Encantos & Desencontros escrita por Maitê Miasi


Capítulo 18
Capítulo 18




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“Você nunca vai estar sozinha
De agora em diante
Mesmo que você pense em desistir
Não vou deixá-la cair
Quando toda a esperança se for
Sei que você pode continuar
Nós vamos sobreviver a este mundo

Vou te abraçar até a dor passar.
Eu vou estar lá sempre
Eu não vou perder mais nenhum dia
Eu vou estar lá sempre
Eu não vou perder mais nenhum dia.”


Nickelback – Never Gonna Be Alone

 

****


Maria saiu do prédio quase correndo, sem entender muito bem o que se passara há alguns minutos, e se culpava, mais uma vez, se culpava.

A mulher, tomada por remorso, decidiu mudar seu rumo, não tinha condições de chegar em casa daquela maneira, ainda mais quando os acontecimentos tão recentes não saiam de sua cabeça, pois, apesar de detestar aquele homem, não podia negar o quando ele a deixava tonta e sem direção.

Sem saber mais que caminho indicar para o taxista, Maria resolveu descer do carro após quase meia hora andando em círculos. O local não fazia parte dos lugares em que estava acostumada a frequentar, pelo contrário, talvez, em sua vasta existência, jamais houvesse posto os pés ali, o que era ótimo, assim não passaria pelo constrangimento de encontrar algum rosto familiar.

Ainda com o episódio fervilhando em sua mente, atordoando-a, pressionando-a, Maria entrou em uma lanchonete, razoavelmente cheia, e sentou-se na mesa mais afastada que havia ali, e ali, resolveu colocar seus pensamentos em ordem, ou ao menos tentar.

— Não está certo isso que você tá fazendo, Maria – sua voz era tão baixa, que ela mal a podia ouvir – você não pode se deixar levar pela lábia desse homem de novo. – Seu dedo indicador contornou a parte inferior do seu olho, impedindo uma lágrima de descer. – Será tão difícil entender isso? – Sua voz aumentou em algumas oitavas, mas ainda se encontrava baixa. – Não, eu não me permito isso, eu não vou me tornar refém dele, ele não vai me ferir de novo.

...

Passadas quase duas horas após o ocorrido, Maria então decide que era hora de retornar para casa. Para sua sorte, não encontrou ninguém ao chegar, menos mal, assim não teria que dar explicações sobre seu paradeiro.

Com suas pernas tão firmes quanto gelatina, Maria seguiu seu percurso até o quarto. Sua mente estava tão longe, que seu coração quase saiu pela boca ao passar pelo quarto de Giovana e ser abordada pela mesma.

— Ai criatura, quer me matar do coração? – Ela indagou com a mão no peito.

— Você tá na rua desde aquela hora? – A menina a olhou com certa desconfiança. – Onde você estava?

— E-eu?

Giovana, cheia de deboche, olhou para os dois lados do corredor, e vendo que não havia mais ninguém, senão as duas, continuou:

— Tem mais alguém aqui? – Maria revirou os olhos. – Vamos mãe, me diga, onde você estava e com quem?

— Eu estava com Estêvão.

— Não sei porque ainda me dei trabalho de perguntar, era mais que óbvio. Aposto que foi dizer pra ele se afastar, e todo aquele blá, blá, blá. – Foi a sua vez de revirar os olhos.

— Também.

— Também? – A menina franziu as sobrancelhas quando encostou seu corpo magro na parede do seu quarto. – O que mais você foi fazer lá?

Maria não respondeu a pergunta da filha, apenas a olhava com um olhar um tanto distante, talvez estivesse pensando em alguma outra desculpa. Sua demora pela resposta fez a mente maliciosa da filha trabalhar e logo, ela chegou a uma conclusão:

— Não vai me dizer que... – Ela fez uma breve pausa, e sua fisionomia logo se tornou espantosa. – Ah, não, não pode ser! – Rapidamente, ela se distanciou da parede e da mãe, e começou a dar pequenos passos de um lado ao outro. – Vocês dois juntos no apê dele, sozinhos, não pode ter acontecido outra coisa!

— Do que você tá falando, Giovana? – Perguntou enervada, com certo receio pela resposta.

— Não seja sonsa, mãe! Tá mais que óbvio, você e o Estêvão fizeram amor.

— V-você não sabe o que tá falando. – A mulher, possuída por uma tensão incalculável, gaguejou ao falar. Seus olhos já não encaravam mais a filha.

— Mãe – ela deu uma risada – você não sabe mentir. Só me admira você ficar bancando a recatada e se prestar a esse papelão. Pensei que o odiasse. Pensei que seu casamento com meu pai estivesse indo de vento em polpa. – Giovana não tinha a menor piedade ao jogar tais coisas sobre a mãe.

— Já chega, Giovana! – Ela foi firme, porém sua voz seguia baixa. Levando a mão em punho cerrado até a boca, ela pedia aos céus paciência para lidar com aquela situação. – Eu não tenho que ficar te dando satisfações, ok? E outra, você quer continuar se iludindo com Estêvão? Eu lavo as minhas mãos, depois que quebrar a sua cara, não vem chorando pro meu colo, tá!

Sem dizer mais nada, Maria saiu marchando em direção ao seu quarto deixando sua filha onde estava, com a cara de quem não se importava, e que aquele era só mais um sermão.

...

Maria seguiu no seu quarto pelo restante do dia, não desceu nem ao menos para jantar. Quando Cláudio adentrou pela porta do cômodo, encontrou a esposa deitada na cama, com o olhar fixo no teto, pensativa, nem a presença do marido a fez sair da sua posição inicial.

Repleto de vontade de ter sua amada em seus braços, Cláudio se aproximou da cama, e pôs-se a beija-la e a acaricia-la, foi nesse momento que Maria esboçou alguma reação.

— Espera Cláudio – ela virou seu rosto para o outro lado, o impedindo de beija-la – eu não estou no clima pra isso.

— Eu posso fazer você entrar no clima rapidinho. – Ele continuava beijando-a, mesmo ela resistindo.

— Eu não quero, estou com dor de cabeça.

— Eu posso fazer essa dor passar.

— Eu já disse que não!

Maria se afastou um tanto ríspida, deixando o marido com cara de poucos amigos. Com certeza sua atitude não lhe agradara nem um pouco.

— Se fosse com Estêvão não tinha essa de dor de cabeça. – Cláudio saiu de perto dela, bastante irritado, assim que lhe cuspiu as tais palavras.

— Estêvão não tem nada a ver com isso. – Repondeu séria e com a respiração descompassada.

— Não? Eu aposto que se fosse ele aqui no meu lugar, você já estava toda derretida.

— Eu acho melhor encerrarmos essa conversa por aqui mesmo.

— Por quê? Sabe que eu tô certo, né?

Ela ficou em silêncio, enquanto o olhava pegando um casaco e um molho de chaves, indicando que iria sair.

— Posso saber aonde você vai?

— Vou dar um volta, e dessa vez eu te digo pra não esperar pra dormir.

— Ok.

— Tá com ciúmes?

— Não, só quero que você apague a luz quando sair, se não for te incomodar.

Cláudio ergueu uma sobrancelha, e ciente que o assunto estava encerrado, saiu do quarto, apagando a luz, como sua esposa havia pedido.

...

Aquele domingo fazia bastante sol, mas o clima estava bem agradável, um dia perfeito para que Estêvão se gabasse para Miguel. Os dois iam conversando animados no carro de Estêvão em direção a sua antiga casa. A forma como eles se davam bem era inenarrável.

— Estêvão! – Fabíola disse esperançosa assim que avistou a imagem do marido, ou ex marido, na sua sala. – Quem bom te ver. E – ela deu uma leve inclinada com sua cabeça para a esquerda, para ver de quem se tratava a pessoa um pouco atrás dele – quem é esse aí?

— Sou Miguel, muito prazer. – Miguel saiu de trás de Estêvão, e foi para o seu lado, lhe cumprimentando com um sorriso muito simpático, e estendeu a mão, mas ela o ignorou.

— Você não me é estranho.

— Nos vimos no trabalho da minha mãe.

— Mãe?!

— Ele é filho da Maria. – Estêvão esclareceu logo, antes que a conversa de ambos fosse muito mais adiante.

— Como assim?! Maria tem outro filho além das gêmeas? – A mulher pasmou.

— Sim. – Ele sorriu de novo, mas ela não sabia se ele estava caçoando de sua cara, ou se era seu jeito.

— Vamos Miguel.

— Até mais, tia. – Lhe deixou um sorriso contendo uma pitada de deboche.

Os dois homens saíram andando, enquanto Fabíola os seguia com o olhar, com uma leve cara de paspalha.

Ainda no primeiro andar da grande casa, os dois entraram num cômodo que estava trancado à chave. Os olhos de Miguel ficaram sobremaneira maravilhados com o que viram ali.

O repartimento, que tinha um tamanho considerável, estava repleto de miniaturas de carros raros e antigos, além de outras raridades, e alguns troféus que Estêvão havia ganhado na época do colegial.

— Estêvão, eu poderia morar aqui dentro! – Ele parecia um criança que acabara de ganhar o melhor presente do mundo. – Eu não consigo parar de olhar pra isso, eu posso pegar, vai ser bem rápido. – Fez cara de menino pidão.

— Pode, mas tome muito cuidado, porque se você quebrar, infelizmente que vou ter que te matar.

Os dois riram.

— Você também coleciona moedas. – Ele se dirigiu para outra estante após devolver a miniatura para seu devido lugar.

— Sim, tem moedas de diversos países aí.

— Meu avô, pai do Cláudio, também colecionava, mas aí ele morreu, e deixou a coleção completa pra um outro neto, mesmo sabendo que eu queria muito. – Ele dizia sem olhar para Estêvão, apenas analisava a singularidade exposta à sua frente.

— Você os chama pelo nome – Miguel o encarou sem entender muito bem do que ele falava – seus pais. Você chama Maria pelo nome, e agora percebi que com Cláudio é da mesma forma.

— É – ele se distanciou um pouco, meio sem jeito – é uma coisa minha, que acabei criando quando ainda era criança. Eu disse a eles que ao voltaria chama-los de pai e mãe quando um certo assunto fosse esclarecido, mas parece que eles estão fugindo disso. – O rapaz, bastante acanhado, deu poucos passos até estar de frente aos troféus. – E esses troféus, hein Estêvão? Acho que temos um verdadeiro campeão aqui. – Brincou, rindo.

— Faz pelo menos uns vinte anos que ganhei o último desses – ele parou ao seu lado – futebol, natação, vôlei, corrida. Até que eu mandava bem. – Disse com uma falsa modéstia.

— Deveria ser rodeado de gatinhas, né – brincou – e esse aqui? – Apontou para um que estava destacado dos demais.

— Esse, Miguel – ele o pegou, com certa dificuldade, já que ele estava no alto – é o mais especial de todos. Ganhei numa final de futebol, com uma turma que detestava a minha turma – um sorriso nostálgico o invadia ao se lembrar dos momentos – mas eu tenho tanto carinho porque o dediquei a sua mãe.

— A Maria?!

O clima fechou no mesmo instante. Estêvão estava tão perdido em suas memórias que mal se ligou que acabara falando demais, enquanto Miguel, ficara sem reação ao descobrir um possível envolvimento entre eles.

— Você dedicou esse troféu a minha mãe, Estêvão?

— É... Ham...

Sem saber ao certo o que falar, Estêvão novamente fora salvo pelo acaso. Henrique entrou na sala, quebrando o clima ruim.
Os três trocaram algumas palavras, e risos também. A entrada do filho distorceu o assunto anterior, e Estêvão agradeceu muito em seu íntimo.

Henrique seguiu seu caminho, enquanto Estêvão e Miguel continuavam ainda na casa. Ambos tinham combinado de almoçar juntos, mas antes de saírem da casa, Estêvão novamente foi barrado por Fabíola, que o impediu de prosseguir.

— Estêvão, não vá ainda, eu preciso falar com você. – Fabíola parecia uma pessoa sensata ao falar.

— Ham, Estêvão, eu vou te esperar na casa da minha mãe. – Ele se despediu da tia com um aceno e saiu.

— Eu ainda não consigo acreditar que esse garoto é filho da Maria. – O observou saindo por cima do ombro de Estêvão.

— O que você quer, Fabíola?

— Quero pedir que você reconcidere sobre a sua decisão. Estêvão, essa casa não é a mesma sem você, eu não sou a mesma sem você. – Foi um pouco mais intensa ao falar.

— Fabíola, não tem volta, eu não vou reconsiderar. Inclusive, já falei com meu advogado, os papéis estão quase prontos, eu espero que você não mostre resistência.

— Não faz isso, Estêvão. Você não pode fazer isso! – Ela já chorava e falava alto.

— Por favor, Fabíola, não comece! – Foi enérgico. – Por que você sempre tem que tumultuar, e causar problemas? Não dá pra fazer as coisas mais serem um pouco mais fáceis?

— Não precisa gritar, eu só tô tentando lutar pelo nosso casamento!

— Não tem como, você parece que só entende as coisas assim! E pare de lutar, vai ser em vão! Agora me dá licença, Miguel tá me esperando. – Ele virou as costas para sair.

— Ela vai me pagar, eu não vou deixar isso barato.

Ele a olhou de relance, mas ignorou seu comentário e saiu. Irada, Fabíola pegou o primeiro objeto que sua mão pôde alcançar, e jogou contra parede, e o vaso caro, que servia de enfeite, se fez em mil pedaços.

— Eu te odeio Maria, eu te odeio.

...

Ao entrar na casa da mãe, Miguel a encontrou na sala de estar, sentada, mexendo em seu notebook, sua falta de jeito, deixou a mãe em alerta.

— O que houve? Você não é de sair entrando assim. – Encarou a fisionomia séria do filho, que estava diferente do normal.

— Eu não sabia que você e o Estêvão se conheceram no passado.

— Ué, pensei que soubesse.

— Ah, pensou. Você tá me escondendo alguma coisa, Maria?

— Miguel, por favor, né.

Miguel ia rebater o comentário da mãe, mas ouviu uma buzina.
— Eu tô saindo agora, mas você não me escapa. Além de me explicar direitinho essa história com Estêvão, tem outra história que você tá me enrolando há tempos.

— Posso saber aonde você vai?

— Vou almoçar com Estêvão.

— C-com Estêvão? Não sabia que estavam tão íntimos.

— Eu sei que, talvez, isso te incomode um pouco, mas ele é uma ótima companhia, Maria, eu gosto de estar com ele. – O rapaz fora sincero, e a mãe percebera.

— Eu não sei o que vocês tanto vêem nele, tantas pessoas tão interessantes por aí, e meu filhos resolvem se envolver com quem? Com esse infeliz! Pois fique sabendo que eu sou totalmente contra, ouviu Miguel.

— Eu respeito sua opinião – Maria logo sorriu pensando que ele diria que se afastaria do amigo – mas não concordo, e não vou acatar. – Logo, seu sorriso se desfez, dando lugar a uma face repleta de repreensão.

— Você prefere que sua mãe fique triste, é isso?

— Por favor, Maria. Você sabe que eu não caio nessa de chantagem emocional, e tá decidido, eu te amo muito, e você sabe disso, mas não vou parar de ver ele porque você quer.

— Ok, tudo bem, continue com essa amizade, mesmo sabendo que eu sou totalmente contra. – Ela aplaudiu sua atitude.

— Tchau, Maria.

Ele simplesmente se virou e saiu, enquanto Maria, continuou ali sentada, pensando como as coisas estavam saindo do seu controle.

...

Nada mais aconteceria naquele domingo. Depois de um dia normal, ele já estava quase no seu fim, com cara de um domingo qualquer. Porém, Fabíola, querendo quebrar toda e qualquer normalidade, resolveu colocar sua mente maquiavélica para funcionar, e não somente isso, queria executar tudo o que havia pensado.

— Posso saber pra quê você chamou aqui a essa hora, Fabíola? – Jacques perguntou, um tanto irritado. – Eu estava numa boa curtindo umas musiquinhas com uns amigos, e você atrapalhou tudo. – Com os bravos cruzados, ele batia o pé, inquieto.

— O que vamos fazer é muito mais importante do que ficar flertando, ok.

— E o que vamos fazer? – Sua curiosidade foi aguçada e seu semblante mudou da água para o vinho.

— Vem comigo.

Os dois seguiram pelos corredores vazios da Casa de Modas, e mil e uma perguntas fora feitas por Jacques, Fabíola não respondera nenhuma. Após andarem alguns poucos minutos, eles finalmente chegaram a uma saleta, onde estavam as lingeries que seriam usadas para o lançamento da coleção, dali a dois dias.

— Ué, o vamos fazer aqui?

— Isso!

Fabíola mostrou seu sorriso mais tenebroso quando tirou de dentro da bolsa duas enormes tesouras. Uma delas, entregou para Jacques, ele entendendo o recado, recuou no mesmo momento.

— Eu não vou fazer isso – deu dois pulinhos para trás – não conte comigo.

— Ah, mas você vai, sim senhor! – Fabíola o puxou pela blusa, e colocou a tesoura em suas mãos. – Ou você tá comigo, ou contra mim, e eu não vou admitir que você se bandeie pro lado da minha irmã.

Sem ter muita opção, Jacques acabou acatando a ordem de Fabíola. A mulher vingativa gargalhava ao cortar em pedaços cada peça que ela via em sua frente. Todos os desenhos feitos por Maria indo por água a baixo, definitivamente, Fabíola estava estragando toda uma coleção feita com amor por sua irmã.

O pobre homem ali presente, tentava despistar, e só fingia cortar, seu coração mole não o deixava fazer tal coisa com alguém que tinha tanta admiração. Para sua sorte, sua amiga estava tão obsecada em fazer mal à irmã, que mal notara que ele não fizera nada.

— Acabamos, né Fabi? – Perguntou em prantos.

— Jacques, por favor né, seca essa lágrima. Você não viu o que ela fez comigo? Acabou com meu casamento, é o mínimo que ela merecia. – Disse, tentando justificar sua atitude.

— Você não soube dividir as coisas, Fabi.

Fabíola revirou os olhos.

Por fim, os dois iam saindo, mas quando Fabíola percebeu algo no bolso do amigo, o fez parar onde estava.

— Pode me dando!

— O quê, sua louca? – Um V se formou entre suas sobrancelhas.

— Eu sei que ainda tem alguma coisa no seu bolso. Vamos, me entregue, você não vai salvar minha irmã com uma ou duas calcinhas.

Novamente sem saída, ele entregou as peças que haviam em seu bolso. Em dois tempos Fabíola as destruiu.

— Agora sim. Eu só queria estar aqui amanhã pra ver a carinha da minha irmãzinha.

— Nós dois vamos ganhar uma justa causa, isso sim.

— Tô pouco me importante com isso, eu quero mesmo é que ela se ferre.

Dito isso, os dois saíram. Jacques um pouco assustado com a atitude fria da amiga, e com o coração partido por não ter podido agir contra, e evitar o estrago.

...

A confusão estava instalada na Casa de Modas naquela segunda feira. Havia muito corre, corre, muito falatório, todos muito empenhados em deixar o evento do dia seguinte impecável.

Maria seguia dando instruções a todos os funcionários, e xingando mentalmente a Fabíola e a Jacques por ainda não terem dado as caras. Ela não se dava muito bem com a irmã, mas tinha que admitir que ela era uma mão na roda.

Quase sem unhas devido ao nervosismo e ansiedade, Maria ia, juntamente com Juliana, conferir mais uma vez a linha de roupas que seria usada no dia seguinte. Desde que as peças começaram a ficar prontas, ela fazia questão de ir todos os dias olhar, para vê se estava tudo em ordem, mas naquele dia, era a primeira vez.

— Mãe, eu vou confirmar, pela milésima vez, com o maquiador, tá.

— Tudo bem, nos encontramos mais tarde.

Maria só faltava cantar de tanta animação. Seus pés seguiam quase dançantes até a sala onde estavam as lingeries que seriam usadas pelas modelos. Sua alegria era tão grande, que ninguém conseguiria por fim nela, a não ser se ela abrisse a porta e desse de cara com um amontoado de peças definhadas, aos pedaços.

— Juliana! – A mulher gritou. Em segundos sua cor se fora.

— Mãe – Juliana, que ainda não tinha virado o corredor, voltou correndo ao ouvir o grito desesperado da mãe – o que foi?

— Olha isso, Juliana.

Quando os doces olhos de Juliana contemplaram o mesmo que sua mãe, pequenas gotículas de lágrimas envolveram seus olhos. Naquele momento, as duas sentiam a dor de um grande trabalho sendo jogado no lixo.

— Isso não pode ser, mãe. Quem foi o monstro que fez isso?

— Só pode ter sido Fabíola, quem mais seria tão baixo? – As duas entraram e logo a porta foi fechada. – E agora, Juliana? O meu desfile foi por água abaixo. – Foi então que ela se permitiu entrar em prantos.

— Calma, mãe, deve ter um jeito.

— Que jeito, Juliana? Olha como está isso. – O coração de Maria se fazia em pedaços ao pegar aqueles pecados cortados das obras desenhadas por suas mãos.

— Mãe, calma. Você confia em mim? – Perguntou decidida.

— Confio, mas...

— Confia, mãe?

— Claro que confio.

— Então vem comigo, eu tive uma ideia.

...

Não foi difícil para Giovana entrar no prédio de Estêvão, foi só dar uma engabelada no porteiro, e pronto, já estava lá dentro.

Ao entrar, Giovana fora direto para o quarto em busca de coisas, só não sabia ao certo o quê. Sem rodeios, começou a revirar as gavetas, mas nada encontrou. Olhou na cômoda, aparador e até mesmo em alguns baús, mas não encontrou nada de significante, até que decidiu abrir o guarda roupa.

Num lado, só haviam roupas, mas o outro despertou algo dentro dela. Algumas caixas e cadernos com cara de antigos lhe chamaram a atenção, e foi ali mesmo que ela começou a fuçar.

— Caixa de lembranças – leu o que estava escrito na tampa de uma das caixas – talvez aqui esteja o que eu tô procurando. – Sem dificuldades nenhuma, ela levou a caixa de tamanho mediano até a cama. – Argh, que nojo, foi aqui que aqueles dois fizeram amor. Foco Giovana. – A menina foi até um dos baús, pegou um lençol e forrou sobre a cama, e sobre ele, se sentou. – Agora sim.

Ao abrir a caixa, Giovana encontrou muitas coisas da juventude de Estevão, e entre elas algumas fotos dele e de Maria, mas o que chamou mesmo sua atenção, foi um envelope que estava escrito “me perdoa, Maria” onde tinham algumas cartas.

— Isso é muito bom. Vamos lá.

Ela começou a ler em voz alta:


04/12/94

Maria,

Eu sei que nada que eu disser vai amenizar a dor que eu te causei. Eu entendo se você me disser que nunca mais vai querer olhar na minha cara, é o mínimo que eu mereço. Eu só queria te pedir uma coisa: me perdoa, por favor.

Sem perder tempo, ela logo pegou a outra carta.

09/12/94

Maria,

Eu me senti e sinto tão mal ao ver você na escola sendo olhada pelos por todos como se fosse uma criminosa, e me senti ainda pior ao me dar conta que eu sou o causador de tudo. Não vai aliviar a sua dor, mas eu tô me sentindo um lixo. Eu queria poder voltar atrás e poder evitar tudo isso. Me perdoa.

E logo, ela pegou a última carta que ainda estava dentro do envelope.

27/12/94

Maria,

Soube que sua mãe faleceu, eu sinto muito. Queria estar do seu lado pra te dar essa força, mas achei melhor não dar as caras, e acho que fiz o certo. Talvez a única coisa certa que eu tenho feito nós últimos tempos.

Ouvi uns boatos que você vai ser casar e vai embora daqui. Você não ama esse cara, eu sei muito bem disso. Você só vai fazer isso pra se livrar desse inferno que você tá vivendo, não é? A cada dia que passa, eu me odeio ainda mais. Eu poderia ter impedido tudo isso, mas não o fiz. Talvez você nunca chegue a ler essas cartas, mas se por acaso acontecer, saiba que eu te amo muito.

Me perdoa.

— Caramba, o que foi que ele fez pra pedir perdão? Deve ter sido algo muito grave. – Ela pegou os três papéis, e começou a anilisar algumas coisas. – Essa data é próxima a data do casamento dos meu pais. Espera aí, minha mãe e meu pai se casaram por causa de uma merda que Estêvão fez? – A menina ficou perplexa ao chegar a tal conclusão. – Eu preciso encontrar mais coisas, eu preciso descobrir o que foi ele fez.

Giovana saltou da cama e voltou a revirar o guarda roupa de Estêvão em busca de mais alguma coisa que revelasse mais sobre o passado dos dois, e para sua sorte, não foi difícil encontrar, o que ela tanto procurava estava bem à sua frente.

— Ora, ora, pra, o que temos aqui? Cartas trocadas pelos pombinhos, talvez aqui tenha o que tô buscando.

Sem mais, ela colocou o caderno que havia acabado de encontrar dentro do sua bolsa, e sem ao menos organizar a bagunça que havia feito, saiu do apartamento, com um sorriso satisfeito, de quem havia acabado de ganhar na loteria.







 


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