Nossa história começa com um garoto correndo apressado pelos corredores da Tech Pokémon, a escola para treinadores pokémon mais renomada da região de Kanto. Seu uniforme estava todo amassado e, ao cruzar com um calouro na frente dos bebedouros, percebeu que não sabia onde estava sua gravata. Olhou a hora, só faltavam dois minutos para começar, porém a arena ficava na área externa, do outro lado do prédio. Ele apressou o passo, no entanto, havia um obstáculo quando virou no corredor seguinte. Havia logo à frente uma mulher com semblante sério demais usando terninho preto, a diretora.

— Garoto, - disse ela, segurando-o pelo braço - você sabe que não pode correr nos corredores. Vai acabar causando um acidente!

— Perdão Sra. White, mas a batalha da Aza vai começar agora e eu estou atrasado - o menino se justificou.

— Você está sempre atrasado, Lucas - falou a diretora em tom de deboche.

Lucas não gostou nada. Ele não achava a Sra White muito profissional. Ela tinha seus alunos preferidos e estes podiam fazer o que queriam na escola, enquanto outros, como ele mesmo, que ela considerava fracassados, serviam de exemplo para mostrar ao resto dos estudantes como não ser um bom treinador.

— Eu também estou indo ver a batalha de sua amiga, você sabe como eu a considero promissora. Quando ela completar o quarto ano aqui, ela ganhará um passe para a Liga Pokémon e nós a veremos brilhar representando essa escola - os olhos da diretora cintilavam falando do futuro de seus queridinhos. - Eu só não entendo como um talento nato como Aza pode ser tão próxima de alguém como você.

— Pois é, Senhora, - Lucas respirou profundamente, pois aquela mulher o fazia se sentir deprimido - somos melhores amigos desde que entramos nessa instituição.

Sra. White riu um riso seco.

— Vamos juntos então… andando - ela deu ênfase na última palavra. - O evento não vai começar sem mim.

Caminhar com a diretora até a arena foi com certeza uma das piores experiências recentes de Lucas. Ela criticou seu uniforme mal cuidado e o repreendeu diversas vezes sobre a gravata que ele esquecera. Nada fora do esperado. Foi quando finalmente deixaram o prédio pelo acesso lateral e passaram pelas estátuas de pokémon de concreto que ela soltou a grande novidade:

— Sabe, eu estava olhando seu histórico escolar ontem, Lucas. Você sempre passa nos exames escritos e nas simulações com nota alta, mas se recusa a usar seu pokémon para batalhar. A Tech Pokémon visa formar treinadores pokémon de alto nível e, para ser um desses, você precisa batalhar.

O garoto sentiu suas pernas fraquejarem de nervosismo por um instante.

— Diretora, eu aceitei vir para cá para deixar os meus pais felizes, mas não pretendo em nenhum momento colocar meu pokémon para lutar.

A diretora deu um sorriso maldoso.

— Hoje é o dia da sua amiga lutar, entretanto, na semana que vem, viremos à arena para ver você numa batalha. Não só eu e seus companheiros de classe, seus pais também virão, eu até já mandei o convite para sua casa. Então, se não quiser desapontá-los, é bom se preparar para enfrentar alguém no próximo sábado.

— A Sra. não pode me obrigar a isso! - Lucas se desesperou.

— Claro que posso - a diretora riu desdenhando. - Você está há um ano aqui e sabia que esse momento iria chegar.

— Mas meu Squirtle não gosta de lutar - argumentou o garoto - Ele gosta de ver o pôr do sol e cochilar depois das refeições.

— Que ridículo! - a mulher se exaltou. - O que você achou, jovenzinho? Que conseguiria passar outro semestre aqui sem se esforçar? Você vai fazer o que eu estou te sugerindo ou diga adeus a sua vaga neste internato e ao orgulho que seus pais sentem de você.

Lucas emudeceu. O final da caminhada foi em silêncio absoluto. Quando eles finalmente chegaram à arena, o garoto fez questão de sentar nas arquibancadas do lado sul, bem longe da diretora, que se acomodou nos assentos a leste. O lugar estava lotado, todos na escola queriam ver a batalha entre as estudantes mais promissoras do segundo ano. Elas pareciam tão confiantes, tão preparadas. Lucas não se sentia nada assim.

Ele estava apavorado. Não queria lutar, nem podia simplesmente dizer a seus pais que a vida de batalhas não era para si, que queria abandonar a Tech Pokémon e virar um criador pokémon ou até um médico pokémon, para cuidar dos monstrinhos que tanto amava. Seu pai reagiria muito mal, o velho sempre foi aficionado pela Liga Pokémon e sempre quis ver seu único filho competindo.

Lucas tentou acenar para sua melhor amiga mas ela não o via na multidão, ele estava sentado bem atrás. A arena tinha um chão de concreto com marcações brancas delimitando o espaço. As arquibancadas que circundavam todo o campo de batalha eram do mesmo material e, isolando este espaço, havia cercas altas de metal. As competidoras se encontravam cada uma em uma extremidade das marcações, prontas para a ação.

— Boa tarde, senhoras e senhores! - o juiz da batalha, o Professor Rockwell, começou a falar no microfone assim que notou a presença da diretora - Fiquem todos à vontade, nossa próxima batalha já vai começar. A seguir, se enfrentam dois talentos natos. Do meu lado esquerdo, eu tenho a espetacular Sakura!

Uma salva de palmas se manifestou para Sakura, uma garota de cabelos negros curtos, pele absurdamente pálida e olhos escuros sempre destacados pelo rímel. Para ela, reforçar a hierarquia estudantil criada pela Sra. White era mais que um passatempo, era uma meta de vida. A Tech Pokémon era o que havia de mais importante para essa garota e seu objetivo era ser a melhor.

— No outro canto da quadra, à minha direita, - continuou Rockwell - está a incrível Aza!

A garota ruiva abriu um sorriso sem jeito e acenou para a multidão. Seus longos cabelos ficavam cor de cobre sob o intenso sol das onze da manhã. Mais palmas. Inclusive de Lucas, que vibrava torcendo por sua amiga.

— Vocês já sabem as regras: cada uma pode usar dois pokémon, vocês se enfrentarão até que ambos os pokémon de uma treinadora estejam fora de combate. Não há limite de tempo. A batalha começa agora!

— Vai Rattata! - Sakura jogou sua pokébola e um pokémon pequeno e dentuço de pelos roxos surgiu sobre o concreto.

— Kakuna, eu escolho você! - um pokémon inseto, que mais parecia um grande casulo amarelo saiu da pokebola de Aza.

As duas criaturas estavam cerca de vinte metros distantes, uma olhando para a outra.

— Investida - gritou Sakura, e seu Rattata correu em direção a seu combatente.

— Kakuna, rápido, use endurecer! - bradou Aza.

O pequeno roedor se aproximava rápido do inseto, porém este estava preparado, seguiu o comando da sua mestra e endureceu o casulo que envolvia seu corpo. Quando a colisão aconteceu, Kakuna não parecia nem um pouco abalado pelo ataque inimigo. E agora estavam frente a frente.

— Picada venenosa - disse Aza.

Um espinho roxo saiu da base do corpo do pokémon amarelo e atingiu Rattata em cheio, que pareceu fraquejar, entretanto logo tomou distância e mostrou que estava pronto para continuar a batalha.

— Use investida - Sakura instruiu.

— Kakuna, endurecer!

Rattata avançou mais uma vez em direção a Kakuna, desta vez, ainda mais rápido. O inseto, então, endureceu seu casulo e evitou novamente grandes danos do ataque. Rattata correu para longe para evitar ser atingido por mais uma picada do oponente. As duas garotas estavam compenetradas. Gritaram de novo o que seus monstrinhos deveriam fazer. O pokémon de Sakura investiu contra Kakuna e este novamente bloqueou parte do dano com seu movimento.

— Investida!

— Endurecer!

A cena se repetiu outra vez e mais uma.

— Seu pokémon é forte, - afirmou a garota de cabelos negros - mas olhe para ele. Não vai aguentar outra rodada. Ataque rápido, Rattata!

Dessa vez, Kakuna realmente não resistiu, ele sequer conseguiu usar o endurecer. O pokémon roxo atacou depressa demais nocauteando o inseto. Aza o chamou de volta para a pokébola.

— Kakuna está fora de combate! - anunciou o Professor Rockwell, fazendo a torcida do lado esquerdo gritar.

— Como eu disse, Aza - provocou Sakura.

Lucas estava nervoso por sua amiga, porém a ruiva não parecia ter perdido nem um pouco sua confiança. Nem mais a plateia parecia deixá-la nervosa. Ela passou a mão pelos cachos acobreados e sussurrou algo ao pokémon que acabara de guardar na esfera branca e vermelha. Em seguida, elevou o tom de voz para falar com a rival.

— Sabe, - começou Aza - você fala demais, mas não percebeu que seu pokémon também não está em bom estado.

— O quê? Do que você está falando? Você conseguiu atacar o Rattata apenas uma vez, ele está ótimo - retrucou Sakura.

— Ah é? Olhe para ele.

O Rattata parecia mal e quando Aza acabou sua frase, ele caiu no chão.

— O que houve? - Sakura arregalou os olhos.

— Rattata está fora de combate! - declarou Rockwell.

— Eu só ataquei você uma vez, mas foi o suficiente para o veneno da minha Kakuna penetrar o organismo de seu pokémon - explicou Aza. - A cada rodada, o veneno esgotava mais a energia do seu Rattata até deixá-lo incapaz de batalhar. E pra confessar, foi até mais rápido do que pensei.

Os espectadores ovacionaram.

— Muito bom, Aza! - gritou Lucas.

Sakura parecia ter superado o choque inicial, a raiva tomava conta agora. Ela cravou o olhar na oponente. Seus olhos negros eram ameaçadores, contudo, Aza permanecia tranquila. Ela arremessou outra pokébola e um lobinho marrom, com olhos e orelhas grandes e uma pelagem cor de creme em volta do pescoço, apareceu.

— Eevee, eu escolho você!

Eevee foi o primeiro pokémon de Aza, ela o ganhou do seu pai no aniversário de dez anos e estão juntos desde então. É do tipo normal e pode evoluir para várias formas diferentes.

— Já que vai usar seu primeiro pokémon, eu também vou. Volte Rattata! Vai Ivysaur! - Sakura convocou seu parceiro para a batalha.

Um pokémon esverdeado com um grande bulbo rosa nas costas apareceu. Era bem maior que Eevee, tinha cerca de um metro de altura. Lucas abriu sua pokédex no mesmo instante. Já ouvira falar bastante sobre Ivysaur, mas nunca havia visto um pessoalmente.

“Forma evoluída do Bulbasaur, este pokémon possui um grande broto nas costas,” a voz metálica da pokédex começou sua didática explicação, “quando começa a passar bastante tempo sob a luz solar e a emanar um cheiro característico, é sinal de que o broto vai florescer em breve.”

— Nossa, então seu Bulbasaur evoluiu… - disse Aza. - Não tem problema, ele não será páreo para meu Eevee.

— É o que veremos - rebateu Sakura.

— Que o segundo round comece! - disse o juíz. 

Sakura foi quem tomou iniciativa para o primeiro ataque:

— Ivysaur, chicote de vinha!

— Eevee, - chamou Aza - evasiva e chute duplo.

Cipós saíram do bulbo de Ivysaur e se moveram em direção a seu combatente peludo. Os cipós, no entanto, chicotearam o ar, pois Eevee desviou de todos os ataques das vinhas e correu em direção ao inimigo dando um coice poderoso em sua cabeça e tomando distância.

— Estou impressionada de ver como Eevee é veloz, - admitiu Sakura - mas não vou desistir. Agora, Ivysaur, use pó do sono!

O pokémon broto obedeceu sua dona, no entanto Eevee correu para longe de seu pó sonífero com facilidade.

— Eevee, vá até ele e use mordida! - bradou Aza.

As presas de Eevee começaram a brilhar e ele se aproximou de Ivysaur, deu-lhe uma grande mordida e recuou.

— Mais uma vez, chicote de vinha! - falou Sakura.

— Ataque rápido - orientou Aza.

Os cipós de Ivysaur tentavam atingir Eevee, porém ele corria rápido demais. Ivysaur fora atacado novamente enquanto seu adversário saiu ileso.

— Eevee, é nosso momento! Finalize com chute duplo!

— Evasiva! - gritou Sakura, todavia seu pokémon não conseguiu desviar do coice.

Ivysaur caiu no chão, enquanto Eevee voltava para perto de sua treinadora. O juíz marcou alguns segundos e, quando percebeu que o pokémon de grama não ia levantar, determinou o fim da luta.

— Ivysaur está fora de combate - indicou Rockweel. - A vencedora é Aza!

A arquibancada aplaudiu e gritou. Várias pessoas foram até a ruiva para cumprimentá-la e Lucas era uma dessas pessoas. Além disso, estava muito ansioso, precisava contar o que tinha ouvido da diretora, sobre ter que batalhar na semana seguinte, porém sabia que não conseguiria naquele momento visto que até a Sra. White estava indo falar com a garota e ele não queria cruzar com ela de novo. Já estava dando as costas quando Aza o viu e o puxou pela mão para perto de si.

— Olha, não dá para conversar agora - disse ela - mas vamos nos encontrar na clareira perto da escola às três da tarde. Eu preciso muito falar com você.

— Eu também preciso falar com você - respondeu Lucas. - Te vejo lá e… Parabéns!

Ele saiu antes que a diretora chegasse mais perto, não queria cruzar com ela novamente. Felizmente aqueles saltos altos enormes não faziam dela a mais rápida da Tech Pokémon. Lucas saiu da arena cruzou o pátio das esculturas e entrou novamente no prédio principal da escola, indo direto para o seu quarto. Queria ficar um pouco sozinho já que não podia estar ao lado de sua melhor amiga e o quarto estava vazio.

O garoto não sabia o que fazer à respeito das ameaças da Sra. White. Ele olhou para seu Squirtle dormindo na cabeceira de sua cama, tão inocente. Nem sabia o que lhe esperava. Fugiria assim que ouvisse seu nome junto à palavra batalha na mesma frase. Esse era o Squirtle: preguiçoso, medroso e também um grande companheiro.

— Logo mais eu vou conversar com a Aza para ver como sairemos dessa, amigão - disse Lucas.

Porém seu pokémon não ouviu. Estava num sono profundo.