Universo em conflito escrita por Mallagueta Pepper


Capítulo 25
Tempos de mudanças se iniciam


Notas iniciais do capítulo

Oi gente, beleza? Pois é, sei que fiquei um tempinho sem atualizar. Acontece que eu estava fazendo o capítulo especial sobre a Srta. Duister e o porquê dela ser o que é hoje. O problema é que quando terminei, vi que tinha vários spoilers de coisas que só serão reveladas mais pra frente. Vacilo, não? Então resolvi encaixar esse capítulo em outra parte da história, depois de tudo já ter sido revelado.
Mas isso não quer dizer que as coisas não vão ficar tensas daqui pra frente. Bem tensas.



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Fazia muitos anos que ela não colocava os pés ali e tudo estava diferente do seu tempo de infância. No entanto, os cheiros eram muito semelhantes e Magali pode ver no balcão todas as gostosuras de que tanto gostava. Seu Quinzão trabalhava atendendo os clientes, já Quim não estava em lugar nenhum.

— Bom dia, moça. O que tu vais querer? – ele perguntou com seu sotaque português. Aparentemente não a reconheceu.

— Trezentas gramas desses biscoitos. – ela apontou para as rosquinhas cobertas metade com chocolate branco e metade com chocolate ao leite.

Seu Quinzão atendeu seu pedido e quando foi pesar os biscoitos, ela viu Quim saindo detrás do balcão. O rapaz pareceu não notá–la e justo quando levantou a mão para acenar e chamar o nome dele, uma garota de cabelos castanhos veio ao seu encontro e eles deram um breve beijo. Por um instante, ela sentiu o chão partindo debaixo dos seus pés.

Já o seu Quinzão era todo sorriso.

— Oi, menina, como vais?

— Tudo bem, seu Quinzão.

— Nós vamos dar uma volta, pai. O senhor sabe... – o rapaz falou todo sorridente.

— Tudo bem, tu podes ir. Só não voltem tarde!

O casal saiu abraçado e Magali sentiu vontade de deixar os biscoitos para trás e sair correndo.

— Aqui está. Mais alguma coisa?

— Não, obrigada.

Ela saiu dali no momento em que uma lágrima começou a cair. Bem, ela não podia esperar que seu ex–namorado continuasse solteiro a vida inteira. Felizmente ele não a reconheceu e isso evitou uma situação embaraçosa. Aquela fase da sua vida estava encerrada. Era hora de seguir em frente.

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— Não tô acreditando, careca! Demorô!

— Bem, eu ainda não sei se esse advogado vai poder ajudar. Nem sei se Rosália vai aceitar a ajuda dele, mas é uma esperança.

— Já pensou se ele consegue reduzir bem a dívida? Aí ela vai embora mais cedo e você vai ter a casa todinha de volta! A festança vai rolar adoidado! Uhuuu!

Os dois deram risadas e Cebola estava otimista. Apesar de Rosália ter lhe dado mais liberdade, ele ainda tinha que trabalhar para poder continuar lhe dando metade do seu salário. Era uma forma de manter as coisas tranqüilas entre eles. Se Rosália saísse de casa, ele poderia continuar pagando as contas só com a pensão da sua mãe e teria mais tempo para investigar.

Eles se despediram e cada um foi para sua casa. Não havia ninguém, para seu alívio, e tudo parecia normal exceto por um detalhe.

— Credo, que cheiro de cigarro! –

O cheiro era forte e parecia recente. Ele deu uma olhada rápida e se certificou de que não havia ninguém em casa, o que era muito estranho. De onde teria vindo aquele cheiro? Será que Rômulo esteve ali mais cedo?

— Eu heim... bah, deixa quieto.

O rapaz abriu as janelas para dissipar o cheiro ruim, caso contrário Rosália poderia colocar a culpa nele. Depois foi cuidar dos seus afazeres.

— Saudações, rapaz.

— Paradoxo? E aí, beleza? Tava mesmo precisando falar com você!

— Imagino que você tenha conhecido Afonso, seu advogado.

— Como sabe? Ah, tá, você andou arranjando as coisas, né?

— Sim. Conduzi tudo para que esse homem pudesse te ajudar.

O rapaz ficou confuso.

— Isso só foi possível porque eu deixei a Mila ganhar o carro. E se eu não tivesse deixado?

— Eu sabia que seu espírito altruísta ia falar mais alto.

— Foi uma forma de ajudar a Mila e também me ajudar, né?

— De qualquer forma, aquele carro não ia resolver seu problema.

— Não? Como assim?

— Você ficará sabendo nesse domingo se tudo der certo. Aconteceu mais alguma coisa que eu devo saber?

Cebola contou tudo o que aconteceu e Paradoxo não soube explicar como Agnes estava absorvendo energia das pessoas, nem como Penha conseguia deixar todos agressivos e violentos. Ele realmente não tinha nenhum jeito para lidar com o sobrenatural e Cebola entendeu que sua ajuda nessa área seria praticamente nula.

— Agora eu devo ir antes que perca muita energia. Mas antes, preciso entregar uma coisa. – disse tirando um papel do bolso do jaleco.

— Quê? Dois mil e quinhentos reais? Esse cara é doido!

— Ele fez essa compra hoje e pretende falar para sua mãe que comprou os pneus em um ferro velho e que foram tirados de uma moto que teve perda total.

— Mentiroso duma figa esse cara! E a Rosália acredita em tudo o que ele diz!

— Sua tia vai lavar a roupa no domingo, certo?

— Vai.

— Perfeito. Faça com que ela veja essa nota, juntamente com a outra que você guardou. O resto virá por si só.

Paradoxo desapareceu e Cebola planejou colocar as notas no bolso de alguma calça do Rômulo esperando que Rosália conferisse antes de lavar. Porém aquilo o preocupou muito. Será que ele estava desviando o dinheiro da dívida? Se sim, Rosália tinha um grande problema nas mãos.

“Pindarolas, essa dívida deve estar monstruosa!” sem pagamento e com os juros cada vez maiores, era provável que Rosália nunca fosse terminar de pagar aquela dívida, nunca mais ia sair daquela casa e ele ia ter que dormir no sofá durante vários anos.

O rapaz teve um sobressalto. Ele estava mesmo cogitando a possibilidade de ficar naquele mundo para sempre? Nem pensar, aquilo era inadmissível!

— Eu preciso ficar esperto com o que ando pensando. Não posso dar bobeira!

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— Ai, Magá, não fica assim! Acho que não era mesmo pra ser. – Mônica tentou consolar a amiga enquanto falavam pelo telefone. – Engraçado, eu não sei quem é essa garota. Deve ser muito recente!

— Pior ainda! Quer dizer que eu demorei demais pra fazer qualquer coisa! Droga, se eu tivesse ido procurar ele antes...

— Antes você não tava pronta pra isso. De que adianta forçar?

A jovem deu um suspiro de tristeza. Talvez fosse apenas nostalgia dos bons tempos de infância, quando eles ainda namoravam e ela ganhava quitutes. Aquele tempo tinha passado e ela precisava aceitar isso e seguir em frente.

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No dia seguinte, enquanto andava pelo corredor, ele passou de novo perto da sala da Denise e deu uma olhada rápida. Daquela vez o professor estava dando aula e todos prestavam atenção, inclusive ela. Era tão triste vê–la com os cabelos daquele jeito e o rosto sem nenhuma expressão... mas era assim que as pessoas deveriam ser. Pelo menos era o que Sr. Malacai lhe falava.

Ele seguiu o caminho e foi conversar com alguns inspetores que não tinham nada para fazer, uma vez que todos os alunos estavam em aula. A conversa deles era basicamente quantos alunos cada um mandou para a diretoria, praguejamentos contra aqueles delinqüentes que sempre arrumavam um jeito de burlar as regras ou sobre algum progresso da organização que cada dia estava se expandindo mais. Coisa chata e sem graça, como a vida devia ser. Mas devia ser mesmo?

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Dez minutos antes de soar o sinal para o recreio, um inspetor entrou na sala para dar um recado importante.

— Atenção todos. – não foi preciso mandar, pois a turma inteira já estava em silêncio. – De hoje em diante, teremos novo cardápio na cantina e novas regras sobre as refeições.

Cebola não gostou nem um pouco de ouvir aquilo. Magali menos ainda.

— Para começar, está total e completamente proibido trazer lanches ou qualquer outra substância comestível para a escola. – um murmurinho percorreu a sala. – As refeições serão fornecidas unicamente pela cantina. Quem for pego quebrando as regras, será punido severamente.

Aquilo era absurdo demais para ser verdade. Os alunos sempre tiveram opção de comprar a comida no colégio ou levar de casa.

— O objetivo é que todos comam corretamente e na quantidade adequada, ingerindo os nutrientes necessários ao desenvolvimento. Qualquer outro tipo de lanche ou comida não será tolerado. Nem mesmo doces ou balas.

O mais triste era que nem reclamar os alunos podiam mais, pois era expressamente proibido retrucar os inspetores.

— Imagino que muitos de vocês trouxeram comida. Vocês devem colocar tudo nessa caixa para ser descartado depois. – outro inspetor entrou na sala carregando uma caixa de papelão e o coração da Magali chegou a doer quando pensou em quanta comida ia ser desperdiçada.

Não dava para acreditar no que estava acontecendo e Cebola precisou descartar seu lanche como alguns outros alunos da sala. O que diabos estava acontecendo com aquele colégio?

O sinal tocou e todos saíram dali remoendo a indignação que não podia ser expressada.

Na cantina, as coisas não ficaram melhores porque os alunos descobriram que o novo cardápio era algo totalmente sem graça para a maioria dos adolescentes: arroz, feijão, chuchu refogado com abobrinha e um frango cozido meio seco. Para beber, um suco ralo de sabor indefinido. Não havia sequer sobremesa porque os doces foram banidos e frutas custavam caro demais.

Como Cebola estava sem dinheiro, Mônica pagou para ele e para Magali que também foi obrigada a jogar seu lanche fora. Eles foram se sentar e viram que o clima de tristeza e desolação era geral.

— Nossa, isso aqui não tem gosto de nada! Não tem nem sal! – Magali reclamou em voz baixa. – E as porções são muito pequenas! Eles querem matar a gente de fome?

Mesmo sabendo que era natural ela ficar ranzinza com aquelas mudanças, Cascão percebeu que havia algo mais ali.

— Você tá bem, Magá? – Ele quis saber.

— Vou ficar bem, pega nada não. É que eu tava precisando me desapegar de alguém e é o que tô fazendo.

Cascão ficou um tanto sem jeito, pois sabia de quem ela estava falando. Magali já tinha falado algumas vezes em procurar Quim e conversar com ele, mas nunca se decidia. Teria ele dado um fora nela?

Cebola viu que o amigo estava em dificuldade e o cutucou levemente para que ele tomasse a iniciativa. Os dois tiveram uma conversa silenciosa enquanto as duas estavam distraídas. Seria mesmo boa idéia ir ao cinema? Talvez sim, pois ajudaria a tirá–la daquela tristeza. E não era exatamente um encontro romântico e sim um passeio entre amigos. Era o primeiro passo para a aproximação deles. Por fim ele decidiu. O coitado engasgou, tossiu e tomou coragem.

— Aqui, a gente tava pensando em ir ao cinema, nós quatro. Vocês topam?

O rosto da Mônica corou, pois ela imaginou que a idéia só podia ser do Cebola.

— Claro que eu vou querer. E você, Magá?

— Vai ser legal!

— Então fechou. – Cebola disse. – Domingo lá no shopping?

Tudo combinado, os quatro continuaram a comer enquanto Cebola colocava as moças a par da novidade, que foi muito comemorada. Era bom saber que a questão da dívida podia ser resolvida mais facilmente. Cascão observava Magali de vez em quando. Cebola estava certo, ele precisava mudar radicalmente. Não era justo querer que uma moça linda como ela andasse com um cara sujo e mulambento. Quanto ao Quim, bem... ele ia dar um jeito de fazê–la desencanar dele. 

—_________________________________________________________

No quarto do hospital, o clima era de tristeza e desolação. Boris olhava, em silêncio, os médicos cobrindo os corpos dos seus pais com um lençol e os levando embora numa maca. Ao seu lado, Agnes chorava baixinho com um lenço junto ao rosto.

— Eu fracassei com eles. – ela falou com a voz baixa.

— Você fez tudo o que pode. Eu não fiz nem a metade.

— Como será minha vida agora? Eu sempre vivi por eles!

— Agora você terá que seguir em frente. Sei que vai conseguir. Eu te ajudarei no que puder.

— Precisamos anunciar a todos da organização.

— Eu farei isso e também cuidarei dos preparativos para o velório e enterro, não se preocupe. Vá para casa descansar, você precisa disso.

Ela agradeceu e saiu do quarto com um sorriso perverso no rosto. Finalmente ela estava livre daqueles dois fardos.

Chegando em casa, Agnes abriu os braços e riu com satisfação. Finalmente livre! Ah, claro. Ela ainda ia ter que representar mais um pouco por causa do Sr. Malacai e o resto da organização, mas era só questão de tempo. A hora estava chegando e ela mal podia esperar.

Em seu quarto, ela soltou os cabelos e tirou aquele vestido horroroso. As peças íntimas pareciam ter saído do século 19 e ela tratou de tirá–las, colocando algo moderno. Seus pais teriam um colapso nervoso se a visse usando aquilo! No fundo do armário ela também tinha escondido uma roupa nova que Penha lhe deu há uns dias e vestiu rapidamente, aprovando o resultado no espelho. Bastou arrumar os cabelos, colocar maquiagem e pronto. Ela estava linda, finalmente!

— É assim que eu serei quando a hora chegar. E nunca mais ninguém vai me dizer o que fazer novamente!

Como queria relaxar, ela trocou de roupa novamente e vestiu uma camisola de seda bem confortável que sua mãe reprovaria com certeza. Depois colocou uma música suave e tomou uma boa taça de vinho enquanto contemplava o céu noturno pela janela. O pingente do seu colar estava bem frio mesmo em contato com sua pele o dia inteiro, mas aquilo não a incomodava. Ela o segurou delicadamente com os dedos sentindo sua frieza e pensando em como sua libertação estava próxima.

— Em breve, estaremos todos reunidos e ela retornará para transformar esse mundo. E eu farei parte de sua obra! Saúde! – finalizou erguendo a taça e dando um bom gole. Tudo estava bem encaminhado, faltava dar um jeito de fazer aquele rapaz bobo revistar sua casa e ela já sabia como fazer isso. A morte daqueles dois veio mesmo a calhar!

—_________________________________________________________

Cebola tratou de acordar mais cedo e correu até o banheiro onde ficava o cesto de roupa suja.

— Deixa eu ver... Essa aqui tá boa! – ele escolheu uma das calças do Rômulo e colocou as notas dentro do bolso de trás torcendo para que Rosália as encontrasse no dia seguinte quando fosse lavar a roupa.

Como ele queria estar perto para vê-la encontrar aquelas notas! Como ela ia reagir? Mais importante: o que ela ia fazer ao descobrir que o filho dela estava desviando o dinheiro da dívida?

“Eu é que não queria estar na pele dele!”

—_________________________________________________________

Denise acordou lá pelas dez da manhã ainda morrendo de sono. Ah, como era bom não ter que acordar cedo!

Sua mãe tinha deixado o café pronto, pois sabia que a filha sempre acordava tarde nos fins de semana. Ela comeu, depois tomou um banho e resolveu dar uma volta, quem sabe visitar alguma amiga.

—_________________________________________________________

— Entregue essa carta ao diretor do Colégio Pitangueiras, depois passe nesse endereço e entregue essa outra carta. – Sr. Malacai lhe estendeu dois envelopes. – Depois do almoço, iremos ao enterro dos pais da Srta. Duister.

— Sim senhor. Imagino que deve estar sentindo a perda.

O velho sentou–se, cabisbaixo.

— Eram pessoas de grande valor para nossa organização. Deram tudo o que tinham para a nossa causa. Mas é hora de seguir em frente e tenho certeza de que Srta. Duister fará um bom trabalho. Agora vá, não quero que meu almoço se atrase.

Antônio saiu para cumprir a ordem e entregou a carta no colégio Pitangueiras. A outra carta tinha que ser entregue no bairro do Limoeiro. Será que Sr. Malacai não conhecia o serviço de correios? Aquelas cartas deviam ser muito importantes para ele querer que fossem entregues pessoalmente.

Era uma casa de aparência sóbria, indicando que alguém da organização morava ali.Um homem beirando os trinta anos atendeu. Era alto e com um bigode pronunciado.

— Eu vim entregar uma carta do Sr. Malacai. – o homem ficou satisfeito.

— Eu estava esperando por isso. Mande meus cumprimentos a ele. – e fechou a porta sem nem convidá–lo para entrar e beber algo, pois fazia muito calor.

O sol realmente incomodava e ele foi andando pela sombra sempre que possível. Por que fazia tanto calor assim? O que estava acontecendo com o clima? Quando passou perto de uma lanchonete, ele decidiu entrar para ver se conseguia comprar algo para beber e viu ficou surpreso ao ver o cobaia no balcão atendendo os clientes e conversando com uma garota ruiva de Maria–chiquinhas...

Antônio franziu o cenho. Por que Denise estava de papo com aquele cobaia? E por que aquilo importava? Como já tinha entrado, ele seguiu em frente e chegou com o peito estufado e fazendo a cara feia de sempre. Cebola o olhou um tanto intimidado.

— Ton... quer dizer... Antônio? E aí? Vai querer o quê?

Denise o olhou parecendo se divertir.

— Olha só quem veio a lanchonete mais descolada do bairro! Tá aprendendo, né amore?

Ele a ignorou e perguntou para o Cebola o que tinha para beber.

— Tem suco de fruta, – ele apontou o cardápio pendurado na parede mostrando os sabores disponíveis – refrigerante e água mineral comum e com gás.

— Eu... eu... – ele não sabia o que escolher, pois antigamente sempre tomava cerveja mesmo não podendo. Ele devia comprar um suco, água ou um refrigerante?

— Eu adoro o suco de acerola daqui. – Denise falou. Me vê um, fófis. Tá fazendo um calorão danado!

Cebola serviu seu suco e ela foi se sentar numa das mesas. Por fim Antônio escolheu a mesma coisa e ia tomar em pé mesmo quando ela convidou.

— Vem sentar aqui. Tomar em pé é muito esquisito!

O rosto dele ficou vermelho.

— Quem te deu intimidade para fazer esse tipo de convite?

— Neném, eu só te convidei pra sentar, não te pedi em casamento não! Mas se quiser ficar em pé, fica. Problema seu! – E continuou tomando seu suco deixando Antônio com a maior cara de tacho.

Cebola precisou virar as costas fingindo estar ocupado com alguma coisa para que o brutamonte não o visse rindo da cara dele. 

O rapaz acabou sentando-se à mesa e deu uns goles do seu suco. Era mesmo bom, embora ele preferisse refrigerante. Mas Sr. Malacai tinha lhe falado várias vezes que aquela coisa não prestava.

— Você devia ter mais respeito ao falar comigo. – ele disse olhando para ela com aquele olhar intimidador.

— Fora do colégio você não manda em mim! – a moça respondeu atrevidamente e Cebola precisou abaixar atrás do balcão e colocar uma toalha contra o rosto para abafar o riso.

— Pode ser que não, mas você ainda vai me ver no colégio muitas vezes e eu garanto que vou pegar pesado na disciplina. Qualquer coisa que você fizer eu...

Enquanto ele falava, ela tomava o suco lentamente saboreando cada gole como se não tivesse mais ninguém perto.

— ... então eu vou te mandar para a diretoria para que Sr. Boris te dê uma boa lição e... você está me ouvindo?

— Ai ai... você não mudou nada, né fofo? – Ela falou antes de limpar a boca com o guardanapo e levantou-se para ir embora. – Sempre o mesmo Tonhão da Rua de Baixo querendo tocar o terror em todo mundo! Que decepção...

Se Cebola, que só estava ouvindo tudo, ficou com os olhos arregalados, os de Antônio triplicaram de tamanho e seu rosto ficou vermelho como um pimentão. Sem dar a menor atenção ao seu choque, Denise saiu da lanchonete com o narizinho empinado. Ele foi atrás, segurou seu braço e levou um tapa bem dado.

— Quem te deu intimidade pra ficar botando a mão em mim?

Ele segurou o rosto onde o tapa queimava sem acreditar no que tinha acontecido. Ela botou as mãos na cintura e falou de queixo erguido.

— Quer me intimidar por acaso? Vai fazer o quê agora? Puxar minha calcinha? Você pensa que mudou, mas continua o mesmo Tonhão da Rua de Baixo que aterroriza todo mundo pra mostrar que pode!

Ele superou o choque e falou indignado.

— Você não pode falar isso de mim, eu não bato mais em ninguém!

— Não bate, mas fica andando pelo colégio pra cima e pra baixo mandando todo mundo pra diretoria só pra bancar o todo-poderoso! No fim acaba sendo a mesma coisa. Agora dá licença que eu preciso escolher uma roupa pra baladinha de hoje à tarde. Beijomeliga!

E saiu dali deixando Antônio fumegando de raiva e soltando fumaça pelas orelhas. Cebola tratou de se esconder até ele ir embora, pois não estava nem um pouco a fim de experimentar das surras que seu duplo levava dele.

—_________________________________________________________

O clima era solene. Todos velavam os corpos em silêncio. Agnes chorava discretamente enquanto Boris lutava para não mostrar emoção. Sr. Malacai se aproximou deles.

— Meus pêsames por sua perda. Eles eram pessoas de muito valor. – o velho falou com grande formalidade.

— Obrigado, Sr. Malacai. Foi mesmo uma grande perda, mas saiba que Agnes fez tudo o que pode.

— Sim, eu sei. Ainda bem que a temos na nossa organização.

Boris fingiu ignorar o tom venenoso na voz do velho. Por que sempre lhe cobravam para atuar mais naquela organização chata? Ele já fazia muito sendo diretor de colégio. Ele saiu um pouco para tomar água e sentiu-se exausto. Será que os preparativos para o enterro teriam lhe cansado tanto assim? Não... As outras pessoas também pareciam cansadas, especialmente Sr. Malacai. Já Agnes parecia bem para quem tinha perdido ambos os pais. Embora parecesse triste, ela não estava exatamente de coração partido. Pelo menos não parecia, era difícil saber porque ela sempre soube esconder muito bem suas emoções.

Era com muito esforço que Agnes derramava algumas lágrimas. Eles eram dois tiranos dominadores, nunca lhe deram carinho e afeto, só uma criação rígida, castigos e punições. Por que ela deveria chorar por eles? E considerando o que estava para acontecer dentro de pouco tempo, ela tinha feito um favor acabando com a vida deles de forma tranqüila e indolor. Mas claro, era preciso representar por mais algum tempo. Mas não muito. O mês de agosto estava acabando e ela sabia que faltava pouco para a data final.

As pessoas ao seu redor pareciam se sentir mal, já que ela sugava a todos mesmo sem querer. Não dava para evitar, era algo que ela fazia naturalmente. Plantas sempre faziam fotossíntese quando tinha luz do sol, ela sempre sugava quando havia pessoas por perto.

Sr. Malacai estava sentado numa cadeira, com a bengala nas mãos e o rosto pensativo. Mal sabia ele o que ela estava tramando. Aquele velho idiota achava que tinha escondido bem o seu segredo, mas ela sabia exatamente como encontrar. Bastava colocar o Cebola no caminho certo e aquele moleque idiota ia fazer todo o trabalho para ela.

 


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