Ignotus - A lenda do Caçador escrita por Azai


Capítulo 5
Capítulo 5 — Reino dos Pesadelos... — Parte 1


Notas iniciais do capítulo

Boa Sexta-feira treze, neném...



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I

Dava pra ouvir o barulho daqueles idiotas de fora do prédio, e pensar que minha mãe pensava que em algum momento esses imbecis poderiam coexistir em paz, seria um sonho? Sim, mas essa criaturas são todas derivadas de nós humanos, tudo neles é a potencialização dos sentimentos ruins e raivosos que os homens carregam… então será que somos tão diferentes assim?

Tenho minhas dúvidas…

Cheguei caminhando pelo tapete vermelho que dividia o local, e entre as cadeiras os homens e mulheres que discutiam, quase se matando, se voltaram para mim com olhares interrogativos, dentre eles existiam uma essência assassina forte e esmagadora que emanava por entre os corredores de cadeiras carmesim. Foi quando um dos indivíduo saltou à frente da maioria daquelas figuras e se aproximou de mim, ele possuía cabelos loiros, olhos vermelhos e trajava vestes incrivelmente elegantes, seus passos o guiaram em minha direção até que ambos ficamos frente a frente.

— Você foi o filho da… — Antes que ele pudesse terminar a frase, acertei um soco no rosto dele, em dois microssegundo, chamei Brasa e apontei a lâmina para o pescoço da figura.

— Ouça com atenção: antes que consiga pronunciar o fonema de meia letra, eu vou atravessar essa espada na sua garganta, — Falei e liberei as chamas contidas na gema da espada. — Então sugiro que tenha cuidado na escolha de suas próximas palavras, porque eu vou abaixar essa espada e nós vamos conversar como seres civilizados… Todos entenderam? — Eles permaneceram em silêncio. — ENTENDERAM?! — Gritei e todos confirmaram com movimentos positivos de concordância.

Passei por eles caminhando e me dirigi ao palco, apoiei a espada no ombro e me voltei para os indivíduos reunidos. No palco existiam duas mulheres com cocares e pinturas indígenas em seus corpos, elas estavam nuas, e possuíam longos cabelos lisos caindo até a altura da cintura.

Uma das mulheres se aproximou e anunciou:

— Digníssimos! — Ela os chamou a atenção, e todos se voltaram para ela, inclusive eu. — Este é o responsável pela reunião do Corte de Sangue, Arthur Andrade, Filho dos Antigos conselheiros da Casa Andrade, Guardiões da Espada Tornado de Brasa, Sobrevivente de hy breasail e atual responsável pela manutenção da paz em Pindorama. — Ela me apresentou e eu a olhei com um sorriso. — Hoje, sob a antecedência da Lua de Sangue tem início o segundo mandato da Família da Espada, no Conselho da Assembleia dos Caçadores e dos Treze Clãs. — A garota que parecia visivelmente nervosa deu alguns passos para trás e tornou a segurar a lança primitiva que tinha em mãos.

— Agora que já nos apresentamos e trocamos algumas amenidades… — Comecei e agradeci a garota com um gesto de cabeça, havia algo familiar nela, muito familiar… — O primeiro tópico que essa Assembléia deve discutir é o seguinte: Um oficial do Exército… Acho que era um sargento, ele desapareceu numa missão de reconhecimento, um tal de Ji-i…Jinn… — Minha memória é um lixo, qual é… — Jinn Saito…

— Onde quer chegar?! — Murmurou o homem que outrora estava irritadiço.

— O Sargento Saito desapareceu e meus caçadores acharam traços de um Corpo-seco no local, portanto estou convocando a ajuda d'Os Reis e seus Clãs, coletem informações e tragam pra mim… — Finalizei.

Burburinho surgiu no meio das pessoas que estavam em pé entre as cadeiras, até que um deles decidiu se manifestar:

— E os seus caçadores, não vão ajudar você, Conselheiro? — Uma mulher em meio a alguns homens se manifestou.

— Nós já estamos agindo, mas eu sou sempre a favor de fechar o cerco, por isso a ajuda de vocês é solicitada, Rainha Daij. — finalizei, justificando minha decisão e desfiz a espada em uma tempestade de fogo. — O segundo e último tópico é a respeito de um Vagante… Nos últimos meses eu estive sendo observado por uma… e quando fui pesquisar a respeito descobri que a pessoa em questão estava desaparecida, o nome é Kamila Branco, portanto vou perguntar e sugiro que tenham cautela na resposta, já que há a possibilidade de um de seus Clãs ser extinto hoje, alguém sabe alguma coisa sobre isso?

Todos se entreolharam, mas não houve resposta, no lugar disso surgiu um silêncio sepulcral, foi quando a mulher que já havia se manifestado se aproximou saindo do meio dos homens, Daij, A Rainha Ninfa, representante dos clãs estrangeiros, ela possui uma beleza aterradora, cabelos cacheados e longos de cor loira, seus olhos são azuis como o céu azul, ela veste um vestido justo decotado que atraia a atenção para os fartos seios, enquanto ao mesmo tempo desenha muito bem seu corpo.

— Ouvi sobre um pequeno grupo de Cães do inferno que raptaram uma garota, mas nada além disso. — Disse ela e no mesmo momento eu saltei do palco.

Me aproximei dela e estendi dois dedos desenhando um X no ar e em seguida um círculo ao redor, mas antes de mais nada a perguntei:

— Se importa? — E ela meneou a cabeça em negação. — Se estiver mentindo isso pode doer bastante. — A mulher apenas sorriu e fechou os olhos, tendo esse gesto acompanhado por todos os outros presentes naquele salão.

Aquele era um momento ritualístico, onde a chama divina queimaria e mataria qualquer pessoa que estivesse mentindo para o Conselheiro, pode parecer um pouco radical? Talvez… mas é a única forma de garantir que eles terão lealdade e não tentarão enganar a mim.

Com meu olho esquerdo pude sentir a essência de sinceridade, 

— Viu? Não estou mentindo, nem omitindo nada.

II

Ana e eu ficamos a noite toda sentados no sofá, enquanto ela segurava uma faca eu fiquei coberta com o edredom e nesse meio tempo eu adormeci e quando acordei comecei a ouvir suas reclamações, ela dizia coisas como: "como você consegue dormir num momento desses?", a bem da verdade nada aconteceu enquanto eu dormia, aquele grunhido diabólico se foi da mesma forma que surgiu, mas tinha algo familiar que começou a me incomodar, aquela sensação ruim no estômago que tanto me perseguia, como um embrulho, seguido de uma vontade sobrenatural de vomitar, mas dessa vez era mais forte, como um soco no âmago estomacal.

— Eu fui lá em cima checar… e a porta do banheiro foi cortada em tiras, é como se alguém com uma motosserra tivesse destruído a porta. — Ela me olhou séria, mas ao mesmo tempo seu olhar estava perdido nos acontecimentos, eu tinha um palpite, eu sabia responder, mas quando abri a boca pra falar ouvimos a campainha ressoar pela casa. — Seja lá quem for, peça pra ir embora, eu vou tentar ligar pra polícia de novo…

A garota saiu rumo às escadas e eu fiquei sozinha na sala ouvindo a campainha ressoar novamente.

— Já vai! — Avisei seguindo rumo a porta.

Girei a chave que sempre ficava pendurada na fechadura da porta de madeira preta e puxei a porta, deixando a grade exterior trancada: — Pois não?

Havia um homem em pé, sua fisionomia era tão bonita quanto eu me lembrava, e aquele sorriso era tão acolhedor, ele havia aberto o portão com a cópia da chave que eu lhe dera, e por fim ele avançou em minha direção me abraçando e erguendo-me no ar.

Logo senti aquele cheiro de shampoo de limão no cabelo e um perfume forte e marcante que Luiz sempre usava.

Eu apenas fiquei sem reação e aceitei o abraço, enquanto arregalava os olhos revisitando a imagem de seu rosto que pude vislumbrar há poucos segundos.

— Luiz… — Falei de forma seca e ele se afastou de mim fitando os olhos verdes em minha direção. — Eu achei que só voltaria próximo ano…

— Essa não é a reação que eu esperava… — Disse ele me olhando com estranheza quebrando o abraço e me pondo no chão.

O ambiente parecia favorecer a beleza desse imbecil... Desculpa a precipitação, você deve estar se perguntando "quem é ele?". Esse é o imbecil que namorou comigo há alguns anos, isso mesmo 'namorou', ele terminou o nosso relacionamento quando recebeu o convite de ir pra uma viagem de negócios para a Austrália há 3 anos, um ano atrás ele voltou pra cidade e quis reatar o nosso namoro e eu meio que aceitei… agora… eis a situação na qual nos encontramos, Luiz é uma ótima pessoa: inteligente, bonito, legal, divertido, companheiro, respeitoso, romântico e educado, ou seja, tudo o que se poderia querer em um homem… Mas tem um grande porém, ele tem a tendência de se vitimizar em diversas circunstâncias, agindo como se todos os problemas dele fossem culpa do mundo ao redor… e é por isso que passei a não suportar a sua presença.

— Vá embora, Luiz… — Dei as costas e bati a porta na cara dele, por fim me sentei no sofá abraçando uma almofada, eu mereço isso? Tava tudo tão estranho e confuso, mas acho que as coisas pioraram em uns 300%.

Sozinha em casa, com um irmão sumido e um ex-namorado de comportamento narcisista.

A enxurrada de sentimentos me engoliu e eu fiquei sentada abraçada com a almofada, foi quando ouvi alguns sons intensos, eram como explosões e um criptar semelhante a fogo, porém existia algo que se sobressaia em meio a todo esse ruído e sons de sirenes, era um grito, um grito forte e agonizante ecoando pelo lugar chegando até mesmo a sufocar meus ouvidos, depois disso ouvi nitidamente uma voz falando "socorro!", era a voz de um menino, fraca e abafada, sem nenhum força em si, e já nessas circunstâncias quando nada poderia ficar mais estranho, um garoto saiu de trás da escada se arrastando, ele estava sujo e vestia roupas rasgadas, seu corpo estava com sinais de desnutrição e maus tratos, ao o ver me levantei do sofá e dei alguns passos para trás, mas após alguns segundos fui me aproximando lentamente por notar que ele havia parado de se mexer, então… Caminhei até ele sentindo um calor tomar o ambiente, chamas inundaram o lugar e faíscas passaram a se projetar na sala, após me aproximar o suficiente dele toquei o no ombro, sua respiração estava fraca e o corpo dele parecia tão fraco ao ponto de se quebrar se eu o tentasse tirar do chão, porém eu tinha que chamar uma ambulância e deixá-lo em uma posição confortável até que alguém viesse buscar, portanto, o virei de barriga para cima e avistei seu rosto transfigurado.

Aquela imagem me fez querer vomitar…

O globo ocular esquerdo do garoto estava esbugalhado, a pálpebra que deveria revestir e o proteger estava derretida como uma borracha, sua pele desde a pálpebra até o meio da bochecha havia ficado repuxada e com aspecto borbulhante, tendo manchas pretas distribuídas pelo rosto e pequenas elevações da pele queimada em diversos locais. Seu rosto estava contorcido em dor, porém ele tinha um aspecto bonito, com no máximo 12 anos de idade, o menino estava com os cabelos raspados e em seu peito possuía uma imensa cicatriz em forma de cruz que cobria a pele até pouco acima do umbigo, seus pulsos possuíam marcas também, pequenas cicatrizes diagonais semelhantes as cicatrizes em pessoas que acumulam tentativas de suicídio, o que aconteceu com esse menino?

Olhando a forma em seu rosto pude ver que o formato da queimadura se assemelhava a cicatriz do caçador, e lhe era familiar até mesmo na aparência física, tornei a me aproximar dele e inconscientemente chamei seu nome em tom baixo, no mesmo momento em que outra voz o chamou:

— Arthur? — O chamou o garoto, igual a ele, que surgiu em minha frente como uma assombração. — Eu consegui uma unidade de fuga… Vou tirá-lo daqui. — A voz do menino era inexpressiva, era como se tudo o que estava acontecendo era irrelevante, mesmo tendo o garoto a sua frente machucado.

Ele era idêntico ao Arthur e aparentava ter a mesma idade do garoto caído, visivelmente eles são gêmeos idênticos, a diferença maior, além do fato dele estar em pé no meio da sala, era um corte muito profundo e largo que ele possuía no rosto, o ferimento era tão grave que deixava os dentes do menino visíveis pelo corte em sua bochecha esquerda, ele também estava com o cabelo raspado e vestia as roupas em trapos como se tivesse sido abandonado numa caverna por anos, a condição física dele não estava melhor do que a do menino inconsciente, e assim como o outro ele tinha cicatrizes, diversas delas espalhadas pelo abdômen e pelos braços numa quantidade tão grande que ele mais parecia ter passado por diversas sessões de tortura com todos os tipos de armas do mundo, mas mesmo em condições de desnutrição eles tinham a condição física forte e desenvolvida para duas crianças.

Ambos estavam ensanguentados, algo que só percebi ao virar o corpo do menino e possuíam hematomas por diversas áreas da pele, suas mãos e pés estavam sujos de uma areia escura e seus corpos suados e cansados, porém aquele garoto que saiu de trás da escada permanecia de pé, ele carregava algo nos olhos, algo como uma espécie de chama, não uma chama literal… digo isso em contexto metafórico, mas a melhor forma de descrever o ato de olhar dentro daqueles olhos castanhos era como pular dentro de um mar de fogo, parecia que ele odiava tudo… naquele olhar havia esse ardor de quem passou a vida toda empilhando ódio em cima de ódio numa corrida desenfreada por algo, e aquela sensação não se foi, mesmo que nossos olhares tenham se cruzado por apenas alguns segundos, ele me deixou paralisada, tempo o suficiente pra pegar o corpo de Arthur e vir andando na minha direção, entretanto, quando ele se aproximou de mim o suficiente pra esbarrar no meu corpo sua imagem desapareceu e as chamas e faíscas que cobriam o lugar sumiram da mesma forma que tomaram forma.

O que eu deveria fazer? Conheço um cara com umas cicatrizes na cara que basicamente me assombrou em alguns pesadelos, depois vejo ele numa loja de sapatos, ele me dá um relógio de ouro e depois desaparece, e, cara, só Deus sabe o quanto eu surtei quando vi ele desaparecer no ar… depois do relógio meu tormento com pesadelos para, e nesse meio tempo eu penso: "tudo vai se acalmar", mas aí o meu irmão sofre um acidente, desaparece, meu ex-namorado babaca volta, mas eu simplesmente penso "calma, Kamila, tá ruim a situação? Tá, mas não pode ficar pior… É só pensar positivo, exalar energia positiva e as coisas vão se acertar" e o que acontece? Eu começo a ter uma crise de choro e logo em seguida começo a ter alucinações… Qual é cara? Me dá um tempo… eu só quero continuar com a minha vida tranquila, trabalhando naquela porcaria de ETE, terminar de escrever o meu romance e quem sabe não arrumar um emprego que pague melhor nesse meio tempo… 

Bem… Talvez eu esteja pedindo muito…

 

Perdida em pensamentos tranquei a porta e me distanciei de casa andando pela rua rumando o pequeno parquinho onde as crianças do bairro costumavam brincar, minha mente estava turva. No caminho percebi que a noite caía rapidamente, logo tornando o céu negro e as nuvens avermelhadas, peguei o celular do bolso e apenas olhei para o relógio, era meia noite? Como?

 

Ouvi grunhidos e ganidos ao redor do lugar, como uma matilha de animais selvagens ganindo, no mesmo momento em que aqueles barulhos ecoaram pelo bairro criaturas semelhantes a cães vermelhos saltaram por sobre os telhados das casas, a pelagem deles soltava uma fumaça estranha semelhantes a fuligem e o cheiro daquela fumaça era muito semelhante a borracha queimada, mas ao mesmo tempo era como respirar o cheiro putrefato de um cadáver.

As criaturas tinham olhos vermelhos e começaram a correr atrás de mim, tentei me distanciar deles ao máximo enquanto assistia pela minha visão periférica o ambiente se distorcer, tornando as construções ao meu redor em uma floresta sombria e enevoada.

Na minha tentativa de fugir daquela matilha de cães, meus pés se atrapalharam e eu caí no chão, os sons dos animais se intensificaram atrás de mim e ao me virar para ver o quão perto estava, vi uma espada flamejante cruzar o ar como um raio, a lâmina rodopiou e acertou os animais, desfazendo alguns deles em cinzas, e em seguida retornou até a mão do homem que a havia arremessado, chamas saiam dos olhos dele, mas apenas pude as avistar pelo canto dos meus olhos e havia um sorriso em seu rosto, o homem segurou a espada e a cravou no chão, se agachando ao meu lado em seguida.

— Oi… É um prazer finalmente te conhecer na vida real… — Disse ele. No meio do nevoeiro uma brisa soprava, assanhando os cabelos castanhos da figura, derrubando alguns dos fios da franja na testa dele assim cobrindo-lhe os olhos. — Eu sou Arthur… — Ele se apresentou e me estendeu uma mão. — Eu queria falar algo legal, tipo "venha comigo se quiser viver", mas seria expositivo demais… — Sorriu.

Continua...

 


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