Encantos & Desencontros escrita por Maitê Miasi


Capítulo 14
Capítulo 14




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Eu prefiro você, você, você

Entre todas as coisas

Amo te ter aqui, aqui, aqui

Mesmo que seja só por algumas horas.

Eu prefiro você, você, você

Embora você desapareça

E só me ame às vezes

O que você me deu ou o que fez comigo

Eu não sei

Mas eu prefiro você

Embora você não seja isso que você mereça.”


Río Roma – Yo Te Prefiero A Ti


****


Maria encheu seu acompanhe de perguntas. Estava ansiosa, curiosa, queria saber todos os seus passos, entre os meses em que estiveram afastados. O rapaz jovem, bem afeiçoado, não se esquivava e nem se exauria em responder, fazia questão de contar-lhe todos os detalhes da sua temporada na África, fazendo trabalho voluntário como médico, já que era recém formado. Após longos e entretidos minutos de bate papo, deixaram o aeroporto, e partiram para um apart hotel.

— Tem certeza que prefere ficar aqui, Miguel? Você sabe que um lugar muito melhor te espera. – Ela o olhava quase que implorando para que ele se convencesse a acompanhá-la.

— Já disse milhões de vezes que não quero ser sustentado pelo seu dinheiro, Maria. Posso muito bem me virar com o que tenho.

— Ai, você fica lindo bancando o orgulhoso – Sorriu, Maria, em uma expressão de caras e bocas. A mão elevou-se para o rosto dele, apertando sua barbicha rala. – Mas você não entende, só quero que fique bem, e confortável.

— Só que não preciso do seu dinheiro pra ficar confortável, você sabe muito bem que não preciso de muita coisa pra me sentir bem. Continua com a mania chata de querer me controlar, hein.— Acusou ele, levemente exasperado.

— Ai, ai, mal nos encontramos e você já começou a me tratar dessa forma?! Vou embora, seu ingrato.

— Ah não, Maria, estou brincando. Não vai.

— É sério Miguel, tenho que ir. – Se pôs um pouco mais séria.

— Problemas?

— Você nem imagina. Almoçamos juntos amanhã?

— Amanhã, e depois, e depois e depois. – Ele abriu os braços, e a abraçou. – Sabe que estarei disponível, sempre e quando você quiser, né?

— É o mínimo! Seis meses é muito tempo, Miguel.

— Isso não vai se repetir.

— Espero mesmo. Bom, estou indo tá?! Dorme bem, meu amor.

Maria deixou o apartamento, sorrindo bobamente. Seu coração estava saltitante por reencontrar, depois de demorados seis meses, a pessoa por quem seu coração batia com todas as forças. Agora sim, sua noite terminaria da melhor forma, e nada poderia tirá-la do sério. Ou não.

O clima na casa dos San Roman não era um dos melhores. E tendia a piorar quando Estêvão escutou gritos furiosos, vindo do lado de fora. Se alarmou.

— Aparece seu desgraçado!

— Senhor Estêvão, tentei parar esse homem, mas parece que ele está possuído.

A empregada suava assustada, enquanto lutava, em vão, para segurar Cláudio. Ele se debatia com um ódio visceral. No estado de raiva, em que se encontrava, nem que houvessem dez seguranças à disposição, conseguiriam doma-lo. O homem realmente parecia estar possuído, bêbado, transtornado.

— Deixa Sueli, pode se retirar. – Disse firme, sabendo que podia esperar o pior daquela conversa. 

— Como você teve coragem Estêvão, pensei que fôssemos amigos!

— Jamais tive a intenção de trair sua amizade Cláudio, mas aconteceu. – Ele fora sincero.

— Aconteceu? É isso que você tem a me dizer? Nem mesmo minhas filhas dariam uma desculpa dessas Estêvão, isso se chama falta de caráter, coisa que nenhum de vocês dois têm!

Cláudio gritava alto, sem se importar com quem pudesse estar ouvindo. No exato momento do rompante, todos estavam presente assistindo a cena. Giovana ria, Juliana encontrava-se perplexa, sem acreditar no que via e ouvia, Maria também estava por ali, escondida, apenas observava a uma certa distância, a discussão.

— É, talvez seja, mas você nunca vai entender Cláudio. – Ele também gritou.

— Entender o quê? — Desafiou.

— Que eu amo a sua esposa.

— Seu infeliz!

Cláudio não esperou mais. Sentia urgência em fazer o que pretendia desde o instante em que entrou na casa do seu sócio, agora arquirrival. Com um soco potente, Estêvão cambaleou para trás, sentindo o maxilar craquelar. Teve a oportunidade de revidar, pois percebeu que Cláudio estava sob o forte efeito do álcool, mas preferiu não o fazer. Sentiu-se em dívida, o único culpado por tudo. E em mais outro momento de distração, Estêvão foi novamente golpeado por Cláudio, que lhe desferiu outro soco no rosto, fazendo o sangue escorrer pelo canto da boca.

— Pai, para! – Juliana se aproximou, na tentativa de parar o próprio pai. Henrique se dispôs a ajudar também, Giovana e Fabíola apenas olhavam, sem se mover. Maria queria correr, fugir dali, mas se segurou. Também não achou uma boa ideia intervir, impôr sua presença. Só amplificaria mais a tragédia familiar.

— Deixa Juliana, ele está no direito dele. – Estêvão disse com a mão na boca, o sangue permanecia escorrendo.

— Se eu te matar, continuo no meu direito, seu desgraçado?

— Quem sabe? Mas fica tranquilo, eu posso amar sua mulher, mas não existe mais nada entre nós dois, isso eu te garanto.

Estêvão se retirou do ambiente deixando todos boquiabertos com sua declaração, inclusive Maria, que permanecia oculta aos olhos de todos. As gêmeas, com ajuda de Henrique, levaram Cláudio para casa, e o ajudaram a se recompor.

Estêvão se acomodou no quarto de hóspedes. Não havia clima para dormir ao lado de Fabíola, e não iria pedir que ela se retirasse, ele mesmo o faria. Porém, ainda assim, a esposa se compadeceu, e foi ver se ele estava bem depois das duas bofetadas que levara.

— A coisa está feia aí, hein.

— Veio zombar?

— Também. Achou mesmo que iria sair ileso? — Atacou a esposa.

— Se for continuar, pode sair por onde entrou!— Estêvão se irritou.

— Calma, vou ajudar você.

Fabíola, a esposa prestativa e atenciosa, que aparentava ser, o ajudou. Não demorou muito, e ele estava novinho em folha, pronto para outra.

— Obrigado.

— Por nada. Você sabe que eu faço tudo por você, se você quiser. Vivo para você Estêvão, será que não entende? Esquece ela, vamos sair daqui, sumir no mundo, vamos ser felizes. Prometo que esqueço tudo o que aconteceu.

— Fabíola – ele se levantou e a olhou nos olhos – entre mim e Maria não há mais nada, mas isso não significa que vou dar uma chance pro nosso casamento.

— E por que vocês acabaram com tudo? Ela te deu um pé na bunda, ou esfregou na sua cara o que você fez com ela?

— Maria tem outro.

...

O clima na casa estava tenso, sobrecarregado. Somente Juliana e Giovana trocavam assuntos entre si, do jeito divergente delas, mas conversavam. Maria tentava o máximo não esbarrar com o marido, evitando enxergar a decepção estampada no olhar dele.

As palavras ditas por Estêvão ainda faziam ecos em sua mente. O que faria? Não sabia se confessava toda a verdade, ou se o deixaria pensando o que bem quisesse a seu respeito. Quando finalmente tinha decidido se entregar ao único homem que sempre amou, vem a vida e apronta outra.

"Obrigada, vida."

Na manhã seguinte, Maria esperou que o marido saísse de casa para que, por fim, pudesse sair do quarto. Encontrou somente Juliana na sala de estar, mexendo no celular. Quando viu a mãe, a menina não escondeu a cara de decepção.

— Oi Juliana. – Ela fora até a filha e a beijou no alto de sua cabeça. Trazia uma expressão suave, porém não menos apreensiva. Não sabia, exatamente, o que esperar da filha.

— Agora não estamos mais no topo das suas prioridades, né mãe. – Disse com pesar.

— Juliana, entendo que você deve está chateada comigo. – Maria tentou toca-la no o rosto, mas a filha se esquivou.

— Se entende, por que se comportou de tal maneira? Mãe, eu tinha você num altar, e daí você faz uma coisa dessas, eu não esperava isso de você.

— Você acha que eu queria que as coisas seguissem assim? Você acha que eu queria mesmo entristecer vocês e ao Cláudio, seu pai?

— Se não quer mesmo que a gente fique triste, por que não encerra de uma vez essa história com Estêvão e se acerta com meu pai mãe, por favor!

— Juliana, as coisas não são tão simples assim, filha.

— Como não? É só você decidir. Você quer ficar com meu pai, não quer?

Maria ficou em silêncio deixando a filha ainda mais nervosa.

— Você quer, não quer mãe? – Ela falou mais alto. – Você tem que querer! — Disse ainda mais incisiva.

— Não Juliana, não quero. – Maria não se sentira bem ao proferir tais palavras. – Gosto muito do seu pai, tenho uma eterna gratidão a ele, mas não o amo, não mais.

— Você não pode fazer isso, mãe, você não tem esse direito! – Ela gritou, e saiu da presença de Maria, que ficou estarrecida com a reação da filha.

...

O clima também não estava muito favorável nas empresas San Roman. Os sócios quase não se comunicavam entre si, somente se direcionavam para tratarem de assuntos de extrema importância. Com o rosto ainda meio arroxeado, e muitos olhares curiosos o sondando, Estêvão preferiu se trancar em sua sala, e só sair no fim do expediente.

— Bom dia, Estêvão. – Giovana o saudou com um sorriso cínico.

— Giovana, o que você tá fazendo aqui?

— Ué, eu ainda trabalho aqui, agora com meu pai. Mas ainda vai ser um prazer, pra mim, ficar perto de você. – Piscou.

— Não começa, Giovana. Minha cabeça está começando a esquentar, e você não vai conseguir deixar mais quente.

— Bom – ela se aproximou da mesa – se você quiser, a gente pode tomar um banho gelado pra esfriar. – Ela sorriu sapeca.

— Aguarda sentada.

— Tá estressado por conta do fim de semana, né. – Ela se sentou na cadeira à frente da mesa dele. – Se tivesse preferido a mim, ao invés da minha mãe, teria uma dor de cabeça a menos.

— Com certeza. E você acha mesmo que eu sei lidar com crianças?

— Ah, não ferra, Estêvão! – Giovana detestava que a comparassem a uma criança. – Se você me der a oportunidade, posso te mostrar que de criança só tenho esse rostinho.

— E se você me der a oportunidade, vou trabalhar. Me dá licença vai, me deixa estar aqui, trabalhando, é a única coisa que eu faço bem.

...

O pensamento de Maria entrou em conexão com o de Estêvão. Decidiu passar o dia trancada em sua sala, para não ter que dar de cara com ninguém, principalmente com sua irmã. Havia um certo murmúrio na boca dos funcionários, já que a maioria soube do acorrido no sábado à noite. 

Fabíola não esperou mais, invadiu a sala de Maria, querendo saber o que ela sentiria ao saber que havia sido traída pela própria irmã.

— Seu fim de semana foi ótimo, né mesmo? — Disse, levemente alterada, acompanhada por Jacques.

— Será que você é surda? Já não deixei bem claro que não entrasse na minha sala, sem se anunciar? Não sabe mais bater ou pedir licença?

— Você não está em condições de fazer exigências, sua fura olho.

— Eu, fura olho? – Riu. – O que você fez, leva o nome de quê mesmo, hein?

— E acaso eu furei teu olho?

— Eu não sou idiota, Fabíola. Sei muito bem que você vivia grudada no Estêvão, mesmo quando eu estava com ele. Sabia que você estava afim dele, e que você fazia parte daquela turma que planejaram aquele absurdo que eu odeio me lembrar. Então, não vem se fazendo de vítima, você só está colhendo o que plantou.

— Isso não justifica, você deveria respeitar meu casamento!

— Não exija uma coisa que você não dá. Se quisesse respeito, teria me respeitado. Agora sou eu quem digo: você não está em condições de exigir nada. Agora sai da minha sala. Fora! — Vociferou.

— Não terminei de falar.

— Mas eu sim. Agora sai!

Fabíola deixou a sala, indignada, inconformada. Jacques, por sua vez, queria arriscar em dizer algo, interagir, trocar algumas palavras com sua ídola, mas a forma como havia se irritado com Fabíola, o fez recuar, desistindo de ficar ali.

...

Um pouco antes do horário de almoço, Maria havia ligado e combinado com Estêvão, para que se encontrassem no mesmo restaurante de sempre.

Ele impôs um pouco de resistência, discutiram, mas no final, aceitou.

Maria chegou no local e o esperou, bem como haviam combinado.

— Sou todo ouvidos. – Maria o viu chegar e logo se acomodar.

— Ele te machucou. – Observou ela, sentindo-se culpada. – Assisti tudo, ontem. Me sinto muito mal por isso.

— Eu não esperava outra reação dele, está no direito de querer defender sua honra, sua moral. – Estêvão falava com ela, movido pela indiferença. Sério e pragmático.

— Ouvi também você dizer, que não temos mais nada.

— Maria – ele respirou fundo antes de continuar – não concordo com o que fizemos, mas está feito, ok. Porém te dividir com um terceiro homem é demais pra mim.

— Nenhum deles me tem como você, será que dá pra entender isso?

— Não pareceu isso quando você falava ao telefone.

— Nem tudo é como parece ser.

— Então me explica, porque eu quero entender.

— Você não deveria dar tanta importância a isso.

— Se não tem tanta importância, por que você não explica logo?

Ela se calou.

— Será que é tão sem importância assim?

Ela permaneceu quieta, muda.

— Não, não é. Bom, não tenho mais nada o que fazer aqui. Conversamos o que tínhamos pra conversar. E eu não quero mais me encontrar com você enquanto essa história estiver mal resolvida.

Estêvão se levantou e se direcionou à saída, a expressão rígida transfigurava-se em mal humor. Maria ergueu-se da cadeira e foi atrás dele. Chamou por seu nome, na tentativa de chamar sua atenção, contudo ele a ignorava.

Já do lado de fora, ela continuava a chama-lo, dessa vez mais incisivamente, fazendo-o se recostar no carro, estacionado em frente do restaurante.

— Olha pra mim, Estêvão – segurou seu rosto com as duas mãos – eu te amo! Minha vida está uma loucura, mas não estou pensando em retroceder, quero enfrentar tudo e todos por você, por nós. Por favor, não faz assim.

— Maria...

— Por favor. – Ela o interrompeu e se aproximou mais, roçando seus lábios aos dele. – Mereço um voto de confiança seu.

Levado por toda aquela situação, Estêvão acabou não resistindo, e a tomou em um beijo apaixonado, quente, cheio de ardor. Jogou por terra todos os seus conceitos. O desejo aliciante de ter aquela mulher em seus braços era maior que tudo, era inevitavelmente, maior que todos. E ali, acoplado nos braços, nos lábios dela, não se importou com quem passasse e os vissem. Sua reputação, naquele momento, já não era prioridade.

— Maria?!

Uma voz masculina os tirou do delírio da paixão em que se entregavam.

— Miguel?! – Os olhos de Maria quase saltaram ao dar-se conta do que o rapaz havia presenciado.

— Miguel...???— Estêvão se pronunciou incrédulo, tirando suas próprias conclusões. —Eu não devia ter me deixado levar por você, Maria.

— Espera, Estêvão.

Estêvão entrou em seu carro, e não demorou muito para que os perdessem de vista. Maria se sentiu um tanto envergonhada por ter sido flagrada naquela cena tão cúmplice e íntima. Por saber que, mais uma vez, o homem da sua vida, estava escorregando por suas mãos.


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