Click! et Brille escrita por Biax, EsterNW


Capítulo 17
Como em um filme


Notas iniciais do capítulo

Ester:
Bora que hoje é dia, meu povooooo!
Preparem seus forninhos que o capítulo de hoje tá bem longo, pra alegria geral da nação :D
Temos dois momentos musicais, um com Amor de Los Autenticos Decadentes e outro mais ao final com When I Fall In Love do Michael Bublé. Link para ambas estarão nas notas finais e, pra quem puder, recomendo ouvir enquanto lêem a cena :D
Hoje também temos aesthetic de menino Nathaniel :3
Boa leitura ;)



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Me larguei no sofá, após ter deixado as coisas da limpeza prontas, enquanto esperava Júlia terminar de escovar os dentes depois do café da manhã, para então começarmos a faxina. 

Era tedioso? Demais, e cansativo também. Mas, como não éramos ricas o suficiente pra contratar alguém pra fazer o trabalho pra gente, só nos restava o sábado…

Meu celular vibrou em cima da mesa de centro e estiquei o braço, pegando-o. Era apenas uma mensagem qualquer da operadora, avisando que meus créditos estavam acabando, porém, o que mais chamou atenção não foi o fato de que eu não poderia mais fazer ligações em breve. Havia uma notificação do Facebook embaixo, indicando que Nathaniel Bonnet mandou uma solicitação de amizade.

Fato 1: provavelmente existem 277283 pessoas com a combinação de nomes Nathaniel e Bonnet no Facebook. Fato 2: a probabilidade de uma dessas pessoas me mandar uma notificação era de, talvez, 0.000001%. Só havia um Nathaniel Bonnet que eu conhecia e vi que era justamente ele quando abri o aplicativo.

A cara de galã de filme romântico estava ainda mais evidente na foto de perfil, sorrindo de forma confiante com os cabelos ao vento, no que parecia ser uma paisagem litorânea ao fundo. Será que ele já pensou em ser modelo pra própria agência?

Em vez de clicar para aceitar, resolvi fuxicar o perfil do meu chefe. Ninguém mandou deixar as publicações públicas, não é mesmo? Pena que ele parecia não ser o tipo de cara que vivia compartilhado coisas. Um álbum de fotos em Cannes, marcado por alguém — e de onde provavelmente vinha a imagem do perfil —, que cliquei e fiz questão de ver uma por uma. Ele gostava de jogar vôlei, então… Saí do álbum e continuei fuxicando. Foto de uma gatinha branca, outra durante o almoço com algum amigo chique, várias marcações desejando feliz aniversário…

Uma música começou a tocar alta do nada, me assustando e me fazendo derrubar o celular na minha cara. Logo Júlia abaixou o volume, com a música do Rouge ainda audível.

— Pronta? — ela perguntou, brotando na sala com os cabelos cacheados presos em um coque. — A gente pode tirar no par ou ímpar pra ver quem limpa o banheiro — brincou, se aproximando para pegar um dos baldes e encher com água.

— Não vale! A gente fez isso e das últimas duas vezes eu tive que lavar o banheiro — reclamei e voltei a olhar novamente para a tela do celular.

Bem, não havia nada demais em simplesmente aceitar uma solicitação… Em todo caso, tinha o botão de bloquear também. Não que eu fosse fazer isso.

Júlia disse algo sobre não ter culpa de eu ser ruim no par ou ímpar e bufei. Para minha sorte e comemoração das minhas mãos, eu ganhei dessa vez, rá!

Passamos a manhã entre limpar o chão, passar pano, tirar roupa suja para lavar outra hora e tudo que englobava uma faxina completa. Júlia deixou o banheiro por último e decidi pedir comida. Trabalhamos na faxina a manhã inteira, custava nada passar essa…

Desbloqueei o celular e vi que tinha uma notificação no Messenger. Abri afobada e era apenas uma daquelas mensagens de "Ciclano e você agora são amigos". Não que eu esperasse que Nathaniel mandasse algo tão rápido, ele com certeza era do tipo ocupado. E não que eu esperasse que ele mandasse algo, claro! Não nos falamos desde quinta na agência, por que ele iria conversar comigo justo hoje?

Fiz o pedido no restaurante que Júlia recomendou e me joguei no sofá da sala, ligando a TV pra passar o tempo. Zapeei os canais, parando naquele dos filmes de tubarão, só que dessa vez estava passando uma daquelas competições de quem fazia a melhor maquiagem cinematográfica. Se eu tinha viciado nesse canal? Talvez…

Meu celular vibrou de leve debaixo de mim e peguei, vendo uma mensagem brilhando na notificação. Justamente de quem? Sim, o meu chefe com cara de galã. 

Fato 3: não mentalize algo, pois pode ser que aconteça. Júlia talvez concordasse com essa afirmação, já que ela é adepta do good vibes. Ou talvez ele apenas estivesse no horário de almoço.

 

"Oi."

 

Era apenas isso que dizia na mensagem. A clássica palavra para se começar conversas universalmente. Sem saber o que falar, que não fosse outro oi, mandei um emoji como resposta.

A mensagem foi visualizada na hora e segurei o celular com as duas mãos, olhando sem ver para os comerciais que passavam na TV e ouvindo Júlia lavar algo. Nada do entregador chegar.

O celular vibrou:

 

"Tudo bem?"

 

Sorri, percebendo que Nathaniel era daquelas gracinhas que escreviam tudo certinho, sem abreviações. Ao contrário de mim.

Respondi que sim e mandei a pergunta de volta, naquela clássica conversação que às vezes não levava a nada. Ele só estava sendo educado, só isso. Nathaniel era alguém realmente educado. Daqueles que puxam a cadeira pra você sentar… 

 

"Bem, obrigado."

"Vai ir no Fulano hoje?"

 

Ele foi direto na pergunta, talvez com pressa pois tinha hora pra terminar de almoçar.

 

"Acho que não… Eu e a Júlia fizemos faxina hoje, tô cansada”

 

Será que eu falava que talvez um outro dia? Só que isso seria dar esperanças pra ele, não é? Júlia deu carta branca pra nós dois e parecia estar melhor com isso, mas…

O entregador chegou e desci para atendê-lo, deixando o celular para trás e passando pelas escadas enquanto pensava em possíveis mensagens que poderia mandar para Nathaniel. E se eu mandasse um meme? Só pra descontrair. Será que franceses gostavam de memes? Todo mundo gosta de memes…

Paguei o entregador e vi-o subir na moto e ir embora. Fechei o portão e subi a escada com a sacola da comida na mão.

E se eu demorasse pra responder? Será que pegaria mal?

Abri a porta e a primeira coisa que bati os olhos foi meu celular largado no sofá. Ignorando que precisava deixar a sacola em cima da mesa e chamar Júlia para comer, a primeira coisa que fiz foi pegar o aparelho e checar a conversa.

 

"Entendo…"

"Hyun me contou que amanhã farão a noite do truco na cantina"

"Nunca joguei isso, mas parece interessante"

"E terá música ao vivo"

 

Bati os olhos nas mensagens e quase derrubei o celular no chão. Ele estava me convidando para sair, era isso mesmo? Talvez estivesse realmente com pressa…

— Que cara é essa, Mari? — Júlia questionou, aparecendo na sala com o penteado bagunçando e carregando as coisas da faxina pra guardar.

— Você sabia que ele tem Facebook? — Levei celular e sacola com comida para cima da mesa.

— Ele quem? — Júlia perguntou, assim que voltou para a sala/cozinha. 

— O Nathaniel! — exclamei, como se minha amiga fosse obrigada a saber de quem eu estava falando. 

— Claro. Eu até tenho ele adicionado — respondeu simplesmente, abrindo a sacola e tirando duas marmitas de lá. — Ele te mandou solicitação? — questionou o óbvio e fui pegar garfo e faca.

— Mandou… Só que o problema não é esse. — Voltei para a mesa e entreguei os talheres de Júlia, vendo que ela me incentivava a continuar. — Ele me convidou pra ir no Fulano amanhã à noite. Parece que vai ter uma noite do truco lá, com música ao vivo e tudo.

Olhei para a tela do celular, vendo que não tinha notificação nenhuma. Ele provavelmente só vai mandar algo de novo quando você responder, Marimar! Ou então acabou o horário de almoço.

— Que legal! — Júlia comentou, realmente achando o convite interessante. Ou isso ou ela estava falando da comida do restaurante favorito dela à sua frente. — Você vai?

— Não sei…

— Ainda acha estranho falar com ele? — continuou, iniciando um momento psicóloga da amiga, bem na mesa do almoço.

— Não sei… — repeti. Eu estava pior do que Jon Snow, não sabendo de nada. Tapada igual ele infelizmente eu era. 

— Uma hora ou outra vocês vão voltar a conversar de novo — Júlia rebateu, levando uma garfada generosa à boca e suspirando com o sabor. 

Desbloqueei o celular, encarando a conversa aberta e ignorando minha comida. 

— Eu te ajudo a escolher a roupa — Júlia incentivou mais uma vez e suspirei, digitando uma resposta no aplicativo.

...

Quando parei em frente ao Fulano naquela noite, a música já era audível do lado de fora, parecendo algum tipo de reggae argentino. Ajeitei os cachos e entrei no restaurante, desfilando em cima dos meus saltos nude.

Talvez fosse chique demais ir de salto? Foi o que eu disse pra Júlia enquanto escolhíamos minha roupa no dia anterior, mas, pra "equilibrar" um pouco as coisas, optei por um vestido de mangas compridas solto, com detalhes florais e de um verde petróleo que, segundo minha amiga, a cor combinava comigo.

Diferente da calmaria dos dias usuais, o Fulano estava lotado, com várias pessoas em seus lugares batendo palmas no ritmo da música, os músicos tocando em um cantinho do restaurante, em que caso alguém tentasse se mexer demais, ia terminar levando uma bordoada do braço do baixo bem na cara. No centro de tudo estava uma união de mesas, lotada de homens e uma ou outra mulher jogando cartas no meio de várias garrafas de cerveja. Provavelmente era ali que se concentrava a competição do truco.

Continuei passando os olhos pelo lugar, vendo Hyun e Layla parados em um canto e batendo palmas ao ritmo da música, em um dos poucos minutos de descanso naquela noite. Finalmente avistei Nathaniel me acenando de uma das mesas, próxima ao povão do truco.

Ele sorriu enquanto eu caminhava em sua direção e acabei repetindo o mesmo gesto, devolvendo toda a simpatia dele. Como sempre, foi todo cavalheiresco e puxou a cadeira para que eu sentasse. Agradeci com um sorriso e ele voltou para seu lugar à minha frente.

— Está linda essa noite. — Chegou logo elogiando e tive toda a certeza que corei, mas o que eu podia fazer com alguém que já chegava logo elogiando? 

Olhei para Nathaniel, vendo que ele usava uma camisa azul com as mangas dobradas até a altura do cotovelo e calça preta de linho. Chique como sempre, mesmo que a ocasião não fosse tanta assim.

— Faz tempo que você chegou? Espero que eu não esteja atrasada. — Dei um riso nervoso e me elogiei mentalmente por não ter soltado uma gafe após o elogio. Sempre fico assim após elogios.

— Não — respondeu, bebendo algo da taça dele. Olhei para a mesa e percebi que já havia outras duas, de água e de algum espumante, para cada um de nós. — Cheguei há alguns minutos. — Ele sinalizou algo para Hyun, que finalmente parou de bater palmas para a música. Layla já estava atendendo uma mesa. — Pedi o prato especial de hoje, se não se importar…

— Imagina. — Dei de ombros e bebi da minha taça que não era de água, sentindo que era mesmo espumante. Não é que o Fulano podia ser um pouco chique? — E o que é o prato especial? Empanada ao molho branco? — Ri e Nathaniel sorriu de canto. Empanadas eram aqueles pastéis de massa assada que Nathaniel costumava pedir. A especialidade da casa.

— Não faço ideia. Hyun apenas me sugeriu pedir.

A música acabou e uma sucessão de palmas veio em seguida. O mesão do truco parecia animado ali perto, com a gritaria de sempre. 

Nathaniel levou a mão ao bolso da calça, tirando de lá seu celular vibrando. Mexeu na tela e depois no botão de volume, provavelmente deixando-o no silencioso.

— Se quiser pode ir atender, não tem problema — disse, mas ele devolveu o aparelho para o bolso, balançando a cabeça.

— Não é nada importante — respondeu e Hyun deixou nossos pratos sobre a mesa. — É apenas minha irmã, qualquer coisa converso com ela amanhã na agência.

— Não disse que era empanada? — Ri alto e peguei o garfo ao lado, cortando a comida. Nada mais era que o prato de sempre, só que decorado com uma salada chique ao lado. Se quiser tornar algo chique, ponha salada e sirva em pequenas porções, é o que sempre vejo na comida dos ricos. — O Hyun deve ter feito isso só pra você pagar mais caro.

Rimos juntos e me peguei observando Nathaniel tirando uma mecha de cabelo da frente dos olhos, em um gesto que percebi ao longo do tempo que era rotineiro. Como eu consegui me encontrar com um homem como esse? 

— Ao menos o preço não mudou muito — devolveu e começou a comer. 

— Quem é a sua irmã? — Retomei o assunto anterior.

— Ambre, a professora de modelos. — Arregalei os olhos, logo associando o nome à pessoa. Sim, era justamente aquela mesma loira das pulseiras que ficou me medindo de cima a baixo no dia da entrevista. Por sorte, quase não esbarrei com ela na agência depois disso. 

— Parando pra pensar, vocês dois até que parecem um pouco mesmo — comentei na pausa entre comer e tomar o espumante. — Os olhos, o formato do rosto…

Nathaniel arqueou as sobrancelhas, talvez surpreso pela comparação.

— Bem, em questão de personalidade não podíamos ser mais diferentes — soltou meio como um desabafo e comeu uma garfada.

— Entendo, sou a mesma coisa com a minha irmã mais velha, Mariana. Eu tenho esse jeito meio coisa louca. — Nathaniel disfarçou um sorriso enquanto mastigava e marquei mentalmente como isso era fofo. — Enquanto ela é toda séria e tradicional.

— Vocês se desentendiam muito?

— Demais! E dividíamos o mesmo quarto no Brasil, então imagina! — Ri baixo quando lembrei de todas as minhas discussões com Mariana, mas agora que estava distante, não podia negar que estava começando a sentir falta dela.

O mesão do truco berrou de novo e dois caras bateram as garrafas de cerveja em um brinde, provavelmente comemorando.

— Esse tal truco é sempre animado assim? — Nath perguntou, apontando para eles com o garfo. — Estão assim desde que cheguei.

— Isso porque você nunca viu o pessoal jogando truco no Brasil. É uma gritaria e às vezes sai até briga. — Nathaniel pareceu espantado e eu ri. Como ele conseguia ter tantas expressões fofas assim? Devia ter um curso pra isso, não era possível. E não podia ser mais diferente da irmã.

 

"Me fui acercando a vos

Con suma precaución

Midiendo cada paso

Retorcido en mi interior

Librándome de miedos

Y de deudas del ayer

Para intentar de nuevo

Volver a querer"

 

Uma nova música começou e o pessoal continuou batendo palmas animadamente no ritmo. Uma sanfona se juntou e percebi que tinha uma mulher nos vocais também. Então não eram tão os Los Hermanos argentinos assim.

Amor, cierro los ojos y salto al vacío. — O vocalista masculino tirou o microfone do suporte e começou a caminhar por entre as mesas enquanto cantava. 

Amor, cómo negarme a tu cálido abismo. — A mulher fez a mesma coisa que o homem e saiu cantando por entre as pessoas, que iam ficando mais animadas. Sabe-se lá se pelo álcool, pela música ou pelos dois.

O negócio era tão bom que até eu me contagiei e comecei a bater palmas junto. Olhei Nathaniel e vi-o me encarando com aquele olhar abobalhado e riu quando percebeu que eu o observava.

 

"Me fui acercando a vos

Con suma precaución

Midiendo cada paso

Retorcido en mi interior"

 

Continuei encarando Nathaniel e ri com a letra toda melosa e romântica, que ele com certeza não fazia ideia do que se tratava. A dupla de vocalistas passou por nossa mesa e começou a cantar para nós, fazendo o mesmo que em outras mesas como as nossas, como se cantasse para aquele casal em específico. 

Me entregue y no me arrepiento, mi vida cambió desde ese momento. — Os dois cantaram ao mesmo tempo e olhei para Nathaniel, que sequer fazia ideia de para que estava batendo palma. — Y hoy me passo el día cantando, sin pensar hasta cuando. — A dupla se afastou de nossa mesa, com direito a uma piscada do homem e um beijo soprado da mulher.

Encarei Nathaniel, rindo junto com ele em um momento de cumplicidade. Sentia-me praticamente em uma novela mexicana com a música em espanhol e aquele clima.

O sanfoneiro começou a solar como se não houvesse amanhã e a dupla de vocalistas puxou mais palmas da plateia, de volta para perto dos outros músicos.

— Se soubesse que ia ser tão animado assim, não tinha nem pensado duas vezes em vir — disse de repente, me aproximando de Nathaniel para que fosse ouvida.

Amor, puede hacer polvo el diamante. — Os dois vocalistas juntaram os rostos, cantando o verso em uníssono.

— Você hesitou em aceitar o convite? — Nath questionou e percebi os olhos dourados me encarando de perto. Acho que nunca estivermos tão próximos assim, tanto que eu podia ver cada detalhe de seu rosto.

— Eu, eu... — Pisquei várias vezes e afastei-me de repente, tomando conta do que eu tinha falado anteriormente. Parabéns, Marimar, fica achando que tá numa novela da Televisa, fica!

— ¡Gracias! — Os vocalistas agradeceram juntos quando a música acabou. Todos os presentes bateram palma e o povão do truco bateu o fundo das garrafas sobre a mesa, comemorando algo.

— Então... Tem trabalhado bastante? — Consegui mudar de assunto com uma rapidez que me impressionou. — Ontem eu tava cansada por causa da faxina, como te falei, mas essa semana tenho um casting pra ir e um shooting pra fazer — contei sucessivamente.

— Fico feliz que esteja conseguindo vários trabalhos na agência — ele respondeu, parecendo ignorar totalmente o tópico anterior. — Você é uma modelo com uma bela carreira pela frente, Mari.

Me derreti um pouco quando ouvi-o dizer meu apelido, não nego. Provavelmente corei e bebi um pouco do meu espumante para disfarçar.

— Agradeço a você pela oportunidade — devolvi com um sorriso por trás da taça.

— Eu seria um idiota se tivesse deixado uma modelo como você passar. — Encarou-me diretamente nos olhos e senti meu rosto esquentar mais ainda, com um sorriso se formando automaticamente. Às vezes os flertes vinham naturalmente, o que eu podia fazer?

¡Truco! — alguém do mesão berrou e ouvi mais garrafas baterem.

¡Ladron! — outra pessoa gritou e me virei na direção deles, esquecendo meu chefe/galã à minha frente, vendo um sujeito apontando o dedo na cara do outro. — Estás robando todo el juego, hijo da...

¡No hables de mi madre! — o primeiro homem berrou de volta, levantando-se da cadeira em um salto e encarando o outro com cara de poucos amigos.

— Gente... — murmurei pra mim mesma em português, assistindo toda a treta de camarote. Vi Nathaniel me encarando com um ponto de interrogação estampado na cara.

¡Hablo de ella, sí! Una mujer que creó un tramposo como usted, ladrón!

— Eu não deixava... — continuei murmurando baixinho em português. Não fazia ideia do que tramposo significava, mas coisa boa não devia ser, visto a cara do primeiro sujeito.

— Senhores, por favor, se acalmem ou serei obrigado a pedir que se retirem. — Hyun apareceu, tentando apaziguar a confusão.

Naquele momento, a música tinha parado e todos acompanhavam a treta dos argentinos. Mesmo que quase todo mundo lá não entendesse espanhol e não fizesse ideia do que estava acontecendo.

— O cara xingou a mãe do outro e chamou ele de ladrão — expliquei para Nathaniel, que estava feito cego perdido no meio daquele tiroteio de ofensas em espanhol.

— Não acha melhor irmos...

Nathaniel sequer chegou a terminar o que quer que fosse propor, pois no mesmo momento um dos argentinos virou a mesa, derrubando todas as cartas e garrafas e partindo pra cima do cara que tinha chamado-o de ladrão.

— Senhores, por favor! — Hyun continuou tentando acalmá-los e se meteu no meio dos dois para apartar a briga, porém, tudo o que conseguiu foi levar uma bordoada de alguém.

— Mari, é melhor irmos embora. — Senti Nathaniel segurar minha mão com firmeza e vi que se levantava da cadeira. Ele parecia de fato preocupado comigo, já que a confusão estava praticamente do nosso lado. — Isso não vai acabar bem.

Me levantei e deixei que ele me guiasse. Porém, em vez de irmos direto para a porta, ele parou para falar algo no ouvido de Layla, que assistia a tudo chocada e com as mãos sobre a boca. Virei-me, vendo que os músicos deixaram seus instrumentos para trás e se juntaram a Hyun, que ainda tentava sem êxito separar os briguentos. Àquela altura, os demais jogadores se juntaram ao quebra pau, transformando aquilo numa confusão generalizada.

Percebi que Nathaniel disse para a garçonete que pagaria o valor do jantar no dia seguinte e me puxou para fora do Fulano, deixando para trás toda a gritaria e quebra-quebra.

Senti a temperatura gostosa no exterior do restaurante e comecei a rir, espantando Nathaniel, que ainda segurava minha mão.

— O que foi? — questionou sem entender nada. 

— Eu tô rindo dessa confusão que a gente foi se meter — disse entre risos e encarei-o, vendo que a preocupação começava a abandonar seus olhos. — Parece até coisa de filme.

Continuei rindo e logo percebi que ele se juntou a mim. Dois idiotas rindo em frente ao restaurante — onde o pau ainda quebrava — e de mãos dadas, sequer se dando conta disso.

— Pena que tenha estragado nossa noite. — Nath foi o primeiro a parar de rir.

— Tem outro restaurante um pouco mais pra trás. — Lembrei do restaurante que parecia italiano, e que jurei que experimentaria um dia. 

— Está com fome ainda? — Neguei com a cabeça. Mesmo que não tivéssemos terminado nossos pratos, senti que aquilo foi o suficiente. — Nem eu. 

Nos encaramos em silêncio. Nossos olhares se voltaram para nossas mãos ainda unidas.

— Conheço um lugar que podemos ir — propôs e eu apenas fui atrás.

Entramos no carro de Nathaniel — aquele mesmo que vale mais que o apartamento da Júlia — e nos colocamos a caminho de onde quer que fosse. Tentei puxar papo, mas Bonnet apenas me disse que íamos a um lugar próximo do prédio dele e que poderia me trazer pra casa quando eu quisesse. Tá!

Após uns dez ou quinze minutos, ele estacionou no meio fio e tirei o cinto, abrindo a porta do lado do passageiro. Quebrei toda a magia dele sair e abrir a porta pra mim naquela postura cavalheira, porém a curiosidade acabou falando mais alto.

— Praça Pour Toujour — Bonnet anunciou, caminhando comigo para a grama bem aparada. — Tenho o costume de fazer caminhada por aqui durante a noite. É um local bem calmo.

— Que pessoa fitness você — brinquei e ri, observando-o sem ter o mínimo de pudor de disfarçar. E pra que, né? Ele também não estava se importando nem um pouco. — Mas eu entendo porque você gosta daqui, é bem calmo mesmo.

A praça estava algo entre lotada e vazia. Algumas pessoas faziam caminhada com seus fones de ouvido, outras estavam apenas sentadas em grupo e conversando, e outras aproveitavam uma barraquinha para comer morango mergulhado no chocolate. Também ouvia um som de saxofone ao longe.

— Sei que você disse que não está com fome, mas… — Nath sugeriu, apontando para a barraquinha.

— Você acha mesmo que vou recusar doce? — Ri alto e ele soltou algo como uma risada soprada. — Até hoje não entendo como você pode não gostar de doces.

Para nossa sorte, não tinha praticamente nenhuma fila e fizemos o pedido direto, tendo apenas que esperar ficar pronto.

— Acho o gosto enjoativo — ele respondeu com uma careta rápida.

— Já que é assim, eu como por nós dois — disse assim que o senhor entregou o espetinho na minha mão. — Sorte minha que eu sou um saco sem fundo e não engordo, como minha irmã costuma dizer.

Nath pagou o homem e deu uma risada gostosa. Caramba, o que esse cara não tinha de bonito? Nem pra rir igual um pato rouco.

— Apesar disso, é bom ficar de olho no colesterol… — soltou em tom de alerta, como se fosse um médico.

— Desse jeito tá parecendo minha irmã falando! — reclamei e trocamos mais uma nova rodada de risadas.

Provei o primeiro morango e quase fui ao céu e voltei com o sabor daquilo.

— Eu realmente preciso voltar aqui pra comer isso mais vezes — comentei assim que terminei de mastigar e logo emendei outra mordida.

— Eu estou aqui todas as noites — ele relembrou, como se fosse para nos encontrarmos novamente.

Apenas assenti com a cabeça enquanto mastigava, em dúvida do que responder. Ia falar que não e que só ia lá pra comer? Ia falar que sim e que ia adorar? Não seria mentira…

— Você gosta de jazz? — Nathaniel perguntou de repente e eu me dei conta de que aquela música ainda continuava tocando, apesar de parecer ser outra.

— Não é muito minha praia, não — respondi e comi mais um morango.

— Esse é um das razões que eu gosto tanto dessa praça — confessou e nos aproximamos de um pequeno grupo de pessoas em frente a um coreto.

Era de lá que saía a música, com um saxofone, um teclado, um baixo e um cantor com uma voz grave deliciosa de se ouvir.

 

"Just to make you smile

Simply makes me smile

Cause today could mean forever

When I fall in love

It will be forever

Or I'll never fall in love

In a restless world like this is"

 

"Apenas te fazer sorrir

Simplesmente me faz sorrir

Porque hoje poderia significar para sempre

Quando eu me apaixonar

Será para sempre

Ou então eu nunca me apaixonaria

Em um mundo inquieto como esse"

 

— É uma canção do Michael Bublé — Nath logo identificou o nome da música que a pequena banda tocava. 

— Você é fã de jazz mesmo, hein? — soltei, observando de canto de olho que algumas pessoas — casais, na verdade — dançavam o famoso dois pra lá e dois pra cá em frente ao coreto.

— É um pouco relaxante — Nath respondeu, encarando-me de canto de olho. Nem ele dava mais a mínima pra disfarçar.

— Ela parece trilha sonora daquele filme, La La Land — comentei e vi quando Bonnet ergueu as sobrancelhas, surpreso. — Vai dizer que nunca viu esse filme?

— Conheço por causa da cerimônia do Oscar. — Claro, chique do jeito que é, provavelmente assistiu toda a cerimônia enquanto tomava uns bons vinhos. Se bobeasse, era capaz de ter presenciado a cerimônia ao vivo e a cores. — Mas nunca assisti.

— Devia assistir qualquer dia desses — comentei e a banda continuava tocando, com o vocalista arrasando nos vocais. — Tem jazz, tem arte, tem dança, tem romance… Parece até que eu tô numa cena do filme.

— Direto de um filme de comédia para La La Land — Nath comentou sorrindo e não resisti a esconder o riso.

— Direto para La La Land — devolvi sorrindo para ele.

 

"And the moment I can feel that

You feel that way too

Is when I'll fall in love with you"

 

"E no momento eu posso sentir que

Você também se sente desse jeito

É quando eu me apaixono por você"

 


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Notas finais do capítulo

Amor, Los Autenticos Decadentes: https://youtu.be/Pvope7xOzHg
When I Fall In Love, Michael Bublé:
https://youtu.be/ZLALutrZGNE

Ester:
Pra quem gosta, vai aí uma curiosidade. A Noite do Truco é algo que acontece na Cantina do Fulano da vida real: https://www.facebook.com/462290474278356/posts/701112223729512/?substory_index=0
Quando eu e a Bia vimos isso, tínhamos que colocar na fic kkkkk Só vale lembrar que todos os personagens e eventos narrados aqui são puramente fictícios ;)
Até mais, povo o/

Bia:
Ai, ai, esses dois! Quem diria que a noite ia acabar num romancezinho desse depois da treta do truco xD Só sei que os caras se xingando em espanhol é uma das minhas cenas preferidas HUSAHUSH
Até mais o/



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