mais, porque estou aqui agora. – falava pausadamente por causa de sua bebedeira – E eu e meu amigo estavamos nos perguntando: Qual de nós dois ele quer comer? Porque olha, seja quem for você já ganhou a noite, porque os dois estão disponíveis, viu?

—Ahahaha! E qual é o seu nome, menina disponível?

O rapaz tinha cabelos castanhos, rebeldes, barba por fazer, ombros e toráx largos, não em exagero, vestia uma camisa xadrez mal abotoada e uma calça jeans desbotada. Um brinco em cada orelha, pulseira de couro no braço esquerdo, olhos pretos:

—Natasha. E o dele é Michel.... Eu estive toda enfaixada esses últimos meses... tirei os gessos ontem... E, se eu continuar bebendo assim posso ter que colocar tudo de novo amanhã!

—O meu nome é Artur. Prazer.

—Artur. É um nome engraçado.

—E Natasha é nome de travesti.

—Ahahahahahahahahahaha! Seu espertinho! Descobriu meu segredo! Agora terei que matá-lo.

Artur abriu os dois braços deixando o peito a mostra:

—Estou entregue.

—Nossa, que peitoral bonito. – disse passando a mão no peito de poucos pêlos do rapaz – Você não quer me comer mesmo não?

—Bem, a gente pode conversar sobre isso. O que acha de irmos para um lugar onde possamos ficar mais a vontade?

—Eu tenho uma casa só minha. Eu fico na do Fip porque gosto de pentelhar ele, mas eu tenho uma casa só minha, a gente pode pegar meu carro e ir pra lá.

—Ok, mas eu dirijo. E seu amigo? Vai ficar aí? Ele é o Michel, não é?

—Éééééééééé. Nossa cidade pequena é uma bosta, hein? Todo mundo se conhece.

—Eu lembro dele quando era pequeno. Virou um rapagão, não?

—Você nem imagina o quanto esse menino cresceu.

—É mesmo? E por que não chama ele também?

—É pra já! – disse se levantando, totalmente bêbada – MICHEL! CAI PRA CÁ! – deixou seu corpo cair na cadeira. – Ele já vem.

—Olá. – disse Michel. – Desculpe pela Natasha, ela andou bebendo um pouco demais.

—Percebi. Mas não se preocupe, é o que eu precisava para animar minha noite. Não quer se sentar?

...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sangue" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.