Despedida escrita por Sirena


Capítulo 2
Capítulo 2




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Gil suspirou se sentando no chão do restaurante vazio.

Harry chegou menos de meio minuto depois, trazendo um monte de sacolas cheias de suprimentos trazidos do porto dos duendes e começando a distribuir entre a tripulação.

O loiro suspirou se encostando contra o balcão, os olhos na televisão, tentando não parecer ansioso. Finalmente, Harry veio em sua direção e lhe entregou uma vasilha. Sorrindo, Gil abriu e se deparou com vários cachos de uvas.

Estavam um pouco machucadas e não eram tão frescas quanto as que ele tinha comido em Auradon, mas, se fechasse os olhos, conseguia fingir estar de frente para o Preparatório Auradon e ter a mais vaga impressão do sol quente.

Quando decidiu voltar para a Ilha com Uma e Harry pareceu certo, mas isso foi há semanas. E a Ilha já não era mais a mesma de quando tinha ido embora. Antes, ainda havia certa esperança. Os vilões acreditavam que o mal deles não poderia ser contido por muito mais tempo e os jovens achavam que seriam selecionados. Agora nem mesmo isso.

A Ilha nunca foi um bom lugar para se viver, era tudo triste e cinza e fedido, mas, agora parecia ainda pior. Você não via ninguém correndo e rindo pelas ruas do mercado enquanto roubava e derrubava bancas. Não havia uma única alma viva no Arcade do Facilier. Estudar o mal não fazia mais sentido. Sentar na praia e olhar o mundo depois da barreira não parecia mais um passeio romântico. Grafitar pelas ruas não tinha graça.

Nada fazia mais sentido.

Nos dezesseis anos que viveu ali, Gil nunca achou a Ilha tão deprimente quanto naqueles últimos dias.

— Começou! – Uma gritou.

Imediatamente os piratas se sentaram ao redor do balcão, os olhos na TV, enquanto a transmissão da festa de noivado de Mal e Ben começava.

Gil não deu atenção aos comentários da Branca de Neve, ou ao vestido roxo com uma longa capa que Mal usava, também não prestou atenção na carruagem que levaria todos ao lugar do festejo:

O portão de entrada de Auradon. Onde, supostamente, a Ilha e Auradon deveriam se ligar, não fosse a barreira mágica e a falta da ponte.

Aquilo parecia uma piada de mau gosto para os piratas, festejar ali, praticamente de frente a Ilha. Era quase uma provocação, tão perto e tão longe. Quase como se pudessem chegar lá... Se não fosse a maldita barreira. Ainda assim, não era nisso que Gil estava prestando atenção. Seus olhos estavam focados no garoto de blazer azul e coque no cabelo, no canto da tela, onde mal se via e mal se podia distinguir quem era.

Foi mostrado um pouco da festa, antes de Mal e Ben se juntarem a comemoração Ambos usando coroas, ainda que a dela não fosse a da rainha. Pelo que a jornalista falou, a coroação dela seria durante a cerimônia de casamento, em algumas poucas semanas.

As costas de Gil já doíam e ele estava cada vez com mais sono, era difícil prestar atenção no discurso de Mal sobre ter que ser uma rainha tanto para Auradon quanto para Ilha. Mas, ele despertou como se tivesse recebido uma descarga elétrica quando a voz confiante de Ben falou em alto e bom tom:

— Chegou a hora, de derrubarmos a barreira!

— Como é? – essa pergunta pareceu ecoar pelo restaurante e por toda a Ilha, enquanto meninos e meninas perdidos, vilões e vilãs antigos a repetiam, entre gritos e suspiros, com iguais doses de choque, alegria e desejo.

— Sai! – Uma falou, pulando sobre o balcão. — Pra fora, agora! Vai, vai, vai!

Eles não foram os únicos a terem essa ideia.

Logo, a entrada da Ilha, onde a ponte surgia, estava infestada de gente. Gil e os amigos chegaram bem a tempo de ver a enorme cúpula mágica sobre suas cabeças cair, a cinzenta nuvem de tempestade que sempre esteve ali sumiu, deixando o sol entrar pela primeira vez em mais de duas décadas.

— Estamos livres. – Jonas murmurou atrás dele, chocado, cobrindo o rosto com as mãos.

— Isso gente, é o sol. – Gil falou, sem conseguir conter um enorme sorriso.

— É tão claro. – Bonnie falou num tom reclamão. — Não gostei!

— É maravilhoso! – o loiro riu, correndo atrás de Harry e Uma.

Eles pareciam tão felizes. Gil não se lembrava da última vez que vira Uma tão contente. Mas, enquanto disparavam pela ponte, ele pensou que sua capitã nunca estivera tão bonita.

Todos dançavam, tanta alegria palpável no ar que era como se cantassem como uma única pessoa, como um único povo. E no meio da ponte, os grupos de Auradon e da Ilha dos Perdidos finalmente se encontraram. E Jay e Gil finalmente se encontraram.

— Dança comigo?

— Danço.

***

Depois do enorme festejo, havia uma quantia enorme de gente no Castelo da Evie. Mal e Ben foram embora logo, tendo de se resolverem com o Conselho de Auradon, que, aparentemente não haviam gostado muito da decisão de derrubarem a barreira.

Para a alegria de todos, Cruela também logo foi embora. Jace e Harrison, amigos de Carlos, filhos de Horácio e Gaspar, provavam vários doces na cozinha de Evie, tentando disfarçar o medo que sentiam de Dude enquanto conversavam com Carlos e Jane. Era para vê-los que Carlos ficou tão animado com a notícia da barreira. Ele ainda tinha tremendo medo da mãe, mas, a simples ideia de rever os antigos amigos era o bastante para deixá-lo radiante.

A Rainha Má e o Jafar estavam sentados em poltronas na sala, a Rainha folheava uma revista de moda e Jafar assistia pelo celular os jogos que Jay teve ao longo da temporada, fazendo comentários aleatórios de torcida. Hades já havia ido embora, afirmando ter muita coisa para organizar no mundo inferior (afinal, depois de tanto tempo sem seu governante, aquele lugar estava uma bagunça).

Harry estava de pé atrás do sofá, os braços ao redor dos ombros de Uma que conversava animadamente com Evie, Jay e Gil.

— Vamos voltar para a Ilha de manhã. – Uma comentou. — Muitas pessoas não vão conseguir se mudar pra Auradon por falta de dinheiro e estou pensando em algo como... Uma reforma na Ilha.

— Uma reforma? – Evie arqueou a sobrancelha.

— É, tirar os lixos das ruas, muitas casas estão precisando de uma... Manutenção. Goteiras, paredes cedendo, valas... Estou pensando em dar uma ajudada por lá, sabe? Ajudar a consertar as coisas, tornar mais bonito...

— As plantas podiam começar a ter folhas! – Gil opinou, gostando da idéia. — E podíamos plantar uvas!

Uma revirou os olhos e Harry tentou abafar uma risada.

— Claro, Gil, claro. Enfim... Só estou pensando que seria bom pra Ilha uma repaginada, nada que tire a cara de vilão mas... Dê um ar de...

— Vilão chique. – a Rainha Má opinou, sem tirar os olhos da revista, um sorriso enorme no rosto. — Como as roupas da Evie. Ah, querida, seus modelos estão em tantas páginas...

— Eu sei, mãe. – Evie sorriu, tentando não parecer presunçosa, mas, claramente estava feliz com o tom de orgulho da mãe.

Gil podia imaginar como ela se sentia. Evie havia conseguido o orgulho da mãe do seu próprio modo, sem ter que se fazer de burra e casar com um príncipe. Ela conseguiu seu próprio castelo, com um enorme quarto para a mãe e muitos espelhos, apenas trabalhando com que gostava e sendo muito inteligente. Ela com toda certeza tinha direito de parecer presunçosa.

— Enfim... – Uma suspirou, lançando um olhar torto a Rainha. — Eu queria saber se você gostaria de ajudar, Evie. Você tem muito bom gosto e desenha bem, podia ser de alguma ajudar, suponho.

— Eu adoraria, mas, só trabalho com roupas, não com prédios. – Evie sorriu de lado enquanto falava. — Mas, acredito que o Carlos tenha um programa de arquitetura no computador dele.

— E quando Ben voltar talvez ele possa ajudar com algo também. – Jay opinou, dando de ombros. — Ou falar com que alguém que possa ajudar com algo.

— Muito bem. – Uma sorriu, como se apesar de tudo, o resultado que tinha a sua frente a agradasse.

— Mas, não se engane, eu vou adorar ajudar com o projeto! – Evie emendou. — A Ilha é meu lar também, Uma. Quero garantir que todos que vivem lá, vivam tão bem quanto os que estão aqui.

— Eu sei. – Uma sorriu. — Tenho certeza que podemos fazer uma boa parceria.

— Gil, o que você acha de irmos dar uma olhada no jardim da Evie? Tem umas plantas muito bonitas lá e várias tão com frutos no ponto de colher. – Jay falou de repente, se voltando pro loiro enquanto se levantava do sofá.

O garoto hesitou, olhando rapidamente para Uma e Harry antes de concordar com a cabeça, se levantando, sorridente. — Vamos.

— É bom você não estragar nenhuma das minhas plantas, Jay! – Evie bufou, as mãos na cintura enquanto lançava um olhar ameaçador para o rapaz de cabelos compridos.

— Ah, qual é? Eu já estraguei alguma coisa antes? – Jay deu risada, arqueando a sobrancelha para a amiga.

— Quer mesmo que eu responda?

— Vamos logo, Gil. – Jay bufou, puxando o rapaz pela mão pra fora do castelo. Atrás deles, Harry e Uma davam risada como se tivessem entendido uma piada.

O cheiro das frutas os alcançou antes mesmo que pisassem no jardim. Era uma mistura bizarra de uvas e morangos, mirtilos e maçãs, pêssegos, bagas e amoras. Jay não tinha certeza se todas aquelas frutas maturavam na mesma época ou se eram dessa estação, mas, isso não importava. Evie tinha contratado algumas fadas das plantas para cuidarem do jardim, de modo que os arbustos sempre tinham flores e as frutas estavam sempre boas para serem colhidas, fosse verão ou inverno, outono ou primavera.

— Isso é tão lindo! Tem alguma pedra peluda por aqui também?

Jay demorou um momento para perceber que Gil estava falando de cocos, então sorriu. — Não, você vai achá-los mais perto das praias.

— Ah... – o sorriso do loiro sumiu por um instante, mas logo voltou. — Faz sentido.

Jay colheu algumas bagas e ofereceu para Gil.

— Você estava mesmo falando sério? – o loiro questionou, de maneira hesitante enquanto comia. — Sobre a gente viajar junto?

— Estava. – Jay sorriu dando de ombros. — Conversei um pouco com o Ben durante a festa, enquanto você estava com a Uma e o Harry... Ele disse que pode emprestar uma lancha real ou algum outro barco do porto da Fera pra gente usar...

— Parece bem legal. – Gil deu risada, prestes a colher mais bagas, mas, Jay afastou suas mãos dos arbustos. — Que foi?

— Fecha os olhos. – o moreno deu um meio sorriso enquanto falava, com certa malicia na sua voz que fez o coração de Gil acelerar de maneira absurda.

— Por quê?

— Confia em mim. – Jay deu risada, colocando as mãos nos ombros do garoto.

Gil hesitou, mas obedeceu. Um instante depois, ele sentiu seus lábios formigarem com uma pressão suave e deliciosa enquanto Jay o beijava extremamente devagar, como se estivesse pedindo por permissão. Era tão bom quanto um arbusto inteiro de bagas.

Espera, espera! Jay o havia beijado? Ele se afastou assustado quando finalmente assimilou esse fato. Engoliu em seco, nervoso e lambendo os lábios. Corado e sem graça, totalmente pego de surpresa.

— Desculpe... – a palavra escapou pelos lábios de Jay antes mesmo que ele se desse conta enquanto seus olhos percorriam o rosto envergonhado de Gil.

— Não se desculpe.

— Eu pensei...

— Fecha os olhos. – Gil murmurou, ainda com o rosto quente, enquanto tentava sustentar o olhar de Jay. O garoto tinha sido pego de surpresa, apenas isso. Mas, conforme seu coração voltava a bater em um ritmo normal e a surpresa ia passando, restava apenas um contentamento. Uma alegria misturada com um caloroso sentimento de reciprocidade.

Jay hesitou, mas, obedeceu. Sentiu as mãos de Gil passando por seu rosto e fazendo carinho em seu cabelo, antes de descerem até sua cintura e o segurarem. Tentou conter um sorriso e resistiu ao impulso de abrir os olhos.

Primeiro, Gil apenas beijou sua bochecha. Jay quase abriu os olhos e começou a reclamar nessa hora, mas, logo, sentiu os lábios dele nos seus e qualquer reclamação morreu ainda em sua garganta.

Havia algo de inebriante em um beijo tão calmo e simples, tão suave e gentil. Havia algo ainda mais inebriante num beijo como aquele misturado ao cheiro doce das frutas. Era tão bom, tão diferente de qualquer coisa que qualquer criança da Ilha dos Perdidos já experimentou, que só poderia ser descrito como perfeito.

Quando Jay se afastou, Gil estava com os olhos brilhando e tão sorridente quanto da primeira vez que comeu uvas frescas, pensando que eram melões.

— Então... A gente vai mesmo viajar? – o loiro questionou, calmamente, se sentindo leve e alegre de formas nunca antes experienciadas por ele.

— Vai. – Jay riu, puxando-o para mais perto pela cintura.

— E ver pinguins!

— Pinguins, leões, fadas, gorilas e o que mais você conseguir pensar! – garantiu dando risada, antes de voltar a beijá-lo.

— Eu amo não estar na Ilha! – Gil comentou entre um beijo e outro, passando os braços pelo pescoço de Jay.


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