KAREN

Karen observava Gadise lavar suavemente os cabelos escuros de Kassaia.Era hoje,o dia em que ela teria sua grande noite com Asher,estranhamene sua amiga não parecia nervosa.Amitis também observava a filha naquele estado tão calmo e controlado,admirada com tamanha frieza;Sammu-Ramat,por outro lado,parecia preocupada com a falta de reação da princesa.

"Kassaia,minha querida,não quer mesmo tomar a infusão de ervas que Mesaque preparou para você?",perguntou sua mãe,a rainha Amitis.Mas a mulher simplesmente sorriu,um sorriso alucinante.

"Não se preocupe,mãe,cumprirei com meu papel de princesa.Não desapontarei a senhora e meu pai.",respondeu mas Karen pôde ver o resquício de dúvida em sua voz.Tocou o ombro da irmã de criação com delicadeza,mas antes que pudesse dizer algo,a porta do harém se abriu revelando Rabe-Sáris com o semblante fechado de sempre.Uma reverência para as mulheres reais,enquanto Amitis autorizava sua entrada.

"Soberana,lamento interromper,mas o Rei pede a presença da princesa Kassandra agora.Devo levá-la até a Sala do Trono.",disse e a rainha autorizou a filha ir com o oficial.Todavia,Karen estava temerosa de que aquilo pudesse ser mais uma armadilha de Nebuzaradã para tê-la;mas Rabe-Sáris levou-a realmente a Sala do Trono e ordenou que as portas fossem abertas,revelando Nabucodonosor sentado imperiosamente no lugar que lhe pertencia.

"Soberano,a princesa Kassandra.",disse e saiu rapidamente,fechando as portas em seguida,deixando Karen e Nabucodonosor frente a frente.

"Aproxime-se,Kassandra.",disse o Rei e a jovem caminhou até estar próxima o bastante para poder falar normalmente com o soberano.

"O que o Rei deseja falar comigo?Algum erro que cometi?",perguntou pois Nabucodonosor não chamava sua presença há cerca de dois anos,exceto em reuniões com conselheiros.Mesmo que muitos não concordassem,sua presença era vital naqueles momentos.O Rei se ergueu do trono e desceu até onde se encontrava a jovem,o rosto voltado para o chão em uma reverência.

"Apenas quis ver se estava bem,Kassandra.Sabe,com tudo o que aconteceu nesses últimos dias,fiquei receoso de que algo lhe acontecesse.Preocupação de pai.",disse surpreendendo a princesa.Nunca,em sua vida em Judá,seu pai dera sequer atenção para se ela estava bem ou não.Eliaquim era o pai mais ausente de todo a Judá,e apenas para ela,pois com Joaquim e Issa ele sempre se preocupava.Antes de entender sua missão como profeta do Senhor,Karen chorava muito por não ter o carinho do pai mas depois que Deus se comunicara com ela,toda a consideração por Eliaquim caíra por terra.

E Nabucodonosor sempre se preocupara com ela,mesmo quando não havia muito que pudesse fazer,como quando suas regras começaram,um problema estritamente feminino.Ou quando percebeu que,mesmo que Nitócris a desprezasse por não ser legítima,Belsazar era grudado com Karen.Sentia como se aquela realmente fosse sua família,Amitis sempre fora sua mãe desde que chegara.

"O Soberano não precisa se preocupar,nada de mal me acontecerá.",respondeu e logo foi liberada para voltar ao harém.Porém,quando chegou ao corredor,sentiu uma vertigem e o mundo girou violentamente.Viu-se em uma cela de prisão,e havia ratos por toda a volta mordendo seu vestido e seu corpo pouco a pouco.

Recobrou a consciência,estava sentada no chão com as mãos fechadas em punho.Mais uma profecia.

Ao longe,viu sua mãe Neusta parada,observando-a atentamente.Desde que o Cativeiro da Babilônia,que Karen e Jeremias tentaram alertar para não acontecer,iniciara que as duas nunca mais tinham se falado.Amitis fazia marcação pesada para impedir,pelo menos nos primeiros anos para garantir que Karen se acostumasse logo com a nova vida.Mas agora,via o olhar de nojo que Neusta ostentava apenas para servos direcionado a ela.

"Não imagina o quanto eu esperei por esse dia.O quanto eu quis reencontrar você,filhinha.Você é a causadora de tudo isso,nossa ruína,a morte do seu pai eu sei que foi você,assassina.Espero que você sofra muito,como agora.",disse em tom acusador mas Karen decidiu não dizer nada,passando em silêncio pela mãe.

Não,Neusta nunca foi sua mãe,da mesma forma que Eliaquim nunca fora seu pai.A única pessoa daquela família que poderia realmente considerar era Joaquim,que mudara da água para o vinho depois de perceber que a irmã sempre esteve certa.

JOANA

Joana parecia estar nas nuvens.Desde que descobrira que Asher estava vivo e que Karen planejava libertá-lo da escravidão,ansiava pelo momento em que se reencontrariam.Era um amor de infância,e nunca seria apagado.

Dana e Rebeca entraram em seu quarto,parecendo contentes em vê-la daquele jeito,cantarolando baixinho as mais belas e antigas cantigas hebreias.Joana era realmente uma mulher de fé,um exemplo a seguir.

"Ei Joana,nós vamos fazer um bolo,gostaria de ajudar?Sabe,de nós três,você é a melhor cozinheira.",disse Rebeca atraindo a atenção da amiga.

"Claro,mas não diga isso.Nenhum dos bolos que eu faço chegam perto da sua torta salgada,Rebeca.",disse sorrindo e logo foram para a cozinha onde,entre risos e conversa,prepararam massa suficiente para quatro bolos.

"Absalom não se meteu mais com você,Dana?",perguntou Joana,lembrando do irmão agressivo de Zac.A outra simplesmente negou com a cabeça.

"Não,desde que você falou com ele,Joana,Absalom nem chega perto de mim.",disse enquanto Rebeca acendia o fogo para assarem os bolos e bolinhos que fizeram.

E Joana ainda pensava em Asher,como ele estaria.

ASHER

Asher estava nervoso.Seria hoje que teria a tal tarefa a cumprir no palácio,por isso tão logo a tarde chegara Larsa o levara até o palácio,onde Darice esperava.A serva de Sammu-Ramat trazia roupas de linho para o escravo vestir e pediu ao feito que os deixasse a sós.

"Está bem.Comporte-se,escravo.",disse lançando um olhar de repreensão a Asher.

"Que tarefa é essa,a senhora pode me dizer?",perguntou inutilmente,ela não diria nada.E realmente Darice apenas o arrumou para de noite,uma tarefa especial ouvira a mesma sussurrar com outra serva o aguardava.

Pensou em fugir daquilo,mas então lembrou-se que Larsa tinha uma mão pesada e pronta para castigar os escravos.Não poderia,mesmo que a chance aparecesse em sua frente.

Sendo assim,o negócio era esperar e ver o que aconteceria.

NITÓCRIS

Nitócris procurava a irmã adotiva para cuidar de seu filho de quatro anos.Nem mesmo ela ou Nabonido acalmavam o pequeno príncipe que chorava a plenos pulmões.Por hora,havia deixado que Nanmu cuidasse dele mas logo voltaria a chorar,e apenas Kassandra acalmava esses momentos de Belsazar.

Encontrou-a indo em direção ao harém,gritou para que parasse e então correu até ela,as lágrimas novamente em seu rosto belo e austero.

"Kassandra,por favor,Belsazar não para de chorar.Tem que acalmá-lo.",disse e a outra rapidamente foi em direção aos aposentos de Nitócris.Chegando lá,Belsazar realmente voltara a chorar mas ao ver Karen à porta,começara a se acalmar.

"Oi meu amigo Belsazar,por quê está assim?Conta pra tia agora,o que aflige seu coraçãozinho.",disse imitando voz de bebê para falar com o pequeno que,sorria abertamente para a jovem.Depois de um tempo,Belsazar dormiu e Karen colocou-o na cama,saindo em seguida.Nitócris deitou-se ao lado do filho chorando,pensando que até ele preferia Kassandra a ela.

BENJAMIN

Tiro era uma cidade bonita.As construções lembravam um pouco Jerusalém,mas Benjamin não pôde ver muita coisa,pois Sanoto o puxava com força para a rua do comércio.Onde ali,seria só mais uma mercadoria.

Entre os compradores,Benjamin viu uma velha mulher em trajes de luxo que olhava diretamente para ele.E sem mais demora,comprou-o por quinhentas moedas de prata,Sanoto entregou-o feliz da vida com o dinheiro ganho.

"Qual seu nome,rapaz?Se tiver um,é claro.",perguntou a mulher ao chegarem em sua casa,enorme e bem mobiliada,Benjamin ainda estava cansado da viagem de três dias até Tiro.

"Benjamin."

"Muito prazer,Benjamin.Eu sou Lúcia,sua senhora a partir de agora.",disse e então levou-o até um dos quartos de escravos.Só havia mais uma,uma menina de oito ou nove anos que olhou Benjamin de forma intrigada.

"Senhora Lúcia,comprou mais um escravo?",disse com voz tímida mas Lúcia saiu sem dizer nada.

"Ela é sempre assim?",perguntou Benjamin em voz baixa.

"Só quando está brava com algum dos filhos,fora isso ela é um amor de pessoa.A propósito,meu nome é  Kiara e o seu?",disse estendendo a mão e Benjamin apertou-a.

"Benjamin.Muito prazer Kiara,acho que seremos bons amigos.",disse e então Kiara relatou como era a vida na casa de Lúcia,uma viúva rica que tinha dois filhos,Hiro e Mayumi.Ambos eram muito irresponsáveis,por isso irritavam a mãe profundamente.

Benjamin,por sua vez,contou-lhe que era hebreu de Judá e fora ali por engano,quando tentava ir para a Babilônia atrás do irmão mais velho.Relatou sobre Karen também,ao perceber que apesar da pouca idade que tinha,Kiara era de confiança.

KASSAIA

O pior dia de sua vida,Kassaia admitiu para si mesma quando se olhou no espelho antes de ser levada para seu quarto esperar o escravo que se deitaria consigo naquela noite.Mentira descaradamente para todos que se aproximaram dela,fingindo uma confiança que não possuía.

Agora,sentada na cama com um véu cobrindo-lhe o rosto para que o escravo não a reconhecesse,sentia vontade de chorar.Ouvia a conversa de Sammu-Ramat com o mesmo na porta de seus aposentos.Kassaia admitiu,era um belo homem,mas não como seu marido,quem ela aprendera a amar nesses anos casada.

Quando ficaram a sós,pôde ver a tensão no rosto do escravo,que correu até uma janela para fugir daquilo tudo.Percebendo que  não poderia permitir,Kassaia chamou-o.

"Por favor,não vá.Eu preciso disso.",disse com súplica na voz e então o homem se aproximou dela com tristeza no olhar também.

"Eu não poderei fazer isso,mesmo que a senhorita não fosse sacerdotisa.É contra as leis do Deus de meu povo.",disse e Kassaia se impressionou com a forma como falava de seu povo.Lembrava Karen,Daniel,Sadraque,Mesaque e Abdenego.

"Qual seu nome?",perguntou enquanto o homem sentava-se à sua frente na cama,olhando para o rosto encoberto.

"Asher e sei que não devo saber qual i seu,pois me..."

"Kassaia.",interrompeu e então começaram a conversar,descobriu que Asher era amigo de Karen e a irmã sempre o visitava,o que a fez lembrar do dia em que a vira fugir.

Asher contou-lhe sobre sua família que morrera num incêndio horrível,como perdera a mulher que amava quando se tornara escravo,a briga com seu melhor amigo pelo amor de Joana e praticamente toda sua vida,criando uma forte amizade com a princesa caldeia.E assim foi,o que era pra ter sido uma noite de pecados,mais pura do que qualquer noite.