Quando as Cortinas se Fecham escrita por rosecoloredJ


Capítulo 1
Parte I




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Parte I: 

Quando as luzes se apagam e as cortinas se fecham, as máscaras caem. 

Para os amantes de ópera, toda a grandiosidade do Teatro Municipal de Seul deixava a sensação de borboletas no estômago. Detalhado cuidadosamente, com o busto de grandes nomes da ópera e dramaturgia coreanas pelo hall de entrada, a homenagem aos que fizeram história emocionava grandes fãs e parecia honrar o sacrifício dos que vieram depois ao ter o privilégio de se apresentar naquele espaço tão renomado e especial. 

Para Jun-myeon, o Teatro parecia iluminar Seul inteira. Quando as cortinas se abriam, seu estômago se revirava como se fosse a primeira vez que pisava ali, quando tinha apenas 17 anos e atuava em peças da escola, as quais levava tão a sério que decidiu ingressar em um curso de teatro que talvez lhe abrisse mais portas do que os teatros escolares que ninguém levava de todo a sério. A busca por um espaço no meio foi sofrida e solitária. Arriscava-se em qualquer teste que aparecia, atuando e cantando, recebendo elogios seguidos de uma negativa, e assim voltava para casa com a cabeça baixa e as vezes até chorava, para no dia seguinte levantar e seguir para mais um dia, em mais um teste, e uma possível rejeição. 

Seu primeiro papel de relativo destaque foi aos 21 anos, interpretando um dos 3 irmãos de Wendy, numa adaptação de teatral de Peter Pan. Sentiu-se verdadeiramente feliz com a oportunidade, mas queria mais, queria também se descobrir mais e explorar mais do que poderia fazer, e como tudo no meio artístico parece chegar quando você menos espera, Jun-myeon foi descoberto de maneira ingênua por uma produtora que passava pelo corredor e o ouviu cantando uma ópera não tão conhecida, mas que era a preferida de Jun-myeon, de dentro de um camarim. Ela bateu na porta, querendo conhecer o dono daquela voz que seria perfeita para a ópera que estava adaptando. Jun-myeon, apesar de apreciador da arte, jamais havia se imaginado cantando num palco, porém, não tendo nada a perder, aceitou a proposta e manteve contato. 

Cinco anos se passaram e lá estava ele tentando em vão conter o nervosismo que antecedia o espetáculo no qual daria vida a Fausto, da ópera Faust. 

A ópera se tornou para Jun-myeon a arte que mais passou a valorizar. Era a perfeita combinação entre o espaço onde poderia ser quem quisesse ser, e onde poderia liberar energia através da voz. Um espaço onde poderia se libertar da timidez que o acompanhava em seu cotidiano. 

Espiou pela cortina e viu os três andares de cadeiras do teatro sendo ocupados. A ópera seria gratuita naquela noite, em comemoração não somente aos dois séculos de existência do espaço, mas também à resistência deste ao sucateamento e desvalorização de autoridades e das pessoas. Um dos acontecimentos que mais partiram o coração de Jun-myeon foi quando o Teatro chegou a decretar falência. O desespero e tristeza foram tão grandes que chorou. Chorou pelo teatro e pela parte dele que era ameaçada com o fechamento de seus portões, porque Jun-myeon sabia que as pessoas não davam a mínima para as artes, como nunca deram e nunca dariam realmente. 

Colocou a cabeça para dentro e voltou-se a andar de volta para seu camarim. Entraria em 10 minutos. 

*

Park Chan-yeol tinha uma maneira simplória de curtir as noites de sábado: se não estava no alojamento da faculdade tocando ou compondo estava em um bar qualquer por perto com a certeza de que só sairia de lá pela madrugada. Bêbado.

Naquela noite, porém, a programação não fora apenas diferente, mas totalmente impensada. Min-seok, seu colega de curso, comentou algumas vezes na semana que seu colega de quarto, que liderava o grupo de teatro da faculdade, estaria se apresentando naquele sábado no Teatro Municipal. Seria uma ópera e Min-seok se mostrou realmente interessado, mas não queria ir sozinho. Chan-yeol recusou algumas vezes, mas Min-seok conseguia ser insistente quando queria. 

Jogado na poltrona, de pernas abertas e o rosto esbanjando uma expressão de tédio, ele esperava impacientemente pelo início da ópera. Nunca havia assistido a uma e não tinha interesse mesmo que superficial em fazê-lo. 

— Chan-yeol, não é permitido comer no teatro - disse Min-seok ao seu lado, já sabendo que Chan-yeol não se preocuparia em lhe dar ouvidos, como não o fez até que um dos seguranças fossem até ele. Revirou os olhos e guardou o pacote de salgadinhos na mochila jogada aos pés da poltrona.

— Sairemos daqui hoje? - Bufou.

— Você poderia ser menos reclamão e aproveitar mais a oportunidade - devolveu Min-seok, passando os olhos pelo libreto* em mãos. 

Chan-yeol revirou os olhos murmurando um "Que seja" mal humorado, até que finalmente um homem entrou apresentando a si mesmo e a orquestra. Em seguida, falou sobre o tema da ópera em questão e apresentou o elenco e seus respectivos papéis. 

Ao som dos aplausos as cortinas se levantaram, revelando um cenário simplório com uma estrutura de madeira que lembrava uma catedral, coberta por um enorme tecido branco e transparente, que se estendia também por parte do palco. Em um canto do palco, quase no centro, uma figura encolhida em uma cadeira, os cabelos cobertos por uma touca e o corpo, por uma manta. Um homem velho e solitário, Fausto, que fez pacto com o demônio Mefistófeles e assim rejuvenesceu. O amor de Margarida é a única coisa que pode salvá-lo, mas seu destino é inevitável. 

Min-seok ficou inquieto na poltrona ao lado quando Fausto se levantou da cadeira de balanço e Chan-yeol soube que se tratava de Jun-myeon. Reconheceu-o da faculdade, lembrando dele como um rapaz reservado e quieto, um rosto não conhecido nas festas e grandes eventos. Notou-o poucas vezes pelo corredores, quase nunca acompanhado - ao menos não de pessoas. Como um bom estudante de literatura, estava sempre que possível com livros por perto para ler quando os horários na faculdade não eram pesados demais e com os braços cheios de papéis de textos ou anotações. 

Chan-yeol não conseguiu esconder certa surpresa ao vê-lo no palco. Podiam não conversar, mas quando o encontrava junto a Min-seok ele estava sempre calado. Não era timidez em si, só seu jeito quieto. Ali no palco, porém, parecia outra pessoa. Sua voz era firme, e ele parecia ter um terceiro pulmão para aguentar as notas altas e longas num tom de voz que deveria ser audível em todo o teatro sem o auxílio de microfones.

Chan-yeol pode ver o peito de Jun-myeon subindo e descendo rapidamente enquanto o intérprete de Mefistófeles cantava sua parte. Viu o brilho em seu olhar ao cantar, o quanto se entregava em sua interpretação e sua emoção nos versos cantados. Percebia o olhar dele, refletindo cada emoção do personagem durante os atos e também como olhava para cada canto da platéia, entregue. 

Quando menos esperou, as cortinas se fecharam e o público se pôs de pé, aplaudindo e gritando a plenos pulmões. Quando voltaram a se abrir, mostravam então todo o elenco da peça ainda em seus figurinos para que pudessem ver melhor nos olhos do público. Min-seok pulava ao lado de Chan-yeol gritando o nome artístico do amigo a plenos pulmões: Suho. Tinha um buquê de flores consigo que foi segurado por Chan-yeol durante os aplausos, que duraram pouco mais de um minuto, com o elenco se curvando em agradecimento, sorrindo com o sucesso da peça e acenando para todos os cantos. Com o buquê em mãos, Chan-yeol se colocou de pé para aplaudi-los, sem conseguir tirar os olhos de Jun-myeon emocionado. 

Fora do Teatro, Min-seok encontrou outros membros do grupo de teatro: Kyung-soo e Jong-in, que eram amigos próximos de Jun-myeon, e Jong-dae, que também tinha um pé em atividades envolvendo canto e era conhecido por sua voz estridente e estável. 

Jun-myeon apareceu já vestindo seu terno, sem a gravata. Os cabelos castanhos jogados de lado de uma maneira despojada, mas não desarrumada, enfeitavam seu rosto belo junto ao enorme sorriso que tinha nos lábios, que aumentou ao ver os amigos ali. 

— Não acreditei quando vi vocês do palco! Achei que não fossem vir! - disse ele, andando até o grupo e abrindo os braços para abraçá-los.

— Não perderíamos isso por nada! - Kyung-soo retribuiu seu abraço apertado.

— Você estava incrível, Jun-myeon. - Sorriu Jong-in - Parecia ter nascido para aquele papel.

— Eu estava tão nervoso!

— Você sempre está nervoso. - Jong-dae passou o braço por seus ombros, puxando-o para perto. 

Jun-myeon sorriu largo para Min-seok, abraçando-o, e esse se lembrou das flores que tinha comprado, que estavam com Chan-yeol.

— São lindas, Min-seok. Obrigado! - disse ele, e então olhou para Chan-yeol.

— Park Chan-yeol, certo? De Jornalismo? Prazer. 

Chan-yeol sorriu educado.

— O prazer é meu. - Chan-yeol fez uma breve reverência. - Foi… Muito bom - disse, sinceramente. Apesar do tédio, reconhecia o talento de Jun-myeon.

— Não sabia que se interessava por ópera - comentou Jun-myeon.

— Ah… Resolvi dar uma chance - mentiu.

— Que bom que gostou, então. Espero que apareça mais vezes. Esse lugar está precisando justamente disto: de pessoas que deem uma chance. 

Chan-yeol acenou com a cabeça pensando sobre as palavras de Jun-myeon por um momento, ditas num tom melancólico, mas não estendeu a conversa para saber o motivo por trás delas. 

— Vamos comemorar? - perguntou Min-seok.

— Pizza na minha casa, o que acham? - sugeriu Jong-dae.

— Ótima ideia! - Jun-myeon sorriu - Eu só preciso cumprimentar algumas pessoas e pegar minhas coisas no camarim e assim poderemos ir.

Chan-yeol se mexeu desconfortável, com as mãos no bolso da jaqueta. 

— Eu preciso ir, tenho alguns trabalhos para fazer para essa semana - disse, e então virou-se para Jun-myeon, forçando um sorriso - Parabéns pelo espetáculo, Jun-myeon.

— Muito obrigado, Chan-yeol. Obrigado por ter vindo.

— Foi um prazer. 

Jun-myeon sumiu por entre as pessoas, sendo parada por várias delas para receber congratulações e presentes. Chan-yeol se voltou para o grupo e viu Min-seok olhá-lo com uma sobrancelha arqueada, chegando perto dele. 

— "Trabalho para fazer"? Quem você pensa que engana?

— Ninguém, nem mesmo a Jun-myeon. - Sorriu irônico. - Mas não estou muito interessado em passar o sábado a noite comendo pizza com a galerinha do teatro - disse, fazendo Min-seok revirar os olhos.

— “Galerinha do teatro”. Claro - resmungou.

— Você foi insistente para que eu viesse, e eu vim. Agora estou indo. Tem como voltar para o alojamento?

— Jong-dae me leva. Até segunda.

— Até. 

*

Anuviado pela fumaça dos cigarros, o subsolo do bar estava cheio naquela noite, como acontecia aos fins de semana. Os risos pelo espaço enchia e irritava os ouvidos de Chan-yeol, que caminhava com duas garrafas de soju em mãos em busca do amigo. Se-hun estava apoiado em um das mesas de sinuca mais afastadas segurando dois tacos.

— Como foi a ópera? - Sorriu ironicamente.

— Não tão ruim quanto esperava. Jun-myeon tem talento. - Deu de ombros.

— Jun-myeon? - Se-hun arqueou uma sobrancelha e Chan-yeol o olhou.

— Do grupo de teatro. Estuda Literatura.

— Ah! Kim Jun-myeon! O Palestrinha! - Suas expressões clarearam, e então ele deu uma risada. - Me lembro dele. Estava fazendo campanha para que salvássemos o Teatro Municipal no semestre passado, falando com as pessoas nas salas, distribuindo folhetos e tudo mais. Parecia desesperado. E ele é meio esquisito.

— Ele manda bem.

— Imagino. Falam bem dele, apesar de tirarmos um sarro quando ele passa - Gargalhou.

Chan-yeol revirou os olhos, sorrindo de canto. Estudantes de Engenharia tiravam sarro de quase toda a faculdade, sendo estudantes de humanas com envolvimento em artes suas vítimas preferidas. 

Baek-hyun apareceu logo depois, com um sorriso travesso, passando o braço pelos ombros de Chan-yeol. Era um estudante de Direito que fumava maconha de vez em sempre e que já foi detido por dirigir bêbado. O retrato da justiça desgovernada. 

— Tenho boas notícias! - Anunciou. Sentou-se sobre a mesa e tomou a garrafa de soju de Se-hun, estendendo-a no ar. - Consegui um show para nós!

— O quê? - perguntaram Chan-yeol e Se-hun surpresos.

— Como? Onde? Quando? - Se-hun praticamente pulou em Baek-hyun.

— O Lay, um colega meu, vai dar uma festa na casa dele mês que vem e disse que não tinha um bom DJ, então perguntou se poderíamos tocar. Ele elogiou nosso show naquela pizzaria no mês passado. 

Se-hun pulava de um lado para o outro, gritando, e beijando o rosto de Baek-hyun, que ameaçou dar um tapa em seu rosto caso não parasse. Chan-yeol assistia a tudo com um sorriso de canto. Os três mantinham uma banda desde o início da faculdade, nomeada Elyxion, por pura diversão, mas aceitavam propostas para tocar. O único que levava as coisas mais a sério entre eles era Se-hun, que via na banda a válvula de escape dos estudos de Engenharia que lhe foram impostos pelo pai que ele não conseguia enfrentar para fazer o que realmente gostava, mesmo que ele não tivesse certeza do que era ainda. 

— Mas e então, Chan-yeol - Baek-hyun tinha um sorriso travesso nos lábios. - Como foi a balbúrdia da noite?

Chan-yeol revirou os olhos com a gargalhada dos dois.

— Tedioso - resmungou.

— Ainda não acredito que aceitou ir. Passaram a semana comentando essa ópera na faculdade. Ia ser protagonizada por um cara do grupo de teatro...

— Sim, Jun-myeon.

— O Palestrinha?! - Baek-hyun quase cuspiu a bebida. - As coisas estão mesmo indo de mal a pior, heim, Channie? - Gargalhou.

— Não fode, Baek-hyun. Não fala como se você não tivesse interesse no Jong-dae - provocou Chan-yeol, sorrindo minimamente. Do outro lado da mesa, Se-hun gargalhou.

— Eu estava bêbado quando cheguei nele, Chan-yeol! - protestou.

— Não é quando estamos bêbados que somos sinceros? - Chan-yeol deu uma risadinha com a expressão de Baek-hyun.

— Você deveria ter ficado naquela ópera!

*

O final do semestre se aproximava, assim como as inúmeras cobranças que pareciam vir juntas, de todos os lados possíveis. Haviam trabalhos a serem entregues e provas para serem estudadas vindo para cima de Jun-myeon como a bola de neve que era essa época do semestre. Paralelamente a isso, o cansaço com as atividades extracurriculares que exercia, das quais não abdicava de jeito nenhum. O cansaço era inerente, assim como as noites mal dormidas, esquecimento com datas e coisas importantes. Sempre prometia a si mesmo que não iria se sobrecarregar com matérias no período seguinte, mas mesmo quando se inscrevia em poucas, ficava cansado na metade do semestre.

Saiu da sala massageando as têmporas sentindo a dor de cabeça se instalando. Mais uma avaliação estava marcada, completando seu calendário. Seriam três semanas de avaliações mais os trabalhos que deveria entregar e apresentar. 

— Preciso me organizar para estudar hoje sem falta… - murmurou para si. Seus estudos eram sempre executados de maneira metódica, após as aulas ou reuniões do grupo de teatro, e sempre organizava os dias para estudar as matérias com pelo menos uma semana de antecedência das avaliações. Nada poderia sair dos trilhos.  

Organizou os livros e papéis nos braços que foram derrubados com o esbarrão proposital que recebeu de um trio de estudantes de Engenharia, que riam, chamando-o de “Palestrinha”, apelido que ganhou períodos atrás ao fazer uma de suas campanhas pelo campus da universidade para que as pessoas assinassem uma petição para ajudar a salvar o teatro pelo qual tinha tanto apreço. “Quando foi que fiquei tão mal falado nessa universidade?”

Tendo reorganizado os livros, sentiu o celular vibrando em seu bolso. Na tela, o nome de Lu Han, diretor do Teatro, brilhava. 

— Desculpa ligar essa hora, é que eu estou por perto, naquela cafeteria perto da sua faculdade e queria saber se tem um tempo livre.

— Claro! Chego em 15 minutos.

Lu Han deixou a China para tentar a sorte da Coreia como artista quando tinha 23 anos. Apesar da superficialidade que isso pode representar na Coreia do Sul, ele viu maior facilidade de oportunidades no país e arriscou tudo até ser aceito como trainee em uma grande empresa de entretenimento.

Lu Han tinha tudo o que o meio exige: uma boa voz, coordenação motora para uma dança complexa e um rostinho bonito. Porém, passados dois anos, ele se viu cansado das privações de sono e boa alimentação, da rigidez quanto a conduta e dentro dos centros de treinamento. Descobriu em si o amor pela direção e assim foi. Com o nome de uma empresa de entretenimento de peso em seu currículo, não demorou a conseguir oportunidades e em alguns anos, conquistou seu espaço como diretor do Teatro Municipal de muitos espetáculos que aconteceram naquele palco. 

Ao contrário do seu tom de voz na ligação, Lu Han tomava seu café com algo diferente no olhar que de início Jun-myeon não soube o que era. Lu Han forçou o sorriso. 

— Matando aula? - Brincou, sabendo que Jun-myeon dificilmente o fazia. Lu Han estendeu a mão que segurava um copo do café preferido de Jun-myeon.

— Foi cancelada. - Sorriu. - O que faz por aqui?

Lu Han suspirou, passando a mão pelos cabelos, e foi assim que Jun-myeon confirmou suas suspeitas de que havia algo de errado.  

— A Secretaria Municipal me contactou. Estão cortando as verbas - contou. Jun-myeon tomou um gole de café, suspirando em seguida. Não estava surpreso.

— Foi uma ameaça, Han - disse, de maneira calma, ainda que no fundo sentisse tristeza e medo. 

— Suho, o teatro vai fechar. A verbas foram cortadas e o anúncio oficial sairá em breve. 

— C-como? - Jun-myeon se inclinou sobre a mesa, como se assim pudesse ouvir melhor o absurdo que Lu Han dizia.

— Falei com eles hoje cedo. Estava desacreditado pois dessa vez não há nada que possamos fazer.

— Impossível!

— Os espetáculos já não tem mais tanto público....

— Mas Faust foi um sucesso! 

— Foi, mas já tem um mês que aconteceu. Precisamos de mais, precisamos mostrar que as pessoas se importam com o espaço. Não podemos deixar aqueles portões se fecharem, Suho. - A voz de Lu Han tinha algo de suplicante no tom. 

Jun-myeon suspirou pesadamente, passando a mão pelos cabelos escuros de maneira desesperada. Estar no palco do Teatro Municipal era um sonho que se tornou realidade, e não era apenas o sonho de Jun-myeon que se concretizou ali, mas os de muitas outras pessoas não só de ser a atração, mas de assistir a atração. As portas ameaçavam se fechar como a areia passava por seus dedos. 

— Você tem algo em mente? - perguntou receoso, mas sabia a resposta.

— Talvez… - Remexeu-se desconfortável. - Eu escrevi uma peça no ano passado, mas engavetei. Está completa.

— Sempre tão inseguro de suas peças… - Jun-myeon sorriu.

— Como você era de sua voz quando começou. Só precisava de tempo e… Uma situação de urgência, como esta.

— E do que se trata?

— De não saber o que fazer da vida quando nos encontramos na beira do abismo. 

*

Jun-myeon puxou a alavanca para cima iluminando o palco do teatro. Àquela hora, muitas pessoas ainda estavam em aula e o grupo só se reuniria mais tarde. Enquanto isso, o lugar ficava quieto e silencioso daquela maneira aconchegante e acolhedora, abraçando Jun-myeon com sua grandiosidade, como ele sabia que abraçava muitas outras pessoas também. Sentia um misto de emoções incômodas após a conversa com Lu Han. Sentia o desprezo pelo descaso, sonhos indo pelo ralo, raiva e tristeza. Haviam histórias a serem contadas, mas que ficariam silenciadas com o fechamento daqueles portões. 

Quando Jun-myeon se sentia sozinho demais ou perdido demais, ia para o teatro da universidade. Não era tão enorme como outros espaços que conheceu, mas sentia-se abraçado naquela grandiosidade. No escuro, parecia haver uma imensidão de todos os lados, protegendo-o das dores do lado de fora.

Em pé no centro do palco, as lágrimas caíram silenciosas, Jun-myeon mal percebeu quando aconteceu. Ali, sentindo-se perdido, não secou o rosto. Deixou que as lágrimas rolassem pois era ali onde ninguém riria de si, era ali que não era o esquisito que passava pelos corredores um tanto cabisbaixo, que promovia campanhas para salvar a arte dentro da universidade e que só recebia deboche em resposta. Ali poderia ser múltiplo, como era. Poderia ser Jun-myeon e poderia ser Suho. 

O barulho da movimentação entre as poltronas desanuviou sua mente. Passando a manga do suéter pelo rosto a fim de secar as lágrimas rapidamente, pois-se a forçar o olhar pelas poltronas no escuro tentando achar quem ou o que fazia barulho. 

— Tem alguém aí? - perguntou e ouviu um pigarreio. 

Uma figura alta saiu das sombras para a frente do palco, iluminado pela luz amarela. Park Chan-yeol estava com um violão numa mão e um caderno em outra, olhando para Jun-yeon. Desde a noite da ópera que não se falavam, pois Chan-yeol também não fazia a mínima questão, mas se esforçava para acenar com a cabeça para Jun-myeon quando passava por ele no corredor. 

— Sou só eu, mas já estou de saída - disse, ajeitando a mochila nas costas.

— Como entrou aqui? - perguntou, depois de um momento em silêncio.

— A porta dos fundos estava aberta.

— Estava? - Arqueou a sobrancelha. 

Chan-yeol ficou calado, olhando-o, e Jun-myeon soube que mentia. 

— Eu dei um jeito de abrir - confessou, bufando, como quem não se importava nem um pouco.

— O que… Inacreditável! - exclamou e Chan-yeol revirou os olhos - Não pode entrar aqui!

— Por que não? Não é um espaço para os alunos? - questionou.

— É um espaço para eventos e reuniões.

— Que seja. 

Jun-myeon ficou sem palavras diante da petulância de Chan-yeol. 

— Não! Está na porta que não é permitido entrar! São regras!

— E eu ignorei isso. Já terminou seu sermão?

— Sermão… - balbuciou - Mas que babaca!

Chan-yeol arqueou uma sobrancelha e subiu no palco, parando bem de frente para Jun-myeon, que deu um passo para trás, retraindo-se. 

— Como é?

— Foi o que ouviu. 

Chan-yeol pensou se valeria a pena discutir com ele. Achava-o irritante em algum nível, com seu jeito tão certinho e metódico, perfeccionista com tudo o que fazia. As vezes ouvia suas conversas com Min-seok, comentando a forma como organizava as coisas,  percebendo como, com ele, nada saia do planejado. Suspirou. 

— Você deveria olhar como fala, Palestrinha - provocou. 

Jun-myeon sentiu a raiva borbulhar com o apelido. Sabia o que falavam de si quando viravam as costas, sabia das piadas, mas aprendeu a ignorar e não se afetar. Ali, porém, sentindo a forma como eram cuspidas por Chan-yeol, sentiu novamente aquele incômodo que costumava afetá-lo no início da graduação. Esforçando-se para não se deixar levar, respirou fundo e deu as costas a ele, caminhando para fora, foi impedido com Chan-yeol chamando seu nome, segurando seu livro. 

— Deixou isso cair hoje de manhã - disse, batendo de leve com o livro no peito de Jun-myeon, que o tomou da mão de Chan-yeol - De nada.

Jun-myeon deu as costas a um Chan-yeol bufando de irritação, xingando-o mentalmente com todos os palavrões que conhecia. 

*

Chan-yeol estava exausto depois da última aula do dia que acontecia pela tarde. O semestre estava sendo exaustivo com a quantidade de matérias que estava fazendo e ainda tinha que lidar com o jornal da universidade, para o qual escrevia artigos sobre políticas e causas estudantis, e tinha uma coluna semanal de crônicas, na qual escrevia assinando apenas com seu sobrenome.

Sua coluna de crônicas tinha um número bom de leitores, muitos o acompanhava fielmente, aguardando a semana toda para a sexta-feira, dia em que as crônicas eram postadas, pela tarde, quando as pessoas costumavam ter mais tempo. Seu temperamento impaciente e pavio curto eram sua marca registrada. Era certo que em geral estaria de mal humor no final do período, e falava apenas o necessário com seus colegas, mas era um dos melhores escritores da redação, suas crônicas rendiam comentários pelos corredores e tinha boas ideias para matérias e por isso mantinham ele. 

Antes mesmo que pudesse entrar em seu dormitório, ouviu a voz de Min-seok chamando seu nome.

— A crônica dessa semana vai ser um tanto polêmica, não acha? - perguntou ele, com um sorriso, segurando um bolo de papéis com os escritos de Chan-yeol impressos para revisar.

— O objetivo é incomodar.

— E você consegue. - Riu. - Tem uma coisa sobre a qual eu gostaria que escrevesse. É um artigo.

— Sobre…

— O Teatro Municipal vai fechar as portas. Preciso que fale sobre. Os outros já estão ocupados com outras matérias e eu quero um artigo para no máximo quarta-feira que vem. Se possível, me manda ainda segunda-feira.

— Ah, tudo bem - respondeu, de maneira simplória, recebendo um olhar de estranhamento por Min-seok.

— Você tem noção do quanto isso é grave, né? - perguntou, cuidadosamente.

— Eu sinceramente não me importo. O Teatro Municipal já foi ameaçado inúmeras vezes. Em todas elas, a Secretaria voltou atrás em algum momento. É só drama.

— Chan-yeol, isso não é uma ameaça. É um fato. Não ameaçaram cortar a verba, já cortaram e só estão nos avisando. 

— É uma pena - disse, sem olhá-lo.

— Céus, você é um merda mesmo com o que não te diz respeito.

— Que seja. Todo mundo sabe que eles vão voltar atrás. 

Min-seok meneou a cabeça incrédulo, mas não estava surpreso. Era melhor mudar de assunto antes que se irritasse a ponto de jogar aquele bolo de papéis em Chan-yeol. 

— Lay disse que sua banda vai tocar na festa dele.

— Sim. Você vai? Kris estará lá - disse ele, sugestivo, vendo Min-seok corar com a menção ao nome.

— Talvez eu vá.

— Pode levar seus amigos também, mas eu duvido que eles queiram ir. - Sorriu irônico.

— Convencerei eles a irem junto.

— Eu duvido muito.

— Você foi à ópera. Não será impossível.

— Boa sorte. 

*

— Jun-myeon, não faça essa cara. Será divertido - disse Min-seok, sorrindo para o amigo sentado ao seu lado no banco do carona.

— Tenho coisas a fazer, Min-seok. - Cruzou os braços mal humorado. 

— Passar a noite lendo o novo livro do Chomsky? Por favor, Jun-myeon! - Jong-dae soltou uma gargalhada. - Aprenda a se divertir. 

— Eu sei me divertir, Jong-dae. E muito - resmungou. 

Min-seok estacionou o carro um tanto longe da casa de Lay. Conforme andavam na direção da casa, ouviam o som eletrônico ecoando pela rua. Perto do gramado, casais se beijavam, pessoas cambaleavam bêbadas e algumas até já vomitavam. E ainda eram oito e meia da noite. 

Jun-myeon sentia o desconforto crescer em si. Tinha poucas lembranças em festas universitárias e não eram interessantes. Não era resistente a bebida e por isso bebia pouco, em geral às sextas com Min-seok e Jong-dae no chão do quarto enquanto Jong-in e Kyung-soo cantavam no karaokê. Ficava alto, mas não passava disso. Passou a se controlar quando, depois de bêbado numa festa que participou no início da graduação, fez coisas das quais não se lembrava e no dia seguinte, além da ressaca, teve que lidar com fotos constrangedoras na internet. 

Jun-myeon não chegava perto de ser festeiro. Sempre fora reservado, mas também sozinho, e na faculdade viu a possibilidade disso mudar - mas não sem um empurrão, não sem tentar ser alguém que não era de fato. No final das contas, aquilo não valia a pena e acabou voltando para seu estado inicial, até integrar o grupo de teatro e conhecer os que seriam seus únicos e melhores amigos da faculdade, um grupo pequeno e seleto de pessoas que o conheciam melhor do que a maioria. 

Lá dentro, foram recebidos aos abraços pelo próprio Lay no hall de entrada que já estava consideravelmente cheio. Lay vinha de uma família rica, vinda da China mas com empresa na Coreia do Sul. Estudava Educação Física e era muito despreocupado. A casa era localizada em um bairro caro da cidade, o que geraria desconforto em Jun-myeon se aquilo não fosse uma festa universitária com pessoas já vomitando em um dos vasos de planta ali por perto. 

— Sintam-se a vontade. Tem bebida e salgados naquela mesa - disse Lay, apontando para uma mesa colocada ali perto. - O banheiro fica lá em cima, na primeira porta à direita. Quero que conheçam uns amigos meus - falou, pegando Jong-dae pela mão e o pulso de Min-seok e chamando os que sobraram para acompanhá-lo até a cozinha, que ficava mais para os fundos.

— Por que essa música alta desse jeito? - resmungou Kyung-soo, desviando-se de um casal de meninas se beijando na parede.

— Quando foi que ficou tão velho, Soo? - Brincou Jong-in, e Kyung-soo revirou os olhos.

— Você não fica tão incomodado com o som alto quando canta com Jong-in no Karaokê - retrucou Jun-myeon com um sorriso.

— É porque lá o meu convívio social é restrito a vocês, não à metade da faculdade. 

Na cozinha, copos de bebida pela metade e garrafas de vodka ou alguma bebida barata estavam pelo balcão de centro. Um grupo familiar a Jun-myeon conversava em um canto, rindo, bebendo e fumando. Um deles era Chan-yeol. Jun-myeon não conteve a virada de olho e o suspiro ao vê-lo, e Chan-yeol não escondeu o olhar enviesado a ele. 

— Então, esses são os amigos que eu falei. Esse é Se-hun, de Engenharia - disse Lay, e o mais alto dos três acenou. - Baek-hyun, de Direito, mas daqui é o mais errado - O mais baixo entre eles, de cabelos avermelhados, sorriu, direcionando os olhos espertos para uma pessoa em especial: Jong-dae.

— E esse é Chan-yeol, de Jornalismo. Min-seok já deve conhecê-lo. Esses são Jong-dae, Jong-in, Kyung-soo e… Me desculpe, eu não sei seu nome.

— Jun-myeon.

— O cantor de ópera da faculdade? - Os olhos de Lay se arregalaram - Falam muito bem de você, cara!

— Ah… Obrigado… - Jun-myeon sorriu tímido.

— Gente, eu preciso receber alguns amigos, mas eu volto assim que possível. 

Um silêncio incômodo pairou sobre todos ali. Parecia haver dois mundos bem diferentes tendo que interagir de uma maneira forçosa que incomodou Jun-myeon, apesar das boas intenções de Lay ao apresentá-los. 

— Vou pegar uma bebida… - anunciou Baek-hyun, chegando perto de Jong-dae - Gostaria de vir junto?

— Há bebidas bem ali - disse Jong-dae, apontando para o balcão atrás do grupo, e ninguém conseguiu esconder as reviradas de olhos e as bufadas com a falta de percepção dele.

— Vai com ele, Jong-dae! - disse Min-seok, impaciente, cutucando-o nas costelas.

— Mas-

— Vai logo! 

Jong-dae olhou irritado para Min-seok e então seguiu Baek-hyun para fora da cozinha. Jong-in engatou uma conversa sobre eles tocarem naquela noite, da qual Jun-myeon ficou de fora, sentindo-se tímido naquele meio. 

— É desconfortável para você ficar fora do teatro? - provocou Chan-yeol, com um sorriso sacana nos lábios que seguravam um cigarro que encheu Jun-myeon de raiva. 

— É desconfortável ficar com você - retrucou, fazendo Chan-yeol bufar. 

— Não aguenta o tranco do que você criou, Palestrinha?

— Não me chame de- Interrompeu-se.

— Do que você não quer ser chamado? 

Chan-yeol deu uma risada irônica com a reação de Jun-myeon, irritado e envergonhado daquele jeito, com o rosto vermelho e não conseguiu deixar de pensar que o desejo de provocá-lo se tornava incontrolável. 

— Vejo que estão se dando bem - comentou Min-seok, ironicamente.

— Super. Até queria que ele andasse com a gente - resmungou Jun-myeon, cruzando os braços.

— Você me deixaria entediado - disse Chan-yeol. 

Jun-myeon buscou palavras para respondê-lo, mas sabia que não  deixaria tão irritado quanto se sentia, então virou as costas e voltou para o hall de entrada procurando a mesa de bebidas, vendo Baek-hyun encurralando Jong-dae na mesa, ambos com sorrisos maliciosos no rosto. 

Parou rapidamente ali para pegar a bebida e foi para fora da casa, sentando-se no gramado. Ficou ali um bom tempo, bebericando o líquido com gosto de tuti-fruti que descia queimando por sua garganta. Sentia-se deslocado. Seus poucos amigos estavam enturmados com outras pessoas de alguma maneira, mas ele era o único que não conseguia. Quantas vezes sentia como se tivesse algum problema consigo? 

Min-seok se sentou ao seu lado, dando-lhe mais um copo daquela bebida estranha mas que caia bem em contraste com a amargura que sentia. 

— Chan-yeol não é tão ruim quanto parece. Talvez vocês só tenham começado de maneira errada.

— Não vejo como começar bem com ele.

— Se não fala com ele, pelo menos dê uma chance a outras pessoas. Não é tão difícil. 

Jun-myeon suspirou absorvendo as palavras que Min-seok lhe dissera inúmeras vezes.

— Vou tentar… - forçou um sorriso e Min-seok sorriu, levantando-se.

— Vamos, eles vão tocar agora. 

Elyxion não era uma banda com um nome interessante, mas com bons covers. Algumas músicas eram conhecidas por Jun-myeon, como Knee Socks, do Arctic Monkeys, que estava sempre no replay de sua playlist, e Attention, de Charlie Puth, que foi adaptada e tocada numa pegada de rock interessante.

Baek-hyun tinha uma voz muito bonita e era bastante carismático. Tinha uma beleza marcante, os olhos espertos destacados com lápis de olho e os lábios finos esbanjando um bonito sorriso. Se-hun era um bom baterista e parecia ser bem diferente no palco. Jun-myeon tinha notado que parecia um tanto retraído, mas ali, tinha um enorme sorriso e vez ou outra fazia graças para a plateia. Era charmoso, divertido e chamava a atenção. 

Por fim, Chan-yeol. Uma figura peculiar, mal humorada e mal encarada, mas que atraia olhares. Jun-myeon não sabia se era a bebida fazendo efeito, mas em algum momento ficou e reparar na forma como ele tocava, como parecia se divertir e até mesmo como o ambiente parecia fazer o inusitado: arrancar-lhes sorrisos. Assim, nem parecia ser a pessoa irritante de cerca de 40 minutos atrás. 

Ao final do show, Jun-myeon sentia-se tonto. As bebidas a mais que tomou junto a movimentação durante o show e pouca tolerância a pouca bebida ajudaram no efeito. Aos tropeços, caminhou para fora da multidão que parecia girar ao seu redor, na direção do gramado. Não prestou atenção no grupo pelo qual havia passado até que um deles colocassem o pé à sua frente e Jun-myeon tropeçasse, caindo com o peito na terra. 

Tentou se levantar mas estava tão tonto que se desequilibrou e caiu novamente, fazendo o grupo rir ainda mais alto. 

— Vocês não tem mais o que fazer, porra? - Uma voz familiar gritou - Sumam daqui!

— A gente só estava brincando com ele, Park.

— Eu disse pra sumirem! 

Jun-myeon sentiu mãos firmes segurarem seu corpo e levantá-lo. O aperto de Chan-yeol em seu braço era firme, e ainda assim ele tinha dificuldades de se manter parado. Chan-yeol riu anasalado. 

— Min-seok está preocupado porque você não atende ao telefone.

— Eu não senti o telefone tocar.

— No seu estado ninguém sente. Quer água? Vai te ajudar. 

Jun-myeon, mesmo que um tanto desconfiado, aceitou a oferta e Chan-yeol o guiou de volta para casa, por entre a multidão, até a cozinha, onde pegou um copo e serviu de água gelada. 

— Olhando assim você não parece tão babaca - disse Jun-myeon, aos soluços.

— E você não parece tão tedioso.

— Eu não sou tedioso! Eu só sou diferente de você! - A voz de Jun-myeon era embolada.

— Esse papo de diferenças é muito fofo, mas você é tedioso sim, Palestrinha.

Jun-myeon revirou os olhos, terminando de beber sua água. 

— Obrigado pela ajuda - disse - Preciso ir atrás do pessoal.

— "O pessoal" está meio ocupado no momento - comentou Chan-yeol, divertido.

— Como assim? - perguntou Jun-myeon e Chan-yeol suspirou.

— Baek-hyun e Jong-dae sumiram, assim como Jong-in e Se-hun. Kyung-soo está com uma garota nos fundos e Min-seok foi "dar uma volta" com Kris Yifan.

— Yifan… Não sabia que ele tinha voltado à Coreia.

— Já tem dois meses - disse Chan-yeol, apoiando-se na bancada de frente para Jun-myeon.

— Obrigado por ter me ajudado - murmurou.

— Não foi nada.

— Eu acho que vou para casa. Vou mandar uma mensagem para Min-seok e os outros avisando. Mais uma vez, obrigado. 

Jun-myeon andava cambaleante pelas ruas do condomínio que pareciam infindáveis, odiando-se por não ter respeitado seus limites a ponto de ter chegado num ponto no qual mal conseguia se manter de pé sem precisar de alguma ajuda. Sempre que passava dos limites quando bebia com Min-seok em seu quarto, ficava com raiva de si e prometia que não faria novamente, como dificilmente fazia. Não gostava de perder o controle das coisas, muito menos de si. 

Uma luz amarelada iluminou a rua e ele foi para um lado, escorando-se no capô de um carro quando o que vinha atrás dele parou ao seu lado e o vidro se abaixou. Chan-yeol arqueou a sobrancelha ao vê-lo daquele jeito, estranhando a figura de Jun-myeon sempre tão nos conformes de repente estar descabelada, com uma mancha de terra no suéter e bêbado. Suspirou. 

— Eu te deixo em casa - disse.

— Não precisa, eu consigo pegar o ônibus - respondeu e Chan-yeol checou as horas no celular.

— O último ônibus parou de rodar há mais de 40 minutos. Entra logo. 

Jun-myeon suspirou e deu a volta no carro, tropeçando nos próprios pés e caindo na frente do carro. Chan-yeol levantou uma sobrancelha divertido ao ouvir ele dizer que estava bem mesmo com o esforço para se levantar e abriu a porta do carona para entrasse. Jun-myeon se tornava uma figura cada vez mais engraçada para Chan-yeol, estava quase conseguindo fazê-lo dar uma gargalhada. 

O silêncio dentro do carro era um tanto constrangedor, mas Jun-myeon se sentia ainda mais tímido com a ideia de puxar assunto. Chan-yeol, por outro lado, simplesmente não dava a mínima se ele queria conversar ou não, apenas seguiu o trajeto até os alojamentos, sentindo olhar do outro em si vez ou outra. Estava em sua costumeira jaqueta de couro, a mesma que usara na apresentação de ópera de Jun-myeon e que fez Min-seok revirar os olhos com tamanha apatia - ou talvez apenas um traço forte de sua personalidade - que o fez destoar dos demais e chamar atenção, jeans escuros e um camisa qualquer. Os cabelos caiam para o lado de maneira charmosa, caracterizando-o de maneira singular. Sua altura e humor intimidavam até mesmo Jun-myeon, apesar de não gostar de admitir, mas percebeu ali que talvez Chan-yeol não era tudo o que havia idealizado. 

Chegando nos alojamentos, Jun-myeon já não estava mais tão tonto e já conseguia caminhar sem tropeçar, sentindo-se mais sóbrio e lúcido. Entraram no elevador e Chan-yeol apertou a tecla “4”. 

— Ah, não precisa me levar até meu quarto - disse Jun-myeon.

— Estou indo para o meu - respondeu Chan-yeol. Jun-myeon corou forte, querendo apenas apagar sua existência naquele momento. - Você precisa de alguma coisa?

— Não! Estou bem, obrigado.

— Ok, então. 

Chan-yeol simplesmente virou as costas e andou até o final do corredor, onde ficava seu quarto. Assim, sem dar boa noite ou um sorriso mínimo para Jun-myeon, que ficou parado na frente da sua porta, sem palavras, observando o outro andando para longe de maneira apática e entrando em seu quarto sem olhar para trás. 

“Qual é o problema desse cara?”




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Notas finais do capítulo

*Libreto: parte escrita da ópera



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