Venha Comigo. vol 4: Presente escrita por Cassiano Souza


Capítulo 6
Carta de suicídio


Notas iniciais do capítulo

Olá! ÚLTIMO CAPÍTULO, POR ENQUANTO. Pois começarei então a escrever e planejar um capítulo para a outra fanfic, que tem a Doutora.
E referência clara a The Chase.
BOA LEITURA!



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— Disse que seria algo que destruiria a nossa paciência. - Comentou Gordon. – Mas, essa sua postura séria e preocupada, é quem está a destruí-la.

Ele andava nervoso, de um lado a outro, envolta do console da cabine azul, em observar o Doutor, que apenas, se mantinha calado e sério, recostado aos controles, e fitando imóvel ao indivíduo do celeiro. Individuo, que se encontrava deitado, desacordado, e algemado, sobre o chão frio da nave, em edredons, e já novos trajes, cedidos pelo Senhor do Tempo.

— Você tem segredos, Gordon? - Indaga o Senhor do Tempo, onde Gordon, franze as sobrancelhas desentendendo a mudança de assunto. – Sim, ou não? - Insiste o Doutor. 

— Bem. - Engoliu a seco, lembrando do que habitava na mochila em suas costas. – Todos temos coisas das quais não precisamos dividir, não é mesmo? Não é obrigação ser um livro aberto. 

— Então sinto muito, mas qualquer um aqui poderá ser condenado por seu passado. - Alertou calmo. – Este ser, não pode mais existir, mas existe. Extintos, há bilhões da anos, em uma guerra. Seres militares, como os Sontarans, e quase esquecidos, porém, ainda assim... À nossa frente.

— Perigoso? - Indagou, cauteloso.

— Dependendo do que você já tenha passado, sim. Tudo o que você já sofreu, cada pensamento ou lembrança, sendo perigosa, vergonhosa, ou triste... Ele não poderá se controlar. Está com fome, e por sua capacidade hiper-trófica, até a sua história será comida.

— Isso é loucura!

— Cozinhar é loucura. Mas, sim, isso não foi literal.

— O que quis dizer?

— Todos os átomos, Gordon, todos os átomos do universo, são gravados em nêutrons de luz. Se pudermos irradiar esses átomos, por meio de uma certa corrente elétrica... Tudo o que já aconteceu ou vai acontecer poderá ser viso, lido, e contemplado.

— E ele faz isso. - Conclui Gordon, fitando o homem desacordado, de cabelos verdes e desgrenhados.

— Sim, ele faz, assim como uma televisão temporal que eu tinha antigamente. Era em preto e branco, mas era ótima! Queria saber porque nunca mais a-usei, ou onde a-deixei. Bem, a TARDIS é boa em perder coisas. Foi útil uma vez, contra os Daleks.

— Ok. - Gordon engole a seco, se voltando às escadas. A sua testa, estampava puro temor. – Vou até o banheiro.

— Com sabe que tenho um banheiro?!

— Ora. - Pensou. – Só achei que até alienígenas também ficassem apertados às vezes.

— Na maior parte do tempo, mas, preferia que nunca soubessem.

Gordon, sorri sem jeito, e apressado, prossegue para a escada, assoprando apreensivo, e dando passos largos, até, ser surpreendido por uma voz masculina, não familiar, a explicar algo:

— Siga à direita, segunda porta, vire para a esquerda, entre no armário, saia do armário pelos fundos, e chegue na travessa de corredores. Na travessa de corredores, entre no primeiro esquerdo, e siga pelo segunda direito, até a sexta porta, e pule pela janela.

Gordon, imediatamente parou estático, não compreendendo aquelas instruções, onde ao olhar para o Senhor do Tempo, o-via com a sua mesma expressão, onde surpresa e pavor se estabeleciam.

— Há coisas em suas costas, homem de bigode. - Afirmou, o homem de cabelos verdes, se levantando do chão, em encarar Gordon.

— Minha mochila. - Respondeu o humano, sorrindo disfarçadamente.

— Mochila? - Pensou. – Não, mochila não, não. Redondo e quadrado.

— Eu não sei do que fala! - Negou, evitando contato visual com o Doutor.

— Eu também não sei do que falo, mas, é sobre algo antigo, poderoso, terrível, e... Triste? Há horas onde não entendo a mim mesmo. - Chacoalhou a cabeça, desconfortavelmente.

— Bom, desculpe, mas acho que estou realmente bem apertado. - Se virou para continuar.

— Não. - Disse autoritária, a voz do Doutor, que fez o humano parar novamente, e se virar envergonhado. – Lhe abriguei em minha TARDIS, lhe permiti ir usar a minha privada, e agora... Descubro que você possui segredos obscuros?!

— Obrigado por me deixar usar a privada, mas como eu disse... Ninguém precisa ser um livro aberto.

— Sim, não precisa, não necessariamente. Mas, precisa onde uma amiga minha é posta em perigo, onde sou guiado para um completo estranho, que supostamente foi guiado igualmente por outro.

O humano, desce às escadas, sendo fitado pelo senhor Doutor, que exigiu: 

— Preciso saber, me conte o que possui, de antigo, poderoso, terrível, e... Triste.

— Não adianta negar, não é?

— Não. - Respondeu, sério.

— Bem, então me rendo.

Gordon, suspirou derrotado, desarqueando a mochila em suas costas, e retirando o mistério incitado, a esfera luminosa de vidro, que brilhava e sussurrava nas mãos do Doutor, que a encarava sem entendimentos.

— Uma observação. - Disse o Senhor do Tempo. – Isso é novo! O que é isso?! - Mirou o olhar curioso para o homem de cabelos esverdeados.

— Não sei. - Respondeu o homem de cabelos verdes, temeroso, como se o objeto representasse a maior questão de sua vida. – Algo me impede de compreende-lo. É como se... - Seus olhos se pararam estáticos. – Como se eu estivesse sendo privado.

— Mas é extraterrestre, como vocês. - Colocou Gordon.

— Sim. - Confirmou o Doutor. – Mas essas vozes... Isto por acaso é algum sistema de suporte de vida?! Acho que já ouvi falar em um planeta com tecnologias assim.  

— Suporte de vida?! Só em uma situação de puro desespero, suponho.

— Puro desespero, puro desespero e perigo. E algo está errado, muito errado, tudo está perfeito demais, encaixado demais, como uma... Armadilha. - Tirou o olhar da esfera, mirando-o para o homem de bigodes.

— Não fui eu! - O humano põe as mãos para cima.

— Grace Holloway. - Diz o Doutor, mirando agora para o homem de cabelos verdes. – Onde está? Você disse que demoramos. Por quê? só podia estar nos esperando. 

— Enfim, chegamos ao ponto. - Encarou, o ser de mechas verdes, de cima até em baixo ao outro. – O Doutor, um lendário, temido, amado, odiado, e velho, velho homem de Gallifrey. Você tem tanta história para ser vista. - Olhava sem foco. – E a garota da Terra... Não, eu nunca a conheci. - Se virou de costas.

Porém, insiste o Doutor:

— O seu aparelho telefônico, estava no celeiro. Você também. E havia um cadáver. 

— Também queriam respostas, nazistas são chatos. Um soldado, o-jogou. - Respondeu, indisposto. – Coisas são perdidas e achadas, e a morte está por todo lado. 

— Então está me dizendo que não sabe de nada sobre a Grace?!

— Estou. - Afirmou triste. – Nomes tem significados, não é? Assim como "Doutor", em muitas línguas é “poderoso homem sábio”, o meu é a “primeira verdade”.

— Verum-1 então. - Concluiu.

— Sim, Jardim do Vale.

O Doutor, desvia o seu olhar. Havia nele, vergonha e fúria. 

— Mas nomes são nomes, e palavras são palavras. - Colocou Gordon. – Dizer e fazer é diferente. Bocas são generais, não soldados. Gordon significa muitas coisas, e uma delas é “competente”. - Suspirou cansado. – Eu não sou isso.

— Então propõe que eu minta? - Questionou, Verum-1

— Se você está dizendo.

— Ora! Homem da Escócia, duvida de mim, que vejo o todo do seu caminho até aqui?!

— Os primeiros a dizerem isso são sempre os charlatões.

— Charlatões não diriam a você que “sim”.

— Sim o quê? - Cerrou os olhos.

— Sua esposa, está com você apenas por que não achou nada melhor. - Garhalhou. - Um magrela sem pulso que apanhou tanto no colegial... Por que mais estaria? 

Gordon, tomou uma triste e ofendida postura, aquilo havia doido. Talvez, houvesse sido uma das coisas que ele mais temesse saber. Verum continua:

— Sempre se perguntou, não foi? E aquela vez que te fizeram mastigar as próprias cuecas? Sabe que ninguém te quer próximo. 

— Não o-escute, Gordon. - Pede o Doutor. – Ele só pode saber do que você já viveu e viu, não o que você sente, ou o que houve em vidas de pessoas que ele nunca conheceu. Ele nunca poderia ter esta resposta.

— Será que não, Senhor do Tempo? - Verum-1, fita minucioso ao Doutor. – Será que eu não sei o que também há fora das vidas daqueles que me cercam? Tenha certeza, Susan chorou muito mais do que você, após aquela despedida. Ou melhor, abandono.

— Pare com isso.

— Não, porque você sabe, ela chorou sim, muito. Enquanto o querido avô... Apenas continuou.

Ódio, se assentou sobre a face do gallifreyano. O revelador termina:

— Sei que voltou muitas vezes escondido, mas do que adiantou?!

— Pare, sei o que está tentado fazer. Tentando nos desequilibrar, nos convencer. Talvez não conheça mesmo Grace Holloway. Que seja, mas não tem direito de usar as nossa falhas para nos atingir. - Se encararam sérios, com uma face quase tocando a outra.

— Me desculpe, acho que é inevitável, basta apenas... Olhar para alguém que não seja um de mim. Consumo as suas experiências, e vocês consomem peixe e fritas. Defecam, assim, como eu, argumentando.

Os dois seres alienígenas continuaram a se encarar sérios, pareciam estarem a ponto de um combate físico. Onde o humano, apenas se mantinha quieto e preocupado, frente aos dois, com o que poderia ocasionar.

— Se é tão sábio, me diga. - Pediu o Doutor. – Porque disse em plural quando se referiu ao que o Gordon escondia? Quadrado?!

— Últimas palavras. - Respondeu Verum-1, apenas.

— Não seja enigmático, enigmas são chatos! Estou cansado de enigmas por hoje. De sábado a sábado, e sempre na hora do chá! 

— Acho que ele se refere a isto. - Diz Gordon, retirando de sua mochila um livro, encapado em couro.

O Doutor, apanha a peça, onde em sua primeira página, se destacava: “diário do soldado Bill Hartnell”

— Não faço ideia de quem seja. - Disse o Senhor do Tempo, passando de página em página, e onde, algumas, até sujas de sangue estavam.

— Mas não pertence a apenas um alguém, senhor. - Avisa Gordon. – Em suas ultimas 10 páginas... Pertence a uma mulher.

— E por que não disse antes?! - Foi até o fim do diário, se deparando com: “diário de Xena”. – Xena quem? Quem é Xena?!

— Não me parece um nome.

— Apelido?

— Por que não?

— Mas de quem? Feminino?

— Leia, homem do espaço. - Sugeriu Verum-1. – Se acha que minhas palavras não são nada, confie nas dela.

E o Doutor, finge não escutar:

— Gordon, onde achou isto?

— No mesmo local onde encontrei a esfera. - Responde Gordon. – Numa trincheira qualquer, próxima a fronteira. Por sorte, achei logo, era um dia chuvoso.

— Ótimo. - Disse desconsolado, se sentando em sua poltrona confortavelmente estofada, e pondo os seus pés sobre um pequeno banco. – Xena, a princesa guerreira, vocês vão adorar a série. Mas, por que isso me lembra alguém?

Foi o gallifreyano, ao início do diário de Xena, concentrando os seus olhos, para uma talvez longa ou breve leitura, amarga ou alegre, a depender do que sairia dali. E ao percorrer com os seus olhos curiosos pelas primeiras linhas, logo, desespero o-tomou por imediato.

***

Diário de Xena. Está proibido de ler, caso não seja meu amigo, tipo a Betty ou Marys.

Terça-feira, dia 04/04, de 1942, que loucura, eu sei. Não devia estar aqui, mas estou. Não é a primeira vez que viajo no tempo... Mas, com certeza é a primeira vez que escrevo algo tão emburrada, quanto os relatórios do hospital. Devia estar lá agora! Ou sendo exata... Cerca de 58 anos no futuro.

E sim, aqui sou eu narrado, Doutor, eu, Grace Holloway, a mulher que te matou do coração. Nos perdemos um do outro, mas eu tenho esperança e certeza, iremos nos encontrar, iremos nos abraçar, e comer peixe e fritas.

Deve estar se perguntando onde eu achei essa caderneta, então, terei de dizer que... Eu não sei de quem ela era, ou se o sangue que borra as páginas eram de seu dono, mas, sei que a-achei por entre um cenário desolado, de corpos carbonizados e tanques e jipes estraçalhados, onde acabei chegando, após fugir de onde estava. Foi tudo tão aleatório, eu apenas cheguei até aqui, há três dias atrás, e então resolvi continuar a pé, não sei aonde mais aquela velha nave poderia me enfiar.

Estou na Rússia. Bem, União Soviética, no interior. Descobri que aqui era aqui, através de uma placa escrita com aquelas letras malucas do alfabeto cirílico. Só dava pra entender em meu idioma “terra prometida”, mas, sei que isso não existe.

Encontrei uma família de camponeses em uma fazenda, eles me deram pão e água para a viajem, e os-avisei sobre os avanços alemães, mas eles não acreditaram em mim, me trataram como uma maluca! Disseram que eu falava coisas estranhas! Dá pra acreditar?! Então os-deixei de lado, e segui em frente. Quero me manter isolada, em um mundo como estou agora, ninguém eu julgaria confiável.

Tenho muito para lhe contar, mas a página já está para acabar, e só me restam 09 ao todo. De três em três dias, manterei contato, mesmo que tendo de enfrentar a dificuldade de falar pouco, pois sabe que falo muito! Boa tarde, e até mais.

Dia 10/04, sexta-feira.

Olá, amigo. Minhas pernas doem, e a vontade de gritar só aumenta. Você sabe, não existe banheiros em bosques, restaurantes, ou camas, então, estou me sentindo uma sobrevivente daqueles filmes pós-apocalípticos.

Estou me aquecendo durante a noite, graças a um saco de carvão, que achei em uma vila destruída, graças a um cobertor, que achei numa posca de lama, e graças, ao casaco que ganhei na vila da qual fugi. Mas, em falar nisso... Tenho que te avisar, sobre o porquê de eu estar aqui.

Há uma ameaça além da guerra, algo perigoso, e terrível, e com certeza nada terrestre. Como sempre, aliens, é sempre assim, mas, já estou acostumada. Existem parasitas, vermes ou vermes parasitas, possuindo soldados nazistas. Não sei se poderia ser alguma arma biológica soviética, ou realmente coisa de fora do mundo. Sei apenas, que... Pode ser perigoso, para as pessoas e para a história. Queria tanto que estivesse aqui.

Paulus, possuía um destes seres, e por algum motivo, todos me receberam como se já me conhecessem, e estivessem esperando por mim. Alguém me queria aqui, para salvar o Paulus, e não romper a história. Mas, com tantas ameaças... Fica difícil achar que tudo acabará sem sequelas.

Havia um alienígena humanoide assim como nós também, em um celeiro que parecia mais ter sido tirado de um filme de terror. Ele, dizia coisas, e sabia de coisas, e disse haver um rival distinto, escondido em algum lugar do mundo, Verum-1 e Verum-2. Pensei ser o Mestre, mas acho que não faria sentido. Ou será que faz?

Não faço ideia, mas, consegui uma bola de cristal falante, e estou me sentindo atualmente uma bruxa. Brincadeira, mas como sempre, é alien, não é? Nossa, preciso de um psicólogo urgente. Pena pelo doutor John não estar aqui, mas ele não acreditaria em mim, foi assim quando você sumiu.

Bem, página terminando, então até mais. E não se preocupe, ainda tenho um pão, dá para ser o almoço e janta de hoje, e a água... Há muitos riachos pela região. Até segunda, ainda há muito chão para caminhar.

Dia 13/04, segunda-feira. Que sorte estarmos na primavera, tomara que me encontre antes que chegue o inverno.

Deve estar se perguntando para onde eu estou indo, mas, a resposta é muito simples, eventos históricos importantes e desastrosos. Pois, onde há caos, grandes explosões, dor, e choro, é lá onde o Doutor sempre vai atender. Stalingrado me aguarda, só consigo imaginar aquela cidade! Afinal, outros grandes acontecimentos já chegaram ao fim, como a tentativa frustrada de invasão a capital Moscou, que foi ano passado, em 1941, onde fortes chuvas impossibilitaram o trafego inimigo. E eu sei, o cerco de Leningrado vai até 1944, mas não há como participar de um acontecido tão insolado, então... Só me resta Stalingrado em mente, já prestes a acontecer oficialmente no mês depois do mês que vem, 17/06. Espero estar viva até lá.

Mas a verdade, é que eu nunca teria chegado até aqui sozinha. Agradeço ao doutor Charles, um médico nazista, porém, com algo ainda de bom dentro dele, e principalmente também, a Adelia, tenho a minha vida a agradecer a ela, e talvez, até toda a humanidade tenha. Porém, ninguém nunca saberá disso. Por que tudo sempre é tão injusto? Sua morte foi horrível, não quero relembrar, e nem sei se acabou mesmo morta ou se foi poupada, mas... Ela não merecia nada daquilo, ninguém sofrendo por aí agora merece. Acho que estou com trauma de cachorro.

Ela confiou em mim, e se machucou por isso, me sinto agora um monstro. Mas eu confio em você, amigo, e continuarei a confiar.

Porém, fiquei triste agora, nos falamos na quinta. E também porque, a caneta está falhando.

Dai 16/04, quinta-feira. Novidades.

Aquela caneta acabou a tinta, mas... Por sorte ou azar, achei a mochila de um cadáver pelas pradarias, por onde um dia houve algum conflito, e lá, tinha uma caneta.

Me sinto mais magra. Na verdade... Estou mais magra. Venho me alimentando apenas de alguns frutas silvestres que acho por aí, e não sei caçar, e nem teria coragem! Então... Me sinto fraca, solitária, e amaldiçoada. Será realmente que o que vivemos não seria um pesadelo ao invés de sonho? Não gosto de me questionar sobre.

Mas, ainda agradeço. Os chãos de capim e grama que piso agora, estão todos esmagados por tanques, então, poderia ser pior, eu poderia ter sido pega por um soldado, ou poderia estar presa em Leningrado, cercada, sem água potável, alimentos, energia, ou remédios. Aquela cidade tentou ser forte, não quis se render, enfrentando as forças inimigas, até serem celadas. As pessoas lá agora, estão se canibalizando, ou comendo pão de serragem e farinha, papel de parede, ou peças de couro. Eu nunca aguentaria isso, serão mais de 850 dias. 

Ou, eu poderia estar em Auschwitz, um dos centenas de campos de concentração espalhados pela Polônia, onde mais tarde, se tornou praticamente de extermínio, e onde, tristemente mais de um milhão de pessoas morreram. Ou melhor, foram assassinadas. Não consigo nem imaginar qual seria a sua reação se um de seus amigos acabasse parando lá. Mas lhe peço, Doutor, aconteça o que acontecer... Não se preocupe comigo, não se irrite por mim, e não se enalteça. Seja o Doutor, não o guerreiro.

E com licença, mas estou escutando algo de estanho por perto...

Dia 19/04, domingo, adoro domingos, dia de ir ao teatro ver opera. Já aqui, tenho o canto dos pássaros e insetos, o que também é relaxante. 

Mas o som estranho que disse ter escutado era outro, eram soldados marchando, rumo ao Cáucaso. Me escondi imediatamente, entre troncos e arbustos no chão, e naquele momento, eu agradeci por estar mais magra. Mas você sabe, os alemães precisavam de petróleo, consumiam bastante, utilizando em seus demais veículos e Panzers, então, ele é um elemento essencial se quiserem continuar nesta guerra. Sabe que estou falando da operação Céu Azul, onde 38 divisões marcharam para o sul, e onde mais tarde, se dividiram, em um rumo ao petróleo, e outro rumo a Stalingrado, em busca de sua destruição, por ser um forte centro industrial, e onde, ao fim de sua batalha, mais de 40 mil morreram.

Por sorte, essas tropas deixaram alguns enlatados para trás, e restos de comida. Me senti como um animal naquele momento, como se a colocação “sub-humana” se encaixasse a mim.

E tudo por quê? Porque uma nação enfraquecida economicamente, socialmente e culturalmente estava cega pelo ódio que recebia do mundo ao seu redor, com os seus erros do passado, e que a fez fechar ainda mais os seus olhos, e que a fez ter muito mais fúria. O nacionalismo então achou um ótimo colo nesta situação, e assim, se assentou sobre a Alemanha, sendo guiado pelo guia, o Fuhrer, que inacreditavelmente um dia sonhou em ser pintor, um artista. Mas agora, não passa de um primeiro ministro ditador e sanguinário, cheio de ódio, e crente em ideias que levariam apenas ao homem ser o lobo do homem.

Olhe só, desculpe Doutor, mas, deixei algumas lagrimas caírem sobre as linhas. Dá pra entender ainda, mas queria nunca mais chorar, estou cansada disso.

Venha logo, meu Senhor do Tempo cabeludo e mal vestido.

Dia 23/04. Nada que gostaria que soubesse.

Dia 26/04. Nada que gostaria que lesse. 

Dia 29/04. Nada que me orgulharia de ter feito.

Dia 02/05. Nada que eu gostaria que alguém passasse.

Dia 05/05, terça feira.

Eu não queria ter de voltar a escrever, mas acho que não há esperanças, meu amigo, e estamos na última página, então, merecemos uma talvez última conversa. O território dessa nação é enorme, e estando a pé, acho que nunca chegarei até você. Estou no meio de um bosque, onde algum embate com certeza aconteceu, a julgar por os destroços das arvores e capsulas de balas.

Porém, não estou aqui para falar disso, estou aqui para te explicar, explicar o porquê desse nome no diário. Quem é Xena? Xena quem? Bem, sei que tem a personagem da série de TV, mas, estamos falando de mim agora. É um apelido, do qual o meu avô me chamava desde criança, nunca me disse por que me chamava assim, mas... Assim como você, ele dizia que eu estava destinada a fazer grandes coisas. Isso me arrepia até agora, como poderiam pensar o mesmo? Não acho que você tenha conhecido ele.

Ele foi marinheiro, e piloto do exército americano, assim que o Japão atacou a base naval americana de Pearl Harbor, no Havaí em 1941, e que fez o meu país entrar oficialmente para a guerra.

Você gostaria do meu avô, me deu uma vez de presente o meu primeiro livro de não-ficção, O Diário de Anne Frank, e me identifiquei muito com aquela garota, junto de Virgina Hall, Ruby Bradley, Nancy Wake, e Noor Inayat Khan.

Mas, o meu avô já se foi, então apenas o-verá com viajem no tempo agora, o que será injusto para mim, pois será como um fantasma. Foi perder ele que me fez o que sou hoje, a mulher teimosa, corajosa, chata, e até boba. Uma médica.

Sei que isto parece mais uma despedida, mas o que mais poderia ser? Não sei mais o que falar, exceto que se apresse, preciso salvar a esfera falante, ela não para de falar em perigo, e inimigos. Há coisas estranhas ao meu redor também, como falta de cadáveres. Pode parecer loucura, mas deveriam haver mais corpos por onde eu passei, e não haviam. Sei que alguns dos os soldados combatidos eram levados às suas famílias, e outros queimados, mas mesmo assim... Acha que nenhum corpo ficaria para trás? Há algo errado, sei disso. Verum-1, mencionou que os possíveis planos de seu rival incluiriam utilizar os mortos, você não acha que...? Eu desconfio.

Mas, perdão de novo, Doutor, a minha fogueira está para apagar, e desde ontem ouço coisas no escuro. O rádio também ficou maluco, e não quer parar de chiar. Restaram algumas linhas, então se eu voltar viva do lado de fora do jipe em que estou... A gente se fala.

Grace, saiu do jipe, abandonado e velho, por entre as trevas da noite, e clareiras do bosque. Ela, logo se decepciona com o fogo, protegido e escondido por uma mureta de pedregulhos, que dando trabalho para se prolongar estava tendo, devido ao orvalho da tarde. Grace, então retirou a lata das brasas que usava como panela, em que estava a preparar algo, para, assoprar as labaredas, e adicionar mais alguns gravetos.

— Ah, você escolhe, ascende, ou te jogo água! Que falta o fogo da Marys faz.

E um estalo por entre os arbustos, ao longe, se sucedeu. Grace, olhou em imediato para aquela direção, mas, nada podia notar, pelo breu lado a lado. Ela tentou ignorar, e voltou novamente a sua atenção para o fogo. Até, que ele se apagou por completo, com se o sopro do mais duro frio o-tivesse matado. Grace, então permaneceu imóvel, em respirar ofegante, e encarar as brasas envigoradas.

— Parece que hoje não é o meu dia de sorte. - Disse baixo. – Mas fazer o quê? Nunca é.

Fitou sem alvo determinado à densa escuridão, até, notar pelas leves frestas lunares algo vindo por entre a floresta, em sua direção. Os seus olhos se arregalaram amedrontados, instantaneamente, e se voltando para outras direções, o mesmo ser via, algo humanoide, como com certeza sendo homens vindo pelo escuro, lentos, e monótonos, em seus movimentos.

— Não. - Disse para si mesma, a ruiva.

Mas, se voltando para o jipe, outros dos mesmos indivíduos Grace notava pelas frestas dos leves brilhos lunares e relevos nas sombras. Não adiantaria entrar no carro, apenas, encurralaria a si mesma. Então, logo a saída também não seria correr sem rumo, já que não se podia ver um palmo a sua frente. A saída, foi se esconder em baixo do veículo, e manter silêncio, enquanto, dentro do mesmo, a esfera de vidro brilhava peculiarmente, e o rádio continuava a chiar.

— O que esse rádio tem?! - Resmungou, já escondida lá de baixo. 

Os homens do escuro, chegam até próximo ao carro, encarando-o com os seus olhares desfocados, e sem brilho, como os de um boneco de cera, ou retrato antigo. Em suas costas, haviam protuberâncias, e suas peles eram pálidas, e os seus odores horrendos. Sabia-se disso, pela face de Grace, cujo a boca e narinas estavam fechadas por suas mãos, evitando qualquer barulho por espirro ou tosse.  Porém, os homens olharam envolta por alguns segundos, com as suas expressões de "não emoção", tentando encontrar a algo, que aparentemente, não encontravam. Assim, se retirando eles, para uma só direção. Grace, respirou aliviada.

— Até mais. - Disse a doutora, se retirando depressa de seu esconderijo, para apanhar a esfera e o seu diário, e fugir dali.

Porém, se não fosse, pelo fato da mão que a-segurava por seu pescoço agora, em esgana-lo fortemente exagerado. Isso, há havia pego de surpresa, e a suspendeu no ar.

— Me solte! - Berrava a mulher. – Me solte! - Porém, nenhum de seus pedidos era cumprido, apenas, mais força contra a sua garganta. – Por favor! Socorro! - Gritava, e estapeava o homem, que nem ao menos demonstrava prazer ou ódio, apenas, uma face abobada e sem expressões concretas. – Por favor! Por favor!

Chorava e soluçava, já sem oxigênio, e forças de combate. Mas, emergindo de dentro da protuberância por de trás dos ombros do homem, seres rastejantes como vermes marchavam por seu braço, até, o pescoço da doutora, para logo, adentrarem à sua boca.

— Não! - Os seres desciam-lhe pela garganta, e logo, vinha a vontade de vomitar, mas, vomito nenhum conseguia sair. – Não!

Grace, rispidamente se contorceu, tendo o seu corpo sendo invadido por seres horrendos, trazendo impressões infernais. Sentia que aquilo significava apenas uma coisa; morte. Não conseguia mais pensar em esperança, escapatória, consolo, ou toda a compaixão que transmitiu por toda a sua vida, pensava apenas em que “sim”, ela estaria perdida.

Os seus braços e pernas, se debatiam, e o seu abdômen, se contorcia. O indivíduo, larga-a no chão, após deixa-la de lado, fitando apenas, à agonia da pobre, até, que se chegasse ao fim, e ela, estivesse completamente sem vigores e força de vontade. Assim, como uma pedra, assim, como uma boneca, assim, como um cadáver. Estava estirada pelo chão, de olhar fixo e desamparado para as nuvens, e onde, em momentos atrás, olhou para os céus, e pensou que haveria estrelas, porque queria que naquele momento, houvessem estrelas.

Não haviam, mas, algo a mais havia, a esfera sussurradora, que brilhava ofuscante, enquanto o rádio prosseguia com a sua chiata.

***

O Doutor, não conseguia crer no que acabara de ler. A sua respiração se mostrava cansada, os seus pelos, arrepiados, e o seu olhar, completamente ameaçador. Ódio e medo, abraçavam os seus pensamentos, e fúria e impaciência, apertavam as suas mãos. O diário tremia nervoso em seus dedos, até, ser atirado no chão, como um descartável qualquer. Mas, disse calmamente indignado:

— Não. - Se voltou sério ao console.

— O que houve? - Perguntou Gordon, preocupado. – Está tudo bem, senhor?

— Não, não está nada bem. Nada ficará bem, nem para mim, ou para quem estiver brincando comigo. Regra 7 da TARDIS, nada de brincadeiras! - Fitou para Gordon e Verum-1. – Grace esteve por uma última vez com a esfera falante em um jipe. Mas você, Gordon, disse que encontrou ela em uma trincheira qualquer.

— Mas foi em uma trincheira qualquer!

— E você, Verum-1, disse nunca ter a-conhecido, mas ela citou claramente o seu nome! 

Verum-1 sorri:

— Eu sei, mas, sei também que você pensa melhor quando está sob pressão. Me agradeça quando lhe nascer uma grande ideia. Atravez de Grace, pode conhece-lo, sabia que viria algum momento, de alguma forma. Fui liberto das correntes no confronto da vila, um soldado me implorou ajuda. Enfim, tentei fugir e acabei ferido, já o humano, morto. Então... Aguardar pela caixa azul foi a melhor opção, mesmo que atrasada. A esperança nunca morre, certo? 

Mas, ao invés do sentimento de agradecimento, o Senhor do Tempo apenas encarou ao outro com pura irá e repreensão, em um mortal olhar farpante.

— Senhor Doutor. - Quebrou Gordon a tensão. – A sua amiga, o que o livro diz?

— Final incerto. - Respondeu o gallifreyano. - Talvez morta, talvez viva, ou talvez, eu esteja sendo lento.

— Como assim?

— Me passe a sua pistola. - Estendeu a mão.

— Minha pistola?!

— Literalmente.

— Mas o senhor já me disse não aprovar armas.

— Bocas são generais, não soldados! 

Se entreolharam contrários, mas, por fim, Gordon cumpriu o pedido, entregando a arma, que o Doutor, logo analisou e confirmou carregada. Verum-1, sorriu malicioso, e o Senhor do Tempo, logo apontou a peça para cima, onde só havia o louco telhado espacial, de estrelas e planetas da vastidão da nave.

— Uma pergunta, senhor. Está louco?! - Indagou o humano.

— Eu não. - Respondeu. – Mas alguém por aí está. Alguém que se acha inteligente, que se acha esperto, e que sinceramente, sinceramente... Não sabe com quem está brincando. - Mirava, fitando destemido para cima.

— Pretende algo?

— Grace contou sobre o motivo de tudo estar acontecendo, contou sobre precisar salvar Paulus, sobre evitar a sua morte, evitar uma interferência no tempo. Sabem o que isto significa?

— Não. - Respondeu o humano, simplesmente desentendido. 

— Significa que há alguém preocupado em não danificarem a história, preocupado em evitar interferências. E se há alguém preocupado em não danificarem a história e preocupado em evitarem interferências... Então se há uma coisa que essa pessoa não deve gostar nada são de paradoxos. Bagunçam tudo, e pifam os micro-ondas, ninguém gosta.

Deixou de apontar para cima, em olhar e armamento, para direciona-lo agora, para a testa do humano, que apenas, mirou os seus olhos amedrontados para o cano entre eles.

— Pai do Brigadeiro, eu adorei ter te conhecido.

Gordon engoliu a seco, e Verum-1, sorriu nostálgico, esfregando as mãos.

— Bem. - Gaguejou Gordon. – O que fará exatamente?

— Adeus.

O Doutor, puxa o gatilho, e o estridente som do disparo, percorre por toda a sala do console e TARDIS.

 


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Notas finais do capítulo

E então o que acharam? Eu estou sendo muito detalhista, não estou? Espero que não estejam com a cabeça cheia.
Não houve aparente carta de suicídio, então talvez tenha se sentido enganado. Mas tive os meus motivos para fazer o que fiz, e talvez a real carta suicida seja o diário de Bill Hartnell. Referência ao ator do 1° Doutor, que também provavelmente lutou na guerra, só não naquela região.
Alguns dos fatos históricos citados aqui eu já ciei em capítulos passados e suas notas, então não voltarei a explicar.
Mas sobre algumas citações: Virginia Hall, foi uma espiã deficiente americana que atuou na França, reportando mensagens de rádio alemãs.
Ruby Bradley, foi uma enfermeira que servia com os militares americanos, até ser capturada durante o ataque a Pearl Harbor. Ela ficou detida por cerca de 37, e durante esse período realizou mais de 200 cirurgias incluindo partos, no campo de concentração em que estava. E mais tarde ainda atuou na guerra da Coreia.
Nancy Wake, foi uma aliada da resistência francesa, e chegou a ser uma das mulheres mais procuradas por alemães. Ela transportava por anos secretamente pessoas, documentos falsificados e refugiados da França durante a guerra, até que tristemente foi capturada. Porém mesmo sob forte pressão em interrogatórios, nunca revelou nenhum segredo e ainda conseguiu escapar, em 1943. Ela então foge para a Grã-Bretanha, onde se uniu alistou na Executiva de Operações Especiais. Mais tarde ela voltou para a França, como uma espiã britânica. Lá, liderou um exército de 7 mil rebeldes contra o 22 mil alemães.
Anne Frank, nem preciso dizer.
Mas agora sobre esse passado as raízes da Grace, onde ela tem um avo que foi importante em sua vida. Isso sou eu quem está inventando, então não achem que isso está na história da personagem por parte do universo expandido ou série. E nunca usem essa ideia, pois é minha. Peguei um pouco das histórias das companions modernas, e fiz uma releitura.
Agora sobre o capítulo e futuro da história, o que acham e esperam?



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