As Lendas dos Retalhadores de Áries escrita por Haru


Capítulo 11
— As quatro estações




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— As quatro estações

Kin acordou em casa, na cama confortável de seu caloroso quarto. Continuou deitada. O cansaço não abandonou seu corpo totalmente, seu cérebro estava demorando um pouco mais do que o normal para processar as memórias e por isso ela teve alguns doces momentos de ignorância sobre os problemas. Sentia o mais belo fruto do esquecimento: a paz. Paz que infelizmente durou pouco.

Ao lembrar de tudo, levantou-se em um salto. Correu para fora do quarto, desceu as escadas e procurou Mari ou Haru na sala. Nenhum dos dois estava lá. Ouviu um barulho, teve certeza, portanto, de que não estava sozinha em casa.

Mari, muito tensa, saiu da cozinha e, pisando em ovos, disse:

 — Kin, eu soube do Arashi e ainda não consigo acreditar...

Então aconteceu mesmo, alguma parte de Kin ainda estava presa à esperança de que tudo aquilo foi apenas um sonho, uma peça que sua sádica mente lhe pregou. 

— Que horas são? — Perguntou, olhando em volta em busca de algum relógio. Perdeu completamente a noção do tempo, para piorar as janelas da sala estavam cobertas por cortinas.

— Quatro e treze da tarde. Ligaram pra cá dizendo que o levaram para a décima quinta, quer que eu vá com você? 

Kin pegou a jaqueta em cima do braço do sofá, jogou nas costas e a aconselhou:

— Não, as coisas não estão boas aí fora, fique aqui dentro e não saia até eu voltar. Cadê o Haru?

— Foi treinar fora, disse que às seis estaria em casa. 

— Quando ele chegar, diga que eu pedi pra ele também não sair. — Pediu Kin, dirigindo-se à porta. 

— O que está acontecendo?

— É o que eu vou descobrir. — Asseverou, bateu a porta e saiu.  

As prisões do Reino de Órion eram as mais vazias do planeta, a taxa de criminalidade ali sempre foi extremamente baixa, de modo que se algum roubo, assalto ou assassinato acontecia, a nação inteira ficava sabendo e fazia disso o assunto da década. Sob o governo de Hayate, Órion, que já era um bom lugar antes de ele assumir o posto, se tornou um dos reinos mais desenvolvidos da Terra. 

A décima quinta era uma das penitenciárias sob a jurisdição de Kazu. Por ter sido preso apenas preventivamente, Arashi estava livre dos interrogatórios e das torturas a que eram submetidos os criminosos assim que eles chegavam ali e foi colocado numa ala especial, isolada dos meliantes que receberam sentença definitiva. A notícia de que um retalhador de elite foi preso, algo inédito na história do Reino de Órion, permanecia um segredo, Hayate sabia o escândalo que isso geraria e pediu sigilo até a sentença final ser promulgada.

Arashi estava sentado no banco de sua cela. Em seu rosto não havia sinal de arrependimento, de remorso ou de tristeza, havia, pelo contrário, a impassibilidade que lhe era típica nas horas mais difíceis. Seus olhos pairavam em algum ponto fixo da parede cinza do outro lado das grades, sua mente estava viajando, foi para muito além daquele pequeno cubículo fechado, mas ninguém saberia dizer que pensamentos enchiam sua cabeça naquele momento.

Kin apareceu e seu coração acelerou, seu peito explodiu de calor, a coisa mais difícil do seu dia foi esconder esses sentimentos. 

— Vai me contar o que está acontecendo? — Ela, num tom baixo e delicado, perguntou. 

— É o que você vê. — Ele friamente lhe respondeu, chacoalhando as mãos e exibindo as algemas especiais que acorrentavam seus pulsos, criadas para inibir os poderes dos retalhadores. 

— Arashi, eu não consigo nem contar quantas vezes te vi sacrificar a vida por esse reino. Você foi do círculo de confiança da minha mãe e, quando se tratava de trabalho, ela nunca errava sobre as pessoas em quem confiava. 

Sabia de antemão que não conseguiria enganá-la quando propôs esse plano, mas esperava que ela demorasse um pouco mais para sacar tudo por causa da privação de sono. Não adiantava nada continuar com aquele teatrinho para ela.

Arashi saiu do banco, se aproximou das grades, apoiou a testa numa das frestas e sussurrou:

— Eu não posso te contar nada agora, pra tudo correr bem você tem que continuar sem saber nada. Você mais do que todos.

— Tudo bem. — Aceitou, encostando a testa no nariz dele. Só o que queria era ouvi-lo admitir, como fez agora, que sua prisão era parte de uma armação, de um plano bem elaborado com algum propósito para o bem do reino. Lembrou que tinha algo para dizer a ele: — E eu também te amo. Sou apaixonada por você desde que me entendo por gente. 

Ele levou a mão ao rosto dela e a beijou, ela, sem hesitar por um segundo, carinhosamente pôs a mão sobre a dele e retribuiu. Ansiou por aquele momento por tantos anos que já nem se recordava mais de quando exatamente começou a gostar dele, mas isso era o de menos, mero detalhe. Só o que tinha que fazer era aproveitar aqueles dois incríveis e eternos minutos, a realização de seus sonhos. 

Um forte tremor os interrompeu, eles trocaram olhares.

— Vai. — Disse. — Estão precisando de você lá fora. 

— Você vai ficar bem aqui, né? — Kin se preocupava porque sabia da reputação da décima quinta, sua fama era a de oferecer o tratamento mais cruel do reino aos presidiários. 

— Vou, tô em prisão preventiva, ninguém pode relar a mão em mim. Vai.

Ela assentiu e foi. Arashi tinha medo de ter estragado tudo com o pouco que admitiu para Kin, mas não era culpa sua se não conseguia enganá-la. Além de ser uma garota esperta, Kin o conhecia melhor do que qualquer um, quase tão bem quanto ele mesmo, no fim era inevitável que ela percebesse tudo sem que ele dissesse uma só palavra.

O próximo a vir foi Kazu. O velho diretor chegou na cela dele com as mãos nas costas e um semblante profundamente sério, que logo se desmanchou em uma cínica expressão de preocupação. Arashi, inexpressivo, olhou fundo nos dissimulados olhos castanhos dele, como que o desafiando. Era uma das poucas pessoas no planeta capazes de encará-lo sem desviar o olhar.

Kazu era uma parte da vida de Arashi que ele nunca compartilhou com Kin. O diretor o acolheu quando Santsuki destruiu o vilarejo e matou sua família, longe de ser por bondade, o que ele queria era um espião, uma ferramenta, e com esse propósito o treinou. Arashi imediatamente o entregou para Yume, mas a falecida primeira ministra lhe orientou que agisse como um agente duplo e, de lá para cá, vem frustrando os planos dele com a ajuda de Hayate e Hanzuki.

Mas o dia do fim da farsa dele havia chegado, estavam prestes a pôr um ponto final em seus desvarios. O medo de ele descobrir tudo, no entanto, era grande e tinha fundamento, Kazu era um homem esperto e tinha seus contatos por todo o reino, aquela era uma operação arriscada que mudaria a nação de Órion para sempre. 

— Estamos com sérios problemas, sua namorada matou a Minerva. — Contou Kazu. Aconselhou Hayate a deixar Kin ir para as ruas mesmo cansada porque não esperava que ela ainda tivesse tanta força, tinha certeza de que, nas condições em que estava, os assassinos que contratou dariam cabo dela.

No fundo, Arashi ficou orgulhoso. Foi muito difícil esconder.

— Mas precisa dos quatro para o plano caminhar. O que pensa em fazer? — Fingiu preocupação. 

— Preciso dos poderes das quatro estações. Por sorte, a que morreu foi a representante do inverno. — Retrucou Kazu, permitindo que Arashi deduzisse por si mesmo onde ele queria chegar. — Eu falei com os outros três e parece que a morte da amiga os deixou mais determinados a levarem o plano até o fim. Vão te receber no grupo deles de braços abertos. 

 — Eu estou sob vigia, Hayate vai descobrir sobre você se me tirar daqui antes de concretizar o objetivo e nós vamos ter mais problemas ainda. — Argumentou. 

O velho sorriu e se aproximou das grades.

— É um pouco tarde para se preocupar com ele descobrir sobre mim, não? Pode parar com o fingimento, eu sei que você trabalhou com eles por todos esses anos, Arashi. — Admitiu, em tom de sussurro. — Demorei mais do que eu gostaria de admitir, mas descobri. Você é um garoto muito inteligente, um espião brilhante. 

— Então o que te faz pensar que eu vou ajudá-lo...?! — Arashi, pela primeira vez em toda a sua vida, foi franco com ele.

Kazu lhe virou as costas e respondeu:

— Talvez uma linda garotinha que, por todos esses anos, você fez de tudo para manter afastada do Reino de Órion e de tudo o que tem a ver com retalhadores, como é mesmo o nome dela? Ah, é, Shiori

Ao ouvi-lo dizer o nome dela, Arashi esmurrou as grades. Nunca sentiu tanto ódio de alguém.

— Se encostar um só dedo nela, eu acabo com a sua raça! — Ameaçou.

— Seria interessante ver você tentar, mas acho que não vai fazer isso. — Replicou, desdenhando dele. — Se não fizer o que eu mandei ou se o Hayate descobrir antes da hora que eu sei do seu teatrinho, sua irmãzinha vai morrer. Se o plano falhar, ela vai morrer também. Estamos entendidos?

Sem esperanças, Arashi abaixou a cabeça e se rendeu a ele:

— Como espera que eu saia daqui?  

— Essa parte não é tão difícil, seus três novos amigos estão vindo pra cá. Boa sorte. — Desejou, virou as costas e saiu andando. 

Arashi não sabia o que fazer. A realização do plano daquele desgraçado significava a destruição do Reino de Órion e a morte de todos os seus amigos, a falha, por outro lado, a morte de seu último laço sanguíneo vivo, sua irmã. Descontou parte da raiva apertando as grades até seus braços ficarem vermelhos. O que eu faço? O que eu faço? Repetidamente se questionava, cerrando os dentes com força. O que eu faço? Deu com a testa nas grades. Pela primeira vez na vida perdeu o controle sobre as próprias emoções.

Na rua, Kenichi esbarrou com a adorável representante da primavera no grupo das quatro estações, Himiko, e os dois começaram uma luta que se estendia já há vários minutos. Himiko falava como uma criança, ria como uma criança e se vestia como uma criança, mas não lutava igual a uma: era bruta, impiedosa e inteligente, qualidades que o macacão rosa, as sapatilhas, os olhos castanhos inocentes e o coque escondiam muito bem. 

O retalhador de elite, diferente dos guerreiros com os quais Himiko costumava se defrontar, não pensou nem por um segundo em pegar leve com ela, ao contrário, empunhava seu montante contra ela como se enfrentasse o mais tenebroso e asqueroso dos monstros. No entanto, estava na defensiva e, por mais que tentasse uma ofensiva, não saía de lá. Himiko tinha o poder de dar vida às coisas, de animar e escravizar seres inanimados, tais como rochas e até casas, portanto antes de chegar a ela precisava destruir tudo o que se interpusesse em seu caminho. 

Perdeu as contas de quantos golens destroçou com sua espada gigante. Por conta disso, mais por culpa dela, a rua que lhes serviu como campo de batalha estava toda esburacada, lotada de escombros e as casas ao redor, destruídas, Kenichi neutralizou Himiko para que os moradores pudessem fugir. Seus braços estavam doendo, ele sabia que já havia passado da hora de acabar com aquilo.

— Vamos, isso é tudo o que você sabe fazer, retalhador de elite? A essa altura já deve ter percebido que combate corpo a corpo não funciona comigo! — Himiko, dez metros atrás de três feras de pedra, gritou para ele em provocação. 

— Cale-se! Não se atreva a fazer pouco de mim! — Kenichi, como de costume, respondeu emotivamente. Havia, sim, algo que ele podia fazer, mas não era fã de combates em que se usavam os poderes da essência, sempre evitava usar a sua, gostava do bom e velho mano a mano.

Mas não havia outra saída, já perdeu tempo demais ali e, numa batalha, tempo era ouro. Encheu seu montante de energia, cravou os pés na terra, contou os golens, fixou os olhos na adversária e partiu para cima dela. As criaturas previsivelmente tomaram a frente de Himiko, Kenichi movimentou a espada e nesse gesto, sem que a lâmina precisasse tocá-las, as explodiu em milhares de pedaços. 

Caminho livre, pensou, esticando para trás os braços e a espada o máximo possível para que seu corte fosse decisivamente fatal, no entanto não conseguiu finalizar o golpe: uma muralha de gelo se ergueu entre sua arma e a garota e salvou a vida dela, seu montante voou longe durante o impacto. Arashi aterrissou na arena, tocou seu ombro esquerdo e lhe deu uma joelhada na testa, arremessando-o para metros e mais metros de distância de Himiko. 

Desgraçado, mentalmente o xingou e sentou-se com a testa avermelhada por causa da porrada. Os encarou, frustrado. 

— Temos que ir, Heiran e Kamino precisam de nós. — Ouviu Arashi dizer para ela.

Himiko bateu os pés e protestou:

— Ah, mas estava tão divertido!

Arashi, um ano mais novo que ela, retrucou como um adulto:

— Ele estava prestes a te matar. 

— Não diga isso para os outros! — Himiko ordenou. 

Eles trocaram mais algumas falas e se foram. O repentino golpe de Arashi foi rápido mas o pegou de jeito, estava doendo tanto que Kenichi mal conseguia se levantar, então ele deitou de costas no chão. Filho da mãe, o maldizia, vendo tudo girar. Vai me pagar por isso, foi então que pôs a mão no peito e sentiu algo. Havia uma carta debaixo de sua camisa. Foi naquele momento, deduziu, lembrando do instante que Arashi pôs a mão sobre seu ombro. 

Um endereço estava escrito na carta junto com uma referência a uma antiga lenda sobre o mundo subterrâneo do Reino de Órion, que segundo se contava era habitado por Hoderi, um gigante assustador. Era uma das muitas histórias que se contava sobre a infância de Azin, segundo relatos ele, com muita dificuldade, matou a fera e a enterrou ali, mas existia um jeito de trazê-la de volta a vida: com a reunião das essências das quatro estações. 

É claro, tudo fazia sentido. Kenichi esqueceu a dor completamente, levantou, chamou Hayate pelo comunicador e disse:

— Preciso contar uma coisa, é urgente!

 Kenichi revelou para Hayate tudo o que sabia e o primeiro ministro, junto com Kin, foi direto para o endereço: uma série de coordenadas que deram em uma sala escura cem metros abaixo da superfície. Ao chegarem lá os dois encontraram com Kazu, que sozinho, de braços cruzados e sorriso no rosto admirava, na parede, uma pintura iluminada por uma tocha acesa. Ninguém sabia dizer que pensamentos passavam por sua cabeça. 

 Não havia móveis naquela sala. Não havia baús, talismãs, armas, nada, apenas quatro lisas e cinzas paredes, por isso nem Kin e nem o ministro sabiam o que Kazu queria ali, mas não tinham mais que saber disso, pois o pegaram. Era o fim da linha para ele — ao menos era no que acreditavam, mas até essa crença foi abalada pelo sorriso confiante que o bandido tinha nos lábios. 

Hayate se culpava pelos transtornos que Arashi viveu, se tivesse agido antes talvez tivesse dado a ele uma nova chance de uma infância normal. Errou em ter ouvido Hizashi. Devia ter confrontado aquele infeliz na hora que soube, tê-lo enviado para a cadeia em prisão perpétua, mas o próprio Arashi argumentou persuasivamente em favor de manter a farsa. 

— Acabou, Kazu. — Anunciou Hayate, andando a vagarosos passos até ele. 

— Aquele pirralho ingrato me entregou, não foi? Ah, não faz mal. A irmãzinha dele vai pagar bem caro. — Deu de ombros, tocou o interruptor do braço e entrou em contato com os retalhadores que colocou no encalço de Shiori: — Matem a menina. 

— "Lamento te desapontar, mas não vai ser possível." — A voz que respondeu não pertencia aos assassinos, mas a Arashi. — "As coisas estão feias por aqui."

Kin andou dois passos na direção dele, materializou uma espada dourada na mão direita e o ameaçou: 

— Vai vir conosco por bem ou por mal? 

Um rugido assustador e poderoso sacudiu o reino inteiro. Tarde demais, Hayate, muito tenso, concluiu. Hoderi estava a solta novamente. Tinha apenas quatro anos de idade quando aconteceu, mas lembrava-se com pavor da última vez que aquela fera viu a luz do dia. Milhares de pessoas morreram antes de Azin, com doze anos, derrotá-la.

Kin, como se fosse seu dever lidar com aquele bicho, pediu:

— Deixa aquela coisa comigo, cuida dele! 

— Não! Kin! Kin! — Protestava em vão o primeiro ministro, pois a loira voou e arrebentou todas as camadas de terra sobre suas cabeças para retornar à superfície. 

Kazu se aproveitou de sua distração e, graças a uma esquiva reflexiva, o apunhalou um pouco abaixo do tórax. Hayate segurou seu braço, deu dois socos em sua cara, removeu a faca do corpo, a partiu em duas e estalou o pescoço, pronto para a briga. Tem algum tempo que eu não faço isso, pensou, um tanto quanto entusiasmado, só não posso demorar, tenho que ir ajudar a Kin.

A criatura tinha cento e vinte metros de altura, era magra, cinza, tinha a pele seca, três olhos, nenhum nariz, uma grande boca aberta, estava nua mas não tinha genitália. Além disso, era muito, muito forte. Seus pés esmagavam as montanhas, seus gritos faziam o planeta tremer e os seus socos eram capazes de destruir um país inteiro. Vários retalhadores tentaram detê-la, mas todos, um a um, estavam morrendo. 

Kin mandou avisar que não queria mais ninguém por perto, que dali em diante ela era problema somente seu, então todos se afastaram. Ela abriu as asas, concentrou no punho direito toda a força que tinha, voou com o máximo de velocidade que conseguia até o rosto da besta e a esmurrou no queixo, fazendo-a subir. O monstro, porém, deu uma mãozada em Kin, mas alguém chegou, a segurou e a salvou de uma colisão violenta com o solo.

Haru, Kin percebeu, depois de abrir os olhos. Seu irmão, sorridente, a soltou após vê-la acordada. 

— O que está fazendo aqui?! — O indagou, em tom de repreensão. 

— Nem adianta me mandar pra casa, vamos enfrentar essa coisa juntos! 

Kin sabia que tentar convencê-lo a voltar era perda de tempo e não tinha tempo a perder, cada segundo com aquele demônio vivo podia significar a morte de centenas de milhares de pessoas. Combinaram juntos um ataque sincronizado de acordo com o qual Kin atacou o gigante primeiro, com um cruzado de direita, Haru veio depois, segurou o punho do grandalhão quando ele tentou acertá-la e o arrastou para cima. O objetivo era mantê-lo no ar para que seus pés parassem de destruir o reino. 

A retalhadora de elite socou o gigante no estômago, Haru o chutou na cara e o monstro, enfurecido, urrou com tanta força que as ondas sonoras mandaram o casal de irmãos de volta para o solo. Os dois caíram num gramado, bem próximos um do outro, Kin, que se recuperou mais rápido, foi verificar se seu irmão estava bem e lhe cedeu a mão, ajudou-o a ficar de pé. Haru não lhe pareceu bem. 

— Como vamos vencê-la? — O garoto perguntou, sacudindo as calças e a camisa preta sem mangas sujas com seu próprio sangue. 

— Você vai voltar pra casa! Isso é trabalho meu! — Foi a resposta de Kin. 

Haru disse como se sentia:

— Nem vem! Já tô cansado de ficar escondido em momentos como esse, você era mais nova do que eu quando passou por cima de uma ordem da mamãe pela primeira vez e foi lutar! 

É, não tem jeito mesmo, concluiu, suspirando contrariada. Olhou para Hoderi, que ainda flutuava. Tinha um plano, o problema era que ele poria a vida de seu irmão em risco. Contudo, como pensou, não tinha jeito mesmo: era arriscar tudo agora ou vê-lo impulsivamente atacar Hoderi para provar seu valor e morrer.

Se calibrasse quantidade suficiente de energia, um disparo de luz seu poderia desintegrar completamente aquela coisa. Porém, não podia errar e, para ter certeza de que acertaria, precisava de uma distração. Era aí que, por mais relutante que estivesse, entrava Haru. Hoderi os atacou com um soco, os errou, Kin rapidamente segurou seu punho, não permitiu que ele atingisse a terra. 

Haru voou até o rosto dele, o esmurrou na testa com um soco usando ambos os punhos, o carregou para as alturas e voou em torno dele para distraí-lo. Kin entendeu aquilo como a deixa, apontou as mãos para Hoderi, as recheou com energia, se preparou para efetuar o disparo mas, quando estava a meio segundo de fazê-lo, Hoderi enlaçou seu irmão com fios que tirou do próprio corpo e o agarrou com as mãos. 

Droga, praguejou, mas quando ia desistir da energia que juntou para ir até lá ajudá-lo, um imenso disco de energia rosa fatiou o braço de Hoderi. Emi, Kin deduziu na hora a responsável pela técnica, sorriu e atirou contra a cabeça de Hoderi, explodindo-a por completo e matando-o instantaneamente.

Um novo problema apareceu: a gigantesca parte inferior do corpo de Hoderi estava para despencar, o que provocaria destruição e muitas mortes por toda a parte. Kin, nas condições em que estava, não conseguiria chegar lá a tempo nem com toda a força de vontade do mundo — e não precisou, Arashi chegou a tempo, impediu a queda com as próprias mãos e se redimiu por ter ajudado na ressurreição do monstro. 

— Tsc! Derrotados por essas crianças... — Kazu disse para Hayate, rindo da própria desgraça. Os dois se enfrentavam numa estrada abandonada a cerca de cinco quilômetros do local do confronto com Hoderi. — Bem, essa é a minha deixa.

— Vai fugir feito um covarde? Nunca pensei que você fosse assim. 

— Não estou fugindo, estou dando por adiado o nosso confronto. Isso ainda está longe de terminar. — Avisou, dando-lhe as costas.

Hayate moveu as mãos como um titereiro com as cordas nos dedos e bradou:

— E acha que eu simplesmente vou deixar você escapar depois de tudo?!

A magnífica Essência das Cordas, pensou Kazu, abismado. Seu corpo fora paralisado dos pés a cabeça. Segundo se contava, Hayate, vibrando aquelas coisas, podia reduzir qualquer corpo a partículas subatômicas e materializar qualquer objeto que quisesse. Fascinante, sorriu impressionado. Mas você não é o único com um ás na manga, pensou, segundos antes de provocar uma explosão da qual, para escapar, Hayate foi forçado a libertá-lo e se afastar dali o mais que pudesse. 

 O poder da detonação cobriu uma vasta área, seu brilho verde azulado envolveu todo o Reino de Órion, cegou momentaneamente os retalhadores de elite contra os quais os três membros remanescentes do grupo das estações lutava e lhes deu tempo para fugir também. Gray, Mahina e Shin, que os enfrentava, nada entenderam quando recuperaram a visão e se deram conta de que seus oponentes haviam sumido. Acho que vencemos, inferiu Mahina, confusa. 

Na mesma noite, as acusações contra Arashi foram todas retiradas e Kazu foi declarado o verdadeiro criminoso, um de altíssima periculosidade, mundialmente procurado. Graças ao trabalho em equipe dos retalhadores nenhum inocente morreu, Haru e Kin, dois dos poucos que foram parar num hospital, saíram de lá poucas horas após. Muita gente ficou desabrigada, mas Hayate agiu para ajudá-los.

 No dia seguinte Kin acordou muito cedo, pois alguém tinha uma promessa a cumprir para ela. Pôs a camisa branca da equipe de elite, a saia preta, as botas negras, fez um coque nos cabelos loiros enrolados e passou um batom rosado nos lábios. Deu uma última olhada no espelho e desceu as escadas correndo, não queria esbarrar com Mari no meio do caminho e ter que dizer onde estava indo "tão produzida".

— Não vai nem tomar café? — A morena gritou, da cozinha. Por momentos como esse às vezes Kin achava que, todo esse tempo, ela era uma retalhadora disfarçada. 

— Não, tô atrasada! — Kin gritou de volta, depois correu para atender a porta. Era Arashi, e seu coração quase pulou do peito quando ela o viu. — Oi!

— Oi — Ele a cumprimentou, sorridente. — Lamento informar, mas te fiz acordar cedo atoa, a Shiori só vai estar na lanchonete daqui a três horas...

— Tudo bem, nós-

— Já tá tudo pronto, convida o Arashi pra comer também! — Mari a interrompeu. — Depois vocês continuam o encontro, é bom que não precisarão gastar dinheiro com comida!

— Como é que ela sabe-

— Eu tenho minhas teorias. — Kin não precisou ouvir a pergunta inteira, sabia exatamente o que ele ia dizer. — Entra aí, temos três horas disponíveis! Me conta da Shiori. 

Arashi estava pensando em trazê-la para o reino, queria ela morando perto para protegê-la e não expô-la aos riscos do dia anterior. Shiori era uma garota esperta e corajosa, a ideia de isolá-la dos retalhadores e de tudo o que tinha a ver com eles não partiu dela mas, para não voltar a incorrer no erro de decidir a vida dela sem falar com ela, os dois conversariam. Aliás, com Kazu a solta, não havia melhor hora para mantê-la próxima.

Fim. 


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