— ... Não é nada.

— Cabeça dura e...

— Molly... louca!

Ouviu vozes, mas estavam distantes e baixas demais para que se preocupasse com o que diziam, além do mais, a mão que acariciava seu ombro parecia cooperar para que continuasse dormindo. Piscou uma vez e percebeu, as vozes que falavam agora riam de algo, e estavam muito mais próximas do que pensara. Lentamente, abriu os olhos e focou nos dois ruivos que a observavam, tinham sorrisos bastante zombeteiros no rosto.

— Dia, dorminhoca!

Resmungou um palavrão e então sentou-se desconcertada. O casaco que a cobria caiu sobre seus pés onde notou a insígnia gravada antes de pegá-lo.

— Estava frio. — Harry explicou-se e levantou-se para vestir seu sobretudo. Sorriu agradecida.

— Como está Hermione? — Um dos gêmeos perguntou enquanto esticava as costas e sentia suas vértebras voltando ao lugar com estalos baixos.

— Bem.

— E então, quando poderemos ver Roniquinho?

— Preciso confirmar com o médico dele. — Explicou, tentando alisar o jaleco amassado que serviu de travesseiro. — Se me derem um instante.

Afastou-se em direção ao consultório de Draco, mas encontrou-o entrando no elevador. Segurava dois grandes copos de café, e entregou-lhe um deles, como se soubesse que precisaria da bebida forte.

— Escute. — Segurou-a por um momento. — Ontem te coloquei sob pressão, precisava ver se conseguia separar as coisas. Me desculpe por isso.

— Eu entendo, não se preocupe.

— Hoje quero que você o examine, vou apenas observar. Acha que consegue?

— É mais um teste? — O encarou esperando por uma resposta sincera.

— Consegue ou não?

Baixou o olhar e suspirou frustrada, não era a resposta que esperava e sabia que não conseguiria tirar mais nada de Draco. Virou-se e empertigou as costas, dirigindo-se para o quarto de Rony.

— Irei examiná-lo e assim que possível libero para visita. — Foi tudo o que disse à Harry, Fred e George.

Entrou no quarto e fechou a porta, adotando uma postura mais severa e profissional.

Rony continuava deitado e adormecido, a pele bastante pálida acentuava as sardas espalhadas por todo o rosto e tórax, este, coberto por algumas faixas que cobriam seus ferimentos. Respirou fundo e se preparou para começar o serviço.

Analisava a cicatrização dos braços quando sentiu um olhar firme em seu rosto. Empertigou-se e sorriu ao ver os olhos azuis de Rony a observando.

— Você se parece muito com uma amiga minha.

— Verdade?

Enquanto ele a observava continuou os exames, medindo os batimentos, aferindo a pressão e verificando seus reflexos. Draco no canto do quarto analisava minuciosamente cada movimento, procurando algum erro ou hesitação, mas Hermione era ótima naquilo que fazia. Precisa e objetiva, movia-se com firmeza e não perdia tempo em procedimentos desnecessários.

— Hermione é você?

Sorriu e afastou-se um pouco.

— Pensei que havia algo de errado com a sua cabeça! — Ajudou-o a ajeitar-se, sentando-o na maca. — Como se sente?

— Um pouco tonto, dolorido e com fome.

Assentiu e sorriu, Rony estava bem.

— Seu café da manhã deve chegar logo, Weasley. — Draco aproximou-se de Hermione e indicou o lado de fora do quarto.

Não entendia o que estava acontecendo e apenas esperou em silêncio enquanto Draco dava às instruções aos gêmeos e Harry.

— O paciente acabou de acordar. Podem entrar, mas sem pressioná-lo ou agitá-lo demais.

Sequer deu tempo de qualquer questionamento, apenas tocou a base da cintura de Hermione e levou-a alguns passos mais adiante no corredor.

— Você assina o prontuário dele, anote todas as suas observações de agora e dos próximos exames antes de liberá-lo.

— Sou residente, não posso assinar prontuários e muito menos dar alta aos pacientes! — Lembrou-o como se estivesse lendo um livro de regras.

Abriu um sorriso que deixou-a confusa o suficiente para trancar a respiração. Ainda não fazia ideia do que estava acontecendo, mas confiava em Draco.

— Ontem à noite conversei com seus orientadores e eles concordaram que você está apta a atender emergências básicas e fazer cuidar das consultas clínicas. — Explicou com calma, era uma boa notícia. — O Weasley é seu primeiro paciente, então sim, você pode preencher o prontuário e liberá-lo quando bem entender.

Levou alguns segundos para digerir as palavras de Draco, mas quando as compreendeu, abraçou-o animada.

— Por quê? Quando? Eu... — Não conseguia formular uma frase, a excitação vibrava.

— Você estava um pouco acima da média e o hospital precisa de pessoal na emergência, pensei que seria interessante ter uma conversa com os orientadores do programa. — Dizia com bastante naturalidade, mas Hermione sabia que convencê-los deve ter sido bastante complicado. — Mostrei os cursos de que você fez comigo na época em que estava estudando e isso fez você pular metade de residência. Claro que você não tem permissão para fazer cirurgias sozinha, nessa área ainda será minha assistente. Mas já é mais independente que toda a sua turma!

— Você é incrível, sabia?

— É óbvio! — Sorriu lateralmente. — Vá cuidar do seu paciente, Dra. Granger.

Satisfeita com seu novo título e com um sorriso abobalhado no rosto, fez o caminho de volta e entrou no quarto. Mas seu sorriso sumiu ao ver os gêmeos enrolando bandagens na cabeça de Rony. O quarto ficou em silêncio e os homens imóveis, como se daquela forma Hermione não fosse capaz de enxerga-los.

— Eu fico fora por cinco minutos e vocês transformam meu paciente numa múmia? — Colocou as mãos na cintura da mesma forma que Molly fazia quando queria dar uma bronca nos filhos.

Harry soltou o ar e afastou-se da cama quando Hermione passou para tirar o rolo de bandagens das mãos de Fred para só então desenrolar o amigo. Os gêmeos riam baixinho no canto do quarto.

— O que Draco queria? — Harry cortou o silêncio e parou do outro lado da maca, para que pudesse observá-la melhor.

— Digamos que Rony ter explodido me rendeu um novo título e ele queria me contar. — Disse tentando controlar a felicidade, mas sentia-se transbordando. — Agora sou Dra. Granger!

— Você terminou a residência? — Rony perguntou virando o rosto para olhá-la, uma tira larga ainda cobria seu olho esquerdo.

— Ainda não. Tenho autonomia na emergência e atendimentos, mas nas cirurgias ainda estou atrelada aos comandos de Draco. — Explicou-se. — Você é meu primeiro paciente!

— Fico feliz que ter explodido tenha te ajudado, de alguma maneira!

Os três riram e Hermione enfim terminou de desenrolá-lo.

— Acho que devemos comemorar! — O ruivo disse, já pronto para sair andando. Mas Hermione o impediu. — Depois que você me der alta, é claro!

— Claro!