That Kiss escrita por Ellen Freitas


Capítulo 2
After That Kiss || Oliver


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas!!
Olha só quem voltou!! Fiquei tão feliz com a recepção de vocês para minha fofinha e simples história. Quem não ama um clichê que atire a primeira pedra!!
E mal chegamos, já estamos indo embora.
Algumas de vocês me perguntaram sobre alguns comportamentos "questionáveis" de Oliver e Felicity. esperem ver mais disso. Eles ainda são adolescentes em parte dessa história, tomam decisões ruins, mas são boas pessoas, confiem em mim.
Mas chega de enrolar por aqui... Boa leitura e até as notas finais. Bjs*



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2012

Segurei a buzina com força pelo que pareceu ser a milésima vez na frente da casa de Felicity.

Eu estava preocupado, ela não havia atendido nenhuma de minhas ligações durante todo o fim de semana, mas achei mesmo que ela não quebraria uma tradição de anos. Desde que nos tornamos amigos eu sempre a buscava em dia de prova para revisar a matéria no carro. Podia estar chovendo as drogas de uns canivetes, mas sempre fazíamos isso. Mas, pelo jeito, hoje não.

Eu realmente havia ferrado com tudo.

― Bom dia, querido ― Donna cumprimentou com um sorriso gentil ao abrir a porta, quando desisti de esperar atrás do volante e toquei a campainha. Ela parecia já estar de saída, com seu uniforme de garçonete do Billy Belly Burguer.

― A Lis? ― perguntei, mas Donna franziu o cenho.

― Ela já foi, faz um tempo. ― Meus ombros caíram, e eu, que quase quicava no meu lugar de ansiedade, congelei.

― Já foi?

― Tomou banho muito cedo e saiu, parecendo que ia me tirar da forca! Vocês tinham combinado algo?

― Não. ― Na verdade, não havíamos combinado, mas você não precisa combinar eventos que já viraram tradição, certo?! Ninguém avisa a ninguém o dia do Natal! ― Obrigado, Donna. Precisa de carona?

― Não, obrigada, menino bonito. Como minha filha consegue ser só sua amiga? ― Sorri amarelo, antes de acenar uma despedida.

Corri de volta para o carro, indo a toda velocidade para o colégio. Se Felicity achava que ia escapar de uma conversa, estava muito enganada. Tudo bem que já tínhamos conversado na sexta à noite, mas agora ela estava claramente me ignorando.

Não, não! Não ia acontecer!

― Cara, estive pensando em uma coisa. ― Tommy passou o braço por meus ombros logo que passei pelo portão principal, começando a caminhar ao meu lado. ― Ainda não me convenci com aquele beijinho mixuruca que você e Felicity deram na festa. Podemos tentar de novo, uma Pool Party, o que acha? ― Ele abriu aquele sorriso de quando acha que teve um plano brilhante. Como me fazer beijar Felicity e acabar com nossa amizade.

― Tommy, agora não. ― O dispensei com um gesto de mão, passando a andar mais rápido e me afastando dele.

― Eita, deu carrapato na cama, foi? ― Como sempre, ele não calou a boca e continuou a me seguir, mesmo que eu o tenha ignorado durante esses dois dias.

― Você viu Felicity? ― perguntei olhando ao redor. Já que decidiu ser minha sombra, pelo menos que servisse para algo.

― Opa, quer dizer que Olicity ainda não é carta fora do baralho? ― questionou animado.

― Viu ou não, imbecil?! ― Minha paciência, que estava em suas últimas horas, acabou de vez.

― Calma, tá nervoso, bebê?! ― Ele provavelmente deve ter visto minha cara ficar vermelha, já que desmanchou o sorriso, assumindo uma feição tensa. ― Sara me mandou mensagem da biblioteca, Felicity estava por lá, acho que revisando a matéria com algumas pessoas da turma.

― Por que ela não me disse? Fiquei igual idiota buzinando na porta da casa dela!

― Não disse? ― Franziu o cenho, sem parecer entender. ― Felicity mandou mensagem até pra mim, e ela sabe que não gosto de estudar em véspera... Ou em qualquer momento, na real.

Ele ainda tagarelava, mas eu já rumava quase cegamente ao meu destino. Ao chegar lá, Felicity tinha simplesmente montado um grupo de estudo, de no mínimo quinze pessoas, para quem ela repassava a matéria de química da prova de mais tarde. Ao que parece, minha professora particular agora comandava aulas de reforço pra geral.

― Ei! ― Eu até planejava falar baixo e com delicadeza, mas acabei gritando e atraindo a atenção de todos do grupo, mais de alguns alunos que estudavam isolados por ali.

― Queen, chega mais! ― Foi Sara que me chamou, já que Felicity se ocupava de olhar para qualquer lugar, menos pra mim.

― Lis, posso falar com você um segundo?

― Estou ocupada, Oliver ― justificou ainda sem me olhar, pegando uma folha de papel que um aluno lhe entregava com algum cálculo. ― Quase, Phill, só acerta a massa atômica no início da questão e estará perfeito.

― Ela já volta, galera!

Segurei a cintura de Felicity e comecei a praticamente a arrastar para fora dali, sob os protestos de todos que estavam se aproveitando das aulas, e mais Tommy, que por algum motivo era o que vaiava mais alto. Quê? Ele nem estava ali estudando!

― Tá, me solta! ― Felicity tirou minhas mãos de si, quando chegamos no corredor, cruzando os braços e tomando o máximo de distância possível. ― O que você quer?

― Como assim, o que eu quero?

― Você me arrastou pra cá. Diga o que quer antes que eu te deixe falando com as paredes, Oliver!

― Ok, eu já peguei algumas de suas TPMs bem ruins, Lis, mas isso nunca... ― Caminhei ao seu redor com as mãos na cabeça. ― Por que está me ignorando?

― Não estou.

― Tudo bem, então me deixa reformular. Por que não me atendeu no fim de semana, não me avisou que viria mais cedo ao colégio e ainda fez questão de se cercar de uma dezena de pessoas? ― Em nenhum momento ela me olhou, apenas ficou ali de braços cruzados e mastigando os lábios, os olhos ficando vermelhos. Ela iria chorar? Pior, iria chorar por minha culpa? ― Eu estraguei nossa amizade quando te disse aquelas coisas, não foi? ― diminuí meu tom, não queria magoá-la mais.

Suas bochechas enrubesceram adoravelmente e finalmente seus olhos caíram em mim. Grandes, azuis, marejados e brilhantes como duas pedras de safiras recém lapidadas. Como pude não me apaixonar por aqueles olhos antes?

― Me diz o que fazer pra consertar, Felicity, não posso ficar sem você! Não me importo, eu vou ser pra você o que precisar que eu seja.

― Preciso de tempo.

― Tudo bem, tempo. ― Assenti.

― E distância.

― Isso não!

― Me respeita, por favor ― suplicou. Busquei na memória em que momento eu não havia feito isso, quando um detalhe estalou em minha mente.

― Isso foi porque disse que não tinha autocontrole com você? Estava tudo no calor do momento, eu jamais te desrespeitaria, Felicity! Pensei que estávamos bem do modo como fui embora na sexta.

― Oliver, respeita minha decisão ― ela deu ênfase as últimas palavras como se para me explicar do que falava. ― E para de ficar me encostando, você nunca foi disso.

― Então é isso? Seremos estranhos colegas de classe a partir de agora? Se soubesse, não teria...

― Oliver, não vamos começar com isso de novo. Só me deixe ter meu tempo para lidar, assim como você também precisa.

― Eu não preciso ― falei resoluto.

― Precisa sim ― me contradisse. ― Eu vou ficar bem, assim como você.

― Quando?

― Quando ficarmos bem. ― Como assim? Isso lá é resposta?

― Tommy vai desconfiar ― apontei o problema óbvio e imediato. Nossa convivência era tão próxima que ele no mínimo suspeitaria de algo diferente em segundos, se já não suspeitava.

― Manteremos as aparências para ele.

― Isso não, não vou esconder nada dele.

― Você que sabe. ― Deu de ombros, indo em direção aos “seus alunos”.

― Tudo bem ― concordei a contragosto. Girei os calcanhares para também tomar o rumo da sala de aula, eu que não ficaria ali com toda aquela galera assistindo as aulas dela.

― Espera, Ollie! ― Apenas ouvir aquele apelidinho ridículo saindo dos lábios dela, me fizeram voltar para onde ela estava, uma pequena chama aquecendo meu coração. ― Você ainda é meu melhor amigo? ― A pergunta saiu receosa, hesitante até. Como seu eu conseguisse viver sem aquela baixinha.

― Pra sempre, Lis. ― Deixei um beijo em sua testa, me dei esse último luxo antes que ela saísse.

― Sinto que parte da culpa dessa crise é minha. ― Tommy chegou ao meu lado.

― Você estragou mais do que só uma tarde ensolarada perfeita dessa vez, parceiro. ― Ok, não era justo colocar a culpa nele, mas meu amigo precisava aprender a medir consequências, mas honestamente, nem estava com raiva dele de verdade, muito menos de Felicity. A culpa era minha por ter estragado nossa amizade.

Ela pediu distância, daria isso. Pediu tempo, também teria. E eu podia nem ser especialista em amor ou apaixonamento, mas sabia que aquilo não passaria tão rápido.

✨✨✨

Ainda em 2012

Ultimamente, eu odiava aquele tipo de lugar. Mas o pior, é que tinha que fingir que gostava.

Tommy e Sara caminhavam de mãos dadas à minha frente, e pareciam muito animados com todas as luzes cegantes daquela festa. Max Fuller, assim como Tommy, não tinha supervisão alguma dos pais e conseguia fazer de sua casa uma verdadeira boate.

― Uau! ― a exclamação animada veio do meu lado. ― Isso aqui é demais!

Laurel também parecia ser uma daquelas pessoas que amava uma boa festa, o que de certo modo era bom. Eu mesmo tinha que manter minha rotina de festas, então ela seria perfeita para mim. Isso sem falar das longas pernas de modelo, seios fartos e olhos verdes brilhantes. A chegada da irmã de Sara da Europa tinha sido uma boa surpresa.

― Você quer uma bebida? ― Quase tive de gritar para ser ouvido naquela barulheira toda.

― Sim, por favor.

A conversa estava sendo mais agradável do que achei que seria. Tommy não calava a boca sobre como eu estava "um pé no saco desde que havia beijado Felicity", mas surpreendente estava sendo bom conversar com Laurel. Ela era inteligente, viajada e parecia gostar da minha companhia, já que seus flertes eram cada vez menos discretos.

― Então, mandei bem, hein?! ― Tommy começou a me acotovelar, sorrindo como um babaca. ― Gostou da minha cunhadinha?

― Ela é legal. Mas não é...

― Felicity!

― Eu não ia dizer isso ― o corrigi antes que aquele assunto se tornasse maior. ― Laurel não é... Na verdade, acho que não estou a fim de namoro.

― Não, idiota! Felicity. ― Segui para onde seu dedo apontava para vê-la em um dos cantos da enorme sala.

― Mas que diabos... ― murmurei, meus pés indo automaticamente naquela direção, sendo seguido de perto por meu amigo.

Felicity usava um conjunto preto de short e blusa de couro sintético, cabelos soltos e tênis. A roupa era provocação pura, mas o que me fez enxergar vermelho foi o fato dela estar numa pegação bem pesada com Max, o babaca dono da festa. O imbecil mais parecia um polvo, passeando as mãos por todo o corpo dela sem o mínimo pudor ou respeito por estarem em um lugar público.

― Ollie, vai com calm...

― Ei! ― gritei, tirando a mão de Tommy do meu ombro com brusquidão quando ele tentou me parar. ― Larga ela!

― Tá doido, Queen? ― Fuller me enfrentou, colocando Felicity atrás de si. O sorriso solto e olhos vermelhos e meio perdidos me confirmaram que ela já estava meio alta da bebida.

― A garota tá bêbada, Max ― Tommy parou ao meu lado, percebendo o mesmo que eu. ― Nos deixe a levar pra casa sem problemas.

― Eu não vou pra casa, não agora ― Felicity se manifestou, saindo de trás do cara e parando na nossa frente, mãos na cintura e olhos fixos nos meus.

― Vocês ouviram a garota! Circulando. ― Bateu palmas encenadas e eu só queria socá-lo.

― Lis, tem certeza que tá bem? ― Tommy a segurou pelos ombros, atraindo sua atenção.

― Estou sim, Tommy, não tão bêbada como pareço. Se precisar de algo, eu chamo você. ― Doeu, e não vou fingir que não.

― Ótimo. E você, oh idiota! ― Apontou para Max. ― Respeita nossa irmã, ou eu solto a coleira do Oliver e ele quebra tua cara em dois socos! Vem, Ollie!

― Mas...

― Vem! ― Começou a me puxar pelo braço. ― Vamos ficar de olho nela, deixe-a se divertir. Melhor Max que Cooper.

Meus olhos não a perderam mais em momento algum daquela maldita festa. Suspirei de alívio porque ela dispensou o Fuller logo depois que nos afastamos, para logo em seguida sentir minha cabeça prestes a estourar, já que a doida começou a ficar com metade da festa. Não julgo, já que fazia isso constantemente, mas era Felicity!

Eu não entendia o tinha dado nela. Ok, Felicity não era exatamente do tipo puritana, mas ainda nem tinha feito sexo, eu acho. Ela pretendia mesmo fazer isso numa festa imunda dessas?

― Eles são sempre assim? ― Acompanhei o olhar de Laurel, que ia direto para onde as pessoas dançavam, e Sara e Tommy faziam o seu show, porque ali era qualquer coisa, menos dança. Minha acompanhante sorria para a vergonha alheia da irmã, e eu me senti culpado por não estar dedicando a mínima atenção a ela, ou a todo o falatório sobre advocacia, faculdade e carreira.

Concentre-se, Queen!

― Tommy encontrou em Sara alguém tão doida quanto ele. ― Não pude evitar sorrir quando a coisa de apenas balançar os braços como Chandler Bing virou a coreografia de Dirty Dancing, mesmo que a música nada tivesse a ver com aquilo.

― Ah, eu preciso filmar isso!

Enquanto Laurel se ocupava em gravar a pagação de mico, voltei à minha função de vigiar Felicity. Meu estômago afundou quando ela não estava mais onde a havia visto pela última vez, para logo em seguida ouvir a gritaria vinda do bar. Era só o que faltava!

― Mas que... Eu já volto ― falei a Laurel, antes de quase correr na direção dos gritos.

Felicity estava deitada no bar com pequenas quantidades de sal no umbigo e limão na boca, desafiando a quem quisesse virar doses de tequila e ganhar seus beijos de recompensa. Uma fila de marmanjos tarados se formava para lamber a barriga dela e chupar o limão de seus lábios. Não, não!

― Agora já chega! ― gritei. ― Você vem comigo, loirinha! E cara, tira a mão da bunda dela, antes que eu quebre seus dedos ― ameacei o imbecil que estava se aproveitando.

― Você é Oliver Queen? ― Felicity perguntou com a voz grogue para mim, logo que a tirei de lá e coloquei no chão, segurando seus ombros.

― Sim, sou eu, Lis.

― Então eu não posso beijar você. ― Ela desabou a cabeça em meu peito.

― O que tá rolando? ― Tommy chegou ao meu lado, seguido pelas irmãs Lance.

― Felicity, olha pra mim. ― Segurei seu rosto perto do meu. Seus olhos estavam vermelhos e mortos, meio desfocados, perdidos até. Aquilo não era só álcool. ― Eles drogaram você, Lis?

― O quê? ― Tommy quase gritou ao meu lado.

― Segura ela. ― Passei o corpo quase desacordado de Felicity para Sara, já entrando em posição de ataque. ― Quem foi o palhaço que colocou algo na bebida dela?

― É melhor alguém dizer, ou vamos quebrar um por um. ― Tommy estalou os dedos das mãos. Digamos que nossa fama de encrenqueiros tinha um fundo de verdade mais real do que admitíamos e aquilo não ia passar barato.

― Não, ninguém? ― perguntei para ninguém específico. ― Melhor ainda. Hora de acabar com essa festa.

Começamos a praticamente destruir o bar, cheio de bebidas que valiam pequenas fortunas, esmurrando quem quer que tentasse impedir.

― Calma, caras! ― Max Fuller saiu de algum buraco, se aproximando apenas o bastante para não ser atingido. ― Ok, vocês provaram um ponto, não vamos mexer com a amiga de vocês, mas eu não sei quem fez isso! Então dá pra parar com o showzinho e irem embora?

― Tommy, acho que ela tá passando mal ― a voz de Sara chamou minha atenção. ― Melhor irmos.

― Na próxima, eu quebro você! Me dá ela. ― Ameacei Max, para logo em seguida colocar Felicity no colo e saímos dali em direção ao estacionamento.

Eu conseguia claramente ouvir os murmúrios de Laurel perguntando à irmã quem era aquela garota e porque eu e Tommy havíamos perdido o controle daquele jeito, ao que ela apenas respondeu que era uma amiga de longa data, quase irmã, que nossa relação era assim e ela devia apenas aceitar.

― Você acha que ela precisa ir a um hospital? ― Tommy perguntou preocupado.

― Pode deixar que eu lido com isso. Pode levar as meninas em casa?

― Claro, sem problemas. ― Assentiu. ― Mais tarde eu ligo pra ter notícias. Vamos, garotas! Tommyzito é só de vocês o resto da noite. ― Ele passou os braços pelos ombros das duas, mas Laurel ainda me olhava parecendo hesitante em apenas ir. Quem poderia culpá-la? ― Relaxa, cunhadinha, ele te liga.

Quando me despedi de Tommy e das meninas e coloquei Felicity no colo novamente, percebi que era a primeira vez que o fazia, e ela era mais leve do que achei.

Não que ela estivesse acima do peso ou coisa assim, todos os treinos a deixaram bem atlética, mas acho que era pelo jeito que a via. Sempre tão forte, determinada e teimosa, ela parecia maior, mas agora, tão frágil e vulnerável em meus braços via como ela era pequena.

― Ei, psiu. ― Estava tão absorto em pensamentos que só percebi que falava comigo quando seus dedos foram pro meu rosto, acariciando com um pouco de indelicadeza meu queixo onde eu estava começando a cultivar uma barba. ― Quem é meu cavaleiro de armadura brilhante? ― Seu sorriso estava bobo e meio flutuante por tudo que ela tinha usado e bebido na noite, mas não deixava de ser lindo.

― Sou eu, Lis, é o Ollie. Você está segura agora.

― Oliver Jonas Queen está me resgatando? ― Seu sorriso ficou maior. Ah, como eu sentia saudades! ― Menino bonito do beijo tão bom. ― Peraí, é isso mesmo? Sua versão bêbada tinha acabado de entregar que ela tinha gostado? O que isso significava?

― Hey, Felicity?! ― O chamado foi em vão, pois ela já dormia. ― Vamos te levar pra casa.

O plano era deixar Felicity aos cuidados da mãe e apenas me certificar mais tarde que ela tinha ficado bem, mas quando cheguei na residência das Smoak, não tinha ninguém em casa. Talvez Donna estivesse pegando os turnos da madrugada na lanchonete 24 horas que trabalhava.

Eu não podia deixar Lis sozinha, não sabia nem o que ela tinha usado ou tomado, vai saber que consequências teriam. E eu bem que conhecia como funcionavam os porres dela, talvez engasgasse no próprio vômito se ficasse sem apoio. Deixá-la agora não era uma opção, e mesmo que nossa relação estivesse uma merda nos últimos meses, ainda era meu dever cuidar dela. E pelo jeito, seria pelo restante da noite.

Apenas o pequeno movimento que ela fez já me colocou desperto de novo. Parecia que eu tinha apenas piscado, e meu pescoço doía pela posição incômoda da poltrona. Ela sorriu de algo que eu não sabia o que era, não saberia dizer se ela ainda estava dormindo ou não, e não seria eu a acordá-la, não depois das últimas horas que tivemos.

Como previ, Felicity passou muito mal a noite toda. Ela não podia beber, porres a faziam vomitar, e isso aconteceu muitas vezes, tanto que resolvi nem subi-la para seu quarto, ficando ali mesmo na sala onde o lavabo era mais próximo.

Felicity se remexeu mais uma vez, parecendo notar pela primeira vez que não estava em sua cama, fazendo uma careta fofa com um incômodo nas costas pela posição.

Caralho, eu estava tão apaixonado que devia ser ridículo de se ver!

― Ai! ― exclamou levando a mão à testa, logo que abriu os olhos, ainda sem me notar ali. ― Merda de ressaca.

― É uma droga mesmo ― falei baixinho para não agredir ainda mais sua dor de cabeça.

― Oliver! ― Ela virou o rosto na minha direção com brusquidão, o que lhe arrancou um gemido. ― Ai, caramba. Dor de cabeça dos infernos.

― Eu vou te conseguir uma aspirina.

Sem demora, fui até a cozinha, peguei dois comprimidos na caixinha de medicamentos e um copo de água. Quando voltei e coloquei as coisas na mesinha à sua frente, Felicity analisava suas roupas, que se limitavam ao meu uniforme do time, que ficava como um vestido nela.

― O que aconteceu noite passada? ― Me olhou desconfiada, as bochechas corando de leve. Franzi o cenho, então arregalei os olhos quando entendi.

Ela não achava que nós...

― Você estava meio mal na festa, eu te trouxe pra casa. Só.

― E isso? ― Apontou para si mesma.

― Você sujou suas roupas. Não quis mexer em suas gavetas para procurar algo, sua mãe não estava em casa e isso era a única coisa limpa no meu carro ― expliquei, mas ela ainda me olhava desconfiada. ― Relaxe, você se trocou sozinha. Demorou longos minutos, achei que tivesse desmaiado de novo no banheiro, mas deu certo. ― Sentei na mesinha à sua frente. ― Como se sente?

― Como se tivesse sido atropelada por todo o time na entrada do vestiário depois de uma final de campeonato ― murmurou massageando as têmporas, para em seguida pegar os comprimidos e os tomar de uma vez.

― Vai melhorar ― falei condescendente, e quando tentei lhe segurar a mão, ela rapidamente a puxou para si.

― Para com isso.

― Desculpa, esqueci as regras. Não encostar. ― Ergui as duas mãos, me afastando dela. ― Você quer algo pra comer, um café pode ajudar.

― Para ― repetiu, soando triste e levemente chateada. ― Para de ser assim.

― Assim como? ― perguntei realmente confuso. ― O que eu fiz de errado?

― Nada, você não fez nada de errado! ― falou mais alto, levantando de seu lugar no sofá e andando pela sala, meus olhos apenas acompanhando aquele rompante sem explicação.

― E então?

― Então você não larga do meu pé. Eu te trato mal, te ignoro, peço pra você mentir por minha causa, fingir uma amizade que não existe mais há meses, beijo na sua frente metade dos seus amigos do time, nosso time, e você ainda está aqui, todo compreensivo se oferecendo para fazer meu café!

― Só estou fazendo o que você pediu, sendo seu amigo, te dando o tempo que precisa! ― também elevei meu tom de voz, não fazendo a mínima ideia para onde aquilo estava indo. ― Como você queria que eu agisse?

― Sei lá, que ficasse pelo menos com raiva! ― gritou, me deixando sozinho na sala e indo até a cozinha. Mais que depressa, me ergui a seguindo. Felicity queria uma discussão, pois tinha acabado de conseguir uma.

― Você acha que eu não sinto isso? Felicity, eu estou com raiva o tempo todo! ― desabafei, indo em sua direção. ― Raiva de fingir que tudo está igual na frente Tommy, quando na verdade essas são as primeiras palavras que trocamos sozinhos em meses! Raiva de levar uma garota incrível pra uma festa e não conseguir desviar os olhos de você durante cada segundo lá. Raiva de não poder encostar em você, de não poder te beijar, bem aqui e agora. ― Ela suspendeu a respiração. ― Você está enganada, Felicity, estou furioso o tempo todo! ― percebi que gritava e que a tinha encurralado contra a ilha da cozinha, quando minha respiração ofegante bateu contra o rosto assustado dela, Felicity se encolhendo diante do meu tamanho. Agora eu a estava intimidando, droga! Respirei fundo controlando meu tom de voz. ― Eu sinto muita raiva, Lis, mas não de você. Eu não consigo sentir nada ruim por você ― confessei, tirando uma mecha de cabelo que teimava em cair em seus olhos.

― Vai embora ― pediu baixinho, olhando por cima do meu ombro para a saída para a sala, parecendo que ia correr a qualquer momento.

― Felicity... Eu te amo, qual a dificuldade de aceitar isso?

― Você não ama, não desse jeito ― me contradisse com a voz chorosa. ― Você só está confuso, transformando um sentimento muito forte de amizade em algo mais, só porque cansou de galinhar e está carente.

― Você não pode afirmar isso com certeza. ― Dei dois passos para longe dela, como se suas últimas palavras tivessem sido socos em meu estômago.

― Sim, eu posso. Qual é, Oliver, diz que "me ama", mas acabou de confessar que não deixa de sair com suas peguetes de sempre. ― Pressionei meus lábios frustrado. Aquilo não era justo, Laurel era a única garota com quem eu havia saído, a primeira vez fora apenas noite passada, e a deixei para atender as necessidades dela.

― Não é justo você dizer isso pra mim ― murmurei entredentes, dando voz aos meus pensamentos.

― Acostume-se, não há justiça alguma entre nós, Queen.

― Finalmente algo em que concordamos. ― Ela abriu a boca para retrucar, quando o barulho da porta da frente sendo aberta chamou nossa atenção.

Felicity, filhinha, cheguei! ― a voz de Donna se manifestou da sala. ― Vou dormir um pouco, convide Oliver para o almoço, vi o carro dele parado lá fora!

― Vá embora ― repetiu para mim, o tom mais incisivo dessa vez.

― Eu vou. ― Dei a volta em meu eixo, me direcionando à saída, então me voltei para ela. ― Só mais uma coisa. Você me queria com raiva de você, parabéns, conseguiu, Felicity. Nada mais de manter as aparências, isso aqui... ― Formei uma linha invisível entre nós dois com o indicador. ― Isso aqui acabou de vez.

✨✨✨

2013

Smokings eram um saco pra fechar às pressas. Tantas camadas de roupas não eram nada funcionais quando se queria ter rapidinhas no armário da limpeza.

― Bom trabalho, senhor rei ― Laurel elogiou, ajustando a saia do seu longo vestido preto.

― Você também, rainha. ― Peguei nossas ridículas coroas de plástico e coloquei a dela em sua cabeça, a fazendo sorrir, enquanto prendia a minha em meu antebraço.

Sim, tínhamos sido eleitos para a idiotice do Rei e Rainha do baile de formatura. Eu não estava dando a mínima para aquilo, mas como parecia importante para minha namorada, aceitei participar, com a esperança de uma recompensa por minha boa vontade. Não fiquei decepcionado.

O som da música ainda estava alto quando saí do armário olhando para os dois lados para não ser pego. Seria nossa última noite juntos como colegas de classe, decidi pular esse último registro em meu histórico.

Mas ouvir a música lenta que tocava ao fundo, me fez ter vontade de uma dança com Felicity. Eu era patético por querer isso depois de tudo que ela havia feito e dito, e com certeza Felicity enfiaria o salto no meu pé ou chutaria minha canela, mas não me impedia de pensar. Ela estava tão linda essa noite.

O vestido vermelho justo até suas coxas marcava suas curvas, estava atraindo atenção demais, inclusive a minha. Ela tinha vindo mesmo sem um acompanhante, e como não nos falamos mais desde a festa de Max Fuller no fim do ano passado, Sara e Tommy estavam encarregados de mantê-la distraída.

Por isso tentei focar minha inteira atenção em Laurel. Fiz toda a frescura com limusine, roupas combinando, corsage, até um torto pedido de namoro a caminho daqui. Felicity havia escolhido me afastar, e eu tinha essa garota incrível que me queria por perto. Ia ficar onde eu era desejado.

― Você está me fazendo muito feliz essa noite, Ollie. Obrigada. ― Laurel ficou na ponta dos pés e selou nossos lábios. O beijo teria ido bem mais longe e talvez até voltássemos para mais uma rodada no armário quando nossos celulares que estavam em meu bolso apitaram ao mesmo tempo anunciando a chegada de uma mensagem.

― Estranho. ― Ela franziu a as sobrancelhas pegando seu aparelho que lhe estendi.

― Mas que merda...

Eram mensagens coletivas, enviadas simultaneamente para todos os alunos do colégio. Na verdade, eram fotos, nudes. Achava essas brincadeiras idiotas, meus colegas de time recebiam punições severas da minha parte quando eu sabia que eles eram culpados. Era imoral, desonesto e babaca quando eles traíam a confiança das meninas que lhe mandavam as fotos.

Já ia procurar o remetente dessa brincadeira sem graça em nosso baile de formatura, quando Laurel chamou minha atenção segurando meu terno.

― É Felicity?

Só então fui olhar as fotos com mais atenção, já que era o rosto da minha amiga ali. O corpo também tinha formas parecidas, mesmo tom de pele, mas não era ela. Com nossas festas na piscina eu já tinha visto bastante para saber, e ela tinha uma marca de nascença no alto da coxa, onde ficavam os nós do biquíni. Não tinha marca ali, o que tinha era uma montagem boa o suficiente pra enganar todo mundo, ainda com a legenda "puta ou sapatão?"

― Não é ela ― comentei quase que para mim mesmo, passando as fotos.

― Como você sabe? ― A voz de Laurel subiu uma oitava. ― Oliver? ― Balancei a cabeça em negativa, não tinha tempo para isso agora.

― Preciso encontrá-la.

Não estávamos muito longe do ginásio onde acontecia o baile, então corri o mais rápido que meus pés permitiram até chegar lá, meus sapatos fazendo um barulho irritante ao frear logo na porta dupla de entrada.

Quando cheguei, o local que estava agitado com pessoas dançando quando saí, estavam uma verdadeira zona de guerra, os gritos da galera se sobressaindo à música, o foco da confusão no meio da pista de dança.

― Ollie, graças a Deus! ― Sara me alcançou primeiro. ― Você precisa tirá-lo de lá, Tommy vai acabar arrumando problemas com a polícia de continuar batendo...

― Batendo em quem? ― A loira me olhou com os ombros encolhidos. ― Em quem, Sara? ― Comecei a andar naquela direção, as pessoas até abriam espaço pela multidão quando ela não me respondia.

― Oliver, se você for ser apenas a gasolina para a fogueira, dê meia volta! ― Ela puxou meu braço, me fazendo parar. ― Onde está minha irmã?

― Tommy está socando quem fez isso com Felicity ― atestei. ― Em quem, Sara?

― Cooper Sheldon. ― Comecei a enxergar vermelho. Aquele moleque ia pagar por ter humilhado Felicity. Aposto que só fazia isso por ter sido rejeitado tantas vezes por ela. ― Não, Oliver, por favor... Vocês vão ficar em sérios problemas, Felicity não seria a favor disso.

― Me solta, Sara ― ordenei, já que ela ainda mantinha a mão firme em meu braço.

Tirei sua mão de mim, mas diminuí o passo. Inspira e respira, Queen, Sara tem razão. Não arrume mais problemas ainda nesse último dia. Quando cheguei ao foco da coisa toda, Tommy estava em cima e batia em Cooper, que sequer conseguia reagir. Fracote.

― Já chega, Tommy! ― Puxei o ombro do meu amigo para trás, o tirando de cima de Cooper e segurando seus braços. Ele me olhou por cima do ombro, parecendo direcionar a raiva para mim por tê-lo parado.

― Você não viu o que ele fez com a Lis? ― retrucou, tentando se soltar.

― Esse bosta não merece que consigamos mais processos! Deixa ele aí.

― Não, eu vou...

― Não vai fazer nada. Essa briga acabou, senhor Merlyn. ― O diretor chegou e ficou entre os dois. ― Agora alguém pode ajudar o senhor Sheldon a achar a enfermaria? Rápido!

Dois garotos se apressaram em erguê-lo do chão, ainda cambaleando, foi quando ele apareceu me notar.

― Oh, o outro chegou. Rei do baile ― impregnou a voz de desdém ao falar o título idiota.

― Cara, fica na sua ― um dos garotos orientou.

― É o último dia, só precisamos falar o que ficou guardado durante esses malditos quatro anos.

― Senhor Sheldon, cale a boca antes que seu histórico piore. Podem levar.

― Todo mundo achava que ela era meio sapatão, mas qual é?! ― Cooper não seguiu os conselhos do diretor e não se calou. ― Eu sei que ela fodia com os dois, talvez até ao mesmo tempo. Por isso não dava pra mais ninguém aqui!

Eu que segurava Tommy, o soltei para avançar na direção do idiota, que foi largado quando os dois caras que o seguravam perceberam minhas intenções, e com apenas um soco o nocauteei.

― Senhor Queen, será punido assim como o senhor Merlyn ― o diretor avisou.

― Não me importo.

Dei as costas para a balbúrdia, puxando o celular do bolso e ligando para Felicity. Eu não a via em lugar algum, e só faziam poucos minutos que a confusão havia estourado. Talvez ainda estivesse por perto.

― Cadê ela? ― perguntei a Tommy, que massageava os dedos.

― Eu sei lá, estava ocupado. Aliás, onde caralhos você tinha se metido?

― Precisamos achá-la.

― O que houve? ― Laurel chegou com Sara, não entendendo nada.

― Esses dois idiotas, que só sabem resolver as coisas nos punhos ― Sara criticou. ― Tiveram sorte de ninguém chamar a polícia.

― Sara, não enche o saco você também ― rebati a crítica irritado. ― Eu vou procurá-la. ― Já estava saindo quando minha namorada segurou minha mão, eu tentando ao máximo resistir ao impulso de soltar instantaneamente. ― O que é?

― Primeiro você reconhece um nude como não sendo sua amiga, então me deixa para correr até aqui e socar um cara, então quer me deixar de novo para correr atrás dela. Qual o seu problema, Oliver? Essa é nossa noite, tínhamos planos!

― Podemos falar disso depois? Eu tenho que ir...

― Correr para uma garota que tem te ignorado pelos últimos meses?

― Não, correr para minha melhor amiga, que está precisando de mim ― retruquei. ― Olha, Laurel, gosto de você, e sei que tínhamos planos, me desculpe por isso, mas você não vai me impedir de ir atrás dela. ― Ela franziu os lábios, mordendo o lado interno da bochecha e cruzou os braços.

― Você que sabe. ― Eu poderia não ser um expert na mente feminina, mas tinha absoluta certeza que um "você que sabe" significava "não faça", mas aproveitei da pequena brecha apenas para murmurar um ok e sair do ginásio.

Aquela maldita escola era do tamanho de um pequeno bairro, então achar Felicity estava se mostrando um desafio. Procurei nas quadras de tênis e vôlei, nas arquibancadas do campo de lacrosse, e na área da piscina, nem sinal.

Quando cheguei nas dependências internas, comecei pelos lugares que ela mais gostava. O laboratório de química, o de física, o de informática, e foi nesse último que a encontrei.

Sentada em posição de lótus em uma das bancadas de mármore onde ficavam os computadores, ela tinha enrolado o longo vestido para ajustar sua posição. Meu coração acelerou de alegria por achá-la, até quebrar totalmente ao notar que ela chorava em silêncio, os dedos contorcendo-se sobre o colo.

― Achei você. ― Ela virou o rosto na minha direção com surpresa, então tentou esconder as lágrimas, virando o rosto para o outro lado, as enxugando com pressa. Quando ela voltou para mim, estava novamente com a mesma expressão vazia dos últimos meses.

― Majestade ― cumprimentou ironicamente.

― Não faz isso. ― Entrei completamente na sala, ficando em frente a ela. ― Não finge que tá bem, não pra mim. Sou só eu, o Ollie. ― Puxei uma cadeira e sentei à sua frente, pegando suas mãos entre as minhas para que ela parasse aquele movimento nervoso com os dedos.

Ela olhou nossas mãos juntas por longos segundos, então levantou o olhar para mim. Seu lábio inferior tremia, os olhos pareciam maiores pelas lágrimas que ela forçava que não caíssem, suas sobrancelhas franzindo-se numa feição tão triste. Até chorando ela parecia um anjo.

― Isso é minha culpa ― começou, a voz tão baixa que eu mal escutava, parecendo com vergonha. ― Ele fez isso porque eu o bati, o dispensei, não quis dormir com ele, sempre preferi estar com vocês.

― Não, ele fez isso porque é um covarde. ― Eu não ia deixar ela se martirizar por aquilo, não mesmo. Apertei sua mão mais forte. ― Você não fez nada de errado, não é você naquelas fotos e mesmo que fosse, ele não teria o direito. Ninguém teria. ― Felicity assentiu sem me olhar, mas não parecia totalmente a favor das minhas afirmações.

Foi só aí que ela mandou a frase que me quebrou, e me deixou me achando mais filho da puta que Cooper. Um merda.

― Onde você estava, Ollie? ― sua voz estava embargada, e algumas lágrimas escorreram.

Laurel não mentia quando disse que Felicity estava me ignorando. Desde o episódio do beijo na varanda, ela tinha se afastado, me afastado, e eu não recebia mais do que frieza, e depois daquela manhã na casa dela, era assim que eu também retribuía. Só que minha promessa de nunca a deixar não tinha condições, não era se apenas ela me tratasse bem de volta. Eu não devia ter deixado ela esta noite, muito menos para conseguir uma rapidinha no armário de limpeza.

― Me perdoa. ― Fiquei de pé, envolvendo meus braços em torno dos seus ombros, a abraçando forte por alguns minutos. ― Eu nunca, nunca vou deixar você, ok?! ― prometi de novo, me afastando apenas o bastante para conseguir olhar em seus olhos.

Ficamos nos encarando não sei por quanto tempo, mas não foi desconfortável, de modo nenhum, eu sentia uma saudade absurda de Felicity, e poder ficar ali, tão pertinho, olhando aqueles dois cristais brilhantes, estava sendo o ponto alto da minha noite.

― Uau! ― ela exclamou me surpreendendo. Ela já não mais chorava.

― O quê?

― Seus olhos ficam mais e mais azuis.

― De quando nos conhecemos? ― Negou com a cabeça. Formei um pequeno sorriso, franzindo a testa.

― Quanto mais tempo fico olhando direto para eles. ― Meu sorriso aumentou. Disso eu sentia falta, dessas coisas doces que ela falava sem pensar ou planejar, da admiração em seu olhar, que provavelmente estava espelhada no meu.

― E só pra você saber, está absolutamente fantástica essa noite. ― Levei uma das mãos à sua bochecha, que corava discretamente, fazendo carinho com o polegar em sua maçã do rosto, tirando o rastro seco das lágrimas.

― Feliz formatura, Ollie ― murmurou, me hipnotizando com o pequeno movimento de morder o lábio inferior.

― Feliz formatura, Lis.

Meu corpo movia-se por vontade própria, meu rosto aproximando do seu, meu nariz a não mais que dois centímetros do dela. Oh, cara, íamos mesmo fazer isso?! Com certeza íamos.

― Aí estão vocês! ― Tommy abriu a porta de súbito, fazendo com que eu me afastasse um passo, soltando seu rosto, mas ainda segurando sua mão. Felicity soltou um pigarro discreto, olhando para o colo, então para ele. ― Eu estava preocupado, Supergirl. ― Ele sentou ao seu lado na bancada.

― Estou bem, Ollie me achou. ― Ele olhou para mim, de volta para ela.

― Então as coisas estão bem por aqui? ― Felicity assentiu, então encostou a cabeça em seu ombro. ― Graças a Deus, não aguentava mais ser o adulto!

― Estúpido ― ela o recriminou, então seus olhos focaram um ponto na camisa de Tommy. ― Isso é sangue?

― Não o meu. ― Deu de ombros, sorrindo orgulhoso. Ela levantou minha mão direita que segurava até perto dos seus olhos, analisando a vermelhidão dos nós dos dedos.

― O que vocês fizeram, seus imbecis?

― Nada de mais, só endireitamos o nariz de Cooper. ― Sorri com a resposta do meu amigo, mas ela ainda nos olhava com repreensão.

― Vocês ainda vão ser presos por toda essa testosterona.

― Ele mereceu, Lis ― afirmei sem me abalar. ― É o último dia, passamos todo o ensino médio querendo fazer isso.

― Acabei de ter a melhor ideia! ― Tommy saltou da bancada. ― Já acabamos com esse baile mesmo, poderíamos fazer algo juntos, só os três, já que é nosso último dia, e vocês dois estragaram nossos últimos meses.

― Ninguém aqui vai morrer, Tommy ― Felicity falou, mas ela parecia empolgada com ideia, ignorando com sucesso a alfinetada.

― Mas vamos nos mudar. Você vai pra Boston, e eu vou dominar Nova York!

― O que disse? ― Me empertiguei na cadeira.

― Não me diz que você...

― Universidade Columbia, aí vou eu! ― Como ele havia entrado em uma Universidade tão disputada, ninguém sabia. Mas eu nunca duvidaria de Tommy quando ele queria algo de verdade.

― Parabéns, Tommy! ― Felicity também desceu na bancada, quebrando nosso contato de mãos e o abraçando. ― Eu tenho a lista de pelo menos quinze musicais que quero ver na Broadway.

― E eu prometo ir a todos com você, e ficar acordado pelo menos dez minutos em cada.

― Idiota. ― Rolou olhos. ― Agora temos que tornar uma comemoração oficial, fazendo o que mais fizemos durante o ensino médio.

― Sexo? ― perguntou zombeteiro, eu sorri.

― Lacrosse ― o corrigiu, também rindo.

― Opa, desse plano sou super a favor ― falei me erguendo. ― Passei quatro anos escondendo bebida nessa escola, o estoque não faria vergonha pra um bar. Vou conseguir algumas garrafas.

― Ótimo, você cuida disso. Eu vou trocar esse vestido e pegar algumas coisas pra jogarmos.

― E eu vou dar um jeito para as irmãs Lance chegarem em casa em segurança. ― Ótimo que ele lembrou disso, já que eu esqueci completamente.

― Elas vão ficar muito putas de raiva, tem certeza que querem essa briga? ― Felicity fez uma careta engraçada.

― Elas são nossas namoradas, mas você é o amor da nossa vida, Lis ― ele disse, estalando um beijo no rosto dela, mas ela olhava para mim tentando esconder uma decepção.

― Quando ia me contar a novidade, Oliver? ― Dei de ombros. Não era como se mantivéssemos as confidências nesses últimos meses.

― É novidade para mim também, então...

― Vocês não vão começar isso de novo, não é? ― Tommy ralhou conosco. ― Tem sido meu inferno esses últimos tempos. ― O nosso, parceiro, o nosso!

― Não ― foi Felicity a dizer. ― A gente se encontra no campo, vou pegar algumas petecas e tacos. ― Ela segurou a barra do vestido e saiu da sala.

― Vou atrás das bebidas. ― Quando já estava saindo, Tommy segurou meu braço.

― Cara, eu vou te falar isso só uma vez, já que você sabe como eu odeio ser o maduro na conversa.

― O quê?

― Eu vi o que você ia fazer se eu não tivesse entrado na sala. ― Minha expressão ficou lívida, e recuei alguns passos.

― Eu não ia...

― Ollie, não perca seu tempo mentindo para mim ― me cortou. ― Você ia beijá-la. Não me leve a mal, algum tempo atrás eu apenas teria dado as costas e deixado vocês se pegarem à vontade aqui dentro, talvez até montasse uma guarda na porta para ninguém entrar, mas as coisas mudaram. Sabe quão culpada e chateada ela ficaria se soubesse que você traiu sua namorada com ela? Parece que não conhece nossa loirinha.

― Ela só estava tão linda e vulnerável ― me justifiquei, desistindo de mentir para ele. ― Foi impulso.

― Eu entendo isso, e sei que deve ser mais forte para você que está tão apaixonado por ela, mas não pode...

― Ei, quem disse que estou apaixonado?

― É tão óbvio quanto o céu é azul, mas me deixa terminar meu discurso. ― Estendeu as palmas em minha direção. ― Não faça isso com Laurel, ou com ela. Tenha uma conversa franca, esclareça as coisas.

― Eu fiz isso, Felicity não sente o mesmo.

― Não? ― Franziu as sobrancelhas com dúvida. ― Tem certeza?

― Ela disse.

― Mano, sinto muito, as coisas ficam mais chatas assim ― lamentou torcendo os lábios. ― De todo jeito, abrace a friendzone se não quer perdê-la.

― Não quero.

― Ótimo. Mas por hoje, vamos só beber, jogar e nos divertir. Nada de beijos roubados e declarações até o fim da noite, ok? ― Rolei olhos, mas aceitei internamente a proposta. ― Agora me deixa ir ali enfrentar aquelas duas princesas Lance.

― Boa sorte com Laurel, ela consegue ser a bela e a fera numa mesma pessoa ― gracejei, mas só Deus sabe o nível de estresse que minha namorada deveria estar. Melhor nem bater de frente agora.

― Vai ficar me devendo essa, Queen.

Demorei mais do que previa para chegar ao campo, já que alguns dos meus esconderijos de bebidas haviam sido descobertos e roubados.

Quando meus pés tocaram a grama, percebi que meus amigos já estavam ali. Felicity havia trocado o longo vestido de festa por uma legging preta e a própria camisa do time, e estava descalça, enquanto Tommy ainda mantinha o smoking, mas assim como eu, havia desfeito o nó da gravata borboleta e se livrado dela.

Recuei alguns passos, eles pareciam estar tendo um momento. Felicity chorava, então Tommy a abraçou por um tempo, logo depois se abaixando à altura dela e falando algo. Uma despedida.

Meu coração apertou. Ela iria embora, Tommy também e eu não sabia como seriam nossas vidas dali em diante. Eu não queria uma despedida deles, principalmente dela.

Mas por mais que eu não quisesse perder nenhum segundo da companhia de Felicity, os deixei ter esse momento agora. Ok, eu devia confessar que me mordi de ciúmes mais de uma vez da relação que ele conseguiu ter com ela, mas entendia agora. Tommy a viu, desde o primeiro minuto. Claro, nos conhecemos no mesmo momento, mas enquanto eu me distraia com outras meninas ou o time, ele viu a garota incrível que Felicity era desde o soco histórico em Cooper, e me fez ver também, forçando essa convivência no início. Nunca vou poder agradecê-lo o bastante. Lis era nossa super garota.

― Prontos para a diversão? ― me manifestei tempos depois.

― Onde você estava, já ia te ligar! ― Felicity perguntou, coçando o nariz ainda vermelho do choro.

― Algumas peças do estoque haviam sido levadas, tive que procurar por mais. ― Levantei as duas garrafas de líquido transparente que trazia nas mãos.

― Pensando agora, vocês dois tem certeza que devemos jogar lacrosse bêbados? Já é perigoso sóbrio, imagine...

― Pare de pensar tanto, Supergirl! ― Tommy beijou-lhe a testa. ― Passa uma garrafa pra cá, Ollie. ― Fiz o que ele pediu. ― Como vamos fazer isso? ― Felicity pegou uma das redes do chão e girou no ar.

― Vou ser a goleira. Se vocês marcarem, eu bebo, se não, vocês bebem ― decretou se rendendo e correndo até o gol.

― Isso é injusto, você é muito boa nisso.

― Sejam melhores, oras. ― Deu de ombros. ― E além do mais, melhor eu não beber tanto. Fiz besteira demais da última vez ― sua voz baixou a apenas um sussurro na última frase, e quando seus olhos azuis focalizaram os meus, parei de respirar.

De que besteiras ela falava? Sobre tudo que aconteceu na festa do Fuller ou depois, na casa dela? Talvez nem fosse sobre aquele dia e eu estivesse fantasiando, mas não pude deixar de pensar.

― Então, vamos com isso? Eu primeiro. ― O chamado de Tommy quebrou nosso contato visual, e ela sorriu para ele, enquanto apertei meus lábios frustrado, dando um passo para trás.

Ela era excelente.

Felicity sempre foi veloz e habilidosa no lacrosse, junte isso ao fato dela conhecer o nosso estilo e jogo e ataque melhor de que ninguém, logo estávamos os dois caindo de bêbados, enquanto ela não havia tomado mais do que três ou quatro doses.

― Sabe o que queria? Morar algum dia em uma cidade onde possamos ver as estrelas. Las Vegas tinha muita luz, Star City muita poluição.

Minha visão estava embaçada, mas não o bastante para deixar de apreciar a bela vista que eram os olhos de Felicity, que brilhavam enquanto olhavam para o céu. Ela estava deitada sobre meu peito, e Tommy já dormia abraçado às suas pernas há um tempo, nós três jogados no meio da grama do campo. Não sei como eu ainda me mantinha acordado.

― Olha, uma estrela! ― Apontei para o pontinho de luz que surgiu bem acima de nós.

― Helicóptero. ― Ela rolou olhos, quando a luz começou a se mover, foi quando ouvi o barulho característico das hélices. Sorri e fechei os olhos, quase sendo levado pelo sono. ― Me perdoa, Ollie ― Felicity falava baixinho, como se confessasse algum segredo para mim, talvez achando que eu dormia. E pra ser completamente honesto, nem eu sabia se era real. ― Eu sei que não costumo dizer isso, porque sou covarde, mas eu te amo, você é meu melhor amigo. Aqui ou em Massachusetts, eu sempre vou te amar.

Talvez fossem todas aquelas doses de álcool que me fizeram ouvir tudo o que ela disse, eu sei que sonhava em escutar tais palavras desde que brigamos. Assim como também as duas garrafas deviam ser às responsáveis pelo toque leve em meus lábios, antes que minha consciência mergulhasse de vez na escuridão. E Tommy achando que eu seria a pessoa a me declarar. Mesmo que fosse apenas a Felicity dos meus sonhos, estava valendo.

Acordei com os solavancos de Felicity em meus ombros, me mandando levantar, então fazendo o mesmo com Tommy. Passei a mão na testa e a dor de cabeça veio acompanhada de água, muita água, na verdade. Ainda era noite e estava chovendo. Forte.

Corremos entre risadas para baixo das arquibancadas, a noite já estava fria como sempre era em nossa cidade, e com aquela chuva, um resfriado coletivo vinha por aí, mas ninguém se importava. Era a despedida perfeita para aqueles quase quatro anos de amizade.

Felicity ligou para Diggle vir nos buscar, explicando que havíamos bebido além da conta e precisávamos de carona, sendo a responsável como sempre.

Acabou que aquela foi mesmo nossa despedida, já que ela partiu no fim do dia seguinte, recusando nossa companhia para ajudar a se alojar. Nem Donna conseguiu a acompanhar, a garota era teimosa demais e queria começar essa nova fase por ela mesma.

Parti com Tommy para Nova York, passando a maior parte do verão por lá, mas acabei voltando para Star City, já que era onde eu faria minha faculdade.

No fim das contas, meu namoro sobreviveu aos eventos da formatura e ao verão. Laurel me ofereceu seu perdão, e argumentou que se estaríamos na mesma faculdade, não custava nada continuar tentando. Estava em dúvida, mas minha namorada era muito boa mesmo em argumentação. O mesmo não pôde-se dizer de Tommy e Sara. Ambos concordaram que jamais conseguiriam se manter fiéis com toda aquela distância. Felicity jogou na cara dele que era só porque não se gostavam de verdade, e ele apenas sorriu e jogou charme para ela, a convidando para aproveitar a solteirice com ele. Babaca.

Mas ela estava certa, a distância não separa o que é de verdade. E foi isso que prometemos enquanto esperávamos Dig, os três, debaixo daquela chuva congelante.

✨✨✨

2017

Só metade da minha mente tinha acordado quando a senti deitar sobre minhas costas e abraçar meu tórax desnudo.

― Sua mãe acabou de me encontrar nua no seu corredor ― Laurel falou ao meu ouvido, um misto de constrangimento e diversão. Dei um sorriso preguiçoso, antes de girar nossos corpos, a deixando embaixo de mim.

― Você não está nua ― atestei, afastando um pouco a gola da camisa para distribuir beijos em seu pescoço. Ela usava apenas minha camisa da festa da noite anterior e calcinha, quase certeza sobre a última peça.

― É sério, Oliver! ― Ela colocou as mãos em meu peito e me empurrou para trás, sentando sobre os joelhos no meio da cama. ― Precisamos dar um jeito nisso.

― Relaxe, minha mãe não se importa, ela até gosta de você quando está completamente vestida ― gracejei, segurando sua cintura para outro beijo, quem sabe uma rodada de sexo matinal, mas novamente fui repelido. ― Qual é, Laurel?

― Eu estive pensando... ― Oh, nunca é bom quando uma mulher começa uma frase assim. ― Não podemos ficar na minha casa, meu pai usaria a arma dele com prazer na sua testa. E só ficar na sua casa também é complicado, você sabe.

― Eu acho até bem simples.

Me aproximei começando a desabotoar a camisa, mais uma tentativa de distrair suas ideias de irem por aquele rumo. Ultimamente, Laurel vinha jogando várias indiretas sobre casamento, morar junto e essas coisas que eu não estava mesmo preparado.

― Ollie, o que acha de procurarmos um apartamento para morarmos juntos?

Minhas mãos congelaram no quarto botão quando ela finalmente disse com todas as letras. Eu estava tão ferrado!

― Quer dizer, nós dois nos formamos, estou nesse emprego bom no CNRI há mais de um mês, você tendo sucesso na sociedade na Verdant com Tommy, além do que já vamos fazer quatro anos de namoro. É o caminho natural a seguir. ― Laurel se tornou uma ótima advogada, não era surpresa que ela tivesse ótimos argumentos. Casamento vinha a seguir nesse tal caminho natural e eu não estava mesmo a fim, não agora. Fiz uma careta, torcendo no instante seguinte que ela não tenha notado.

― Não faça essa cara! ― Merda, ela notou.

― Não estou fazendo caras, só acho precipitado. Você está mesmo pronta para morar comigo? Eu sou bem bagunceiro. ― Joguei a coisa de volta para ela.

― Amor, eu te conheço há muito tempo. Se seus defeitos me incomodassem tanto, nem estaríamos mais namorando.

― E estamos indo tão bem nisso, por que mudar? ― contra argumentei. ― Meu trabalho é durante a noite, o seu durante o dia. Para que procurar um lugar se nem ficaríamos juntos nele?

― Por que considera essa ideia tão repulsiva, Oliver Jonas Queen? ― Ela cruzou os braços com uma cara de brava. Consegui meu nome completo ali, e assim como quando minha mãe fazia isso, eu estava com problemas. E dos grandes.

Como um anjo enviado dos céus, meu celular começou a apitar a chegada de uma mensagem. Então outra. E mais uma sequência delas. Torci para ser um fornecedor da boate, ou até mesmo Tommy desesperado com um problema para que eu resolvesse e conseguisse fugir desse aqui. Peguei o celular de cima da mesinha.

Lis: Hey!

Lis: Hey!

Lis: Ollie?

Lis: Ollie, tá aí?

Lis: Pega esse celular, seu bastardo, vive com ele na mão e agora não me responde!

Lis: Ollie, me atende!

Lis: Oliver Jonas Queen, pega a droga desse celular, preciso te contar uma coisa!

E aí estava meu nome completo do novo. Essas garotas ainda iam acabar com minha sanidade, mas não pude evitar sorrir para a tela. Felicity tinha essa mania de mandar dezenas de mensagens seguidas quando queria minha atenção e de Tommy. No início, eu havia ficado desesperado, pegar o celular com cinquenta mensagens mais quinze ligações da sua melhor amiga que estava morando em outro estado, era meio preocupante e desesperador, mas depois percebi que era só um de seus gracejos para não me fazer esquecê-la. Como se fosse possível.

― Você é inacreditável.

Levantei meu olhar para Laurel. Ela estava com os lábios franzidos e os olhos levemente apertados e marejados. Raiva. E mágoa. Droga!

― O que foi agora, Laurel?

― Nada. ― Ela ficou de pé ao lado da cama, procurando o vestido no chão.

― Tá na cara que foi algo.

― Você tá certo, foi algo. Um sinal do universo para mim, que tenho me negado a ver há tanto tempo! ― O celular largado em cima da cama continuava a apitar.

― O quê? Felicity? ― Apontei para o aparelho, e ela não pode evitar uma careta de desgosto. ― Ela é minha melhor amiga! ― Minha namorada não disse mais nada, apenas pegou os sapatos perto da porta. ― Ei, fala comigo. ― Segurei o seu braço para que ela me olhasse. ― Como essa coisa de apartamento virou uma crise infundada de ciúmes?

― Infundada?

― Sim, infund... ― O toque do celular me interrompeu. Olhei para o aparelho e depois de volta para a mulher raivosa à minha frente. Pediria desculpas para Felicity depois por ignorar, mas ela teria que esperar eu resolver essa crise.

― Me solta, Oliver. ― Obedeci, e ela pescou o sutiã de quase embaixo da cama, tirando minha camisa e o vestindo.

― Vamos conversar, Laurel.

― Eu tentei conversar, mas você não... ― Ela olhou com raiva para celular que continuava a tocar. ― Atende essa porra antes que eu o atire pela janela! ― gritou.

― Ok. ― Segurei um "acalme-se" na ponta da língua, e peguei o aparelho. Mulheres não costumavam reagir bem àquelas palavras. ― Oi, Lis ― atendi, saindo para o corredor, e ainda ouvindo Laurel bufar.

Finalmente! Por que a demora, deslizar o dedo por uma tela não é tão difícil assim, Queen.

― É algo urgente?

Não, mas...

― Felicity, estou no meio de uma coisa importante aqui, posso te ligar depois? ― Não esperei a resposta e desliguei o telefone. Quando voltei ao quarto, Laurel já estava vestida e calçada, a bolsa e o casaco nas mãos. ― Você não precisa ir assim.

― Oliver, eu amo você. ― Por que aquela frase não parecia o início de algo bom?

― Eu também te amo.

― Eu sei, você me ama. Você ama nós duas. ― Soltei um suspiro frustrado.

― Para com isso.

― Cara, eu me odeio por ter entrado nessa posição de namorada ciumenta, mas pelo amor de Deus, você não facilita, Oliver.

― Eu não facilito? O que fiz de errado?

― Acredito que não fez nada, mas só porque Felicity é uma pessoa decente. Mas eu sei que ela só precisa estalar os dedos e você vai correndo até ela, declarar seu amor eterno. A verdade é que eu nunca fui páreo, só começamos a namorar porque vocês estavam brigados e só continuamos porque ela não mora aqui.

― Ei, não fala assim, você não faz o tipo auto depreciativa.

― Oliver, você para tudo para atender os telefonemas dela.

― Você me mandou atender...

― A gente estava transando uma vez ― me lembrou. ― Você até viajou para lá em um dos nossos aniversários de namoro! Percebe quão anormal essa amizade de vocês é?

― Está exagerando.

― Vou te dar uma informação antiga, mas que você é lerdo demais para perceber: ela está apaixonada por você, desde o colégio, é transparente como o cristal para qualquer um que a observe um pouco.

Senti minha boca ficar seca diante da afirmativa e meu coração acelerou.

Não, Felicity não gostava de mim desse jeito, havíamos discutido isso anos atrás. Eu confessei meus sentimentos naquela época, nos beijamos e ela disse não. E disse não mais algumas vezes depois. Os ciúmes de Laurel a estava fazendo imaginar coisas.

― Eu também sou loucamente apaixonada por você, e como disse antes, você ama nós duas. Só precisa decidir para quem dedica sua amizade e para quem vai todo o seu coração.

― Laurel...

― Vamos, Oliver, pense rápido. E escolha.

Soltei o buquê na cadeira ao meu lado, já que minhas mãos suadas estavam estragando o embrulho. Já eram quase sete da noite, ela já deveria ter saído do trabalho. Mas eu a conhecia o bastante para saber o quanto era dedicada e não deixava nada por metade. Eu realmente não deveria ter a estressado essa manhã, então as flores eram para amenizar isso.

Eu passei o dia analisando o que Laurel havia me dito, mas ainda não entendia. Minha amizade com Felicity não era estranha, éramos assim basicamente desde o início.

Quando ela se mudou para estudar no MIT, nós três prometemos não nos afastar. Então todos os feriados ela estava em Star City, e pelo menos uma vez no mês eu, Tommy ou os nós dois voávamos para encontrá-la em Massachusetts. Eu conhecia os amigos dela de faculdade, colegas do estágio, a garota com quem ela dividia o quarto e até alguns professores.

Conheci cada um dos dois namorados que ela teve por aqui. O sem graça do Billy Malone, que ela conheceu numa cafeteria próximo à Universidade, mas tão logo o conheci, sabia que não iria render, Felicity não gostava dele, era óbvio. Então teve o que quase me fez querer quebrar cada um dos vasos caros que minha mãe colecionava, Raymond Palmer.

Ray, ou o doutor Palmer como ele era chamado por lá, tinha sido professor dela nos primeiros períodos e lá pelo segundo ano de curso começaram a namorar. Um aproveitador da inteligência dela, era o que eu tinha certeza que ele era. Lembro exatamente do gosto amargo que dominou minha boca quando ela contou para mim e Tommy que finalmente havia rolado sua primeira vez. Tommy ficou feliz e deu parabéns, mas não deixou de fazer uma dezena e comentários obscenos, enquanto eu apenas fingia um sorriso e concordava. A coisa deles ainda durou quase dois anos, mas eles terminaram quando o Palmer teve que se mudar e ela não aceitou o convite ir com ele para a Europa. Só então pude respirar normalmente de novo.

Nunca deixamos de sempre nos falar pelo telefone ou webcam, mas era isso que bons amigos faziam, certo? Aparentemente não, segundo Laurel.

Quando o elevador se abriu, perdi o fôlego. Ela não me viu, já que estava distraída demais conversando e rindo com seu amigo Curtis, mas eu a vi, e era como se visse de novo pela primeira vez.

Felicity tinha os cabelos soltos e usava uma saia preta e justa, onde um tecido se sobrepunha ao outro, formando uma fenda frontal quando ela caminhava. A blusa branca de mangas curtas tinha pequenos bordados em preto e o tecido semi transparente estava me deixando louco, e os saltos... Caralho, os saltos destacavam tanto suas pernas!

Acho que só a vi de salto na nossa formatura, mas ela usava um vestido longo. Ela devia usar esse tipo de roupas no trabalho, mas sempre que vinha aqui, ela já estava com seu jeans, rabo de cavalo e tênis para me receber. Eu tinha ciência que estava secando descaradamente minha melhor amiga, mas não conseguia olhar para outro lado.

Curtis me viu primeiro, seu olhar baixou até as flores na minha mão, que nem percebi que havia pego de novo, e então deu um sorrisinho malicioso antes de se virar para ela e cochichar algo em seu ouvido.

Então ela me viu.

Nossos olhos se encontraram e ela sorriu. Ah, aquele sorriso! Suspirei, rindo de volta como um idiota, enquanto ela caminhava mais rápido em minha direção.

Ok, Laurel estava certa. Eu definitivamente ainda estou apaixonado por Felicity.

― Você... ― Quando achei que ela fosse me abraçar, me surpreendi ao receber um tapa forte no braço. Como assim, ela não estava sorrindo para mim um instante atrás? ― Como ousa desligar na minha cara e não atender mais minhas ligações? Eu fiquei tão preocupada! ― Então ela passou os braços por meu pescoço e me abraçou forte.

Oh, sim. Senti falta disso.

Apertei sua cintura a puxando mais ainda para mim, dedicando alguns segundos para cheirar seu cabelo. Eu podia morar naquele abraço.

― Você está bem? ― Ela se afastou contra minha vontade, mas manteve o contato enquanto subia e descia os dedos pela gola da jaqueta, quase sem perceber.

― Prazer em vê-lo, Oliver. Até amanhã, amiga, me conta tudo. ― Curtis passou por nós, recebendo um aceno de cabeça de ambos, mesmo que Felicity parecesse confusa com sua última frase.

― Eu estava quase hackeando as câmeras de Star pra te achar. Tommy não sabia de você, nem Thea. Eu até liguei para Laurel, mas ela não atendeu. ― Soltei um murmúrio chateado à menção do último nome. ― Mas agora você tá aqui, tô tão feliz com a visitinha surpresa. ― Ela deu saltinhos, segurando minha mão livre das flores. ― Vem, vou te mostrar minha sala. Se tudo der certo, consigo tornar esse estágio em algo permanente em menos de...

― Felicity. ― Mantive meus pés firmes no lugar quando ela começou a tentar me arrastar na direção do elevador. ― Isso é pra você. ― Lhe estendi as flores, que ela pareceu notar pela primeira vez, então arregalou os olhos para elas, corando adoravelmente.

― Oh. Não precisava comprar flores só porque não me atendeu, devia estar ocupado. Você nunca me deu flores.

― Precisamos conversar. ― Ela assentiu séria.

Com a mão ainda presa à minha, caminhamos para fora do prédio.

― Você ainda mora aqui? ― falei a contragosto quando entramos no quarto-sala minúsculo de Felicity, que não ficava longe de seu emprego. ― Tinha me dito que estava procurando outro lugar.

Eu odiava aquele apartamento. Era pequeno, úmido, em um bairro ruim e nem um pouco funcional, menor até que o meu quarto. A sala e a cozinha eram um cômodo só e o quarto era menor que o do dormitório antigo dela, tudo porque ela não aceitou minha ajuda e de Tommy em conseguir algo melhor.

― Eu estou procurando. ― Deu de ombros. ― Agora desfaz era carinha de menino rico e senta um pouco. Vou colocar água nessas princesas.

Sentei no sofá puído e a assistir deixar os saltos perto da porta e mexer em uns armários embaixo da pia, até achar um vaso e colocar as flores na água, se demorando um pouco em alisar as pétalas. Felicity nunca admitiria para mim, já que vivia fazendo as vezes de "mulher moderna que não gosta de flores", mas ela tinha gostado, havia mesmo gostado. Fiquei feliz com aquilo.

― O que foi? Você tá me olhando esquisito. ― Franziu o cenho, indo em direção ao quarto e voltando em seguida sem a bolsa e o casaco, então sentando do meu lado. ― Vai, me conta. O que precisamos conversar que não podia ser dito pelo telefone como nós jovens fazemos em 2017? ― Engoli seco.

― Me desculpa não ter te atendido direito ou retornado as ligações e mensagens.

― Tudo bem, Ollie, eu só fiquei preocupada.

― Eu não falei com você direito hoje de manhã porque estava com Laurel na hora.

― Ah ― falou casualmente, até seus olhos encontrarem algum entendimento, então ela começar a avermelhar, levando minha justificativa para um lado totalmente errado. ― Uou, interrompi vocês... ― Fez uma careta de nojo. ― Foi mal.

― Não, a gente não tava... A gente estava brigando.

― E eu atrapalhei, me desculpa, Oliver ― pediu, parecendo envergonhada. ― E acho que você vir aqui não ajudou seu caso, hein? No que estava pensando, seu estúpido? Você vai perder a namorada desse jeito! ― Felicity deu um soquinho em meu ombro.

― Foi Laurel que praticamente me empurrou para cá.

― Como assim? ― Pigarreei, não fazendo ideia como prosseguir no assunto sem abalar nossa amizade no processo. De novo.

― Ela estava falando sobre morarmos juntos. Disse que seria o próximo “passo natural” a darmos em nosso relacionamento. ― Felicity se encolheu, mordeu os lábios e se afastou de mim, desviando o olhar. Foi bem pouco, bem rápido, mas eu percebi.

― Ela tá certa, Oliver. Vocês são perfeitos um para o outro.

― Em teoria... ― murmurei vagamente.

Eu sabia que por fora, éramos o casal perfeito. Gostos similares, hobbies similares, até o futuro que todos planejavam para a gente era similar. Era um namoro bom e tranquilo, então porque eu não conseguia imaginar ir adiante?

― E ela está mesmo disposta a morar com você, todo mundo sabe que você é bem bagunceiro. ― Felicity me trouxe de volta à conversa com um sorriso pra lá de amarelo, quando passei tempo demais divagando em pensamentos. Dei um sorriso um pequeno, já que essa havia sido minha primeira justificativa rasa. ― Então, vocês brigaram porque você queria uma mansão e ela um triplex?

― Eu simplesmente estaquei, Lis. Não conseguia sequer cogitar um futuro assim com ela.

― Eu não te entendo, Oliver, sinceramente. Se não imagina um futuro com ela, porque namorar por quatro anos? ― E aí estava a pergunta de milhão de dólares, para a qual eu não tinha resposta.

― Eu não sei ― falei sincero. ― Talvez eu só queria estar com alguém.

― E agora? Vocês estão dando um tempo, ou... ― Ela parou, parecendo se dar conta de algo. ― Oh, espera! Em que parte dessa conversa eu comecei a mandar mensagens? ― Dei de ombros, não respondendo sua pergunta. ― Ai, caramba, Oliver! Aprenda a colocar seu celular no modo avião quando não quiser ser interrompido!

Lembrei que sempre colocava o celular no modo avião quando estava aqui com Felicity, inclusive estava assim no momento. Agora vejo um dos pontos de Laurel.

― E aí, o que rolou depois disso?

― Nós terminamos.

― Só porque não quis morar com ela agora? ― perguntou revoltada. ― Oh, Ollie, eu sinto muito. ― Felicity pareceu hesitante, mas decidiu por me abraçar. Eu já havia consolado em mais de um término, mas era a primeira vez que a coisa acontecia na mão oposta, ninguém sabia como agir direito ali. Não que eu estivesse devastado, porque na real, não estava.

― Não foi por causa do apartamento, nós terminamos porque ela me ofereceu uma escolha ― falei em seus cabelos, e ela se afastou, me olhando em dúvida, entortando um pouco a cabeça para o lado. ― Ela ou você.

Todo o sangue se esvaiu do rosto dela, e Felicity me soltou como se encostar em mim lhe desse choques, sentando o mais longe que o sofá pequeno permitia. Sua boca estava aberta e então ela engoliu seco, piscando tantas vezes seguidas quanto possível. Eu conhecia essa expressão, foi a mesma que ela fez mais de quatro anos atrás quando eu disse o que sentia por ela.

― Eu te amo, Felicity. E mais do que isso, estou apaixonado por você, acho que sempre estive, não consigo não estar.

― Oliver, não. ― Ela afastou a mão da minha quando tentei pegá-la, e ficou de pé, andando pela sala. ― A gente já teve essa conversa.

― Eu sei, mas por mais que eu tenha tentado, nada mudou aqui. ― Fiquei de pé e apontei para o meu peito, bem onde meu coração batia acelerado.

― Pare de fazer isso comigo! ― Ela passou os dedos pelos cabelos.

― Eu não estou te cobrando uma resposta afirmativa, Lis, sabe que nunca te pressionaria a isso.

― Você terminou seu namoro por minha causa, isso é tão errado! Meu Deus, Laurel deve me odiar agora e ela tem razão.

― Não pode ser errado que eu me apaixone pela minha melhor amiga, que eu ame tanto essa pessoa que fez de mim quem eu sou hoje. ― Segurei seus braços a fazendo parar e olhar para mim. ― Você me faz rir, é a pessoa mais inteligente que eu conheço e não se gaba disso, é linda, gentil, divertida. É pra você que eu quero contar sobre meus dias, não Tommy, nem Laurel, você, só você.

― Ollie... ― murmurou com os olhos marejados.

― Foi errado tentar com outra pessoa quando é só em você que eu penso desde que te beijei pela primeira vez. Você é minha luz, Felicity, e não importa se vou receber outro não agora ou quantos anos passem. Vou tentar e tentar até que ganhe meu...

― Sim ― ela me cortou, quando me abraçou pela cintura, chegando mais perto. ― Eu também te amo, Oliver.

― O quê? ― exclamei chocado. ― Pensei que ia precisar insistir mais, eu tinha argumentos para a noite toda.

― Precisaria, se eu não estivesse apaixonada por você desde que me beijou na varanda da minha casa.

― Do que você...

― Naquela madrugada, depois daquele beijo, eu soube que tinha me ferrado. Eu não devia me apaixonar por você.

― Mas eu perguntei e você disse...

― Eu fui covarde. Eu tinha medo de não ser sério, que você desistiria quando enjoasse, não queria perder você quando não desse certo. Tentei me distanciar, tentei ficar com outros caras, mas você estava lá, sob minha pele. ― Eu a olhava como se estivesse vendo um alien. Como deixei todos esses sinais passarem? ― Quando finalmente estava pronta para admitir que não tinha outro jeito, você começou a namorar. Parecia feliz, ela é essa pessoa toda super, apenas assumi que havia perdido minha chance. Merda, isso parece a droga de uma novela ― murmurou a última frase para si mesma, pensando alto como sempre.

Eu poderia fazer drama e questionar o porquê dela ter mentido para mim naquela época, o olhar temeroso e apreensivo dela me mostrava que ela pensava que eu o faria, mas, honestamente, não queria mais perder tempo.

― Se isso é uma novela, hora do beijo. ― Subi uma das mãos até encaixar em seu pescoço e incliná-lo em minha direção. Ela espelhou o sorriso que estava em meus lábios e foi como seu meu mundo ganhasse mais cor.

― Espera! ― Espalmou meu peito, quando eu já estava na metade do caminho. ― E se a gente se beijar de novo e perceber que tudo que sentimos foi loucura da nossa cabeça porque ficamos remoendo um único beijo de anos atrás?

― Daí só testando, meu amor.

Segurei seu rosto e cheguei perto aos poucos. Primeiro encostando nossos narizes num beijo de esquimó, sentindo sua respiração entrecortar, depois brincando com seus lábios em carícias suaves, para então os chocar com firmeza. Ali estava o encaixe perfeito que eu me lembrava. O jeito como os lábios dela sugavam o meu inferior, para então abrir mais a boca me convidando a aprofundar aquilo, e foi o que eu fiz.

Minha língua deslizou sobre a dela, e a senti arfar, quando começamos aquela batalha gostosa. Soltei seu rosto para agarrar sua cintura, inclinando meu corpo um pouco sobre o dela, ao mesmo tempo que ela passava um dos braços por meu pescoço e acarinhava minha barba com a outra mão, como em gestos encenados para um beijo perfeito de telenovela.

A necessidade de fôlego fez com que nos separássemos, e logo abri os olhos, esperando a resposta dos seus. Sim, o beijo só havia provado como eu a amava.

― Então? ― Tirei uma mecha de cabelo do seu rosto, só aí ela abriu os olhos. Azuis, brilhantes como duas pedras preciosas, me encarando sorrindo.

― Definitivamente você, Queen. ― Felicity puxou meu pescoço para outro beijo arrebatador, que dessa vez eu a deixei ditar o ritmo, em seu jeito próprio que estava amando descobrir.

Eu não lembro de ter estado tão feliz alguma vez na vida.

O toque do telefone dela chamou nossa atenção, e ela se afastou para pegar em cima da mesinha, mas segurei sua mão a impedindo de ir longe demais.

― Deixa tocar. ― A puxei de volta para mim, selando nossos lábios rapidamente.

― Como se ele deixasse alguém ignorá-lo. ― Felicity virou a tela para mim, o nome e foto de Tommy brilhando nela.

― Ele só pode ter colocado alguma câmera escondida na gente. Oh, ser humano com o pior timing da história!

― Fala ― ela finalmente atendeu e colocou no viva-voz, segundos antes da chamada ir para a caixa postal.

Olha aqui, eu exijo ser tratado com mais respeito. Como assim “fala”? É pra atender sempre “alô, Tommy, meu amor”, já tivemos essa conversa, Supergirl! ― Ela rolou olhos, mas sorriu.

― Diga logo o que quer, Tommy, meu amor ― ela ironizou. ― Mas diga rápido, estou ocupada.

Você conseguiu falar com o Ollie?

― Digamos que sim ― respondeu sorrindo para mim. Não resisti ao impulso e beijei seu queixo. Então sua mandíbula. Então um ponto abaixo de sua orelha. E só não continuei porque ela espalmou a mão em meu peito, me olhou com repreensão e gesticulou um “pare” com os lábios. ― É, eu falei com ele.

Menina, ele te contou o babado? Lauriver é passado, Sara que me disse. ― Como a ótima comadre fofoqueira que era, Tommy logo soltou a notícia, ainda conseguindo me impressionar com a total ausência de discrição da parte dele.

― Você anda de fofoquinha com sua ex? ― Felicity sabiamente desviou o assunto para a outra parte da sentença.

Somos amigos, claro que fofocamos. ― Quase pude vê-lo dar de ombros. ― Então, por que você acha que foi?

― Sara não te contou?

Ela não sabe. Enfim, descobre essa história aí pra gente, já que Oliver só responde você, então me liga imediatamente.

― Por que a pressa em saber sobre isso, Tommy?

Oras, quero meu amigo galinha de volta! Quer dizer, nós dois não estamos solteiros ao mesmo tempo desde os dezoito, temos que aproveitar. E se fazíamos um estrago naquela época, Star City não vai estar preparada para o que vem a seguir. ― Assisti com diversão os lábios de Felicity franzirem em irritação, seus ciúmes bem claros para mim. Adorável. Mas eu não daria margens àquilo, ela tinha que saber quão sério eu estava sobre nós.

― Na verdade isso não é uma verdade ― falei revelando minha presença.

Espera, Ollie está aí? E como assim isso não é uma verdade? ― Trocamos um olhar, quando a linha ficou silenciosa por tempo demais. ― Yes! ― ele gritou tão alto que Lis saltou de susto. ― Ninguém se mexe, estou pegando meu jato e indo praí. Precisamos tornar essa comemoração oficial, estou tentando isso há longos oito anos!

― Tommy, acho melhor não... ― Felicity começou.

― Tommy, pegue a indireta e dê um tempo. Tchau. ― Desliguei o telefone antes que ele tornasse aquela conversa mais comprida.

― Vamos. ― Ela segurou minha mão.

― Pra onde?

― Quarto, ué ― sorriu travessa, como se fosse óbvio. ― Minha cama não é a sua master king size, mas serve. ― Não contive minha expressão abismada.

― Tão rápido? ― Por mim, já estaríamos lá, mas tinha que perguntar.

― Oito anos, Ollie. Não é tão rápido. ― Piscou para mim, me puxando para o quarto.

Oh, sim. Eu estava feliz.

✨✨✨

2019

Minhas mãos suavam e minhas palmas já estava ficando vermelhas de tanto que eu as friccionava em meu jeans. Eu nem lembrava a última vez que me sentia assim, como um adolescente inseguro. Era estranho e quase uma novidade, mas não posso dizer que era bom.

Pelo amor de Deus, Oliver, você não tem mais idade para isso, controle-se!

Saí do lugar que estava sentado na cama há quase meia hora e caminhei até o gaveteiro, na esperança de que olhar para a coisa me deixaria mais calmo.

Na primeira gaveta guardávamos coisas práticas como carregadores de celular, carteira, eletrônicos ou qualquer outro item que precisaríamos ter à mão rápido, mas a coisa estava no fundo falso.

Felicity sabia do esconderijo, mas nunca mexia ali, já que só tinham documentos importantes da empresa, passaporte ou outro item apenas meu, o que fazia daquele fundo falso o esconderijo perfeito para o anel dourado com o diamante solitário no topo dele.

Peguei a caixinha de veludo verde escuro e abri. Eu queria mesmo ter achado uma pedra maior, mesmo sabendo que ela brigaria comigo pelo preço exorbitante da joia, mas não me importava. Aquele pobre diamante 5 quilates iria ficar ofuscado por ela, como todas as outras joias, mas ele seria a mais importante de todas.

Já fazia algum tempo que eu queria ter feito o pedido, mas ela não estava pronta, e sentia que viria um não ou um vamos esperar mais um pouco se perguntasse.

Logo que começamos a namorar, ela não se mudou, mas eu sim. Laurel tinha um ponto, não dava pra ficar pra sempre na mansão dos meus pais, então logo que voltei de Boston, comecei a procurar apartamento, até me deparar com essa cobertura duplex no centro da cidade. Grande conceito aberto na parte de baixo, paredes com tijolos vermelhos e cozinha moderna, além dos muitos quartos na parte de cima, uma suíte com vista linda de Star City. Mesmo achando ostentação demais, Felicity não conseguiu me esconder como tinha amado o lugar logo que pôs os olhos nele na primeira visita, me fazendo suspirar aliviado. Rodaria a cidade de novo até achar um que ela gostasse.

O primeiro ano de namoro foi difícil, ela lá e eu aqui, a Verdant crescendo, o que limitava minhas idas a dois fins de semana ao mês, então graças aos céus, ela voltou pra Star City, para a casa de sua mãe, para só no ano seguinte vir morar comigo.

Desde então tem sido um sonho, dormir e acordar ao seu lado sempre, os sábados preguiçosos no sofá, os domingos da faxina, até suas TPMs. Mas essa é a vantagem de começar tudo com a amizade de anos, já estava acostumado a muito disso e conhecia seus defeitos como a palma da minha mão. No fim, eles também me faziam amá-la.

Mas agora acho que ela estava pronta para meu sim, o que não me deixava menos nervoso. Felicity era linda, independente e muito inteligente, poderia ser o que quisesse, fazer o que quisesse e estar com quem quisesse. No fundo, eu ainda tinha a insegurança de que qualquer dia ela acordaria vendo que poderia ter mais do que eu lhe oferecia, mesmo que fosse tudo de mim.

Girei o solitário em meus dedos, o tirando da caixa para olhar de perto. O dia que visse minha Lis com aquele anel no dedo seria o mais feliz da minha vida.

― Ollie, o que acha da gente constranger Tommy na frente da nova namorada dele? ― A caixinha voou da minha mão para dentro da gaveta e ela só não viu porque​ eu estava de costas. Me apressei fechar o anel dentro da minha mão e virar pra ela. ― Te assustei? ― Ela fez um biquinho adorável e inclinou a cabeça para o lado quando percebeu que todo o sangue tinha se esvaído do meu rosto.

― Não, eu só estava... ― Dei um passo para trás para fechar a gaveta com minhas costas. ― Deixa pra lá. Você estava falando sobre constranger Tommy? Tô dentro. ― Mudei de assunto, já que sequer tinha pensado sobre o que falar quando fizesse o pedido.

― Caitlin é ótima, bonita, inteligente, uma biomédica bem sucedida. O que será que ela viu nele? ― Felicity soltou aquela risada analasada engraçada que só ela tinha.

― Merlyn sabe ser bem insistente quando quer algo, temos umas fotos bem comprometedoras da época do colégio. Acho que ele merece no mínimo isso, já que tem nos estressado por tantos anos.

― Ótima ideia, eu pego. ― Felicity soltou minha mão e já ia voltando em direção ao gaveteiro. Tudo bem que os álbuns de fotos ficavam na última gaveta, mas não era bom arriscar ela perto dali antes que eu escondesse tudo de novo.

― Pode deixar, eu pego. Você pode voltar pra recepcionar as pessoas lá em baixo, eu pego. Eu pego as fotos. ― Quase me esmurrei por estar parecendo tão óbvio.

― Ok, senhor estranho. ― Minha namorada estreitou os olhos para mim, não comprando em nada minhas desculpas, mas parecendo deixar aquela conversa para mais tarde. Suspirei em alívio e apoiei minha palma em suas costas a conduzindo para fora. ― Ah, espera. Esqueci que Sara tinha pedido um carregador emprestado.

Antes que eu pudesse a segurar ou dar outra péssima desculpa, ela já deu a volta em meu corpo e alcançou a primeira gaveta, a abrindo em seguida.

― Não, não, não! ― Ainda estendi minha mão na direção dela, uma frustrada tentativa de pará-la antes que visse...

― Ai, meu Deus! ― exclamou ainda de costas para mim. ― Isso é...

― Calma ― pedi, lhe estendendo as palmas, mas ela se virou para mim com os olhos arregalados e a caixinha na mão.

Eu ainda não estava pronto para fazer o pedido, Felicity merecia algo bonito e minimamente elaborado e romântico. Nem havia me planejado sobre o que dizer.

― Isso é... ― Ela abriu a caixinha e seu semblante pareceu morrer em decepção. Então raiva. ― Está vazia. Isso é uma brincadeira pra você Oliver?

― Calma ― pedi novamente me aproximando, sem saber ao certo pra onde aquela conversa estava indo. Felicity me deu as costas e começou a andar pelo quarto.

― Olha aqui, Oliver Jonas Queen, se isso for uma brincadeira sua e de Tommy, eu juro por Deus que vou te dar um pé na bunda tão forte que você vai sentir saudade da época que a gente jogava...

Eu não sei ao certo como ou quando aconteceu, mas logo que ela se voltou para mim, eu já estava com o joelho no chão lhe estendendo o anel que tinha guardado no bolso. Dane-se pedido elaborado e procura por momento perfeito. Todos meus momentos com ela eram perfeitos e aquele seria o mais especial deles, mesmo sem preparação. Eu a amava mais que tudo, e sentia esse amor de volta. Éramos melhores amigos há tanto tempo, que mal podia esperar para dar mais esse passo.

― Uou!

― Casa comigo? ― perguntei simplesmente.

― Caso, claro que caso! ― Felicity respondeu tão rápido que não segurei o suspiro de alívio, ao mesmo tempo que uma felicidade tão grande e genuína encheu meu peito como nunca antes. ― Quer dizer, me desculpa. Você ia falar mais alguma coisa, tinha feito algum tipo de discurso? Eu sempre interrompo seus discursos ― ela balbuciou me fazendo rir de seu nervosismo, tão grande quanto o meu no momento.

― Eu deveria, mas meu cérebro virou gelatina, não consigo pensar em nada ― confessei, e foi a vez dela rir, mesmo que seus olhos estivessem marejados. ― Eu só sei que te amo, cada dia mais. Mal posso esperar para que você seja além da minha melhor amiga, minha melhor pessoa, o amor da minha vida, minha esposa.

― Eu te amo tanto, Ollie.

Felicity deixou as lágrimas escorrerem, foi quando fiquei de pé e coloquei o anel em seu dedo, mesmo que levasse mais de uma tentativa pelo jeito como estávamos tremendo. Segurei seu rosto com as mãos, selando nosso novo status de compromisso com um beijo.

Não consigo explicar exatamente, mas aquele beijo foi diferente dos que já estávamos costumados a trocar diariamente. Aquele beijo marcava o início de uma nova fase, que eu tinha certeza que seria a melhor de todas.

― Vestidos ou não, aí vou eu ― Tommy anunciou já entrando.

Abracei Felicity quase que por instinto. Não mais os instintos de proteção e controle que me surpreendi ao desenvolver por ela no fim da nossa adolescência, agora era diferente. Um amor maduro, de querer sempre estar perto porque ela era a pessoa que mais me fazia bem e a que eu dedicaria minha vida a fazer feliz. Anos depois eu finalmente entendi que tudo aconteceu no momento e na idade certa.

― Vocês estavam demorando, resolvi checar, e... ― Tommy franziu o cenho olhando para nós dois abraçados. ― Ela está chorando, o que você fez, Ollie? ― me repreendeu.

― É de alegria, Tommy ― ela explicou, passando a mão no rosto para enxugar as lágrimas.

― Espera, isso é um anel de noivado? ― perguntou baixinho e contido demais para Tommy Merlyn, os olhos fixos na joia que se destacou em sua frente. ― Você propôs?

― Sim.

― E você aceitou?

― Sim. ― Felicity acenou com a cabeça, ainda sorrindo.

― Ai, meu Deus! ― o grito dele saiu tão alto que eu não duvidaria se tivesse chamado a atenção do prédio todo.

― Se controle, homem! ― o reprimi, mesmo sabendo não ser possível, pois ele já corria em nossa direção.

― Eu estou nas nuvens, vocês me colocaram nas nuvens. ― Ele abraçou ambos de uma só vez.

― Ok, já chega, Tommy. ― Foi Felicity que o afastou primeiro, quando ele não quis nos largar do abraço.

― Me contem tudo! Todos os sórdidos detalhes românticos e sexuais. Aliás, querem que eu suma com todo mundo daquela sala pra vocês "comemorarem"? Se é que entendem o que quero dizer. ― Olhou para nós dois com malícia, piscando apenas um olho.

― A gente sempre entende, mano, sempre. E não, a gente vai aproveitar e comemorar com nossos amigos próximos, certo, amor?

― Certíssimo, e ainda temos que mostrar umas certas fotos e vídeos pra Caitlin. A pobrezinha precisa saber no que tá se metendo.

― O quê? ― Os olhos dele cresceram um par. ― Vocês não vão...

― Dez anos de estresse precisam ser pagos de algum modo, querido. Ollie, onde colocamos os álbuns?

― Eu preciso tirar ela daqui! ― Correu em direção à porta de saída do quarto. ― Parabéns, meus lindos.

― Ei, ainda vamos "comemorar", certo? ― Usei o mesmo tom malicioso de Tommy, fazendo ela gargalhar.

― Estou bolando jeitos de fingir um vazamento de gás e expulsar todo mundo daqui, amor.

― Amo o modo como pensa, Lis.

― E eu amo você, Ollie.

A beijei de novo, a beijaria para sempre como se fosse a primeira vez.


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Notas finais do capítulo

Também estão vomitando arco-íris do lado daí?
Espero que tenham gostado de passar esse tempo com esses lindos!!
Nos vemos nos comentários e até logo!!
Mais histórias completas no meu perfil e outras logo em breve.
Bjs*



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