Isso não é uma carta de suicídio escrita por Beykatze


Capítulo 2
Pai


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura ♥



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"Pai, me desculpe"

Apagou o pedido.

"Você tem que pedir desculpas"

Encarou a sentença. Sabia que aquelas palavras o magoariam, mas eram necessárias. Varreu com os dedos os pedaços de borracha que ficaram sobre a folha e voltou a escrever.

"Não é difícil ligar pra sua filha. Sei que quando vocês se separaram você não ligava para mim. Eu não lembro, mas eu ouvi minha mãe falando uma vez pra tia Mari que eu chorava de saudade e ela tinha que te telefonar pedido pra ligar pra mim.

Não sei se você se arrepende disso, de não ter sido mais presente mesmo que à distância, mas eu ainda sinto.

Minha melhor memória de nós dois é daquela tarde em que passamos no sofá comendo pipoca doce e assistindo a todos os filmes medievais que encontramos. Caras com armaduras em cavalos magníficos correndo em direção a uma batalha é a imagem que tenho na cabeça daqueles filmes. Um pouco triste essa ser minha melhor memória. Detesto filmes medievais.

Às vezes eu penso que talvez você simplesmente não gostasse tanto assim de mim, não o suficiente para estar em seus pensamentos. Imagino que, se e quando eu tiver um filho, eu pensarei nele ou nela toda noite, antes de dormir, pensando se está bem, como foi o dia, inclusive as partes que não me contou. Mas eu sei que você não fazia isso, pois, se fizesse, lembraria de me ligar com uma frequência maior que uma vez a cada aniversário.

Eu sei, pai, eu sei que não foi proposital a falta de atenção para comigo, mas ela machucou mesmo assim.

Você nunca prestou atenção o suficiente para ser meu pai.

Nossa relação é mais como um tio legal e uma sobrinha. O problema é quando essa intimidade é forçada por que você é meu pai. Coisas como saber de namorados ou se já bebi. Você perdeu o direito de saber essas respostas no momento que escolheu não estar presente.

E veja bem, não culpo você pela separação (embora saiba que minha mãe pediu o divórcio porque descobriu uma traição), apenas culpo você por ter escolhido estar distante, não ligar, não fazer perguntas. 

É, pai. As pessoas tem uma imagem do pai como um super herói, protetor e carinhoso.

Mas onde estava você pra me salvar quando eu tentei me matar?

Onde estava você quando eu passei as noites chorando depois de me machucar?

Ou melhor, onde estava você quando meu cachorro morreu? Minha mãe estava lá.

E quando meu gato sumiu? Ela estava lá também.

Onde você estava?

Me perguntou como eu estava?

Me perguntou alguma coisa?

Você me ligou?

Você sabe alguma coisa sobre mim?

É claro, além do comum. Além dos meus cabelos castanhos, olhos pequenos, gosto pela leitura e amor por animais.

Sabe algo além disso?

Então, pai. Espero que essas palavras te tragam alguma luz e, quando minha irmãzinha nascer, que tu não cometa os mesmo erros.

Se conecte com ela. Converse. Faça coisas junto. E, mais importante, não faça merda e não vá embora.”

Naiara saiu do quarto mais uma vez, a cortina balançava com o vendo forte e teve que apoiar o celular na carta para que não voasse.

Foi até a cozinha e tirou o bolo do forno, cortando alguns pedaços. Depositou as fatias quentinhas em um prato e voltou para o quarto, respirando fundo e dando uma mordida antes de começar a outra carta.


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