A Dama do Coração Partido escrita por Claen


Capítulo 21
A Presa Cai na Armadilha




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Eu ainda estava ponderando todas as recentes revelações de Holmes, quando desembarcamos na gelada Bedford. Dessa vez não havia ninguém nos aguardando, até porque, a ideia era justamente não chamarmos atenção. Andamos tranquilamente até a delegacia sem atrair nenhum olhar curioso em nossa direção. Só não posso afirmar se tinha sido pela qualidade de nossos disfarces ou pela escassez de pessoas nas ruas devido ao frio congelante que fazia.

Enquanto caminhávamos, usei a incontestável ausência de pedestres ao meu favor e consegui dissuadir Holmes do terrível e totalmente desnecessário uso do tal carrinho de mão com lenha.  Se às 13h30 não havia quase ninguém transitando, quem diria mais tarde. Não precisávamos provar que éramos entregadores, simplesmente pelo fato de que não haveria ninguém nas ruas para nos ver! Graças ao bom Deus, dessa vez, ele me deu razão.

Quando chegamos à delegacia, George Haylock, quase não nos reconheceu. O jovem Inspetor estava boquiaberto com a transformação de Holmes e finalmente tinha entendido o pedido estranho que envolvia lenha e o famigerado carrinho de mão. No entanto, logo depois ficou desapontado em saber que tínhamos desistido justamente daquela parte do plano, e ele tinha passado metade de seu horário de almoço cortando lenha à toa. Contudo, seu desapontamento durou pouco.

Assim que entramos em sua sala, Holmes contou-lhe o que planejámos fazer naquela noite e o rapaz animou-se quando dissemos que precisaríamos de sua ajuda. Meu colega não lhe disse tudo o que havia me confidenciado no caminho, mas foi só ele dizer que o caso Edwards se encerraria naquela mesma noite, que Haylock colocou-se prontamente a nossa disposição.

— Eu não perderia isso por nada! – exclamou o Inspetor animadamente.

— Então sugiro que troque de roupa, porque não quero que nosso suspeito fuja ao ver um policial rondando a casa.

— Sem problemas. Em 20 minutos eu resolvo isso.

— Certo, mas não precisa se apressar. Ainda temos tempo para isso. – disse Holmes, acalmando-o de seu ímpeto - Agora, conte-me como vai a outra parte do plano. Os alvos estão sendo vigiados?

— Sim, senhor. Eles saíram apressados há cerca de 10 minutos e confirmamos que foram para a casa dos Edwards. Já o outro suspeito, não conseguimos encontrar em lugar nenhum. Mesmo com a sua descrição, não sabemos onde poderia estar. Se está aqui na cidade, está bem escondido e não saiu para nada.

— Imaginei que esse não seria um alvo fácil. Mas não importa, porque é justamente por ele que voltamos aqui e garanto que o encontraremos próximo a casa assim que anoitecer. Vamos pegá-lo com a mão na massa! – respondeu Holmes animadamente esfregando as mãos - E o problema com nosso transporte, o senhor conseguiu solucionar, Inspetor?

— Sim. O Sr. Jones, que é o entregador de leite, tem uma carroça grande e vai para aquele lado da cidade. Ele aceitou nos levar escondidos até próximo a casa.

— Perfeito! Assim que chegarmos perto, seguiremos o resto do caminho a pé, para não chamarmos a atenção.

O tempo passou rápido enquanto alinhávamos os últimos detalhes do plano e colocávamos Haylock a par de tudo o que tinha acontecido em Londres naquela manhã. Quando nos demos conta, já eram quase 16 horas e uma verdadeira nevasca tinha tomado conta da cidade. O vento soprava gelado, quando o jovem inspetor foi se aprontar. Ele morava bem próximo à delegacia e como havia prometido, em 20 minutos estava de volta, vestido como nós e decidido a fazer o que fosse necessário para pegar o tal suspeito, nem que para isso tivesse que enfrentar uma nevasca.

Por sorte, não precisamos chegar a esse ponto, porque quando saímos da delegacia para dar cabo de nosso plano, a neve já não caía mais, porém uma boa quantidade dela se acumulava pelas ruas. O leiteiro nos aguardava na praça da cidade e assim que subimos em sua carroça, os dois cavalos que a puxavam, começaram a andar lentamente.

Conforme seguíamos por nosso trajeto sacolejante na parte de trás da carroça, junto dos tambores vazios de leite, pude provar que minha dedução anterior estava correta e não encontramos vivalma vagando pelas ruas. O mau tempo tinha feito com que a noite caísse mais cedo e ainda estávamos longe de nosso destino, quando a lua tímida, quase que totalmente encoberta pelas nuvens pesadas, surgiu no céu de Bedford. Os cavalos faziam o que podiam, mas era difícil enfrentar toda aquela neve e eles venciam lentamente os obstáculos.

O relógio marcava 18h30 quando chegamos ao fim da viagem. Agradecemos ao bom leiteiro e aos seus valentes cavalos pela carona. Eles seguiram seu caminho, enquanto nós seguimos o nosso a pé. Se a situação era complicada para os cavalos, imagine para nós. Não havia voltado a nevar, mas a neve acumulada tinha de 30 a 40 centímetros e a cada passo que dávamos, nossos pés afundavam e ficávamos enfiados quase até os joelhos.

Avançávamos lentamente rumo ao nosso objetivo, enquanto mantínhamos nossos olhos e ouvidos atentos. Infelizmente estava escuro e não conseguíamos ver muita coisa. Se houvesse alguém nos observando, dificilmente saberíamos.

Paramos a cerca de 70 metros de distância da casa e nos escondemos em meio às árvores que a cercavam. O plano era ficar lá de tocaia até algo acontecer. Se Holmes estivesse certo, o “fantasma” só apareceria quando tivesse certeza de que todos dormiam, então o jeito era esperar.

Quinze minutos haviam se passado e eu já não sentia mais os meus dedos, nem das mãos nem dos pés, que estavam encharcados e congelando. Acredito que Holmes e Haylock também estivessem na mesma situação, mas pareciam estar aguentando melhor do que eu. Sentei-me num pedaço de tronco caído e tirei minhas botas para ver a situação em que se encontravam meus pés. Acho que foi bom não conseguir ver direito, porque provavelmente estavam horríveis. Como sabia o que iria enfrentar, fui precavido e levei comigo outro par de meias, que me foi muito útil naquela hora. Enquanto eu trocava minhas meias molhadas pelas secas, Holmes e Haylock permaneciam  em pé, vigilantes e atentos a tudo.

A noite já havia caído por completo, quando algo finalmente aconteceu.

Foi Haylock quem notou a presença de alguém próximo ao estábulo. Observamos com mais atenção e vimos que ele tinha razão. Uma figura toda vestida de negro estava parada lá, imóvel, quase imperceptível.

Embora soubéssemos que era apenas uma pessoa, parecia mesmo um ser sobrenatural e o apelido de “fantasma” lhe caía perfeitamente. Aparentemente, ele não tinha a intenção de agir naquele momento. A única coisa que fazia era observar o lugar.

Ainda era cedo e nós não pretendíamos ficar ali, por horas a fio, naquela noite congelante, esperando por algum movimento dele, então, decidimos tomar a iniciativa. Ele jamais conseguiria escapar de nós três.

Separamo-nos e assim que Holmes deu o sinal, seguimos lentamente na direção do “fantasma”. Eu já estava bem perto, quando um maldito galho se partiu sob meus pés e fez um barulho que acabou por alertar nosso alvo. Assim que ouviu o estalo, ele olhou para trás assustado e me viu. Imediatamente começou a correr. Foi para a direita, mas deu de cara com Holmes.

Não tínhamos visto que ele carregava consigo um pedaço de pau e acertou Holmes no braço. Não foi nada grave, mas foi o suficiente para desequilibrá-lo e levá-lo ao chão. Cheguei perto novamente e tentou me acertar também, mas consegui me desviar. Enquanto estava distraído com Holmes e comigo, não percebeu que Haylock se aproximava por trás dele. O jovem policial era forte e conseguiu desarmá-lo de seu porrete improvisado e imobiliza-lo até irmos ao seu encontro, mas o homem de negro ainda tentava se desvencilhar e continuava se debatendo como um peixe no anzol.

— Acalme-se, rapaz. – disse Holmes, tentando dissuadir nosso prisioneiro - Não vamos te machucar. Só queremos acabar com isso de uma vez por todas e acho que você também quer.

Ao ouvir as palavras de Holmes, ele finalmente desistiu de tentar se livrar de Haylock. Já mais calmo, pudemos ouvir sua voz pela primeira vez.

— O senhor é Sherlock Holmes? – foram suas palavras, quando olhou para meu colega mais atentamente. Parece que os disfarces não estavam tão bons assim.

— Eu mesmo. – respondeu Holmes tirando o bigode falso e a peruca loira – Não te disse que ele nos conhecia, Watson?

— De fato. E então, é ele mesmo, Holmes? – perguntei curioso.

— Não tenho dúvidas!

— Quem é, Sr. Holmes? – indagou Haylock, ainda sem saber de quem se tratava exatamente.

— Vamos levá-lo para dentro e lá esclareceremos todas as suas dúvidas, Inspetor Haylock. Estão nos esperando.  Já pode soltá-lo.

O policial obedeceu e soltou os braços do homem de negro.

— O senhor não vai tentar fugir, não é, Dr. Edwards?


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Notas finais do capítulo

Obrigada por acompanhar a história! Gostaria de saber a opinião de vocês e se estão gostando. Seus comentários serão sempre muito bem-vindos.



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