Encantos & Desencontros escrita por Maitê Miasi


Capítulo 27
Capítulo 27




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“Quando a gente gosta
É claro que a gente cuida
Fala que me ama
Só que é da boca pra fora
Ou você me engana
Ou não está madura
Onde está você agora?”


Caetano Veloso – Sozinho

****

Giovana, que estava na cozinha, voltava tranquila para o cômodo com um copo de suco na mão, mesmo ouvindo tamanha gritaria, afinal, sabia que não sairia boa coisa tendo mãe e tia no mesmo ambiente. Porém a menina de desesperou ao ver o que a tia acabara de fazer. Num instante, o copo que estava em sua mão foi ao chão, e se fez em mil pedaços. Logo, ela correu até a mãe e tentou fazê-la voltar, mas foi em vão, Maria nem ao menos se mexeu.

— Mãe, por favor, acorda!

Em meios as lágrimas, ela suplicava para que a mãe desse sinal de vida, e seu coração se apertava ainda mais quando percebia que a mesma nem se movia.

— Alguém chama uma ambulância, pelo amor de Deus! – Gritou para ninguém em especial, mas alguns empregados que ouviram o barulho da queda também se faziam presentes no cômodo, logo se moveram, e foram pedir ajuda. – A culpa é sua, eu sei disso, você empurrou minha mãe da escada! – Ainda ajoelhada do lado da mãe, Giovana gritou para a tia que observava tudo do topo da escada.

— Você enlouqueceu, garota? Eu não fiz nada, sua mãe caiu sozinha. – Fabíola começou a descer a escada, e sem que a sobrinha a impedisse, saiu da mansão, fugindo da cena.

— Será que vocês vão deixar minha mãe morrer aqui, cadê essa ambulância que não chega?

— Calma Giovana, já ligaram pra ambulância, daqui a pouco eles estão aí. – Lourdes, uma das empregadas da casa, tocou em seu ombro, com paciência e ternura. – Sua mãe vai sair dessa bem, ela é forte.

— Ela tem que sair, eu não vou aceitar se acontecer alguma coisa com ela.

Em poucos minutos se ouvia o barulho das sirenes da ambulância. Os profissionais agiram com rapidez, a imobilizaram e partiram rumo ao hospital mais próximo. Giovana acompanhou a mãe, ainda preocupada, já que não sabia o estado em que se encontrava. Durante o caminho, fez algumas ligações rápidas, informando o acontecido.

O percurso até o hospital foi rápido, já que a ambulância fora abrindo passagem entre os carros, e logo estavam no estabelecimento. Giovana tentou seguir os médicos que levavam sua mãe na maca, mas fora impedida, e contra sua vontade, ficou aguardando na sala de espera.

Em menos de quinze minutos o pai e a irmã chegaram, encontrando-a segurando o choro, tentando ser forte, porém, quando avistou os dois, ela se jogou nos seus braços em prantos. Cláudio e Juliana foram receptivos a atitude da menina.

— Pai, a minha mãe... – Disse em lágrimas, com o rosto enterrado no peito do pai.

— O que foi que houve, Giovana? – Juliana perguntou. Sua voz havia desespero, faltava pouco para que ela também começasse a chorar.

— Giovana – Cláudio segurou seu rosto, e a olhou dentro dos olhos encharcados – se acalme, e nos conte o que houve. – Apesar de transmitir segurança, se via que ele também estava à beira do desespero.

— É tudo culpa dela! – Giovana falou alto, trazendo algumas atenções para si. – Foi ela, aquela bruxa! – E saindo dos braços do pai e da irmã, passou a andar de um lado a outro.

— Que bruxa, Giovana? – Juliana perguntou, tentando acompanhar os passos da irmã.

— Foi a Fabíola, aquela desgraçada, filha da p...

— Olha a boca! – Cláudio a repreendeu. – O que foi que sua tia fez?

— Eu juro que se acontecer alguma coisa com a minha mãe, eu mato aquela infeliz!

— Fala logo, Giovana! Para de enrolar! – Foi a vez de Juliana atrair as atenções pela forma que falou.

— Minha mãe e aquele ser humano estavam discutindo, e ela acabou empurrando minha mãe da escada, foi isso.

Os olhos de Cláudio e Juliana quase saltaram diante da afirmação. Ambos se mostrarm indignados, com o mesmo sentimento de ódio e repulsa que Giovana, porém, antes que manifestassem a aversão em palavras, Estêvão e Miguel chegaram afoitos ao hospital, com a preocupação estampadas em seus rostos.

— Assim que vi sua mensagem, vim correndo pra cá. – Miguel disse com a respiração ofegante, olhando Giovana. – O que houve? Como ela tá?

— Ela foi jogada da escada lá de casa, mas não sabemos como ela tá, ninguém nos informou nada ainda. – Giovana respondeu a pergunta do irmão irada.

— Como assim, jogada? Que história é essa Giovana? – Estêvão perguntou, sua respiração descompassada informava que ele havia corrido um pouco.

— Como assim? Pergunta pra sua ex mulher desequilibrada, que não aceita ter perdido você pra irmãzinha dela. – Apesar do estado de preocupação rondando, Giovana não perdia a oportunidade de debochar.

— Foi Fabíola? – Miguel Indagou.

— Pelo visto ela não superou ser abandonada, Estêvão. E mais uma vez, uma desgraça chega na nossa casa por sua culpa. – Juliana acusou sem dó.

— Não vou discordar de você, filha. – Cláudio assentiu à acusação da filha, passando seu braço em seu ombro.

— Eu acho que é esse é pior momento e lugar pra lavarmos roupa suja. Nesse momento, Maria tá numa sala, e nenhum de nós sabe o que tá havendo, será que não podemos dar uma trégua? – Miguel usou de sua maturidade; ela viera bem a calhar. Os outros quatro concordaram. – Vamos esquecer as diferenças, as coisas que estão acontecendo, e focar no bem estar dela.

— Miguel tem razão – Estêvão encarou seu rival – é melhor esquecermos as diferenças nesse momento, Maria não iria ficar nada satisfeita sabendo que estamos aqui brigando.

Todos os presentes acataram o pedido de Miguel sobre fazerem um trégua, afinal, aquele não era o melhor momento nem o melhor lugar para discutem o conflito familiar que viviam. Eles estavam ansiosos por um parecer médico, mas aquela espera parecia ser interminável.

O tempo passava como um passo de tartaruga, deixando-os ainda mais tensos. Cláudio se portava como o pai atencioso que sempre fora, e tentava se manter forte diante das gêmeas. Estêvão e Miguel se destacaram dos demais, cada um em um canto, pediam aos céus que trouxesse Maria de volta, sã e salva.

— Familiares de Maria Fernandes? – Um médico, um tanto sério, se aproximou quase quatro horas após a chegada, e ao ouvir o nome de Maria, todos os outros o rodearam.

— Sim doutor, eu sou o marido. – Cláudio fez questão de atestar. Estêvão o olhou de rabo de olho.

— Fala logo como minha mãe tá, doutor! – Giovana praticamente ordenou ao médico.

— Pois bem, o estado de saúde dela é bem delicado. Com a queda, sua esposa teve uma costela quebrada, e por muito pouco, e por terem esperado a emergência chegar sem movê-la, ela não perfurou o pulmão.

— Ah, então não é tão grave assim! – Miguel se pronunciou.

— Não, mas ela também teve um traumatismo cranioencefálico.

— O que é isso? – Juliana perguntou arqueando as sobrancelhas.

— É causado quando uma pessoa bate a cabeça com muita força, que é o caso de Maria. Nós já realizamos a cirurgia, e apesar dos riscos, ela reagiu bem, mas só vamos poder tirar conclusões quando ela acordar.

— E vai demorar muito, quando vai passar o efeito da anestesia? – Foi a vez de Estêvão perguntar.

— Ela pode acordar em algumas horas, ou alguns meses, ou até anos, não podemos afirmar com precisão.

— Eu não tô acreditando nisso. – Cláudio disse com a mão no rosto, decerto, não queria acreditar no diagnóstico.

— E eu sinto informar a vocês que ela poderá ter algumas sequelas, como...

— Deixa doutor, eu explico a eles. Eu sou médico também, e vai ser menos doloroso se eles ouvirem de mim.

— Tudo bem.

— A gente pode ver ela? – Giovana indagou afoita.

— Nesse momento as visitas são restritas.

Assim que o médico virou as costas, as gêmeas se jogaram nós braços do pai, e choraram como crianças. Miguel suspirou com pesar, como médico tinha ciência da gravidade do estado da mãe, e isso o deixava ainda pior, sofrer como inocente era mais fácil.

Estêvão, percebendo que era um intruso no meio deles, se retirou sem que ninguém percebesse, com um único lugar em mente. Ele dirigiu pelas ruas engarrafadas de São Paulo com o coração na apertado por não saber ao certo qual seria o destino de sua amada, e ainda mais apertado pelo modo como levaram a última conversa. Última.

O percurso até sua antiga casa foi um pouco mais longo, devido ao número de carros que estavam na rua naquele horário. Faltou muito pouco para que Estêvão xingasse um ou outro motorista, mas logo se conteve, sua reação negativa não o ajudaria nada. E depois de um pouco de estresse gratuito, por fim, chegou a mansão.

— Fabíola? – Entrou aos berros. – Fabíola, apareça!

Estêvão seguiu para o segundo andar da casa em direção ao quarto da ex esposa, e entrando de supetão, a encontrou fazendo as malas, de certo iria fugir, já que sabia que Giovana não ocultaria os acontecimentos daquele dia.

— Posso saber onde você pensa que vai? – Perguntou ao ver a mala sobre a cama.

— Estêvão? – Deu um pulo com o susto.

— Você acha mesmo que vai fugir depois do que fez? – Sua voz era amena, porém firme. – Acha, Fabíola? – Gritou, jogando a mala para fora cama. Roupas ficaram espalhadas por todo o quarto.

— Eu não sei do que você tá falando. Eu só ia fazer uma viagem, espairecer um pouco.

— Mentira! Você sabe exatamente o que fez. – Ele se aproximou, e a encarou, nos olhos de Fabíola havia medo. – Tá feliz com o estado de Maria? Sua irmã está mal por sua culpa!

— Você quer saber a verdade? Eu tô sim, quer dizer, só podia ser melhor que ela tivesse morrido de uma vez. Eu não aguento mais ter que ouvir o nome dela, tudo é Maria, tudo é pra Maria, chega, já deu!

— Você enlouqueceu? – Pasmou. – Independente do que tá acontecendo, ela é sua irmã!

— Eu tô pouco me importando, e quer saber mais? Por mim podia morrer todos: o corno do Cláudio, as gêmeas insuportáveis, e sobre o seu filhinho? Por mim ele morreria da forma mais cruel e horrenda que existe, eu seria uma pessoa realizada.

— Cala a sua boca! – Gritou mais uma vez, e segurou seu braço com força. Ambos estavam tão perto que dava para um sentir a respiração do outro. Os olhos de Estêvão estavam estavam a ponto de sair fogo. – Não ouse repetir uma coisa dessas, senão...

— Senão o que? – O cortou. – Me mata? – Riu, e se soltando, foi para o meio do quarto. – Você não tem coragem Estêvão! – Cuspiu as palavras bruscamente. – Você é um covarde, não teve coragem de lutar por Maria, de enfrentar tudo e todos, você acha mesmo que me mataria?

— Não duvide de mim, Fabíola.

— Ah, e como duvido. Eu te conheço Estêvão, sei até onde você é capaz de ir, e matar não é uma coisa que você faria, nem mesmo por ela.

— Como eu tive coragem de trocar ela por você. O maior erro da minha vida foi ter me contentado com migalhas.

— Agora eu sou migalhas? Não me surpreendo nem um pouco com isso, mas você parecia bem satisfeito com as migalhas nas diversas que fizemos amor nessa cama. – Apontou.

— Pelo menos isso você sabia fazer direito, mas ainda assim, não conseguiu ser melhor que ela.

— Seu desgraçado, infeliz! – Possessa de ódio, Fabíola se jogou em cima de Estêvão, na intenção de agredi-lo, mas sem dificuldade, ele a segurou pelos braços.

— Entenda uma coisa, Fabíola: você nunca será melhor que ela em nada. – A soltou, e se afastou. – Eu não vou dizer que esses quinze anos foram somente feitos de momentos ruins. Eu até aprendi a gostar, a respeitar você, e queria que o fim desse casamento fosse de uma forma civilizada, mas vendo o que você andou fazendo pra me separar dela, só me leva a ter os piores sentimentos por você.

— Tudo o que eu fiz foi por te amar, Estêvão. – Ela se jogou novamente em seus braços, mas dessa vez chorando, tentando o abraçar.

— Que amor é esse? Que tenta só prejudicar o amado? Eu dispenso. – Ele a afastou de forma brusca.

— Se essa maldita não tivesse voltado para o Brasil, ainda estaríamos bem e felizes! – Vociferou em lágrimas.

— Tá vendo? Suas palavras só me levam a ter desprezo por você, te olhando assim, vejo que é digna de pena.

— Eu não quero isso, quero seu amor, Estêvão. Esquece ela e volta pra mim, eu imploro! – Fabíola se jogou aos seus pés, em prantos.

— Me solta! – Numa sacudela, ele se soltou dela, e ela permaneceu ali, jogada no chão. – Mesmo se você fosse a última mulher do mundo, eu não voltaria com você. A coisa mais sensata que eu fiz nesses últimos tempos, foi me separar de você.

— Estêvão, por favor!

— Reze, mas reze muito pra que Maria sobreviva, porque senão eu mando você pro quinto dos infernos!

Ela a encarou pela última vez, e a deixou largada chorando no chão.

...

O dia já amanhecia, e por mais que os médicos tivesse os aconselhado a irem para casa, eles não arredaram o pé dali, fizeram questão de ficar e esperar por alguma notícia de Maria, porém ela continuava na mesma.

— Ai, eu não aguento mais essas espera! – Giovana se pronunciou.

— Eu também não. Ninguém fala nada, a gente não pode entrar. – Juliana concordou.

— Eles não falam nada porque não tem o que falar. É uma situação delicada, como disseram, e agora só depende da Maria. – Miguel acrescentou.

— Eu daria qualquer coisa pra que ela voltasse bem, até a minha própria vida. – Estêvão disse, melancólico.

— Poupe suas palavras bonitas, Estêvão, elas não vão salvar Maria. – Cláudio comentou.

— Pois é, eu nem sei o que você ainda tá fazendo aqui, você não notou que não é bem vindo? – Juliana acrescentou.

— Por favor gente, se lembram do acordo que fizemos?

— Vocês querem comer alguma coisa? – Giovana perguntou. – Eu vou na lanchonete, meu estômago não para de roncar.

Todos negaram a pergunta da menina, e após obter sua resposta, saiu rumo a lanchonete. Giovana fez seu pedido portando o mais triste dos semblante, e agradeceu em seu íntimo pelo estabelecimento não estar cheio, só assim poderia expressar seus sentimentos sem muitos olhares sobre ela.

— Deixa que o lanche da moça eu pago. – Uma voz surgiu por trás, assustando Giovana.

— Máximo? – Franziu a testa. – Não... Precisa?

— Eu só quero ser gentil. Aceita?

— Tudo bem. – Assim que ele fez o pagamento, os dois se acomodaram numa mesa. – O que você tá fazendo aqui?

— Minha irmã é enfermeira daqui, e esqueceu o celular em casa, aí eu fiz a gentileza de trazer pra ela, como ótimo irmão que sou. – Brincou, mais ao ver o rosto tristonho de  Giovana, pôs-se mais sério. – E você, não tem cara de que tem irmão médico.

— Na verdade, tenho sim – forçou um riso – mas não vim aqui trazer o celular dele não. Minha mãe sofreu um acidente e tá internada.

— Nossa Giovana, eu sinto muito. É grave?

— Parece que sim. Eu não deveria me abrir com você Máximo, porque não vou com a sua cara, mas não tô me importando muito não, mas tô com medo, se acontecer o pior com ela, eu acho que enlouqueço.

— Ei, não fala assim, não pense o pior, seja otimista.

— Eu tento, mas às vezes o medo fala mais alto. A gente tava voltando a se dar bem – sorriu com as lembranças, mas logo o medo voltou a falar mais alto – e agora acontece isso. Eu não sei o que sou capaz de fazer se vir aquela vaca na minha frente.

— Oi?

— É uma longa história. Mas a vaca é a minha tia, uma pessoa desprezível, que eu não suporto.

— Entendi. Sei que não somos muito íntimos, mas se precisar de um ombro amigo, estamos aí. Se quiser desabafar, tô aqui, se quiser aprontar uma com sua tia, tô aqui também. – Brincou.

— Você me deu uma ótima ideia.

— Giovana... Eu tô brincando.

— Ah, mas eu não.

Totalmente diferente de como havia chegado, Giovana saiu da mesa deixando o sanduíche quase intacto, com o sorriso mais perverso que poderia mostrar. Seu acompanhante permaneceu sentado, sem saber o que ela pretenderia fazer, mas sabia que não vinha boa coisa dali.

Bastou apenas algumas ligações e algumas horas para que tudo que estava em mente fosse posto em prática. Giovana não pretendia economizar na maldade, e ia fazer Fabíola provar na pele o quão cruel poderia ser.

— Bom dia! – Com um sorriso aberto, saudou Fabíola e Jacques. Ambos estavam à beira da piscina tomando sol.

— Quem foi que deixou essa louca entrar? – Fabíola se ajeitou na cadeira, e tirando o óculos escuro do rosto, encarou Giovana enraivecida.

— Nossa titia, pensei que fosse um pouco mais hospitaleira.

— Juliana?! – Jacques perguntou, repetindo a ação de Fabíola. – Não, você não é Juliana, você não parece a gêmea boazinha. – Deduziu. – Oh my God! Estou vendo Raquel em carne e isso na minha frente! – Pasmou, levando a mão até a boca.

— É isso aí, o que vocês vão ver agora é a encarnação da Raquel, vocês vão conhece a gêmea má. Galera – olhou para a entrada – entra aí.

 


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