Ocean Motion escrita por Camí Sander


Capítulo 12
Capítulo 11 - Obrigações do noivo


Notas iniciais do capítulo

Volteiiii!!! Demorei um pouco mais do que o previsto, mas aqui estou com um capítulo QUILOS mais leve que o anterior. Espero que gostem!



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Obrigações do noivo

 

Dois dias se passaram desde que Randall me ligou dizendo que Demetri era um homem procurado. As acusações eram de grupo terrorista que atuava no país sob ordens da máfia alemã. A polícia nunca conseguiu prendê-lo por falta de provas, contudo, acreditava-se que o grupo liderado por Demetri Orsini era responsável por uma série de homicídios na cidade.

O caso mais brutal conhecido é o de uma professora de ensino médio, conhecida como Cecilia, ou algo assim, que cobrara demais de seus alunos. Randall mostrou-me a foto da mulher. Sorridente, cabelos escuros lisos e pele caramelizada. A última foto tirada antes de ser pega pelo pessoal do Orsini. No relato da polícia, ela foi torturada de várias maneiras.

Cortaram seus tendões do braço direito, esmagaram a mão esquerda e quebraram as rótulas dos joelhos. Não queriam informações, pelo que foi estudado no caso. Apenas tortura. Parece que espancaram e estupraram por dias antes de fazê-la desmaiar de dor e jogá-la no Lago Michigan com blocos de cimento amarrados nos pés. Randall não me mostrou as imagens, mas só de imaginar que Isabella poderia ter levado aquele destino, fazia com que cada momento que eu estivesse perto dela fosse extremamente necessário.

Conseguiram encontrar Isabella ainda naquela sexta-feira, contudo, não encontraram Demetri. Vasculharam o local e fizeram todo o teste para coletar DNA. Não adiantou muito, já que eu mesmo vi quando limparam tudo na quinta-feira. Inclusive as roupas de Isabella. Até mesmo a pele da minha funcionária foi esfregada com lenços umedecidos para não ter rastro dos capangas que a violentaram nos dias anteriores.

Ainda assim, havia a chance de detê-lo por suspeita.

Olhando para a mulher deitada, um sentimento de pesar se apoderou de mim. Ela não merecera nada do que passara. Aquelas coisas tinham acontecido especialmente para me desestabilizar. Acabei por estragar toda a vida de Bella ao não conseguir protegê-la como deveria. Alice arrumou toda a papelada para férias depois que o período de licença por doença acabasse. Isabella estaria com mais de seis meses longe da Ocean e uma carta de recomendação para qualquer emergência. Ela também tinha ganhado uma passagem para Seattle para ficar um tempo com os pais.

Eu não queria que Bella fosse embora para sempre, mas conversara com os médicos e talvez novos ares ajudassem a combater os traumas que ela passara. Isso e o apoio familiar. Nunca estará totalmente curada, disse o doutor, mas é fundamental que possamos tratá-la como uma pessoa capaz se superar. Ela não era uma pobre coitada. Devíamos ter a sensibilidade de confortá-la quando necessário, mas não a tornar incapaz.

As recomendações eram complicadas, porém, eu faria de tudo para seguir à risca cada uma.

 

—Oras, quem acordou?! – murmurei no quarto escuro.

A luz fraca, que vinha dos monitores ligados a ela, mostrou o momento que sua cabeça se virou para minha direção. Aquele rosto confuso me trouxe um sorriso nos lábios.

—Edward? – Sua voz saiu rouca. – O que você está fazendo aqui? Que horas são?

Admitindo a mim mesmo, a desorientação atual dela era melhor do que o desespero que passamos nos últimos dias. Aproveitei a situação para brincar com ela. Precisávamos de um tempo para relaxar, depois de tudo.

—Você está atrasada para trabalhar, Swan – comuniquei com seriedade. – Já são mais de cinco e meia.

O bipe do aparelho que media seu batimento acelerou e o debater dela no leito para tentar se levantar foi bastante hilário, exatamente como imaginei que seria. Empurrei-a de volta e acionei a enfermeira com uma risada.

—Acalme-se. Você está no hospital, são duas da manhã e você ganhou umas férias – expliquei enquanto pegava um copo com água e passava para ela. – Além do mais, duvido que alguém te deixaria sair daqui depois de dormir tanto.

—Dormi? – questionou depois de ter bebido a água com sofreguidão.

—Praticamente dois dias inteiros.

Era verdade. Desde que os policiais a resgataram e a levaram para prestar depoimento, Isabella recostou-se na cadeira de espera e não acordou mais. No hospital, tentaram lhe acordar para banhá-la antes de qualquer procedimento. Inconsciente, murmurou para que a deixassem em paz. Como eu já estava chegando no hospital, ordenei que lhe encontrassem um leito vago e qualquer coisa que a deixasse nutrida enquanto dormia, uma vez que ela precisava tanto de descanso.

—Meu Deus – sussurrou chocada. – E você está aqui desde quando?

—Desde ontem – confessei. – Não consegui dormir, então troquei de lugar com a minha mãe. A sua está a caminho, a propósito.

O sorriso de lado que surgiu em sua boca fez surgir o meu próprio. Se estava sob efeito dos remédios para estar tão leve, não fazia muita diferença. O importante era que Isabella sorria.

—Não conseguiu uma moça que o satisfizesse, senhor Cullen? – zombou a Swan.

—Depois de duas semanas escutando seus gritos, é muito difícil voltar a dormir no silêncio – retruquei fingindo culpá-la.

Não era exatamente uma mentira – meu quarto ficou estranhamente silencioso depois que desliguei o link assim que a polícia apareceu no local –, mas não culpava Bella por ter chorado e gritado todas as vezes que aqueles monstros tentaram algo com ela.

—Que macabro, Edward! – reclamou.

—Apenas a verdade – brinquei dando de ombros e sorrindo.

Ela suspirou, parecendo resignada com a situação.

—Vir aqui fez com que se sentisse bem? Conseguiu dormir mais rápido?

—Não – Fiz um muxoxo, estalando a língua. – Você dormia tão pacífica que parecia morta. Não me adiantou de nada!

—Você é horrível! – Bella riu baixinho.

Ri com ela. Nunca pensei que ficaria tão leve ao ouvir esse som. Não depois do que causei. Algo que os médicos já tentaram me inteirar dos danos. Também pudera, falei que éramos noivos. Noivos! Só de lembrar como as enfermeiras ficaram quando mencionei a palavra, já me dá um pequeno ataque de risos.

—O que aconteceu? – Bella franziu o cenho, confusa com minha risada fora de contexto. – Estou muito descabelada, não é?

Contudo, a enfermeira apareceu exatamente quando eu responderia que o cabelo dela estava virado em um ninho de ratos. Obriguei-me a me conter e parti para a encenação.

—Não, querida – sorri de canto e pisquei com um dos olhos. Esperava que ela não me desmascarasse agora. – Você está linda como sempre. Parece que acabou de acordar depois de uma longa noite comigo.

Bella sorriu, olhando para baixo e corando até o último. O bipe mostrava que seu coração estava prestes a explodir. Para dar mais credibilidade, coloquei uma mecha de cabelo atrás de sua orelha e beijei-lhe a testa.

—Depois te explico – murmurei em sua pele o mais baixo possível e ela apertou minha mão. Completei em bom som: – Minha cama não é convidativa sem a sua presença, minha querida.

A enfermeira afastou-me com certa brutalidade, acendeu o abajur que ficava ao lado do leito e conferiu o prontuário. Entrou muda e saiu calada. Não perguntou como ela se sentia, nem deu um mero sorriso de solidariedade. Além da demora para o atendimento, achei que o valor gasto no internamento do paciente nesse hospital não condizia com a aspereza dos profissionais. Isso não ficaria assim. Eu não estava pagando tão caro para “minha noiva” ser tratada como um mero objeto.

Fora isso, a carranca da mulher depois que eu me debrucei em Bella e falei que ela parecia ter abusado do meu corpo foi muito engraçada. Por isso, eu ri. Ri muito. Ri até a enferma levantar a mão e bater na minha cabeça.

—O que você aprontou, Cullen?

—Nada – fiz-me de ofendido. – Precisei de uma desculpa para poder ficar aqui… falei que éramos noivos – ri mais um pouco.

Ela revirou os olhos.

—Pensei que tinha subornado todas elas com sexo.

—Não exagera, Swan – fechei a cara. – Faz tempo que não sou mais assim. Foi isso que te levou a ser sequestrada, lembra?

E era verdade. Depois do escândalo de Rosalie com as loucas na Ocean, descobri que muitas das garotas da lista estiveram de olho em qualquer motivo que fizesse com que fossem menos procuradas. Jessica e Alisson diziam para as novatas que eu estuprava qualquer uma que achasse interessante; Tanya era a responsável por analisar todas que entravam em meu escritório, já que trabalhava próxima dali; Renata humilhava as meninas e Lauren garantia que pedissem demissão. O que mais me intrigou foi a solução que Heidi escolhera para tirar “a pedra” de seus caminhos. Descobrir que minha funcionária era irmã de mafioso e planejara cada passo daquela tortura psicológica foi demais até para mim. Incrivelmente, ela desapareceu assim como Demetri.

—Sinceramente? – a voz de Isabella me fez voltar ao quarto. – Aquilo é coisa de gente doente, Edward. Não deve se culpar pelo que me aconteceu.

Responsabilizar-me pelo que acontecera era inevitável. Porque eu mesmo acreditava que a culpa era minha. Se eu tivesse parado aquele esquema antes, se descobrisse que as cartas falavam dela, colocaria todos os seguranças para fazer sua proteção. Isabella se tornou mesmo uma pessoa preciosa para mim. Além de ser melhor amiga de Alice e guardar meus segredos como ninguém, sempre parecia ter a razão ao seu lado. Seus conselhos eram realmente bons e ela conseguia olhar a essência das pessoas. Bella só perdia o posto de minha melhor amiga para Alice. Elizabeth até podia saber de coisas da minha vida que eu não coisa nem mesmo para Alice, mas ainda assim, minha irmã viva podia fazer o que minha irmã morta não podia mais: Reclamar de minhas atitudes.

—Você não está se culpando por toda essa besteira, não é? – a voz de Bella me tirou do transe. – Edward, você é melhor do que isso!

—Perdoe-me, Bella.

Não consegui olhar para seu rosto, peguei sua mão e comecei a brincar com os dedos finos de unhas recém pintadas. Alice tinha passado esmalte perolado quando a médica lhe avisou que Isabella demoraria para acordar. Bella fechou a mão e prendeu meus dedos no processo.

—Ei, olha para mim – ela pediu com a voz meio enrolada. – Edward, você não tem culpa, ouviu? – falou assim que a fitei.

—Swan...

—Nada de "Swan" agora – brigou. – Homem, você tem muita mágoa de si mesmo e não é de hoje que vejo isso. Coisas assim acontecem, Cullen. Você não é o único a ter a "noiva" estuprada. Tem gente que perde a filha pequena por conta desde tipo de monstro. Há homens sendo estuprados também. Você foi corajoso. Eu não me senti sozinha em momento algum desde que aquela luz não se apagou no primeiro dia, nem quando tudo aconteceu. Imaginar você lá, segurando minha mão, repetindo que tudo ia dar certo, que você não estava desistindo de mim...

Eu assisti suas palavras se embolarem cada vez mais e seus bocejos se tornarem mais frequentes. Beijei sua mão, sua testa e pedi para que voltasse a dormir.

Não era necessário dizer que Isabella podia estar certa sobre não estar desistindo dela. Ninguém que a conhecesse poderia fazê-lo. Bella era especial demais para todos. Suas convicções e princípios eram louváveis. Fechei os olhos com as lembranças dos bons momentos que passei ao seu lado e acabei adormecendo na cadeira mais próxima, segurando sua mão.

Na manhã seguinte, minha mãe chegou cedo para trocar de lugar comigo. Trouxe uma muda de roupas e uma toalha, além de escova de dentes e sabonete.

—E a mãe dela? – indaguei baixinho.

—Só depois do meio dia, meu amor. – Esme me respondeu com ternura. – Como está a nossa pequena?

Sorri um pouco ao lembrar os acontecimentos da madrugada. Olhei para Isabella e ajeitei-lhe os cabelos para fora do rosto. Mal se mexera na cama durante a noite de tão cansada.

—Acordou essa madrugada e conversou comigo por uns vinte minutos, mais ou menos.

—Isso é muito bom, meu filho. Ela ficou com alguma depressão ou trauma, você pode dizer?

—Não sei, mãe – murmurei com tristeza. – Ainda é muito cedo, mamãe. Aparentemente, não, mas os médicos me alertaram que, talvez, esse quadro mude quando sair do hospital e se ver sozinha no apartamento.

A careta que minha mãe fez ao olhar para o rosto pacífico da doente fez com que meu peito se contraísse. Naquele momento, prometi a mim mesmo que me mudaria para o quarto de hóspedes de Isabella se fosse necessário. Eu não deixaria aquela garota sozinha para superar um trauma que minha irresponsabilidade tinha causado. Seriam dias até ela sair de Chicago e, com sorte, meses depois de voltar. Nesse meio tempo, eu cumpriria minha promessa de procurar pelo noivo.

—Eu tenho a chave, mãe – lembrei-a.

—Será que ela não preferiria passar um tempo comigo? – cogitou pensativa. – Tenho certeza de que Carl não se importaria.

Sorri. Eu ainda ficava admirado com o poder que essa mulher tinha de cativar as pessoas. Primeiro foi com Alice, depois meus pais se apaixonaram perdidamente por ela, agora que eu dera chance, não conseguia ver minha vida sem sua companhia na empresa e no prédio.

—Falei para Alice reservar os próximos meses para as férias atrasadas da Isabella.

—Será o suficiente, meu filho?

Suspirei. Eu não fazia ideia. E se não fosse? E se ela não quisesse mesmo trabalhar na Ocean depois de tudo? O que eu faria sem a língua ferina dela me contradizendo o tempo inteiro? Sem aquele olhar furioso querendo me mandar para o inferno? Ela ficava tão engraçada quando com raiva! Como eu manteria a ordem naquela empresa? Impossível! Isabella era a única que realmente questionava minhas ações! Ela me mantinha na linha.

—Se não for, lidarei com isso na hora. Não consigo pensar direito...

Dona Esme colocou a mão em meu ombro, enternecendo-se da minha posição. O olhar que me lançou foi de dor. Ela me entendia.

—Tudo bem, meu filho, agora, deixe que eu cuido da nossa Bella e vá para casa descansar.

—Mãe...

—Negativo, Edward Anthony – interrompeu-me Esme autoritariamente. – Você não é de ferro e passou por um terror tão grande quanto o dela!

—Posso apenas tomar um banho em casa e voltar? – supliquei. Eu precisava estar por perto!

—Não, você vai dormir um pouco! Vai descobrir que está terrivelmente cansado e acabar cochilando no volante. Tenho certeza, afinal, sou sua mãe e te conheço bem!

Suspirei resignado. Não tinha razão para comprar aquela briga. Ela venceria de qualquer maneira. Todavia, o pensamento de que teria que encarar aquela cama, aquele teto, me assustava.

—Posso dormir na sua casa? – pedi por fim. – Aquele apartamento não me traz paz. Eu fecho os olhos e lembro dela esparramada naquela mesa...

E minha voz entrecortou. Não conseguia mais olhar para aquelas paredes. Os gritos dela ecoavam no quarto e eu não podia fazer nada a respeito.

—Oh, minha criança, é claro que pode! Você é meu menino, afinal. Sempre será o meu pequeno Tho...

—Mãe – adverti interrompendo. – Thony morreu com Lizzie.

Assim que pronunciei as palavras, me arrependi amargamente. Ver o rosto retorcido de Esme naquele hospital por causa de uma irresponsabilidade minha já era difícil. Mencionar outra irresponsabilidade minha que levou a parte mais bela de nossas vidas ainda nesse mesmo hospital foi muita imprudência.

—Perdão – murmurei com os olhos baixos.

—Tudo bem, meu amor – ela me abraçou. – Vá para casa e tome seu banho. Acho que os pais de Bella chegam logo depois do almoço e sei que você quer dar uma palavrinha com eles.

—Preciso colocar alguns pontos que nem Alice sabe. Aposto que nem Isabella. Acredito que gostarão de compreender e poderemos discutir como se darão os próximos meses.

Ela sorriu, mesmo que não tenha chegado aos olhos.

—Carlisle está em casa, e sua irmã também.

Beijei seu rosto e a testa de Isabella como despedida. Prometi voltar ao hospital antes do meio-dia e regressei ao meu cativeiro: Minha mente.

 

Foi ruim chegar em casa e encontrar a desordem que deixei quando soube que Isabella estava sendo levada ao hospital. Ficou difícil abrir a porta do quarto, então apenas peguei a roupa que minha mãe tinha separado e fui para o banheiro social. Tomei a ducha mais rápida da história, pois queria sair logo dali. Realmente o sono estava apenas à espreita e nem ousei sair do estacionamento do carro, embora estivesse com muita vontade de chegar na mansão dos meus pais.  Dormi no banco dos passageiros com os vidros abertos e acordei três horas depois com dores no corpo. Pelo menos estava sem sono. Voltei ao apartamento apenas para comer alguma fruta e escovar os dentes, logo estava chegando ao encontro de minha mãe mais uma vez.

—Dormiu bem, filho? – o tom de voz e o olhar indicavam que Esme sabia que eu não cheguei até sua casa.

—Como uma pedra, mamãe – sorri de lado.

—Esme? – a voz de Bella impediu o discurso preparado para mim. – Você também está aqui?

—Oh, meu amor – a voz da mais velha saiu embargada. – É claro que estou! Eu nunca a abandonaria, Bella. Você é como se fosse minha filha. Sabe disso, não sabe?

Bella deu um sorriso fraco e eu espelhei. Dei bom dia e fui sentar-me no sofá do quarto enquanto pegava o celular e começava a jogar qualquer coisa para passar o tempo.

A enfermeira foi chamada e logo o próprio médico estava ali para examiná-la. O diagnóstico foi o mesmo da chegada: Bella estava fisicamente bem e precisaria passar por um teste psicológico para ver o quanto aqueles crápulas a feriram.

—Se ela quiser – explicou-me o médico fora da sala. – Podemos reconstruir o hímen. Contudo, como toda cirurgia, há riscos de infecção e rejeito do corpo.

—Falarei com ela - prometi, já imaginando como raios eu entraria no assunto e xingando-me mentalmente por ter avisado que ela era virgem antes. – É provável que ela não queira fazer essa cirurgia. Haverá consequências quando nos casarmos, da mesma maneira. Eu não sei se conseguiria evitar a dor e não quero causar mais disso a ela...

—Entendo. Bem, a opção está de pé, avise-me se Isabella decidir por fazê-la.

—Sim, senhor – respondi rapidamente torcendo para que ele percebesse que devia sair.

Percebeu. Trocamos um breve aperto de mão e logo se encaminhou a outro quarto.

Agora eu teria que voltar para o quarto e inteirar tanto minha mãe quanto Isabella sobre sua situação. Como, no inferno, eu conseguiria falar sobre reconstrução de hímen com minha funcionária? Impossível, eu diria. Talvez minha mãe pudesse explicar... Com certeza, essa responsabilidade seria passada para ela. Ou Alice.

—E então? – foi o que saiu da boca das duas morenas antes mesmo de eu fechar a porta.

—O quadro está bom – pontuei. – Como já havia explicado à Isabella essa madrugada, será preciso fazer exames psiquiátricos e de avaliação por abuso, mas acho que volta logo para casa.

Minha mãe estava visivelmente aliviada enquanto a paciente olhava com desgosto para os tubos de intravenosa e eletrodos em seu corpo.

—Por quanto tempo? – Bella sussurrou.

—Eu não sei – respondi condoendo-me. – Isso leva dias, Isabella, não posso dizer. O doutor também não especificou.

—Tudo bem – resmungou a enferma enquanto afundava a cabeça no travesseiro e fechava os olhos. – Acho que aguento mais alguns dias

—Oh, minha querida, estaremos aqui para o que precisar – minha mãe afagou seus cabelos. – E sua mãe também está chegando para cuidar de você.

Olhei a interação das duas e senti um misto de compreensão e ciúmes. Minha mãe estava se oferecendo para ser uma segunda mãe para a mulher que já foi minha inimiga declarada. E eu via que era algo sério, que ela realmente se considerava uma mãe para Isabella. Restava saber se perdi meu posto de irmão mais velho preferido da Alice, porque de filho, já era.

—Mãe, posso conversar rapidamente com a senhora?

Isabella lançou-me um olhar questionador enquanto eu arrastava Esme para o canto do recinto. Era uma boa coisa que Bella ainda estivesse presa a eletrodos e intravenosa. Embora tentasse disfarçar, claramente focou em nossas posturas e sussurros.

 

—Você quer que eu fale com ela sobre reconstrução de hímen? – chiou minha mãe. Parecia mais alarmada do que eu quando recebi a notícia. – E por que você foi chamado pelo médico, e não eu? Por que aquele homem simplesmente não jogou as cartas na mesa? Quem deve decidir é ela, afinal!

—Precisei de uma desculpa para ficar à noite, mamãe – murmurei culpado.

Seus olhos se estreitaram e ela cruzou os braços. Tremi internamente. Aquela era a pose das broncas mais feias que recebi dela.

—O que aprontou agora, Edward Anthony? – grunhiu na minha direção.

Encolhi meus ombros, preparando-me para a reação explosiva que vinha depois daquela voz.

—Falei que era o noivo dela.

—NOIVO! – seu tom era sarcástico.

E sua postura relaxou tão abruptamente que me assustou... até perceber que ela parecia zombar de minha mentira. Será que ela não confiava em minha capacidade de estabilidade pessoal?

—Qual o problema, mamãe? – perguntei chateado.

—Edward, você nunca nem mesmo namorou, filho! – respondeu impaciente. – Como alguém pôde acreditar que você noivou?!

Bufei irritado. Ah, sim, como se isso fosse um argumento válido para sua descrença evidente!

—Pode me ajudar, mãe?

Ela lançou um olhar piedoso à Bella e voltou-se para mim, franzindo os lábios.

—Meu filho, talvez devamos deixar esse assunto para que a mãe dela discuta com ela, certo? Eu sei que acabei de dizer que ela é como uma filha para mim, mas não é como se eu pudesse me intrometer em qualquer tema sem que a constranja tanto.

—E se o médico vier colher a resposta ainda hoje?

O sorriso maroto que ela deu me arrepiou de medo.

—Bem, você é o noivo, cumpra com o seu papel - e voltou para perto do leito.

 

Alice chegou próxima ao meio-dia para trocar de lugar com Esme no quesito cuidar de Isabella. Vi minha possibilidade de pedir auxílio à baixinha minutos depois que nossa mãe saiu do quarto. De acordo com Esme, comida de hospital era boa, mas não se comparava ao tempero de casa e era por isso que a matriarca estava em seu caminho para preparar o almoço.

Com muito custo, depois de deixar Bella reclamar das unhas pintadas, cabelos bagunçados e dor nas costas por ficar deitada por tanto tempo, puxei Alice para o mesmo canto que puxara Esme, dando um sorriso amarelo para a mais velha, e pedi para a baixinha falar sobre a cirurgia opcional.

Ela resmungou e virou-se para a hospitalizada.

—Ele te contou sobre essa história de noivado, Bella?

—Claro que contei! – retruquei ao mesmo tempo em que Bella dizia:

—Claro que sim. Ele me pediu em casamento naquele domingo chuvoso, eu aceitei e tivemos uma ótima noite.

Acho que a expressão de minha irmã era a mesma de quem estava enfartando. Isabella abriu um sorriso e piscou para mim. Sorri e agradeci sinalizando com a cabeça. Passado o choque, Alice voltou-se para mim.

—Cumpra com seus deveres de “noivo atencioso”, então.

—Mas, Alice...

—Estou de saída – declarou a baixinha. – Até mais tarde, irmãozinho. Descansa, amiga.

E então percebi que ela fez exatamente o que eu fizera com ela na tarde anterior.

Depois de toda aquela quadrilha montada na Ocean, Alice riu de minha desgraça e disse que o nome da fábrica condizia com o que se passava ali: Movimentos do Oceano. Uma hora calmo, outra, parece que tudo pode ruir. Revirei os olhos para a analogia horrível e a deixei falando sozinha.

Fiquei olhado para a porta do quarto com uma expressão desolada.

—Que horas vai me contar o que tanto te preocupa? – perguntou Bella quando se passaram cinco minutos que eu não tirava os olhos da entrada.

—Você promete que não vai rir? – supliquei, voltando para o acento ao seu lado.

Ela ergueu a sobrancelha.

—É tão ruim assim?

Assenti com a cabeça, ainda esperando pela sua promessa. Mas Isabella não respondeu como eu queria. Ela segurou minha mão com uma das dela e deu tapinhas reconfortantes no torso com a outra.

—Não fique assim, Cullen – pediu calmamente. – Todo mundo broxa alguma vez na vida. Já era hora de deixar teu brinquedinho descansar, coitado!

Saí de perto dela como se tivesse levado um choque. O quê? Broxar? De onde tirou isso?

—Cala a boca, Swan! – briguei com raiva enquanto ela ria de mim. – Eu não pediria conselhos para a Alice sobre esse tipo de disfunção! Jesus! Quem você acha que eu sou?

Ela deu de ombros, ainda entre risos.

—Pela sua cara de preocupado, imaginei que não quisesse falar comigo, porque eu levaria essa para o "nosso" casamento! – riu e fez um gesto com as mãos. – Na hora dos brindes, lá estarei eu, brindando pelo brinquedinho disfuncional de Edward Cullen! Oh, que maravilha!

Fuzilei-a com o olhar.

—Você quer mesmo discutir sobre minha capacidade de ereção aqui no hospital, Swan?

—Se teremos um problema nas núpcias, é bom que já estamos aqui e você pode se tratar.

—Isabella...

—Edward...

Respirei fundo. Não perderia a cabeça com essa maluca hoje. Eu merecia descanso.

—O médico que te atendeu queria falar comigo sobre cirurgia para você – falei por fim.

Ela arregalou os olhos, petrificada.

—Não quero fazer cirurgia nenhuma – declarou. – Aliás, que cirurgia é essa? Eu não me lembro de ter necessidade! Aqueles crápulas abusaram sim de mim, mas não é algo que vão conseguir cortar do meu cérebro!

—É sobre a parte que eles lhe roubaram, na verdade – fiz uma careta.

—Para de enrolar, por favor, vá direto ao ponto.

Soltei o ar com força e sentei-me novamente ao seu lado. Peguei sua mão e comecei a brincar com seus dedos. Era bastante reconfortante para mim, o ato.

—É uma cirurgia estética – expliquei. – Querem que saiba que é puramente opcional e farão como tentativa de amenizar os traumas de... disso. Reconstrução do hímen. Tentei pedir para minha mãe conversar com você, e para Alice, porque não sei se o médico virá recolher sua resposta logo. Claramente, não adianta esperar alguma coisa daquelas duas. Só o fato de que não acreditam na minha capacidade de me estabilizar emocionalmente com uma pessoa já...

—Espera aí um minuto! – interrompeu-me quando percebeu que eu saía do foco. – O doutor veio falar com você para saber se eu queria reconstruir uma parte do meu corpo? Por quê?

—Bem... acho que é... porque... eu sou... seu... noivo? – arrisquei lentamente, olhando em seus olhos e arqueando as sobrancelhas.

Isabella deixou cair a cabeça no travesseiro, gargalhando da minha miséria enquanto dava-me tapinhas reconfortantes no ombro e soltava alguns “bem feito”.

 


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Notas finais do capítulo

E então, o que acharam? Comentem! Dissertem sobre essa desconfiança das mulheres na estabilidade do Edward!



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