A chuva molha as roupas da aluna, que sobe a grade e salta para a beirada do telhado dos dormitórios da escola. E então, barulho de passos se aproxima e ela se vira, vendo Yuuri Katsuki se aproximando, usando uma larga camiseta e uma calça de pano pretas, pés descalços, cabelos bagunçados e sem seus óculos.

"O que pensa que está fazendo?" Ela pergunta, o vendo subir a grade e se juntar a ela.

Yuuri Katsuki a olha tristemente, fala algo para ela, mas não adianta. A garota larga a grade e se joga do telhado. E Yuuri só é capaz de ficar ali, chocado por não ter conseguido ajudar a garota...

~x~

O dia está se aproximando. 

Yuuko Toyomura olha para o calendário em sua escrivaninha, onde daqui a 3 dias está marcado com uma caneta vermelha. Uma lágrima escorre no rosto dela, quando ela se lembra do que aconteceu no ano passado, de como sua melhor amiga Chihoko se tremia ao tentar contar as brutalidades que sofreu por causa do namorado.

Namorado esse que foi ela quem apresentou. Que foi ela quem insistiu para Chihoko se declarar após a ouvir dizendo que gosta dele. Que foi ela quem os seguiu em um encontro onde ele a levou até uma praia e andou com ela de mãos dadas pelo mar, a vendo sorrir enquanto cantarola sua música favorita para ele, que a beija ao lado de um velho armazém. Que foi ela quem sugeriu deixar os dois sozinhos logo depois e decidiu voltar para os dormitórios, pegando um táxi e enfrentando um engarrafamento enquanto sua amiga estava sendo violentada pelo namorado. 

E Yuuko não havia entendido o que havia acontecido, afinal as coisas estavam indo tão bem entre eles. Mas quando ela viu as fotos do que aconteceu na internet, já era tarde demais.

Na tarde chuvosa do seu aniversário de 15 anos, Chihoko Nakamura pulou do telhado dos dormitórios da Academia Clockstrings, não sobrevivendo ao impacto. E Yuuko, covarde que é, escolheu esperar um ano. Um ano enfrentando lágrimas, solidão, dor e saudade. Mesmos quando o envolvido tenha misteriosamente confessado o crime para a polícia após ser agredido por alguém violentamente, ela escolheu esperar um ano para poder pagar pelos seus erros.

E o constante desejo de voltar no tempo e viver os bons momentos novamente. De poder consertar tudo o que fez. 

~x~

"Nikiforov." Ele escuta a Vice-Diretora o chamar e se aproxima dela. "Fiquei sabendo que você está ciente sobre 'ele'."

"Sim." Victor responde, já entendendo o que ela estava falando.

"Entendo. Então só me resta dizer uma coisa." Ela diz, o olhando friamente. "Mantenha seus olhos nele. Por favor. Do mesmo modo que ele é egoísta o suficiente para se preocupar com os outros, ele é ignorante quando se trata de si mesmo e se recusa a aceitar a ajuda dos outros."

Victor se surpreende com o que escuta, franzindo a testa.

"Eu farei o possível para mantê-lo em meu campo de visão." Ele responde, recebendo apenas um aceno dela.

~x~

"Socorro! Yuuko está planejando se matar!"

Yuuri, que estava dormindo na aula de matemática, acorda e rapidamente se levanta da cadeira e sai da sala de aula, ignorando o olhar de irritação de Mari a respeito disso. Ele está sendo seguido pelo espírito de uma aluna que se suicidou no ano passado. 

"Chihoko, o que eu posso dizer a ela?" Ele pergunta, parando de andar ao olhar a porta fechada da sala de aula de artes.

Devo pedir ajuda?

Não. Ele não merece se envolver nos meus assuntos. E provavelmente ele deve estar ocupado.

Ele corre em direção aos dormitórios, torcendo para que consiga chegar a tempo e escutando o que o espírito diz.

"Você pode dizer para ela..."

...

A ventania agita as roupas do fardamento da aluna, que sobe a grade e salta para a beirada do telhado dos dormitórios da escola. Então, barulho de passos se aproxima e ela se vira, vendo Yuuri Katsuki se aproximando ofegante e suado, com o seu uniforme escolar amassado e molhado em seu corpo, cabelos bagunçados e sem seus óculos.

"O que pensa que está fazendo?" Ela pergunta, o vendo subir a grade e se juntar a ela.

Yuuri Katsuki a olha tristemente, fala algo para ela antes de olhar para baixo, abrir um sorriso, largar a grade e se jogar do telhado. Apavorada, ela grita, e inconscientemente, se vê do outro lado da cerca, confusa e chorando muito.

~x~

"Se você acha que está tudo bem em acabar com sua vida, ninguém tem o direito de te impedir. Mas tenho certeza de que não é isso que Nakamura Chihoko queria que acontecesse com você. Viva não só por você, mas por ela também. Seja feliz, construa seu próprio futuro e acredite em si mesma. Volte para o outro lado da cerca e se esqueça de mim e da minha voz."

~x~

Não era isso que Victor esperava ao retornar da loja de conveniência. Uma estudante no telhado dos dormitórios, pronta para se suicidar. E quando Yuuri Katsuki se junta a ela, as coisas apenas pioraram.

"O que diabos ele pensa está fazendo?" Victor pergunta, franzindo a testa.

Ele logo se aproxima de onde ele pode cair e percebe que Yuuri havia lhe notado. De repente, ele se joga do telhado e tenta agarrar as grades das varandas, com dificuldade, mas o suficiente para não o fazer cair de vez no chão depois de pular de um prédio de 6 andares. Quando Yuuri abre os olhos, a primeira coisa que ele percebe são um belo par de olhos azuis. 

Victor, ao ter Yuuri Katsuki em seus braços, percebe que ele está se tremendo e possui machucados nas mãos e nos pés. Ele também nota que partes das roupas dele estão rasgadas e deduz que ele deve ter ainda mais escondido no corpo. Quando ele fita os gentis e calorosos olhos castanhos dele, e percebe que ele agarra sua camisa com dificuldade, algo dentro de si o faz desejar proteger com sua própria vida.

É certo estar querendo desejar isso?

É errado estar querendo desejar isso?

"Nakamura Yuuko. Ela ainda deve estar no telhado. Mari é responsável por ela. Você pode me deixar por aqui mesmo. Vá até a menina. Ela precisa de ajuda." Yuuri diz e Victor franze a testa ao notar o modo como ele fala.

Minutos depois, Victor percebe que Yuuri está dormindo em seus braços. Ele solta um suspiro e entra no prédio dos dormitórios, ainda o carregando.

~x~ 

Yuuri acorda em um quarto que parece com o seu, mas apesar de estar sem seus óculos, ele nota que a decoração é diferente. Ele se vê usando só a calça, e diversas ataduras em seus braços, mãos, ombros e pés. Ele nota o espírito de Chihoko Nakamura o olhando com preocupação.

"Onde estou?" Ele pergunta, se levantando da cama e notando estar sozinho em um quarto.

"O professor russo bonitão te trouxe até aqui, no quarto dele e cuidou dos seus machucados. Ele ligou para a professora Katsuki e explicou tudo para ela. Yuuko está com a professora agora, não se preocupe. Ele precisou ir dar aulas, mas disse para ninguém para ficar de olho em você, o que me deixou surpresa." Ela fala e ele abre um leve sorriso.

"Hoje não é só o dia de sua morte, não é?" Yuuri pergunta, inclinando o rosto para ela. 

"Hoje é meu aniversário. Eu estava comemorando com ele, mas então o estupro aconteceu e como o senhor sabe, ele divulgou as fotos na internet. Muito obrigada, novamente, por ter me defendido e cuidado de tudo ao meu respeito. E não ache que você tem culpa por ter chegado tarde demais. A culpa foi minha por não ter aceitado sua ajuda e te fazer me ver saltando do prédio." Ela diz, derramando lágrimas. "Além disso, você me permitiu vigiar Yuuko, e pude perceber que ela planejava se matar hoje da mesma forma. Mas agora que ela desistiu, eu estou pronta para ir."

"Muito bem." Yuuri sorri, estendendo a mão para ela, que a segura. "Bons Espíritos, cuja missão é assistir os infelizes, tomai-a sob a vossa proteção; inspirai-lhe o remorso pelo erro cometido, e que a vossa assistência lhe dê a força de enfrentar com mais resignação às novas provas que terá de sofrer, para repará-lo. Afastai dela os maus Espíritos, que poderiam levá-lo novamente ao mal, prolongando os seus sofrimentos, ao fazê-la perder o fruto das novas experiências. E a ti, cuja desgraça provoca as nossas preces, que possa a nossa comiseração adoçar a tua amargura, fazendo nascer em teu coração a esperança de um futuro melhor!"

Ele sente a ventania surgir e raios de luz caem do teto, a envolvendo em um brilho gentil. Logo, um espírito superior surge e acolhe a alma da ex-aluna em seus braços, como se ela fosse uma criança. Ele se curva para Yuuri e logo ambos desaparecem, deixando Yuuri ali, sozinho. 

"Eu estou bem." Ele diz, sentindo a dor dos machucados sumirem. 

Ele olha para os braços, se perguntando se deveria retirar aquelas ataduras. Mordendo o lábio inferior, ele decide que não e se levanta da cama, a ajeitando. Ele sorri ao ver um prato com sanduíche e suco na mesa e, agradecendo pela comida, come tudo. De volta para o quarto, ele toma um banho e se prepara para um novo dia de trabalho.