Human ▸ Leah Clearwater escrita por Woodsday


Capítulo 3
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Naquela noite, durante o jantar, Leah não tirou os olhos da porta que levava a garagem. Felizmente, com a morte do seu pai, Sue havia colocado um armário de louças que cobria toda a passagem e não permitia que nenhuma das mulheres se lamuriasse durante a madrugada naquele cômodo em específico. 

— Tudo bem, Lee? — sua mãe questionou gentilmente, colocando a mão sobre a dela. 

Leah rapidamente desviou-se do toque, ignorando deliberadamente a expressão magoada da mãe. 

— Tudo bem mãe, apenas cansada. — Foi sua resposta curta e não de todo mentirosa. Sue estreitou os olhos para ela, mas permaneceu em silêncio enquanto voltava a enfiar a garfada de macarrão na boca.

Leah sabia muito bem que Sue se entristecia com a distância que ela havia imposto entre as duas, mas havia algo na loba que há muito tempo não conseguia se conectar com o resto do mundo.

Leah não conseguia se conectar nem mesmo a única pessoa que sempre a entendeu, apoiou e protegeu. 

Lembrava-se perfeitamente da mãe marchando para a casa de Emily  e acertando um tapa estralado no rosto de Sam, é claro que isso fez com que a pequena mulher saísse com uma fratura grave, mas a mãe não deixou um único gemido de dor sair de seus lábios, nada além do olhar furioso em direção ao ex-namorado da filha.

— Eu me arrependo do dia que abri minha porta para você. — ela disse rudemente antes de dar às costas e seguir direto ao médico da reserva. Nem Sue e nem Leah entendiam exatamente o que estava acontecendo, tampouco porque seu pai parecia tão favorável a Sam. Foi só mais tarde, com a sua própria transformação que Leah entendeu e que procurou os braços acolhedores e protetores da mãe, buscando um conforto inexistente nas palavras orgulhosas, mas duras de seu pai.

As lendas eram todas verdadeiras, mas ninguém parecia ter compaixão das coisas que Leah perdeu com elas.

— O macarrão está uma delícia, mamãe. — ela disse suavemente, na esperança de fazer Sue se sentir melhor e como era o esperado, funcionou.

O rosto da mulher mais velha se iluminou, contente por receber um elogio de Leah. É claro que a loba sabia que magoava muitas pessoas ao redor dela, mas ela sempre disse à todos que era como uma bomba química soltando fragmentos que adoeceriam todos ao redor, até que finalmente, ela explodisse e se tornasse uma tragédia. 

— O que tanto olha, Lee? — Seth questionou cutucando-a nas costelas e Leah crispou os lábios, fazendo um som de desagrado enquanto afastava a mão do irmão rudemente. — Tem algo no armário da mamãe?

— Nada que seja da sua conta, moleque. 

Seth bufou, lançando à ela um olhar indignado. — Leah deve ter sido transformada na tpm, mamãe. Não é possível.

— Respeite sua irmã, querido. — Sue disse firme e Seth lamuriou-se, recebendo um sorriso vitorioso de Leah. — Como está o trabalho, filha?

Leah parou o garfo a meio caminho da boca, à medida que o semblante de Sue tornava-se de lamento e o de Seth divertido. Leah suspirou, deixando a comida cair sobre o prato novamente e preparando-se para um discurso que não fizesse a mãe enxotá-la de casa.

— Você perdeu outro emprego, Leah?

— Bem, em minha defesa, aquele merda tentou passar a mão em mim, mãe! — Leah resmungou irritada, lembrando-se do episódio onde estivera trabalhando na oficina do único mecânico de La Push, Leah fazia um trabalho de contas e atendimentos, não havia nenhum motivo para o velho nojento e safado do Cleiford se aproximar e tentar a encurralar como se ela uma garotinha indefesa. 

Ficou muito contente ao ver o velho mecânico ficar roxo de dor enquanto se ajoelhava levando as mãos ao peito, tentando suportar a dor dos ossos quebrados.

— Leah quebrou todos os dedos dele. — Seth contou, rindo abertamente e Leah deu um sorrisinho, desmanchando-o imediatamente quando a mãe a olhou furiosa.

— Bem, é claro que você estava certa, mas... — os ombros de Sue caíram em desanimo. — as coisas não estão fáceis, querida. Nós precisamos...

— Vou dar um jeito, mãe. — Leah prometeu, tentando confortar Sue. Sabia que desde a morte do seu pai as coisas não estavam bem. Financeiramente falando, haviam muitas contas esperando por pagamentos e a lista só tendia a aumentar. Mesmo com Seth procurando trabalho e Sue lavando algumas roupas para as mulheres mais ricas de Forks, ainda era... Complicado.

Ser uma protetora da humanidade e baboseira e tal não fazia com que Leah tivesse alguma recompensa de fato. Por isso ela vinha tentando arduamente encontrar um bom trabalho, não que estivesse tendo sucesso. Seu temperamento explosivo sempre fazia com que Leah explodisse e mandasse tudo para os ares, ficando assim, sem expectativas de um salário completo ao final de cada mês.

Não ajudava muito que os velhos tarados de Forks achassem que a sua pouca roupa era um convite para a exploração. Leah odiava exibicionismo, mas também não tinha mais muitas calças em seu guarda-roupa, o que a fazia usar bermudas e regatas na maior parte do tempo.

Os homens idiotas daquela cidade achavam mesmo que Leah fazia questão de passar frio só para mostrar seu corpo para quem quisesse ver. Ela achava um absurdo o quanto eles pensavam que isso lhe davam direitos que só poderiam vir da sua boca. 

— Leah... E se você conversar com o doutor Cullen, sabe... — sua mãe a olhou apreensiva e Leah comprimiu os lábios, irritada por ter que ouvir mais uma vez aquela conversa.

— Mãe, eu odeio ficar perto de sanguessugas. Eu não vou pedir dinheiro à eles.

— Não é dinheiro, filha. — Sue afastou o prato de si mesma, encarando-a com os olhos negros cheios de sabedoria. — É trabalho.

— Eu vou dar um jeito, mãe. — Leah prometeu levantando-se com o próprio prato e retirando-se da cozinha sem se despedir. Ainda pode ouvir um suspiro da sua mãe antes de atravessar a porta e correr em direção à garagem, onde tinha quase certeza que o animal já havia partido. Leah optara por deixar as portas dos fundos encostada e deixara isso bem claro para o inteligente tigre.

Internamente, esperava que o bicho já tivesse ido embora. Assim teria uma preocupação à menos em sua cabeça, ainda que o sentimento que ver o animal partindo fosse como cordas puxando algo dentro do seu peito.

Não doía, necessariamente, mas era uma sensação incomoda. 

Leah puxou o ar corajosamente antes de empurrar as portas avermelhadas de madeira fina. Mesmo com a pouca claridade do ambiente, Leah não teve dificuldades para encontrar o animal deitado sobre uma colcha antiga que Leah roubara do próprio guarda-roupa. 

Ele ergueu a cabeça assim que Leah entrou, as orelhas em pés e os olhos azuis brilhavam na escuridão, tornando-se quase brancos. Por um segundo, Leah perdeu o fôlego.

Ele era realmente lindo.

Como uma criatura mística vindo dos livros que ela lia quando era mais jovem, ela podia imaginar que ele não deveria ser um tigre comum. Não com toda aquela magia rondando ao redor deles como se os próprios espíritos guerreiros estiverem presentes na pequena oficina de seu pai. 

— Oi. — Leah disse depois de um momento dando um passo em direção ao animal. — Você quer caçar? Sabe... As coisas estão difíceis, então... Não tenho nenhum bife suculento para te dar. 

O animal grunhiu, deitando-se novamente sobre a colcha e Leah suspirou, aproximando-se dele e se sentando lentamente,

— Olha. É melhor você caçar. Não quero você arrancando minha cabeça porque estava com fome. 

O animal outra vez grunhiu e Leah quase teve a sensação de que ele estava revirando os olhos. Seria muito cômico se alguém a visse neste momento.

— Bem, você quem sabe. — Ela disse finalmente, olhando-o diretamente e o animal abriu a boca gigantesca em um bocejo preguiçoso antes de se mover e aconchegar-se junto das pernas de Leah. Ela sorriu, quase comovida com a forma como ele parecia um gatinho domesticado, então inclinou o corpo, apoiando-se sobre as costas do animal. — Bella Swan fica exatamente assim com Jacob, sabe, em sua forma de lobo. Eu acho um absurdo, como eles se comportam como namorados quando Bella Swan não está nem aí para nada além da sua própria bunda e a bunda de seu sanguessuga idiota. 

O tigre soltou um murmúrio preguiçoso e Leah realmente tomou aquilo como um incentivo.

— Jacob é meu amigo, talvez um dia você o conheça, apesar de achar que ele vai tentar me internar. Mas bem... Se você não for embora antes...

Leah foi interrompida pelo rosnado abaixo dela e sorriu, dando dois tapinhas nas costas do animal.

— Todos partem um dia, amigo. Eu já estou acostumada. — Foi sua resposta acompanhada de um bocejo igualmente cansado. — Você deve ter uma família, certo? Uma tigresa e outros mini tigrinhos. Quem sabe... — A voz de Leah se tornou baixa a medida que o sono a envolvia e Raghe movimentou-se lentamente, aconchegando-a de melhor forma às suas costas e fechou os olhos, deixando-se envolver pelo perfume atraente daquela mulher peculiar. 

Ele havia tido uma esposa, um dia. Mas ela fora brutalmente assassinada e Raghe, tomado pela sua dor profunda havia amaldiçoado o deus Odin por tirar dele sua amada. Odin, por um azar do destino, ouvira todas as maldições e as revertera para Raghe, condenando-o a permanecer do corpo de um animal até que encontrasse outra mulher tola o suficiente para amá-lo exatamente da mesma forma que Katirha um dia amou. 

Mil anos haviam se passado, longas lutas por sobrevivência, séculos de vida se passaram antes que Raghe pudesse sentir outra vez àquela sensação, o instinto de proteção e cuidado. Suas necessidades moldando-se às de outra pessoa.

Uma pessoa nova, diferente e absolutamente encantadora. Uma mulher, cuja Raghe sabia, estava destinado à amar. 

 


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