P.O.V. Kyle.

Pensei que dentre todas as pessoas, a Kelly me apoiaria. Parece que eu me enganei.

Eu sei, Kyle e Kelly. Soa até meio brega agora.

—Então... está terminando comigo?

—É. Antes você era feio por dentro, mas era rico e gato. Agora você é feio por fora também. É uma monstruosidade. E eu não quero ser vista perto de você.

E ela saiu. Eu fiquei sozinho. Completamente e totalmente sozinho. Na escola ninguém falava comigo. Minha mesa que antes ficava lotada, agora está vazia.

Então, alguém sentou nela.

—O que está fazendo?

—Te fazendo companhia. Parece que precisa. E... eu trouxe café.

—Não preciso da sua pena!

—Tudo bem. Eu estava ser legal, mas... se você não precisa de ninguém... Tchau Kyle.

Ela se levantou.

—Espera. Sinto muito.

—Isso é um avanço. E eu te perdoo.

Antes de começar a comer, ela fechou os olhos e uniu as mãos e quando a boca abriu todo encarou. 

—Amém.

—Isso eu entendo.

Ela riu.

—Que língua era aquela?

—Uma língua muito, muito, muito antiga.

—Porque está aqui?

—Eu estudo aqui.

—Quero dizer aqui, sentada na minha mesa? Falando comigo? Você acha que eu sou um idiota.

—Não. Você se comporta como um idiota. Há uma diferença muito grande. E acredite, eu já vi mal verdadeiro e você não se encaixa nesta categoria.

A única pessoa que não se afastou de mim depois... a transformação foi ela.

—Meu pai quer me operar.

—Porque?

—Por causa disso.

Disse apontando para meu corpo deformado.

—Mas, você está saudável! Você não corre o risco de morrer e não há nada errado dentro de você.

—Como você sabe disso?

—Eu sei como a maldição da Fera funciona. Odeio ter que dizer isso, mas o que você vê é o que você é. Seu interior é refletido no exterior. Como um espelho da alma.

Disse comendo um pouco da sua comida.

—Como você sabe como funciona?

—Porque já foi usada antes. Em alguém que não era você. Não sei que dor é essa que você guarda, mas... sofrer não te torna menos homem, chorar não te torna menos homem, te torna humano.

Como que eu nunca notei ela antes?

—Você estuda aqui á muito tempo?

—É. Só á três anos.

—Sim. Me disse isso no baile. 

—Uau! Ele me ouviu. Chocante.

—Uau! Me sinto um idiota.

—Você se comporta como um.

Charlotte e eu nos conhecemos na noite em que Kendra me transformou neste monstro. Estamos nos sentando juntos á duas semanas.

—Te trouxe uma coisa.

—O que?

Estendi a rosa branca pra ela.

—Sou...

—Sou digno de você. Eu sei, eu me lembro. Mas, não acho que eu seja digno de você.

—Porque não?

—Você prefere o conteúdo, á forma, mas neste momento eu não tenho nenhum deles.

—Porque pensaria isso?

Também naquela noite tiramos uma foto juntos para o jornal da escola e eu notei que ela tinha o sorriso mais lindo e autêntico que eu já tinha visto.

—Você quer jantar comigo?

—Tipo um encontro?

—Se quiser que seja um encontro.

—É um encontro.

Mais tarde, depois da escola nós jantamos na minha casa.

—Bela casa.

—Obrigado.

—Uau! Luz de velas.

Começamos a conversar e conversa vai, conversa vem ela viu uma foto da minha mãe.

—É a sua mãe?

—Sim.

—Vai me apresentar?

—Ela morreu quando eu tinha sete anos. Num acidente de carro.

—Sinto muito. Tenha certeza que ela está na Cidade Prateada.

—Cidade Prateada?

—Quero dizer, no céu.

—Espero que sim. Ela merece.

—Esta é a sua dor. A morte da sua mãe, a ausência dela. Sinto muito, Kyle. Mas, como você tem sotaque britânico?

—Meu pai, nunca foi um bom pai e depois que minha mãe faleceu... ele me mandou para ter a melhor educação, num internato na Inglaterra.

—Minha Nossa! Sinto muito, mas tenho certeza que ele tinha as melhores intenções.

—Eu duvido. Meu pai me odeia.

—Eu duvido. Sabe, você é mais inteligente do que pensa, melhor do que pensa. Porque não se dá uma chance? Tente e faça por você. Não para agradar alguém. Seja você mesmo e dane-se o que os outros pensam. Se você for você mesmo, alguém vai gostar eu aposto. E se não gostarem? Azar o deles né? E julgando por este belo jantar á luz de velas, quando você decide fazer alguma coisa... Pelo Amor de Deus! Você deixa os outros no chinelo.

—Obrigado. Mas, que outros?

—Eu já tive outros namorados e eu tenho uma filha. O nome dela é Jessica.

—Você tem uma filha?

—Tenho.

—Quantos anos tem a sua filha?

—Vamos devagar.