No dia anterior entregara sua carta de demissão.

Nunca pensou que seria fácil o fazê-lo, mas enquanto seu chefe lia o conteúdo teve de controlar o sorriso que lutava para brotar em seus lábios. A sensação era de que fazia a coisa certa, mesmo depois do sermão sobre sua “irresponsabilidade” com o departamento e falta de respeito às leis e normais da Holanda.

Pouco se importava, estava fazendo o que era certo para si e ninguém a impediria.

***

Chegara em Londres no meio da manhã, e só de pisar na cidade em que crescera já sentia a felicidade se expandir em seu peito. Era disso que precisava, ainda não acreditava que passara tanto tempo fora vivendo uma vida que não era sua. Estava quase completa.

Antes de encontrar Harry foi até o St. Mungos, onde assinou seu retorno ao Hospital. Logo que tomara uma decisão enviara uma carta pedindo seu reestabelecimento a emergência, explicando que voltaria definitivamente para Londres e tinha muito a oferecer como médibruxa. A resposta positiva chegara poucas horas depois, dando-lhe as boas-vindas.

Saiu do St. Mungos pouco antes do meio dia, e foi direito ao Ministério da Magia onde se encaminhou direto para o QG dos aurores, bastante impressionada com a organização do lugar, dado em consideração que Harry e Rony dividiam a chefia do departamento.

— Hermione?

Virou-se alegre para receber um abraço apertado de Rony.

— Você voltou! — Afastou-se poucos centímetros para checar se era mesmo a sua amiga. — Quando? Como? Por quê?

— Era a melhor decisão, apenas demorei para entender! — Explicou-se com sinceridade. — Harry está?

A expressão de confusão no rosto do amigo lhe causou um arrepio.

— Harry saiu mais cedo ontem e não veio trabalhar hoje. — Parecia quase se desculpar pela falta do amigo. — Eu pretendia passar no Largo durante o almoço e ver se estava tudo bem.

— Ele estava bem?

Rony sacudiu a cabeça, como se disse que as coisas estavam mais ou menos.

— Eu vou até o Largo e te aviso se houver qualquer coisa fora do normal! — Propôs, já considerando uma ideia para colocar em prática.

— Certo!

Acenou com a cabeça e começou a percorrer o caminho até o elevador.

— Hey, Hermione. — Virou-se novamente para o ruivo. — É bom tê-la de volta!

Sorriu e deixou o Ministério.

***

Não queria aparecer de mãos vazias, era quase hora do almoço e por isso decidiu parar em um restaurante no caminho. Fez seu pedido para viagem e enquanto aguardava sentou-se numa mesa ao lado da janela, onde passou a observar o pouco movimento.

Estava nervosa, esperava que Harry a recebesse bem, mas não o culparia se não o fizesse, tinha plena consciência de que o havia magoado quando sequer lhe dera a chance de participar da decisão. O amava, já não podia fingir, esperava apenas que ainda fosse recíproco.

Precisava de algo para relaxar, foi então que mexeu em sua bolsa atrás das cartas que jogara lá dentro. Não as queria ler realmente, mas podiam ser uma boa distração para conter sua ansiedade em encontrar Harry. Passou o primeiro envelope para trás, e repetiu o gesto com o segundo, mas parou no terceiro.

A cara era de Londres.

Rasgou o envelope com cuidado e desdobrou o pergaminho.

“Hermione,

Soube recentemente que você retornou para Amsterdam, e por mais complicado que isso possa parecer, não me deixou de maneira alguma mais feliz ou tranquila. Pelo contrário.

Nossa última conversa foi conturbada e me sinto envergonhada pelo modo que agi, ainda que estivesse magoada, foi imaturo da minha parte te acusar de algo que eu sequer entendia direito. E quanto a isso, gostaria que me desculpasse. Presenciar o beijo de vocês despertou algumas coisas ruins e outras boas, infelizmente não pude controlar a velocidade com que eu as recebia e exagerei. Compreendi melhor após levar uma bronca de Rony, foi nesse momento que consegui colocar a cabeça no lugar e entender tudo de uma maneira mais ampla. Com isso percebi que Harry e eu nos separamos, e aceito isso. Quero que ele seja feliz e é isso que importa! Infelizmente levei tempo demais para ter essa conversa com você e esclarecer as coisas, por isso resolvi escrever essa carta.

Ainda é difícil imaginá-los juntos, acho que nossa história complica um pouco as coisas e acredito que você concorde comigo. Ainda estou superando o modo que as coisas aconteceram, mas já consigo aceitar que Harry seguiu em frente e estava feliz. E eu fico feliz que seja com você!

Como disse, ainda é difícil vê-los juntos, mas tampouco espero que vocês se separem por minha causa. Agora percebo que posso tê-la influenciado na decisão, e não quero ser esse tipo de pessoa. Vocês devem ser felizes se assim desejarem! E, se fui eu a causa do seu retorno, espero que reconsidere.

Sinceramente,

Gina Weasley.”

Deixou o pergaminho sobre a mesa e passou a mão no rosto, tentando digerir as palavras uma a uma. Temeu por tanto tempo que sua relação com Harry fosse exposta e magoasse as pessoas que amava, e agora Gina praticamente estava lhe dando a carta branca. A situação era confusa.

Mas diferente do que imaginou não sentiu-se mais aliviada ou tranquila em relação aquilo, já não precisava daquilo. Demorou tempo demais para perceber, mas era verdade. Jamais devia ter esperado a aprovação de ninguém, seu relacionamento não tinha de passar pelas permissões de seus amigos.

Gina tinha razão quanto a história deles tornar as coisas mais complicadas, mas ainda assim, era livre para amar e ficar com quem bem entendesse. Com o tempo tudo se ajeitaria, mas para isso, tinha de dar o primeiro passo.

E era exatamente o que estava fazendo naquele momento.

Aparatou em frente ao largo a respirou fundo. Não havia mais volta, mesmo se quisesse.

Mas não queria!

Atravessou a rua em poucos passos e parou em frente a porta, levantou o punho fechado com mais firmeza do que acredita ser capaz e bateu apenas uma vez. A porta se abriu no segundo em seu se preparava para dar a segunda batida, o que lhe fez empertigar as costas bruscamente. Como se tivesse levado um susto.

— Hermione?

— Harry!

Ele ainda segurava a maçaneta da porta, não havia movido um músculo desde que percebera sua presença. Parecia atônito. Mas Hermione aproveitou para observá-lo com atenção, dos cabelos bagunçados até a outra mão que segurava uma mala com as iniciais H.P em dourado.

— Vai viajar? — Perguntou quando o silêncio se tornou desagradável.

Harry olhou para a mala, dando-se conta do que fazia antes de vê-la.

— Sim.

A falta de detalhes fez com que Hermione tentasse manter o diálogo, ainda que bastante desconfortável.

— É alguma missão? — Harry negou com a cabeça em resposta. — Então para onde está indo?

Pareceu sair do torpor e abriu um breve sorriso.

— Amsterdam.

Surpresa com a resposta, baixou o olhar por um milésimo de segundos e sorriu.

— O que está fazendo aqui, Hermione? — Aproximou-se um passo e cruzou os braços sobre o peito.

— Eu estava errada!

Harry produziu um assovio.

— Nunca pensei que a ouviria dizer isso. — Hermione revirou os olhos. — Mas continue, por favor!

— Eu estava errada quando voltei para Amsterdam, tratei a situação como se não houvesse escolha quando na verdade eu tinha. — Começou com calma, já havia ensaiado aquele momento várias vezes desde que tomara sua decisão. — Percebi, talvez tarde demais, que meu lugar é aqui em Londres com você. Então, se não for...

Antes que terminasse a frase Harry a puxou e beijou-a com carinho, como se estivesse querendo eliminar toda a saudade que sentira através do gesto delicado. Compartilharam um mesmo sorriso quando se separaram.

— Você estava mesmo indo para Amsterdam? — Harry assentiu. — O que faria quando chegasse lá?

— Daria um jeito de fazê-la me aceitar!

— Esse era seu plano? — Afastou-se apenas o necessário para poder olhá-lo nos olhos.

— Não julgue o plano, não pude colocá-lo em prática para ver a funcionalidade real. — Apertou-a um pouco mais em seus braços e selou seus lábios rapidamente. — Mas me diga você, teria funcionado?

— Com certeza!

 Abraçou-a apertado.

— Sabe, eu passei alguns dias ensaiando o que faria para te conquistar, o que acha de eu te mostrar? — Sugeriu com um sorriso de lado.

— Claro, será ótimo!

Com os dedos entrelaçados puxou-a para dentro do Largo.

— Então me acompanhe até o quarto, por favor.