Pretérito Imperfeito escrita por Fe Damin


Capítulo 4
Capítulo 03


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas maravilhosas, tem alguém aí ainda?
Espero que sim...
Peço mil desculpas pela demora em postar a continuação da história, mas vocês vão acreditar se eu disser que esqueci? Pois é verdade kkkk
Tantas coisas acontecendo que eu deixei escapar totalmente da minha mente que eu já tenho trocentos caps dessa história para vcs!
Mas não vai acontecer de novo, prometo (tentar) :D
Espero que gostem!



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James Potter se orgulhava em dizer que não deixava a opinião dos outros sobre ele o afetar. O que mais o irritava era a insistência idiota das regras em possuir exceções. A dele tinha longos cabelos vermelhos e olhos verdes. que antes ele achava tão acolhedores, só para substituir o pensamento pelo gelo que, no presente, o encarava todas as vezes que a dona daquele olhar se dignava a perceber que ele estava no recinto. Como aquela garota tinha a coragem de levantar o nariz perfeito e o tratar como se estivesse acima dele? No seu próprio pedestal onde achava ter permissão para vestir uma capa de ultrajada, quando na verdade fora ele o devastado pelas atitudes insensíveis dela. Foi o coração dele que teve que se segurar inteiro depois dos ataques certeiros de palavras cruéis ditas como se não fossem nada.

No entanto, era mentira pensar que ele não sabia a razão da situação em que se encontrava, ele sabia sim, e muito bem. Apenas não gostava de se lembrar, pois batia de frente com a realidade que ele fazia questão de mostrar a todos, a fachada que ele construira tão cuidadosamente durante os anos. Ele era o despreocupado, para quem tudo vinha fácil e o sorriso charmoso conseguia livrar da maioria das enrascadas. Não combinaria com essa fantasia, admitir ter deixado seus sentimentos levarem a melhor, reconhecer que, o antes conquistador desapegado, tinha sido rendido por um sorriso doce e uma coleção de sardas. 

Falso, no final era tudo falso.

A raiva borbulhava dentro de si, todas as vezes que ele se deixava pensar no papel de idiota que representou, no motivo que deve ter sido para várias das risadas sarcásticas de Lily, sempre alimentando a mágoa que agora era residente permanente de seu peito. Esse sentimento só o fazia querer provocá-la, arrumar briga, provar algo que nem ele mesmo sabia o que era. Porém, até quando o motivo era trocar farpas, se tornava necessário estar por perto, e ele não conseguia decidir se gostava ou odiava o fato de ser incapaz de se afastar totalmente. Deixáva-o satisfeito ver os olhos dela pegando fogo, queimando com os ataques que ele disparava, pois se ela se deu ao direito de brincar com ele, nada mais justo do que devolver na mesma moeda, ele pelo menos tinha a coragem de fazê-lo na frente de quem quisesse ver.

Pelo menos havia um lado positivo: James tinha aprendido a lição. Entendera que o melhor para manter-se inteiro, era seguir os ideais de seu amigo Sirius. Ele estava mais do que certo quando declamava ao grupo de amigos que não valia a pena se concentrar em uma só pessoa, prender a sua existência e condenar a sua felicidade a depender de um indivíduo só, não era apenas um risco, era imprudente, e a razão era o simples fato de que a tendência dos seres humanos era decepcionar uns aos outros. Há algum tempo, James achava que essa era uma visão um tanto cínica e pessimista da vida, resultado de uma família que não sabia distinguir parentes de inimigos, mas seu erro de julgamento veio lhe mostrar que olhando por esse prisma, sua segurança seria muito mais forte. Ele duvidava que algum dia veria Sirius com um coração partido.

Nunca havia contado a nenhum de seus amigos o que realmente sentia por Lily, nem quando seus convites de brincadeira começaram a assumir um tom mais sério, e muito menos quando ele sentiu vontade de engolir de volta todas as palavras gentis que já dirigira a garota. Preferia deixar que eles achassem que era um joguinho, praticamente uma tradição dele, a de implicar e correr atrás da ruiva. Quanto menos portas abrisse para sua alma, menos trabalho teria para cuidar de suas defesas. Além de tudo, sabia que eles gostavam dela, era uma amiga querida, e não estava disposto a lidar com o que implicaria destruir essa ilusão. Ele cuidaria de seus problemas sozinho, do jeito dele e tudo ficaria bem.

Entretanto, as brigas ferrenhas, que começaram já no primeiro dia do ano letivo, não tinham como passar despercebida pelos marotos. Peter nunca teria peito de abordar o assunto, mas James sabia que Sirius e Remus remoiam as cenas e deviam estar a beira de começar algum tipo de sermão. Ele até tinha passado as férias mentalizando que deixaria tudo passar, não ia se incomodar, não ia se importar, porém bastou o olhar de desdém de Lily ainda no trem ao ver que ele era - assim como ela - o monitor chefe daquele ano, para jogar todas suas resoluções pela janela. Ela não dissera nem uma palavra sequer, mas não foi necessário, a atitude fria e hostil podia ser sentida até na maneira com a qual ela fingia escutar o que ele dizia.

Claro que a situação virou um braço de ferro e, se antes ele competia com ela para conseguir vencer suas supostas barreiras e trazê-la para perto de si, agora eles disputavam a última palavra. Ela assumiu sua melhor pose para ignorá-lo, mas isso não aplacava raiva, então ele forçava uma interação, obrigava-a a entrar no jogo e reagir, apenas com dois participantes ele poderia ganhar. E dessa forma continuava a interação entre eles. Trocas de farpas e insultos velados, que James desejava com todas as forças que pudessem ajudar a eliminar de si qualquer resquício de propriedade que a ruiva ainda possuísse sobre aquilo que sentia, e tinha que ser logo, pois não conseguia voltar a olhar em outras direções enquanto só se ocupava da raiva que precisava alimentar.

Depois da aula de transfiguração, onde a professora McGonagall fez o favor de interromper o que estava sendo um dos seus melhores ataques dos últimos dias, James decidiu que não iria para a aula de Advinhação naquela tarde. Estava irritado demais para passar duas aulas escutando o lenga lenga infinito da Professora Trelawney sobre algum tema que provavelmente não teria nada a ver com os trabalhos que precisariam fazer. Ao invés disso, faria qualquer outra coisa.

—Onde você vai, James? - perguntou o seu amigo Peter, na voz baixa e chiada de sempre.

—Pra qualquer lugar que não seja a próxima aula - ele respondeu quando saíram do almoço.

—Vai faltar de novo? Já marca uma bronca do Remus na sua agenda - zombou o Sirius, fazendo menção à personalidade muito mais responsável do amigo em comum.

—Ela não vai falar nada que eu já não saiba - deu de ombros, sabia que era inteligente, e suas notas nunca disseram o contrário.

—Posso ir com você? - Peter sempre estava em busca de seguir James para onde quer que pudesse, mas no momento o rapaz queria sossego.

—Não, Peter, você vai para a aula, ou já esqueceu da sua nota nessa matéria no ano passado? - não foi necessário mais nenhum argumento para convencê-lo.

—Tudo bem…

—Vejo vocês mais tarde - se despediu e tomou rapidamente o caminho para fora do castelo, não traria nada de bom ser pego vagando pelos corredores.

Ele pensou em ir até o lago, em espairecer no campo de quadribol, mas acabou se decidindo por fazer uma visita ao seu velho amigo. Não precisou pensar nas direções até a cabana do gigante que morava nos terrenos da escola, tamanha era a quantidade de vezes que já as tinha percorrido. Avistou de longe a cabeça barbuda de Hagrid pela janela, ele parecia animado com o que quer que ele estivesse mexendo. Ao se aproximar mais, James conseguiu escutar uma melodia alegre que ele cantarolava, mesmo que as palavras fossem impossíveis de entender.

—Olá, Hagrid! - James o cumprimentou pelo lado de fora da janela.

—James, que surpresa! Venha, entre - ele foi até a porta pesada de madeira e a abriu para que o garoto se juntasse a ele no interior da cabana - ao que devo a honra da visita?

—Só vim conversar um pouco com meu bom e velho amigo - ele lançou um sorriso sincero.

Conhecia Hagrid desde o primeiro dia em que pisara em Hogwarts, e a simpatia com o gigante foi instantânea. Ele tinha um bom coração e, mesmo com seus gestos meio estabanados e habilidades duvidosas na cozinha, sempre estava disponível para ajudar e oferecer qualquer tipo de apoio que os amigos precisassem, seja ele uma palavra de conforto, ou um conselho.

—O senhor não deveria estar na aula? - ele perguntou desconfiado.

—Nosso segredinho, sim? - o sorriso assumiu o tom levado de seus momentos de traquinagem, fazendo com que Hagrid risse.

—Vocês crianças não tem jeito mesmo.

—Era só adivinhação.

—Oras, é importante mesmo assim!

—Pois eu estou mais feliz numa folga - zombou o garoto.

—Tá certo - Hagrid deixou esse assunto morrer - fazia tempo que você não vinha me visitar.

—Último ano, sabe como é, os professores acham que tem que nos dar lição de casa para durar o resto da nossa vida toda - James disse dramático.

—A Lily também não aparece tem mais de uma semana, nunca mais vieram juntos, geralmente chegavam um na companhia do outro… aconteceu alguma coisa? - o gigante sentia falta das tardes de conversa dos três.

—Nada demais, ela só descobriu que eu não estou dentro dos requisitos - ele falou deixando pela primeira vez transparecer a mágoa, porém logo se arrependeu - esquece que eu disse isso, não aconteceu nada, de verdade.

—Hum… se você insiste, mas é uma pena eu sempre achei que vocês formavam um belo casal. Lembro que pensei “Hagrid, você ainda vai no casamento desses dois”.

—Nunca fomos um casal, Hagrid. 

—Ah, não?

—Só amigos, na verdade nem isso…

—Tem certeza?

—Como eu não ia ter certeza sobre isso? - ele deu uma risada fraca com o absurdo da pergunta.

—Bom… você parecia mais feliz com ela por perto - o gigante não era bobo e conhecia aqueles dois há vários anos, tinha certeza de que ali existia mais do que eles admitiam.

—Impressão sua, eu estou sempre feliz - como se para provar seu argumento, James exibiu um de seus sorrisos radiantes, mas que não podia ser mais forçado nem se ele quisesse.

—Sim, claro - percebendo que não adiantava insistir, Hagrid decidiu mudar de assunto - quer ver uma coisa legal? Eu estava até preparando as coisas para levar até lá quando você chegou.

—É algum bichinho de estimação novo? - todos os amigos de Hagrid conheciam sua paixão por tudo que fosse animal, principalmente os do tipo venenoso, perigoso, com garras e espinhos.

—Não exatamente…

—Por Mérlin, não são aqueles troços espinhudos que soltam fogo de novo, são? Me avisa logo que eu nem saio daqui, dá ultima vez quase fiquei sem olho.

—Não seja exagerado, aquele espinho não ia te cegar, mas confie em mim, dessa vez você não vai se arrepender.

—Espero que não - o garoto soltou um suspiro e foi atrás do gigante pela porta dos fundos da cabana.

—Ele não é uma beleza? - Hagrid perguntou quase em êxtase.

Deitado perto da plantação de abóboras estava um dos animais mais bonitos que James já tinha visto na vida.

—Isso é… - ele ainda estava surpreso demais para falar - um unicórnio? - a pelagem branca quase prateada, com a crina lisa que escorria pela sua cabeça e o chifre resplandecente não abriam espaço para dúvidas. O animal permanecia sereno, o olhar tranquilo vagando ao longe.

—Sim!

—O que tem um unicórnio fazendo aqui, Hagrid? Não é proibido prendê-los?

—Ele não está preso, James! Apareceu hoje cedo aqui, provavelmente veio da floresta, ele está machucado, não pode voltar assim - ele apontou para a pata do animal que o rapaz percebeu estar enrolada em ataduras.

—Ele vai ficar bom? - parecia quase um pecado uma criatura tão bela como aquela ter qualquer tipo de ferida.

—Vai, só precisa de tempo para a pata sarar, deve ter caído entre alguma das árvores, eles são animais muito inteligentes, quando estiver bom, vai voltar sozinho para casa - explicou o Hagrid - mas enquanto está aqui, ele não tem como se alimentar sozinho, por isso eu trouxe comida.

Assim se justificou a quantidade de folhas de vários tipo que o gigante trazia nas mãos enormes,

—Espero que ele se recupere logo - James disse com sinceridade.

—Quer me ajudar a alimentá-lo?

—Posso chegar perto? - ele não se lembrava muito sobre o comportamento desses animais, mas tinha quase certeza de que eram bem particulares quanto a aproximação de humanos.

—Já vamos descobrir, toma - ele botou um maço de folhas na mão do garoto e acenou para que ele fosse em frente - vá devagar, se ele reclamar, volte.

Pé ante pé, o garoto foi se aproximando. Alguns passos depois, o unicórnio fixou os olhos prateados no James, que se sentiu até desconcertado com a intensidade do olhar que parecia ler através da pessoa. Encorajado pela falta de negativa do animal, ele esticou o alimento, e ficou feliz ao ver que o bicho começou a mordiscá-lo. Ele se sentou em frente ao unicórnio, observando com atenção enquanto ele comia.

—Acho que ele gostou de você! - Hagrid disse contente.

—Ele é esperto - James zombou.

—São muito fiéis, os unicórnios, se você conquista a confiança de um, tem um amigo para a vida toda.

—Falta mais disso no mundo, as pessoas podiam aprender com eles - o garoto observou.

—São assim inclusive com seus parceiros, apenas um, mesmo depois da morte.

—Aí eu já fico triste por eles, por que se você só pode ter uma chance, faz o que se errar logo de cara? - novamente o gigante conseguiu ver o ar de ressentimento nublando os olhos do amigo, mas não comentou nada.

—Não falei que eles são inteligentes? Eles sempre sabem, nunca erram.

—Isso os humanos podiam aprender também, nunca se enganar seria ótimo…

Ficaram em silêncio enquanto o animal terminava de comer, não demorou muito mais tempo para que James se despedisse do amigo.

—Tchau, Hagrid e vê se não vai criar confusão com esse unicórnio.

—O diretor não está hoje, mas assim que ele chegar, vou relatar a situação, pode deixar, nada de confusão.

Já era quase hora do jantar, então James se apressou a voltar para o salão principal. Ele tinha treino de quadribol marcado para logo depois, então não podia demorar. Começou a comer antes mesmos que seus amigos se juntassem a ele, porém ainda estava no meio do prato quando Sirius se sentou à sua direita.

—Não perdeu nada da aula - ele declarou

—Como eu esperava, muito melhor a visita que fiz ao Hagrid.

—Não tenho dúvidas - Sirius ficou quieto por alguns segundos antes de abordar o assunto que realmente queria - Você vai insistir em não me dizer o que está acontecendo entre você e a Lily?

—Já falei que nada é o que está acontecendo. - James já estava cansado das inquisições curiosas do Sirius.

—Então o que foi aquilo antes da aula da Minnie hoje? - ele levantou as sobrancelhas sem acreditar no amigo.

—Só um lembretezinho para ela - ele deu de ombros sem querer alongar o assunto.

—James, meu velho, eu te conheço bem demais para você conseguir me enganar assim. Até cinco segundos atrás vocês eram só sorrisos e conversinhas, agora não podem trocar duas palavras que já sai uma briga…

—Por que você não vai perguntar para ela? Eu continuo a mesma pessoa.

—Continua mesmo, ainda de quatro por ela - Sirius falou em tom de deboche, porém acreditava piamente em suas palavras.

—Não sei de que sonho você tirou isso, Sirius, mas acho melhor inventar uma nova mentira para a sua mente viajar, essa aí está absurda demais.

—Ah, então você nunca quis nada com a Lily?

—Não vou dizer que a noção não me passou pela cabeça, ela é até gostosinha, mas depois que a gente vê o que tem por baixo da capa, não vale a pena a dor de cabeça - a mentira era tão grande que ele se impressionou de não estar escrito em sua testa.

—Quanta merda pode sair de uma boca só? A Lily é uma das melhores pessoas que vivem nessa escola, com certeza muito melhor do que eu e você - Sirius já estava se irritando com aquela atitude do amigo, ele queria ajudar, queria que ele fosse feliz, mas tudo tinha limite.

—Se você acha tudo isso, por que não vai lá se declarar pra ela? Aproveita e leva ela pra bem longe de mim!

—Ótimo, talvez eu faça mesmo isso - a declaração do amigo num tom tão presunçoso fez James querer dar um soco bem no meio do seus dentes, ele não sabia da onde o sentimento tinha surgido, apenas sabia que precisava sair dali o mais rápido possível para não fazer besteira.

—Essa conversa já está enchendo o saco, vou pro treino - não esperou por nenhuma reação do amigo, largou o prato como estava e saiu da mesa.

James foi pisando forte até chegar ao seu quarto, não melhorou muito o seu humor olhar para o lado oposto do corredor e ver a entrada que escondia os aposentos da sua eterna dor de cabeça. No ano anterior, teria sido um sonho estar a uma porta de distância da ruiva que ocupava seus pensamentos, porém no presente momento parecia mais uma ironia cruel da vida. O garoto nem entendia o razão pela qual foi escolhido para o posto, a não ser o seu profundo conhecimento de detenções que, no entanto, não tinham a perspectiva esperada de um monitor.

 Logo na primeira semana de aula, ele foi até a sala do diretor perguntar o porquê da nomeação, entretanto, Albus Dumbledore nunca fora especialista em respostas diretas. James conseguiu apenas um “parecia o certo a fazer”. Certo? Pois para ele parecia exatamente o oposto. Só o colocava a menos distância de Lily, além das horas de ronda e trabalhos em conjunto. Definitivamente errado. Ainda tentou argumentar com o diretor de que haviam pessoas mais qualificadas, só para aprender que mudar a opinião do bruxo era ainda mais difícil do que conseguir uma explicação.

James desviou o olhar para a própria porta, entoou a senha e entrou, satisfeito em se separar do resto do mundo por alguns instantes. Naquele espaço ninguém entrava sem seu conhecimento ou permissão, era reconfortante saber que a possibilidade de ficar sozinho existia. Porém, no momento ele não era uma boa companhia para si mesmo, os pensamentos ainda ferviam cheios de razões e sentimentos que ele não entendia e, francamente, não tinha tempo nem vontade de desvendar. O medo do que poderia descobrir era maior do que a curiosidade, bastava saber que estava bravo com as gracinhas do amigo, gente intrometida dava nos nervos.

Ele foi até seu quarto, jogou a capa escura sobre a cama, e tirou o resto do uniforme, trocando-o rapidamente pelas vestes escarlates que eram o uniforme de quadribol da Grifinória. Só de estar naquelas roupas já se sentia mais relaxado, quadribol era uma paixão que ele cultivava desde pequeno. Aprendeu a voar numa vassoura antes de ter idade suficiente para se lembrar como era não conhecer a sensação, e amava cada segundo do vento batendo em seus cabelos, junto com a liberdade de ver o mundo em borrões a sua volta. Enquanto ele jogava, não pensava em nada mais, a mente se desconectava de problemas, e isso era o que ele mais precisava.

Para sua sorte, o garoto não era apenas um entusiasta do esporte, ele era também muito habilidoso, num nível excepcional, o que o garantiu uma vaga no time da escola desde cedo. Tinha compatibilidade para jogar em mais de uma posição, porém nunca existiu dúvida de que ele nascera para ser apanhador. Sam McAllister, seu primeiro capitão, o disse uma vez que ele tinha a personalidade perfeita para ser o responsável por capturar a bola mais difícil do jogo: determinado a vencer desafios e com o nível de presunção suficiente para sempre achar que conseguiria. Os anos passaram, conquistaram a taça do campeonato - um dos momentos mais felizes da sua vida - e agora a responsabilidade de comandar o time era sua.

A notícia de que James Potter era o novo capitão do time da Grifinória não foi uma surpresa para ninguém, já que o anterior se formara, mas trouxe junto uma animação para os alunos e a expectativa de que a casa conquistaria novamente o título de dois anos antes. Aquele seria o segundo treino do ano, e o garoto continuava incomodado por não ter um time completo. Vários jogadores deixaram o time por terem terminado a escola, ficou para os seus ombros, aguentar o peso de escolher e formar um novo grupo de campeões. Era a primeira vez, desde que ele entrara para o time, que haveria uma mudança tão substancial de participantes. O treino anterior funcionara como teste inicial para novos integrantes, quase todas as posições foram preenchidas, contudo ainda lhe faltava um artilheiro.

Respirando fundo, ele pediu baixinho que dessa vez aparecesse alguém competente para a posição, o dia já tinha sido irritante o suficiente, não estava precisando de outra decepção. Olhou para o relógio pousado ao lado de sua cama, e constatou que tinha vinte minutos para o começo de treino, era melhor se apressar, se não, chegaria atrasado. Estava quase chegando a porta, quando escutou batidinhas vindas da janela. Aguardando empoleirada no parapeito, estava a sua coruja, no bico, uma carta.

—Sybil - ele abriu o vidro para que ela entrasse - o que você tem aí, garota?

A coruja depositou o envelope na mão estendida do dono, e esperou manhosa pelo carinho que sempre ganhava após um serviço bem feito. Não foi diferente dessa vez, James passou os dedos em sua cabeça, deixando o bichinho satisfeito. Ele sabia que não tinha tempo a perder, mas ao constatar que o remetente era seu pai, se apressou a abrir o lacre do papel. Seus pais já tinham uma idade avançada e, recentemente, sua mãe havia ficado doente. Ele havia escrito ao pai pedindo mais notícias alguns dias atrás, e sabia que não se concentraria em nada mais antes de ler o conteúdo da missiva.

 

Querido James, 

Pode ficar tranquilo, sua mãe se recupera bem. Já vejo suas bochechas coradas de novo, e até levei duas broncas por me preocupar demais hoje, portanto tudo de volta ao normal. Ela manda beijos e abraços e disse que escreveria ainda essa semana.

Espero que esteja tudo bem na escola, e como vai o time?

Mande notícias.

 

Com amor, 

Papai.

 

Uma onda de alívio se espalhou por seu corpo inteiro, sua mãe ficaria bem. Algo de bom a sair desse dia. A notícia tinha elevado consideravelmente seu humor, conseguiu até se livrar um pouco da irritação que o incomodava. Um sorriso lhe chegou aos lábios ao pensar na mãe fazendo sua melhor cara de brava para brigar com seu pai e com certeza falhando. James costumava dizer a ela, que ela possuía um coração grande demais para ser levada a sério quando tentava se zangar. O comentário, claro, o acarretava alguns puxões de orelha, mas nada que um sorriso certeiro não amolecesse a pose rígida da mãe.

Acabou passando tempo demais divagando com a notícia, faltavam apenas cinco minutos para o início do treino.

—Merda! - ele falou em voz alta - você vai ficar aqui ou vai voltar?

Perguntou a Sybil que respondeu se aninhando muito confortavelmente onde estava.

—Tudo bem, te vejo mais tarde então, garota.

James atravessou correndo o quarto e sua sala de estudos e nem prestou atenção a nada em volta quando passou pelo buraco atrás da estátua, seu intuito era chegar o menos atrasado possível. No entanto, ao atravessar o corredor, uma voz irônica e muito familiar se intrometeu em seus ouvidos.

—Atrasado, Potter? Não consegue chegar na hora nem pros seus joguinhos? - Lily tinha os braços cruzados, nos olhos, o melhor tom de condescendência

James quis xingar o indivíduo responsável por coincidências, pois, claro que ela tinha que estar chegando no exato momento em que ele passava. No entanto, quando se relacionava a ela, seu instinto para brigas não precisava de muito incentivo, aquela provocação foi o necessário para fazê-lo parar, e se virar para encará-la com um sorriso dissimulado.

—Isso, Evans, com certeza não te diz respeito - viu com prazer os olhos verdes se estreitando.

—Mas você faltando a uma aula me diz respeito sim, desse jeito você mancha a reputação dos monitores - ela apontou o dedo indicador em sua direção, sem maneirar na acusação.

Ele sentiu vontade de rir na cara dela, pois se a madame estava pensando que ele acomodaria sua rotina para servir aos moldes dela, estava muito enganada. Os minutos se passavam, mas aquela era uma chance boa demais para deixar passar.

—Estava me procurando para ter notado a minha ausência? - agora o tom era presunçoso, adorando a indireta de que a ruiva prestava mais atenção nele do que admitia, ainda mais por ela não fazer aquela aula com ele.

—Problema seu, se você tem amigos de língua comprida - ela deu de ombros, não se deixando afetar por um segundo sequer, o que deixou James insatisfeito.

—Pode se enganar, ruivinha - ele deu um passo à frente se colocando a um braço de distância da garota, se esticasse a mão, conseguiria lhe tocar o rosto - estou te vendo interessada demais.

—Não quero sua irresponsabilidade estragando o meu histórico, se você vai ficar perdendo aulas e se atrasando por estar ocupado em alguma festinha por aí… - ela ia continuar com o discurso de boa aluna, mas ele não tinha mais paciência para escutar, muito ela achava que conhecia da vida dele, quando na verdade não sabia do que falava. Ele podia muito bem ter jogado a carta do pai na cara dela, mas de que adiantaria? Não era mais sua intenção causar uma boa impressão.

—Você não sabe o que me atrasou, então não dê palpite onde não é chamada. Agora o que está me atrasando é você - cuspiu as palavras junto a toda a sua irritação.

Sem aviso prévio, ele se virou e desapareceu no corredor, deixando a Lily falando sozinha, já que ele não tinha dúvidas de que a garota preparava mais um argumento. Pronto, todo o alívio e tranquilidade que conseguiu ao ler a carta do pai foi suplantado por mais um encontro espinhoso. Lá estava a ruiva se colocando no papel de saber tudo sobre a vida dele, sempre com as piores conclusões, mas não era mais hora de deixá-la perturbá-lo, tinha um treino para conduzir.

Quando finalmente conseguiu chegar ao campo, o time inteiro o aguardava, bem como os alunos que tinham vindo em busca de preencher a vaga em aberto.

—Olá a todos, desculpem o meu atraso. Vamos começar primeiro com um aquecimento, e depois dar uma olhada nesses novatos - ele indicou para que todos montassem em suas vassouras, e em pouco tempo estavam no ar.

O time fez algumas repetições da sequência padrão de aquecimento, mesmo os novatos do time já se enturmavam bem. Finalizado o exercício, James montou alguns grupos para que pudesse avaliar a performance dos estudantes que queriam se entitular novo artilheiro da Grifinória. A fim de ter um resultado mais próximo do real, além de lançar a goles, soltou também os balaços, pois um artilheiro não precisava apenas ser bom de passes, mas também de esquiva.

Dizer que aqueles alunos eram ruins seria pouco, o teste foi um verdadeiro fiasco. A cada passe errado, ele respirava fundo para não esbravejar, mas a situação chegou a um nível tão crítico que não conseguiu continuar.

—Podem parar! Isso não está funcionando, de jeito nenhum! - ele olhou para os quatro alunos que estavam sendo testados - eu não posso ficar com um jogador que erra uma bola parada pelo aro, ou que quase escorrega da própria vassoura, ou pior ainda, que foge pro lado contrário!

Sem perceber, foi aumentando sua voz, e quando deu por si, os quatro garotos - todos mais novos do que ele - o olhavam com olhos arregalados. Ele se interrompeu e respirou fundo antes de continuar, tentando conter o peso da esperanças perdidas.

—O que estou querendo dizer, é que para entrar no time, precisamos que vocês tenham mais um pouco de treinamento, mas obrigado por terem vindo, qualquer coisa, vocês serão notificados.

Os garotos pousaram, e voltaram depressa para o castelo.

—E agora, James? Esses eram os últimos a tentar - Marlene, uma das colegas do seu ano e artilheira entre os integrantes mais antigos do grupo, indagou apreensiva.

—Não sei ainda, Lene, mas vou dar um jeito - de alguma forma ele teria que resolver o problema, contudo, sabia que não seria naquele dia.

Com um aceno de mão, fez o time voltar a formação e retomar o treinamento, no entanto, todos estavam agitados demais com a falha em completar o time, deixando com que a performance ficasse a desejar. James começou a se irritar com as várias besteiras que os companheiros estavam fazendos, e decidiu por finalizar o treino de uma vez, nada de bom sairia naquele dia. Sua cabeça ainda estava cheia do olhar de deboche de Lily e a paciência não havia se recuperado. Quando o último dos seus colegas de time saiu do campo, ele ainda ficou para trás a fim de guardar as bolas e tentar pensar um pouco sobre uma possível solução. Ele poderia muito bem jogar como artilheiro, mas duvidava que fosse mais fácil achar um apanhador entre os alunos de sua casa. Desistindo de pensar naquilo por hora, retomou o caminho para o castelo.

Satisfeito de, pelo menos, não ter encontrado nenhum contratempo para voltar para o seu quarto, James se livrou do uniforme de treino e gastou uns bons minutos no banho. O dia estava quase acabando, mas tinha ainda um lugar a visitar. Colocou as primeiras roupas que encontrou, e traçou o caminho até a enfermaria. Seu amigo Remus não estava se sentindo bem desde o dia anterior, então foi aconselhado a permanecer em observação junto à Madame Pomfrey. Devido a sua condição “delicada”, o garoto passava mais tempo em um daqueles leitos do que a maioria dos outros estudantes juntos. Todos os dias em que ele perdia alguma aula, ou tinha que passar afastado, os amigos o visitavam para relatar os acontecimentos, aquela não seria uma ocasião diferente.

—E aí, Moony, se sentindo melhor? - James puxou um dos bancos e sentou ao lado da cama onde o amigo estava sentado com um livro nas mãos.

Ele tinha a aparência cansada, as olheiras mais fundas do que o habitual, dando um aspecto doentio à sua compleição já delicada.

—Sim, amanhã já saio daqui. Nada contra as instalações, mas é meio silencioso demais - ele falou em tom de brincadeira.

—Como sempre, a Madame Pomfrey vai chorar sua partida - o amigo rebateu divertido.

—Achei que você viria mais cedo com o Sirius e o Peter.

—A cara do Sirius me tirou a paciência hoje - James resmungou, se lembrando da última conversa que tiveram.

—Ele não me pareceu muito feliz contigo também, não posso nem passar um dia longe que os mocinhos ficam de picuinha - ele revirou os olhos.

Geralmente o caso era esse, James e Sirius tinham as personalidades mais explosivas do grupo, de modo que eram os melhores parceiros em todas as travessuras, mas também nas brigas. Restava para Remus mediar a relação dos dois, e manter o mínimo e paz quando eles resolviam se estranhar, efeito colateral de ser o integrante mais ponderado no quarteto.

—Vamos mudar de assunto? Podemos falar sobre a aula de transfiguração, que tal? - James sabia que esse era um tema que atrairia a atenção de Remus.

—Não precisa, a professora McGonagall veio até aqui me passar o conteúdo que estudaram.

—Que atencioso da parte dela - ele falou meio a contragosto, tendo em vista que sua possibilidade de desviar de assuntos que ele não queria tocar, desaparecera.

Remus o observou de canto de olho, notando que o amigo não estava no melhor dos dias, mas mesmo assim decidiu retomar a conversa.

—Fiquei sabendo do showzinho entre você e a Lily hoje…

—Até você, Remus? O que é isso, uma intervenção? - ele franziu o cenho, abertamente descontente com o rumo do diálogo.

—Só estamos estranhando, vem acontecendo sempre desde que as aulas começaram - ele manteve um tom conciliador, nada de acusações ou repreensões.

—Foi o Sirius que abriu a boca? Ou foi ela que veio fazer fofoquinha? - James não duvidava nada que Sirius tivesse vindo tentar trazer Remus para sua empreitada, mas não seria nada impressionante se Lily fosse a pessoa a ter contado tudo, de preferência num ponto de vista bem favorável a ela.

—Nem um, nem o outro na verdade.

—Além de tudo é vidente, agora? - as palavras saíram cheias de ironia, e assim que as escutou se arrependeu.

—Além de tudo? - Remus levantou as sobrancelhas, sabendo exatamente sobre o que o amigo se referia, mas escolhendo relevar o fato pelo desconcerto evidente em seu rosto.

—Desculpa, Remus, é que essa história já me tirou a paciência hoje - o garoto passou as mãos pelos cabelos bagunçados, se amaldiçoando por ter falado demais, principalmente quando Lupin não tinha nada a ver com o seu dia ruim.

—James, você é uma boa pessoa, sabe disso, não sabe? - a pergunta veio do nada, mas era algo que Remus sabia que precisava falar mais cedo ou mais tarde, amigos estavam presentes para esse tipo de coisa e ele tinha consciência de que se não fosse ele a dizer, não seria mais ninguém.

—Que conversa é essa, claro que sei - James se surpreendeu com a pergunta, assumindo logo um ar defensivo.

—Eu não estou dizendo de saber da boca pra fora, e sim de saber de verdade, porque às vezes eu acho que você se esquece disso.

—Eu…

—Você se esquece, e pensa que tem que magoar as pessoas, você não tem que fazer isso, ninguém vai achar que você é menos James Potter, se for legal com quem quer ser. E a Lily não merece… 

Claro que tinha a ver com a Lily! Ou melhor, com defender a Lily do malvado James, mas se tinha algo que ele não ia escutar calado, principalmente naquele dia, era um despropósito daqueles, então interrompeu logo o amigo.

—Como você sabe que não? É tão mais fácil jogar a culpa em mim, não é? Claro, o James é o errado, olha só a ficha listando as merdas que ele já fez na vida, A Lily, tão boazinha, gentil, não machucaria nem uma mosca, quem acreditaria que ela é responsável por qualquer desastre, não é mesmo? - não era hábito seu deixar tanto de seus tormentos transparecerem.

—Por que você não me conta então? - o que Remus mais queria era entender a situação e poder ajudar, do mesmo jeito que ele sabia que o Sirius desejava. 

—Porque não aconteceu nada, só não somos amigos, ponto final - o garoto levantou a mão, indicando claramente que aquele assunto morria ali, não era algo que ele quisesse discutir com ninguém, muito menos as pessoas que ele sabia terem muito apreço pela garota.

—Você sempre foi orgulhoso, mas agora pelo jeito está sendo é imbecil mesmo.

—Remus, eu estou cansado, continuamos isso depois, ok? - ele se levantou, pronto para partir.

—Eu sei que você gostava dela, Prongs - o amigo jogou as últimas cartas na mesa, mesmo sabendo que não seria o suficiente - e não só no tipo de teatrinho que você faz para as outras garotas, e esse tipo de coisa não some de um dia para o outro.

—É aí que você se engana, não precisa nem de um dia - sem falar mais nada, James virou as costas e saiu.


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Notas finais do capítulo

Hum... quem está curiosa pra saber o que houve entre James e Lily? Engraçado, mas os dois parecem chateados e muito! Quem teve razão aí? O que aconteceu? Deu pra ver que o James tá se fazendo de forte, mas não tira ela da cabeça... e não se esqueçam que, enquanto isso, Ginny e Mione estão presas no castelo no ano errado!
Não deixem de comentar se gostaram ou não, ando meio desanimada com a escrita, comentários sempre me inspiram!
Ate o próximo capítulo
Bjus



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