Sangue escrita por Salomé Abdala


Capítulo 15
Capítulo 13 - Prelúdio para a felicidade




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Michel acordou com um incômodo na garganta, sentia seus olhos secos ardendo e uma grande dor no estômago, foi quando se deu conta que não comia há tempos e logo se levantou para o café da manhã. Não tomou banho, como era de seu costume, e desceu as escadas com pressa, seu estômago reclamava seus direitos. Seus pais estavam à mesa, olharam-no com repressão quando ele se sentou e sua mãe disse:

—O que foi? Não tem mais família, por acaso? Está achando que essa casa é uma pensão? Que você entra e sai quando e como quiser sem ter que dar satisfações? Essa não foi à educação que eu te dei mocinho, trate de me explicar onde esteve por esses dias!

Michel, segurando o ódio em sua garganta engoliu em seco, ignorou o que sua mãe dizia e bebeu um pouco de leite para ajudar o ódio a descer:

—Sua mãe falou com você, Michel! – disse o pai. – Isso não são modos de agir!

—Transar com a empregada também não. – respondeu o garoto enquanto comia um pão de queijo.

Sua mãe deixou a xícara cair sobre a mesa, derramando café no pano de mesa francês. Seu pai abaixou o jornal com fúria enquanto dizia quase aos gritos:

—COMO É?! O QUE VOCÊ DISSE, MOCINHO?!

—Você me escutou, pai. Não me faça ser baixo a ponto de repetir. E você mamãe, não faça essa cara de espanto, você já sabia. – tomou mais um gole de leite –  Então parem de exigir que eu seja um rapazinho perfeito porque eu não tenho nem metade dos pecados eu vocês tem.

—ESCUTE AQUI MOCINHO! – disse o pai de Michel já se levantando da cadeira – NÃO VOU TOLERAR QUE VOCÊ NOS TRATE DESSE JEITO! SUBA JÁ PARA O SEU QUARTO QUE NÓS VAMOS TER UMA CONVERSA!

—Eu não vou conversar com você. Estou saindo dessa casa. – e colocando mais um pão de queijo na boca, Michel se levantou e caminhou em direção a porta.

—Meu filho, o que aconteceu com você? O que você está falando? – perguntou sua mãe em tom de súplica.

—Eu já sei de tudo mãe. Sei quem vocês são. Não quero continuar aqui.

—MICHEL! – gritou seu pai segurando o garoto pelo braço.

—Não encoste em mim. – respondeu o garoto secando o pai com os olhos – Eu já sou um homem e posso enfrentar você no braço, se for preciso.

—Meu filho! Não diga uma coisa dessas! Peça desculpas para o seu pai!

—Não, mãe, são vocês quem devem pedir desculpas para mim. Agora me solte pai. Eu estou indo embora.

Puxou o próprio braço de modo que o pai o soltasse e caminhou até a porta:

—Se você sair por essa porta não poderá voltar mais! – disse seu pai.

—Ficarei muito honrado em faze-lo. - Respondeu Michel.

Sua mãe, aos prantos, ficou chorando na mesa. Michel saiu pela porta da frente, pegou a pequena mala que havia escondido atrás da árvore do jardim e saiu em direção a casa de Fip. Pretendia explicar-lhe a situação e, depois de se despedir, partir para a capital e recomeçar uma nova vida por lá. Tinha um dinheiro guardado e isso devia ajudar.

...

            Natasha acordou cansada. Havia se exercitado muito na noite anterior. Ela e Fip tiveram uma noite selvagem que só não se prolongou por mais tempo devido a suas ataduras. Sentou-se na cama e tentou se vestir. A camisola era fácil de se manipular e, por isso, a garota conseguia vesti-la mesmo estando toda enfaixada. Também conseguiu se atravessar sozinha para a cadeira de rodas e se locomover até o pé da escada:

—CHICO ME AJUDE A DESCER! – gritou lá do alto.

Poucos segundos depois, Fip subiu as escadas com um garoto desconhecido logo atrás de si. Natasha resmungou:

—Mas essa casa é mais freqüentada que um bordel, Chico. Quem é esse aí?

—É meu primo. – responde Fip sorrindo.

—Primo? É, ele se parece mesmo com você. Oi primo do Chico, eu sou a Natasha, prazer.

—Oi Natasha, me chamo Felipe.

—Que bom pra você. Chico, me ajude a descer?

—Mas é claro my lady.

Fip e Felipe desceram Natasha até o salão de baixo. A garota olhava para Felipe intrigada:

—Você disse que não gostava da sua família, Chico. Por que esse menino está aqui?

—Ele disse que sabe onde está minha mãe. Mas não quis me contar. – disse Fip olhando para Felipe com repreensão.

—Eu vou te contar Francis. Já disse que vou te levar até ela.

—Sua mãe Chico? Não sabia que você tinha mãe. Pra mim você tinha cara de filho de chocadeira.

Fip riu, adorava as piadas de mau gosto que Natasha soltava como uma metralhadora. Felipe ficava constrangido, mas saboreava o modo como a garota lembrava o jeito do Fip:

—Vocês já comeram? Estou louca para comer alguma coisa! Vamos tomar nosso café da manhã!

—Nós ainda não comemos. – disse Fip.

—Eu não estou com fome. – respondeu Felipe.

—Está sim.  – disse Natasha – Ele vai ficar aqui com a gente, Chico? Ele é tão fofinho, diz que eu posso ficar com ele, por favor??

—Vai sim. Ele não vai sair tão cedo dessa casa. – Disse Fip encarando o primo.

—Ela é sua namorada? – perguntou Felipe.

—Quem? A Natasha? Não, ela é só uma garota que eu achei caída numa vala qualquer por aí. Fiquei com dó e peguei pra cuidar.

Natasha riu alto:

—O pior é que isso é verdade. – e continuou a rir.

Felipe ficou ali constrangido em meio aqueles dois furacões. Fip e Natasha eram brilhantes juntos, se completavam nesse terrível senso de humor, e, qualquer um que os acompanhasse ficava perdido no meio da conversa dos dois. Eles agiam como se só os dois existissem, conversavam como se não tivesse mais ninguém.

Já sentados à mesa, Natasha e Felipe começaram a conversar, enquanto Fip servia o café da manhã. Olhando diretamente em seus olhos, a garota perguntou:

—Como você achou o Chico? Ele tinha me falado que ninguém sabia onde ele estava.

—Eu imaginei que ele viria para cá.

—Porra, e acertou hein? Muito bom de palpite você é.

—É... acho que sim.

A campainha tocou. Fip deixou um prato com bolinhos na mesa e foi atender:

—Nossa, o Francis é bem popular por aqui, não?

—Não é? Essa casa não para de entrar gente, parece um putero!

—Err... se Francis não tomar cuidado logo vai ficar mal falado na cidade.

—Acho que é essa a intenção. Me passa mais um desses bolinhos de banana? Eu adoro bolinhos de banana.

—Como você se machucou assim? – perguntou Felipe enquanto passava os bolinhos.

—Ah, eu fui atropelada. O Chico cuidou de mim. Depois disso passei a morar aqui.

—Típico do Francis isso.

—É? Ele já fez isso antes?

—Com passarinhos, cachorros e gatos. Mas não me espanta que tenha feito com uma humana também.

Natasha riu alto. Felipe apreciou o modo como a garota jogava a cabeça para trás para rir escandalosamente, sem autocensura, sem se coibir. Ria como se o universo reservasse a ela o total direito de rir. ‘’Francis e eu não tivemos essa sorte. Fomos treinados para apenas sorrir.’’ Pensou enquanto divagava sobre a rígida criação que tivera. Foi quando Fip apareceu com um rapaz loiro, de olhos claros, mochila nas costas e cara de quem pouco dormiu:

—Gente esse é o Michel. – disse Fip. – Ele vai tomar café com a gente.

—Não vou não. – disse Michel.

—Vai sim. – respondeu Natasha. – Sente-se aqui. – disse puxando a cadeira que estava ao seu lado.

Michel, sem ter o que responder obedeceu. Fip seguiu servindo a mesa para depois de sentar à cabeceira, como o chefe da família:

—Bem, vamos comer então. – disse o anfitrião.

—Já estamos comendo. – respondeu Natasha.

—E você está melhor? – perguntou Michel a moça.

—Ah sim! Só o gesso que coça um pouco, mas isso dá para agüentar.

—E você não pensa em voltar para a casa?

—Não. – respondeu Natasha – Estou gostando de ficar aqui. Não sou do tipo que gosta de morar com os pais.

—Acho que ninguém aqui é. – disse Fip – Você podia ficar aqui também, Michel. A casa é grande acomoda todo mundo. Fica aqui uns dias até você colocar a cabeça no lugar.

—Eu não sei Fip.

—Fica! – insistiu Natasha. – Qualquer coisa, se você enjoar, a gente fica na minha casa do outro lado da rua. Fica, por favor, pode ser divertido!

Michel abaixou a cabeça e começou a pensar. Poderia sim ser divertido, viver um tempo entre pessoas jovens como ele, despreocupadas com o que os outros vão pensar. Ter a liberdade de agir como quisesse, de falar com pessoas que não iam o censurar. Parecia sim uma boa idéia, disse a Natasha que ia pensar.

...

‘’Mais tarde, logo depois do almoço, comecei a olhar para minha casa cheia. Meu primo, Natasha e Michel pareciam se divertir muito juntos. A essa altura já pareciam completamente a vontade um com o outro isso era bonito de se ver. Sei que com o tempo ia odiar tanta gente na minha casa e querer mandar todo mundo embora, mas, por hora, estava feliz em ter quem preenchesse o silêncio. Faltava Flavius, esse filho de uma rapariga. Passei a mão sob meus lábios inchados e sorri ao me lembrar daquele pequeno e magnífico desgraçado. Decidi visitá-lo e convida-lo a participar dessa festa. Fui caminhando devagar até sua casa e toquei de leve a campainha:

—Oi. – ele disse. Estava sem camisa, fato bestinha que me fez tremer dos pés a cabeça, ai ai essas paixões adolescentes.

—Você foi me pedir desculpas, e eu fui rude contigo. Por isso vim te trazer meu pedido de desculpas perante a forma como recebi as suas desculpas!

—Tudo bem. – disse ele rindo – Eu não acho que eu possa te culpar por isso. Eu fui um total idiota.

—Por isso, vim te chamar para jantar. Vou fazer uma pequena comemoração de boas vindas ao meu primo e estarão todos lá, Michel, Natasha, eu e você.

—Pensei que você não gostava da sua família.

—Mas o Felipe é diferente. Ele é dos meus!

—Não parece. Não confiei naquele menino.

—Enfim, o Michel vai estar lá. Pode ser uma boa chance de vocês conversarem, você sabe, no meio da festa, com mais gente, você pode se sentir mais à vontade. – festa com cinco pessoas? Que merda eu tava falando?

—Por que você está fazendo isso?

—Isso o quê?

— Empurrando ele para mim. Pensei que você gostasse de mim.

            -É...eu pensava isso também... Mas não sei exatamente se quero gostar de alguém que me ataque como você fez.

            -E então? Ainda quer que eu vá?

            -Sim.

            -É por causa desse seu primo né?

            -É por causa dele o que?

            Eu estava, confesso, totalmente desconcertado:

            -Que você está me empurrando para o Michel. É porque esse seu primo chegou e você prefere ele.

            -Não é não! Primeiro que, puta que pariu, olha pra mim, você me bateu! E eu estou fazendo isso por você, oras! E não estou te empurrando pro Michel desde o começo?.... Você está com ciúmes, Flavius?

            -Talvez. Agora me diga, o que ele tem que eu não tenho? – disse ele me puxando para dentro da sala e me empurrando contra a parede – O que ele tem que eu não posso oferecer?

            Flavius havia me deixado surpreso. Não esperava em absoluto essa atitude dele. Ainda aturdido tentei, sem sucesso, lhe responder. Ele me olhou nos olhos e disse:

            -Cancele a festa. Mande ele embora e fique comigo!

            Minha cabeça girou. Parecia muito surreal para mim. Isso mudava totalmente a ordem natural das coisas! É óbvio que eu queria o Flavius para mim! Queria mesmo ouvir isso,  mas é engraçado como não sabemos lidar com o que querermos quando tudo acontece!

            -Do que está falando? – perguntei atordoado.

            Ele não respondeu, se aproximou dos meus lábios e me beijou. Depois me soltou e disparou a rir:

            -Do que você está rindo, Flavius?

            -Você precisava ver sua cara, Fip. Precisava mesmo!

            -Como assim? O que você está fazendo?

            -Ah, você não é o único a fazer piadas de mau gosto por aqui, Fip. Eu posso também.

            Ele ficava tão bonito quando sorria. Era fascinante! Eu fiquei ali, como um completo panaca olhando para aquele menino bonito. Então era essa a sensação?

            -Quer dizer que eu não sou o único, é? –perguntei passando a mão por sua cintura e encostando minha testa na dele.

            -Não. – ele disse passando a mão no meu rosto e fechando a porta com os pés. – Você não é!

            -E então, você vai na festa ou não vai?

            -Isso nós decidimos mais tarde. – disse ele e depois me beijou, eu apertei meu corpo contra o dele e continuei a beija-lo.

            -Minha tia não está. Sua casa tem gente demais. Por que não ficamos aqui até a hora da festa?

                Flavius não disse mais nada, apenas me beijou novamente segurando meu rosto, bagunçando meu cabelo. Eu o segurava pela cintura, apertando meu corpo contra o dele:

            -Seus lábios ainda estão inchados. – ele disse – Me desculpe.

            -Vou pensar no seu caso. – disse olhando para ele, devorando-o com os olhos, devorando-o com meu corpo todo! Éramos só libido nesse instante e não havia mundo abaixo, atrás ou acima de nós! Éramos só libido nesse instante e tudo o que pensávamos era em nos saciar...

...


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